Outra Nega Fulô

O sinhô foi açoitar
a outra nega Fulô
– ou será que era a mesma?
A nega tirou a saia,
a blusa e se pelou.
O sinhô ficou tarado,
largou o relho e se engraçou.
A nega em vez de deitar
pegou um pau e sampou
nas guampas do sinhô.
– Essa nega Fulô!
Esta nossa Fulô!,
dizia intimamente satisfeito
o velho pai João
pra escândalo do bom Jorge de Lima,
seminegro e cristão.
E a mãe-preta chegou bem cretina
fingindo uma dor no coração.
– Fulô! Fulô! Ó Fulô!
A sinhá burra e besta perguntou
onde é que tava o sinhô
que o diabo lhe mandou.
– Ah, foi você que matou!
– É sim, fui eu que matou –
disse bem longe a Fulô
pro seu nego, que levou
ela pro mato, e com ele
aí sim ela deitou.
Essa nega Fulô!
Esta nossa Fulô!

 

(Cadernos Negros 11, p. 56-57).


LIVROS E LIVROS

Ficção

Cadernos Negros 38 - contos afro-brasileiros
  "Estamos no limiar de um novo tempo.Tempo de Áfricavida nova, mais justa e mais livree,inspirados por ela,renascemosarrancando as máscaras brancas,pondo fim à imitação.Descobrimosa lavagem cerebral que nos poluíae estamos assumindonossa negrurabela e forte. As diferenças de estilo,concepções de literatura,forma,nada disso pode mais serum muroerguido entre aquelesque encontram na poesiaum meio de expressão negra.Aqui se tratada legítima defesados valores do povo negro.A poesia como verdade,testemunhado nosso tempo." Cadernos Neg...

Poesia

Nina Rizzi – Caderno-goiabada
    porque alguns nomessão tão desdizíveiscomo marido e esposo êxtase, precipício porque desse nomecalcanhar ou punhoé tecido destino   fio em desfiopronto a não-ser   porque de um outro nome seu nomepura renda alcanço a delicada e violenta potência de dizer anchova   Nina Rizzi 2022     Livro de receitas, diário, processo de escrita criativa e de descoberta de si mesma, de um corpo-voz; poesia, questionamento de fronteiras – dos meios, da forma, do status quo –, ou ainda experimento se...

Ensaio

Ele Semog - A Galinha Garnisé e outros Eusébios de Queirós
  Não tenho nenhum motivo para deixar de combater o racismo. Não faço acordo com a minha poesia. Há alguns anos, conversando com o professor Abdias Nascimento, ele me disse que muitos brancos o consideravam um negro ingrato. Então, de pronto lhe respondi: “então somos dois negros ingratos, professor”. E caímos na gargalhada, cheios de motivações.  Ele Semog A sociedade brasileira, hierarquizante e hierarquizada, que dos seus quase cinco séculos de existência, foi escravista por mais de trezentos e cinquenta anos, ainda contemporaneamente concebe as diferenças cultura...

Infantojuvenil

Patricia Santana - Entremeio sem babado / Minha mãe é negra sim / Cheirinho de neném
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Memória

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