Reconhecimento de firma

 

esperto ciumento peripatético

alinham-se como que progredindo

para um a prancha cubista

 

parentes disparatados-toantes de

mário de andrade (a meditação

 

sobre o tietê) pessoas paranormais e

paronomásticas clemantes e

cínicas ou metafísicas ainda

 

signatários da função poética da linguagem

assim alberto ass. adalberto ass. Dagoberto

 

(Vá de Valha, 1992)

Dois do dois: olomí


mar em festa as gentes
   infestando as águas da mãe grande
o sentamento das coxas encimadas
   por quadris de contrabaixo o velido
vestido com vida própria que se
   sustenta nas próprias barras
longo-cerúleo
   a escorrer do colo até os tornozelos
lambendo rente suas curvas
   untuosas sempre recomeçadas
deambula senhora dona sobre escuma de flores
   deslinda-se lisa
bailadora de melífluo pensamento
   fleuma de chama branca
pétalas verdes um pé após outro
   olho alongado apenas para o que está
à altura dos seus olhos se espraia
   vai-vai (esteira de aeroporto) incansável
ou como que pousada em andor
   suspensa acima de dor e adoração
serena sereia sarada
   avião levando a pique cópia de barcos
de brinquedo objetos do artesanato mercante
   desova de coisas baratas
na praia clara
   odalisca de todas as luas loas e olas
olorosa bunda barroca
   suas ancas justificam o epíteto:
sacudidora da terra
   sovaco nu polido como a concha
pelo lado côncavo
   se homero conhecera iemanjá iorubá
talvez conformara mais doce
   o mar de odisseu filho de laertes

 

DESLIMITES 4

navalha um sol de azeviche
negride
– guerreiro em dorso de pedra.
desfruto de um tempo
escultor de tragédias.

procissão de navegantes rotos
clamores
que tocam para o sr. ninguém,
ventos que sopram para lugar nenhum,
assassinos que anunciam santos.

auroram prímulas de sangue
                                     e amargaridas
ávidas
nos meninos que trepam na chuva.

vagam vagões no caos
                – refúgios de ciclones –
risos em releases
almas de silicone.

onde se esgota a semântica do esgoto,
o tecido frugal do ser,
o ácido licor da espera?

vela a primavera
                     ao herói
e sua era,
rompe a lírica dos deuses
e sua dança de enigmas.

desentrevam luzes à barbárie.

e os surdos ouvem
e os cegos vêem.
                        (Palávora, p. 50-51)

o retorno

 

o preconceito racial vive abre

os olhos hiberna numa zona intermédia

entre o costume história como texto divino

hábito treta milenar e o reino da estupidez

congenial ao nascimento

sentimental intelectual da

alma sopro do macaco desnudo

depelado

 

mas a audácia o topete a afronta

afro do negro aquele um que responde

retruca em legítimo ataque

e de maneira sem papado na língua

sem travas na

e não engolindo mais a meia-idéia

de que para um limbo

tenha sido conduzido o racismo

 

um limbo murando-o

para que borrascas borra

de negrada não o reduzisse a pó branco

imêmore marmóreo

um limbo que servisse servindo

de abrigo ao racismo

para então alguma vez última-forma e meia-

volta re-tornar em visitação pública

farejando o ar revigorado de novas folhas

e disposto a não ver os negros espaços infinitos

onde coruscam ínfimas

estrelas

DO SOPRO

O sopro que intercepta
o self dos meninos
                          avança
s águas turvas
e o rasgo
             da mirada.

(Límpido perfil do gesto
atado ao transe.)

O sopro lume
                  e larva
pedra
       sangue
                 flor

face ao que consagra
e nutre,
face ao vário
                 desvario
onde anjos rotos
rezam aos abutres.

Há uma zona
em que os cristais
se partem
sob essa aragem ancestral
do sangue.
Há incêndios na raiz
do gesto. Vestígios
de pólvora nas palavras.
E quando há voz,
é a cicatriz que canta.
              (Sol sanguíneo, p. 33-34)