Zagaia (trechos)

O moleque é Zagaia

Filho de presidiário

Ardida fera ligeira

Criada sem horário

Aprendiz da Lua Cheia

Veneno de Serpentário

 

Pai sempre na carrocinha

Zagaia rua e casa

Neblina e madrugada

No vidão ganhando asa

Amigo dos viajantes

Descalços pisando brasa

 

É bom lembrar o óbvio

Senão fica esquecido

Trocentos anos de senzala

Negro chicote sentido

Hoje em morros crianças

Rosto preto ou curtido

 

Filhote no subúrbio

Mulato, pardo ou preto

Sobra futuro capenga

Dia-a-dia de espeto

De ancestral Moçambique

Angola, Jejê ou Queto

 

Cabra vindo do Nordeste

De pele pouco mais clara

Também sofre do Quebranto

Pois justiça é joia rara

Fugindo da amargura

Com tristeza se depara

 

No bairro onde ficaram

Predomina a pindaíba

Guetos quentes sempre cheios

De irmãos da Paraíba

Moeda forte por ali

É malícia e catimba

(Zagaia, 2007.)

 

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LIVROS E LIVROS

Ficção

José Endoença Martins - O Dom de Casmurro - Resenha
Exu, entidade do princípio e da transformação. Ele se multiplica, transmutando. Instaura o princípio da reciprocidade, da transformação e do movimento. Nem bom, nem mau: reúne em si todas as contradições do homem. Exu resolve conflitos, mas também pode provocar. Separa e une. Nas palavras de José Endoença Martins: “Exu é capaz de neutralizar polaridades e polarizações para ensejar fusões e combinações” (p. 12-13). Nada melhor do que a imagem e a ideia de Exu para perceber o objeto desta resenha: O dom de Casmurro, romance escrito pelo...

Poesia

Carlos de Assumpção - Não pararei de gritar
Adélcio de Sousa Cruz* NoiteQue conservaOrgulhosamente A despeito de tudoUm punhado de estrelasEm cada mão(Autorretrato, p. 51) Reler/ler Carlos de Assumpção é sempre um presente envolto num turbilhão de emoções. A voz ancestral e simultaneamente contemporânea, performando versos rápidos, sonoros, cadenciados, pode tirar nosso fôlego, a depender dos ares do dia e/ou da noite. Curioso notar, entretanto, que em alguns dos poemas a rima se parte ou é quebrada ao final, em tom de mimese daquele dramático momento em que inúmeras trajetórias de nossos a...

Ensaio

Eduardo de Assis Duarte - Machado de Assis afrodescendente
Chega à terceira edição o livro de Eduardo de Assis Duarte, cujos estudos são referência para quem quer compreender a obra de Machado de Assis a partir do lugar de negro que ele foi e do qual produziu sua obra. Essa nova edição, enxertada com novos textos do autor carioca e com novos ensaios críticos, testemunha a receptividade e a pujança da investigação dessa dimensão da obra machadiana, em fase de exploração e descobertas. A capa do livro estampa linda foto de Machado maduro, posando elegância, de barbas embranquecidas em contra...

Infantojuvenil

Jorge Dikamba - Amaní
Mais de trezentos anos de escravidão marcam a história de um país. E isso se reflete na maneira como nós, da outra extremidade do Atlântico, enxergamos a África. Em geral, a vislumbramos a partir do exotismo, fruto de nosso desconhecimento e das imagens estereotipadas difundidas no Ocidente. Mesmo nas escolas, o continente africano só passa a “existir” após a chegada dos europeus. De certa forma, é outra a África representada em Amani. Historiador e pesquisador da cultur...

Memória

Abdias do Nascimento - Submundo: cadernos de um penitenciárioUm prefácio para (a alma nua de) Abdias Nascimento*   Denise Carrascosa   Os escritores costumam redigir os prefácios dos seus livros – ou deixá- los aos cuidados de outrem – quando a obra já se encontra terminada e nas vésperas da publicação. Eu, por motivos mui especiais, vejo-me na contingência de inverter essa norma: a mais forte razão desse procedimento reside no fato de não ser eu um escritor.   Abdias Nascimento   Submundo (2023) é um livro de cadeia. Foi nela, mais precisamente na Penitenciária do Carandiru, que Abdias Nascimento escreveu um importante capítulo da jornada que fez de...

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