DADOS BIOGRÁFICOS

Francisco Solano Trindade nasceu em 24 de julho de 1908, no bairro de São José, em Recife-PE, filho do sapateiro Manoel Abílio e da doméstica Emerenciana Quituteira. A miscigenação está presente nas origens étnicas do autor: neto de negro e branca, pelo lado paterno; e negro e índígena, do lado materno. Estudou no Liceu de Artes e Ofícios da capital pernambucana, tendo concluído o equivalente ao ensino médio atual.

Desde cedo, estabeleceu contato com a cultura popular e o folclore, levado pelas mãos do pai que, nos dias de folga, dançava Pastoril e Bumba-meu-boi nas ruas do Recife. O carnaval, suas figuras, o maracatu, e o frevo fascinavam o menino. A pedido da mãe, analfabeta, lia novelas, literatura de cordel e poesia romântica, que ambos apreciavam. Já adulto, o autor se casa em 1935 com Maria Margarida – terapeuta ocupacional e coreógrafa – com quem teve quatro filhos.

A década de 1930 é marcada em todo o mundo pela ascensão do nazismo e do fascismo, que iriam controlar quase toda a Europa a partir da deflagração da Segunda Guerra Mundial, em 1939. A polarização ideológica entre direita e esquerda contamina as discussões sobre arte e literatura. E a noção mítica de "raça superior", oriunda cientificismo racialista do século XIX, impulsiona fortemente a discriminação racial existente no Brasil desde a colonização. O autoritarismo segregador defendido pelo discurso nazifascista se espalha pelo país a partir da crescente pregação do Partido Integralista, dirigido pelo também escritor Plínio Salgado.

Em contrapartida, dá-se o fortalecimento na Imprensa Negra e a criação da Frente Negra Brasileira, que também se organiza em forma de partido político e fortalece a resistência dos afrodescendentes em sua luta pela obtenção da cidadania plena, a começar pelo direito à Educação, passados mais de 40 anos de vigência da Lei Áurea.

Nesse período, Solano Trindade participa em Recife do I Congresso Afro-brasileiro, organizado por Gilberto Freyre, que reúne dezenas de intelectuais voltados para a discussão da contribuição cultural da diáspora africana em nosso país. Participa também do II Congresso Afro-brasileiro, realizado posteriormente em Salvador.

Em 1936, entusiasmado com os movimentos em prol da consciência negra, que se espalhavam nas principais cidades do país, funda a Frente Negra Pernambucana e o Centro de Cultura Afro-Brasileira, juntamente com o poeta Ascenso Ferreira, o pintor Barros e o escritor José Vicente Lima. Esse órgão tinha como objetivo, dentre outros, promover a pesquisa da afrodescendência na cultura e na história, buscar a expressão afro-brasileira na literatura e nas artes em geral, além de promover a divulgação de intelectuais e artistas negros. Em seu documento de fundação, o Centro de Cultura Afro-brasileira proclama: “não faremos lutas de raças, porém ensinaremos aos irmãos negros que não há raça superior, nem inferior, e o que faz distinguir uns dos outros é o desenvolvimento cultural. São anseios legítimos a que ninguém de boa fé poderá recusar cooperação.” (Apud FARIA, in: TRINDADE, 1981, p. 15).

Ainda em 1936, estreia na literatura com a publicação de Poemas negros. Editada em Recife, a coletânea de Solano Trindade polemiza com o livro homônimo do também nordestino Jorge de Lima, lançado no mesmo ano e trazendo a público o discutido poema "Nêga Fulô".

Na década seguinte, depois de passar por Belo Horizonte e Porto Alegre, fixa residência no Rio de Janeiro, onde se integra aos círculos literários e culturais e trava conhecimento com outros artistas afrodescendentes. Em 1944, lança seu segundo livro, Poemas d’uma vida simples, que obteve boa repercussão junto à crítica da época. Amante devotado das formas populares de representação, o poeta assiste à criação do  TEN – Teatro Experimental do Negro – fundado em 1944 por Abdias Nascimento. 

Em 1950, Solano Trindade funda em Caxias, na Baixada Fluminense,  ao lado da esposa, Margarida Trindade, e do sociólogo Edison Carneiro, o Teatro Popular Brasileiro, que contava com um elenco formado por domésticas, operários e estudantes e tinha como projeto estético-ideológico "pesquisar na fonte de origem e devolver ao povo em forna de arte." Ainda na década de 1950, os espetáculos de canto e dança apresentados pelo TPB foram levados a vários países da Europa.

Em 1958, lança seu terceiro livro, Seis tempos de poesia, publicado em São Paulo.

A partir dos anos 1960, o poeta passa a residir em Embu, nas cercanias de São Paulo. Ato contínuo, deflagra grande movimentação artística e cultural na cidade. Espetáculos sucedem-se, atraindo público da capital e estimulando o desenvolvimento da pintura e do artesanato locais. A pequena Embu transforma-se mais tarde em “Embu das Artes” e vira atração turística.

Em 1961, sai o quarto livro, Cantares ao meu povo, cujos originais haviam sido enviados a Roger Bastide, um dos primeiros estudiosos da poesia afro-brasileira, que se encanta com os poemas.

Doente e cansado, Solano Trindade deixa Embu para residir em São Paulo. Termina seus dias pobre e esquecido numa clínica no Rio de Janeiro, onde faleceu em 1974, vítima de pneumonia.

Referências

FARIA, Álvaro Alves de. Poesia simples como a vida. In: TRINDADE, Solano. Cantares ano meu povo. São Paulo: Brasiliense, 1981.

TRINDADE, Raquel. Dados biográficos. In: TRINDADE, Solano. O poeta do povo. São Paulo: Cantos e Prantos Editora, 1999.

 


PUBLICAÇÕES

Obra individual

Poemas negros. Recife: Edição do autor, 1936.

Poemas d´uma vida simples. Rio de Janeiro, 1944.

Seis tempos de poesia. São Paulo: A. Melo, 1958.

Cantares ao meu povo. São Paulo: Editora Fulgor, 1961.

Edições Póstumas

Cantares ao meu povo. 2 ed. São Paulo: Brasiliense, 1981.

Tem gente com fome e outros poemas. Rio de Janeiro: Sindicato dos Escritores do Rio de Janeiro,1988.

Solano Trindade: o poeta do povo. Organização de Raquel Trindade. São Paulo: Cantos e Prantos Editora,1999.

Poemas antológicos de Solano Trindade. Seleção, organização e prefácio de Zenir Campos Reis. São Paulo: Nova Alexandria, 2006.

Canto negro. Apresentação de Zenir Campos Reis. São Paulo: Nova Alexandria, 2006.

Antologias

Poesia negra brasileira: antologia. Organização de Zilá Bernd. Porto Alegre: AGE : IEL : IGEL, 1992.

A razão da chama: antologia de poetas negros brasileiros.  Organização de Oswaldo de Camargo. São Paulo: GRD, 1986.

O negro escrito. Organização de Oswaldo de Camargo. São Paulo: Secretaria de Estado da Cultura, 1987.

O negro em versos: antologia da poesia negra brasileira. Organização de Luiz Carlos Santos, Maria Galas e Ulisses Tavares. São Paulo: Moderna, 2005.

Antologia de poesia afro-brasileira: 150 anos de consciência negra no Brasil. Organização de Zilá Bernd. Belo Horizonte: Mazza edioções, 2011.

Literatura e afrodescendência no Brasil: antologia crítica. Organização de Eduardo de Assis Duarte. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011, vol. 1, Precursores.

 


TEXTOS

 


CRÍTICA


FONTES DE CONSULTA

BERND, Zilá (Org.). Poesia negra brasileira: antologia. Porto Alegre: AGE: IEL: IGEL, 1992.

BROOKSHAW, David. Raça e cor na literatura brasileira. Trad. Marta Kirst. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1983. 183-186.

ALMEIDA E SILVA, Denivaldo. M. M. A escrita negra de Solano Trindade: movimentos de resistência e modos de identidade da consciência poética. 2013. 135 f. Dissertação (Mestrado em Letras) – Pontifica Universidade Católica. São Paulo, 2013.

FARIA, Álvaro Alves de. A poesia simples como a vida. In: TRINDADE, Solano. Cantares ao meu povo. São Paulo: Editora Brasiliense, 1981.

GREGÓRIO, Maria do Carmo. Solano Trindade o poeta das artes do povo. Rio de Janeiro: CEAP, 2009.

LIMA, Vicente. Os poemas negros de Solano Trindade. Recife: Casa da Cultura Afro-brasileira, 1940.

MACHADO, Serafina Ferreira. Literatura como movimento humanizador: o projeto poético de Solano Trindade. Dissertação (Mestrado em Letras) – Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2006.

MARTINS, Leda Maria. Solano Trindade. In: DUARTE, Eduardo de Assis (Org.). Literatura e afrodescendência no Brasil: antologia crítica. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011, vol. 1, Precursores.

SANTOS, Daiana Nascimento dos; PEREIRA, Édimo de Almeida. Memória da escravidão na sociedade e na cultura brasileiras: a poesia afro-brasileira de Solano Trindade e Adão Ventura. Verbo de Minas, v. 21, n. 37, p. 342-362, 2020.

SANTOS, Suely Maria Bispo Dos. A importância da obra de Solano Trindade no panorama da literatura brasileira: uma reflexão sobre o processo de seleção e exclusão canônicos. 2012. 147 f. Dissertação (Mestrado em Letras) – Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, 2012.

SANTOS, Oluemi Aparecido Dos. Nas sendas da revolução: a poesia de Agostinho Neto e Solano Trindade. 2009. 168 f. Dissertação (Mestrado em Letras) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2009.

SOUZA, Elio Ferreira de. Memória, construção de identidades e utopia em Canto dos Palmares, de Solano Trindade. In: FERREIRA, E.; MENDES, A. M. (Org.). Literatura afrodescendente: memória e construção de identidades. São Paulo: Quilombhoje, 2011, p. 61-74.

SOUZA, Elio Ferreira de. Poesia Negra das Américas: Solano Trindade e Langston Hughes. 2006. 371 f. Tese (Doutorado) – UFPE, Recife, 2006.

SOUZA, Elio Ferreira de. Poesia Negra: Solano Trindade e Langston Hughes. Curitiba: Appris Editora, 2017.

SOUZA, Florentina. Solano Trindade e a produção literária afro-brasileira. In: JÚNIOR, Robert Daibert; PEREIRA, Edimilson de Almeida (Orgs.). No berço da noite: religião e arte em encenações de subjetividades afrodescendentes. Juiz de Fora: MAMM Ed., 2012.

TRINDADE, Raquel. Dados biográficos. In: TRINDADE, Solano. Cantares ao meu povo. São Paulo: Editora Brasiliense, 1981.

 


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