Memória e escravidão na sociedade e na cultura brasileiras:
a poesia afro-brasileira de Solano Trindade e Adão Ventura[i]

 

Daiana Nascimento dos Santos[ii]

Édimo de Almeida Pereira[iii]

 

RESUMO

Cento e trinta e dois anos, contados a partir da assinatura oficial da Lei Áurea, separam os tempos de violência e de exploração da força de trabalho retirada do continente africano em prol do desenvolvimento da então colônia do império ultramarino português no Novo Mundo e os dias que vivenciamos no Brasil do século XXI. Tal constatação insta-nos ao exercício de pensarmos a memória por intermédio do presente artigo, que tem por objetivo estabelecer uma reflexão não só a respeito da instauração do regime escravista no Brasil e da memória em relação ao período em que o mesmo vigorou no país, como também a respeito das implicações da presença negra outrora escravizada na conformação do que são a sociedade e a cultura brasileiras contemporâneas. Nesse expediente, iremos nos valer da observação de aspectos da poesia levada a termo pelo escritor pernambucano Solano Trindade, bem como pelo poeta mineiro Adão Ventura, tomando por base, nesse caso, as duas vertentes criativas identificáveis na obra desse autor. Em um segundo momento, recorreremos a aspectos socioculturais da contemporaneidade brasileira em torno da temática em questão, no que teceremos considerações a partir de aspectos presentes no enredo do Grêmio Recreativo e Escola de Samba Paraíso do Tuiutí, agremiação vice-campeã do Carnaval carioca de 2018, que trouxe para o centro de uma das maiores manifestações culturais nacionais a indagação Meu Deus, meu Deus, está extinta a escravidão? Pensarmos a escravidão no Brasil e os efeitos da mesma sobre a constituição de um imaginário ora presente, ora aparentemente ausente no cotidiano da população e da cultura brasileiras leva-nos,  então, a recorreremos aos aportes teóricos de diversos estudiosos, tais como, Clóvis Moura, Kabengele Munanga, Nilma Lino Gomes, Oswaldo de Camargo, Grada Kilomba e Marianne Hirsch, dentre outros.

Palavras-chave: Contemporaneidade. Escravidão. Memória. Poesia.

 

ABSTRACT

One hundred and thirty two years, counting from the official signing of the Lei Áurea (Golden Law), separate the times of violence and exploitation of the labor force taken from the African continent in favor of the development of the then Portuguese Overseas Empire colony, in the New World, and the days that we experience in Brazil of the 21st century. Such observation urges us to think about the memory of slavery, through this article, which aims to develop a reflection not only on the establishment of the slave regime in Brazil related to the period in which it was held in the country, but also on the implications of the black presence once enslaved for the conformation of what contemporary Brazilian society and culture represent. In this expedient, we will make use of the observation of some aspects present in the poetry taken by the author Solano Trindade, from Pernambuco, as well as the poet Adão Ventura, from Minas Gerais, having as a basis, in this case, two identifiable creative strands in the author's work. In a second moment, we will resort to sociocultural aspects of the Brazilian contemporaneity around the theme in question, when we will weave considerations from aspects present in the plot of Grêmio Recreativo and Escola de Samba Paraíso do Tuiutí, vice-champion of the Rio de Janeiro Carnival Festival in 2018, that brought to the center of one of the largest national cultural manifestations, the quest, My God, my God, is slavery extinct?. Thinking about slavery in Brazil and its effects on the constitution of an imaginary now present, now apparently absent in the daily life of the Brazilian population and culture leads us, then, to resort to the theoretical contributions of several scholars, such as Clóvis Moura , Kabengele Munanga, Nilma Lino Gomes, Oswaldo de Camargo, Grada Kilomba and Marianne Hirsch, among others.

Keywords: Contemporaneity. Slavery. Memory. Poetry.

INTRODUÇÃO

Só conhecendo nossas origens
poderemos entender
quem somos de verdade.
Enquanto não superarmos a escravidão,
não teremos paz – nem os escravizados,
nem os escravizadores.

 Zulu Araújo[iv]

 

         Cento e trinta e dois anos, contados desde a assinatura oficial da Lei Áurea, separam os tempos de violência e de exploração da força de trabalho retirada do continente africano em proveito do desenvolvimento da então colônia do império ultramarino português no Novo Mundo e os dias que vivenciamos no Brasil do século XXI. Conforme o que podemos verificar no trabalho intitulado El océano de fronteras invisibles: relecturas histórica sobre la esclavitud en la novela contemporánea, a escravidão foi um dos principais mecanismos do sistema econômico da época, o qual se manteve em vigor pela prática das suas diversas formas de violência que envolveram tanto o senhor como o escravizado nas diferentes esferas dos seus cinco séculos de resistências (NASCIMENTO DOS SANTOS, 2015). Nessa sequência de ideias, Kabengele Munanga e Nilma Lino Gomes (2006), na obra O negro no Brasil de hoje, advertem que:

O fato de serem libertados por força da lei não garantia aos negros os mesmos direitos de fato e todas as oportunidades dadas aos brancos em nosso país, sobretudo, às camadas mais ricas da população. Por isso, além da libertação oficial, instituída na lei, os negros brasileiros após a abolição tiveram que implementar um longo e árduo processo de construção de igualdade e de acesso aos diversos setores sociais (GOMES; MUNANGA, 2006, p. 107).

 

         Tal constatação insta-nos ao exercício do pensamento acerca de alguns dos variados aspectos que se formam e se constituem em torno de uma memória da escravidão no Brasil. Nesse bojo, este artigo busca estabelecer uma reflexão não só a respeito da instauração do regime escravista no Brasil e da memória em relação ao período em que o mesmo vigorou no país, como também acerca das implicações da presença negra, outrora escravizada, na conformação do que são a sociedade e a cultura brasileiras contemporâneas, particularmente no que concerne às contribuições de ordem econômica, histórica e socioculturais inerentes ao Brasil.

          No entendimento de Júlio José Chiaventato (2012), externado em O negro no Brasil, “O Brasil não existiria sem os negros. Sem esse dado não se entende o país” (CHIAVENATO, 2012, p. 11). Por mais que essas contribuições tenham sido historicamente marginalizadas pelos discursos de poder, a capacidade dos indivíduos de exporem as suas experiências subjetivas tem resistido por meio de diários, textos poéticos e narrativas de diversos gêneros, atribuindo às mesmas uma nova significação como forma de compartilhamento, aproximando-se de algo que poderíamos chamar de pós-memória.

         Marianne Hirsch (1997), em Fotos da família: maus, luto, e pós-memória (Family pictures: maus, mourning, and post-memory), define a pós-memória como “[...] uma estrutura de transmissão inter e trans-geracional de conhecimento traumático de ponta e experiência” (HIRSH, 2011, p. 2), referindo-se aos movimentos de rememoração traumática, ao contrário do pós-traumático, pontuado por um processo de remoção. É, certamente a hipótese de rememoração da lembrança de gerações anteriores em um processo de memória de ligação.

         Tomando como base esse processo de escrita, Solano Trindade e Adão Ventura não hesitam em propor um olhar revisionista sobre a história da escravatura no Brasil e sobre as consequências deixadas no cotidiano do povo negro ainda hoje. Tal empreitada é assumida literariamente por ambos os poetas, os quais demonstram, através das suas obras, que os resquícios do passado escravocrata persistem em se fazer presentes na atualidade. 

 

2 MEMÓRIA E RESISTÊNCIA NOS VERSOS DE SOLANO TRINDADE E DE ADÃO VENTURA

 

Ali na fazenda, ninguém suportara a penitência do tanque. Antes de Damião, dois escravos tinham fugido, preferindo a aventura na mata àquele castigo infindável.
                    Josué Montello

         Oswaldo de Camargo (2009), escritor e estudioso da Literatura Brasileira Negra, na obra Solano Trindade, poeta do povo: aproximações, trazendo-nos à vista notas biográficas sobre Francisco Solano Trindade, informa-nos que o poeta nasceu no Recife, Pernambuco, em 26 de julho de 1908, mesmo ano de morte de Machado de Assis, e faleceu no Rio de Janeiro, em 19 de fevereiro de 1974, ao que acrescenta a importante observação de que a vida e os livros de Solano Trindade

[...] podem motivar uma oportuna reflexão sobre o papel da literatura quando examinada como presença na observação das relações raciais no Brasil ou quando, procurando transpor essa questão, busca ser instrumento na tentativa de corrigir o mundo, vergando-o para o lado da justiça, bem-estar e liberdade para todos; caso exemplar desse poeta negro (CAMARGO, 2009, p. 13).

         Camargo (2009) afirma que a memória da escravidão comparece na poesia do bardo de Recife com as marcas da simplicidade e do orgulho de ser negro. Esta rememoração, a que se refere o também autor de A descoberta do frio (1979), pode ser verificada em versos como os do poema Canto dos Palmares, a seguir transcritos:

Canto dos Palmares

Eu canto aos Palmares
sem inveja de Virgílio de Homero
e de Camões
porque o meu canto
é o grito de uma raça
em plena luta pela liberdade!

O opressor
não pode fechar minha boca
nem maltratar meu corpo
meu poema
é cantado através dos séculos
minha musa
esclarece as consciências
Zumbi foi redimido

       (TRINDADE, 1981, p. 28)

 

            A intenção em ressaltar o grito de resistência de uma raça em plena luta pela liberdade coloca em evidência a empreitada política de que se arma o discurso do eu poético em Solano Trindade, na reafirmação feita ao opressor de que este não pode maltratar o corpo do enunciador e calar-lhe a voz. O discurso de que o negro deve se conservar firme, de que não deve sucumbir mediante a opressão e de que não deve ceder às condições adversas que historicamente lhe são impostas se perpetua através dos tempos por meio do esclarecimento de que Zumbi, símbolo da oposição à opressão ao negro na sociedade brasileira, encontra-se redimido. O tardio reconhecimento da existência histórica do líder de Palmares não passou despercebido, portanto, à pena do poeta recifense, que em verso de inegável força esclarece as consciências quanto ao fato de que Zumbi não é apenas uma figura mitológica, mas real, na História do Brasil.

         De fato, Eduardo de Assis Duarte (2020), em artigo intitulado "Solano Trindade, presente!", chama a atenção para a voz autoral presente neste poema, afirmando que a mesma,

Em todo o texto, [...] se coloca em primeira pessoa e faz o eu poético ser um dos guerreiros que peleja ao lado do líder quilombola, para com isto colocar seu leitor dentro dos acontecimentos. Solano cumpre o projeto da literatura negra quanto ao resgate histórico dos heróis da diáspora africana nas Américas, dando a eles a visibilidade ocultada ao longo de séculos. E Zumbi, que durante um bom tempo foi classificado como “mito” construído pelo movimento negro – só teve sua existência reconhecida oficialmente quase três séculos após seu assassinato, em 20 de novembro de 1695 –, recebe no poema de Solano, com algumas décadas de antecedência, o reconhecimento de sua existência e de sua luta (DUARTE, 2020. Não paginado, grifo do autor).

             Outras faces da obra poética de Solano Trindade, dentre elas o alinhamento com a poesia negra produzida por autores de todas as Américas, foram observadas por Zilá Bernd (1992), na organização que faz da obra Poesia negra brasileira: antologia. Desse modo, avaliando e reafirmando a importância de Solano Trindade e de sua obra para contextos mais amplos, a pesquisadora afirma que baseando-se numa busca identitária, não somente individual ou nacional, mas  solidária a todos os negros americanos, a poesia de Solano Trindade é talvez a que apresenta o maior número de traços em comum com a melhor poesia negra produzida nas três Américas (BERND, 1992).

            A partir dessas premissas, podemos então ressaltar que a experiência diaspórica é comum aos negros escravizados e os discursos poéticos que se ocupam da memória da escravidão que a motivara encontram, deste modo, representantes em todas as Américas[vi]. O discurso de diversos poetas negros, das mais diversas origens dentro do amplo âmbito Americano, encontra pontos de liame[vii], inclusive, o voltar-se para a memória dos antepassados e a afirmação do orgulho identitário, como podemos verificar nos versos de Sou negro.

 

Sou negro

                      A Dione Silva

Sou Negro
meus avós foram queimados

pelo sol da África
minh'alma recebeu o batismo dos tambores
atabaques, gonguês e agogôs

Contaram-me que meus avós

vieram de Loanda
como mercadoria de baixo preço
plantaram cana pro senhor do engenho novo
e fundaram o primeiro Maracatu.

Depois meu avô brigou
como um danado nas terras de Zumbi
Era valente como quê
Na capoeira ou na faca
escreveu não leu

o pau comeu
Não foi um pai João

humilde e manso.

Mesmo vovó

não foi de brincadeira
Na guerra dos Malês

ela se destacou.


Na minh'alma ficou

o samba
o batuque

o bamboleio
e o desejo de libertação (TRINDADE, 1999, p. 48).

 

            De outro modo, Solano Trindade também dá aos seus versos a face da crítica social feita a uma certa gente engravata[viii], como podemos perceber em Gravata colorida. Adiantemos que a gravata dos poderosos também será objeto da poética de Adão Ventura como veremos oportunamente no presente artigo.

 

Gravata colorida

Quando eu tiver bastante pão
para meus filhos
para minha amada
pros meus amigos
e pros meus vizinhos
quando eu tiver
livros para ler
então eu comprarei
uma gravata colorida
larga
bonita
e darei um laço perfeito
e ficarei mostrando
a minha gravata colorida
a todos os que gostam
de gente engravatada... (TRINDADE, 1999, p. 89)

 

            Solano Trindade também demonstra elogiável genialidade no poema Navio Negreiro. Em diálogo direto com a poética condoreira de Castro Alves, cujo poema homônimo revela com enorme expressividade o drama e as agruras dos escravizados a bordo dos negreiros no translado transatlântico em direção ao Novo Mundo, os versos de Solano, contudo, ocupam-se em evidenciar que os tumbeiros não transportavam no seu tráfico vil seres reificados, passivos e animalizados; ao contrário, traziam carga humana, repleta de cultura, de resistência e inteligência.

 

Navio Negreiro

Lá vem o navio negreiro
Lá vem ele sobre o mar
Lá vem o navio negreiro
Vamos minha gente olhar...

Lá vem o navio negreiro
Por água brasiliana
Lá vem o navio negreiro
Trazendo carga humana...

Lá vem o navio negreiro
Cheio de melancolia
Lá vem o navio negreiro
Cheinho de poesia...

Lá vem o navio negreiro
Com carga de resistência
Lá vem o navio negreiro
Cheinho de inteligência...(TRINDADE, 1999, p. 45)

 

 Para além desses elementos, vale recorrermos uma vez mais a Camargo (2009) quando este ressalta que:

Para se entender a repetitiva explicitação epidérmica em Solano, não apenas no referir-se à cor da pele, mas na deliberação de que essa referência seja minimamente elaborada para que o povo plenamente a entenda, é inarredável colocá-lo na moldura de seu tempo: nasceu negro no primeiro decênio do século XX, quando ideias racistas herdadas do século XIX ainda frequentam mentes e bibliotecas, e o projeto de República proclamada em 1889 falha na proposta  de cidadania, igualdade e bem-estar para todos, Res publica: cosa pública...(CAMARGO, 2009, p. 16, grifos do autor).

 

            De fato, o projeto republicano permanece falhando ao longo do tempo no que toca à parcela afrodescendente da população brasileira, situação que se mostra submetida a severa crítica na criação poética de Adão Ventura Ferreira Reis, poeta nascido em Santo Antônio do Itambé, Minas Gerais, em 5 de julho de 1939, e falecido em Belo Horizonte, em 12 de junho de 2004.

          A memória da escravidão – ou a (pós) memória da escravidão, na acepção de Hirsch (1997) –  bem como a temática étnica aparecem na obra de Adão Ventura, que deu o título de A cor da pele (1988) ao terceiro livro de sua autoria, em duas vertentes, conforme defendido por Pereira (2010) em Metamorfoses do abutre: a diversidade como eixo na poética de Adão ventura.  Uma primeira, presente nas publicações de estreia do poeta de Santo Antônio do Itambé, na qual podemos  verificar a versificação a que Pereira (2010) associou certa influência surrealista; outra voltada para a temática social contundente e à reafirmação da negritude. Na obra do poeta, é possível vislumbrarmos, por conseguinte, um rememorar da escravidão em poemas como Algumas instruções de como levar um negro ao tronco e Comensais, considerados a seguir:

     

        Algumas instruções de como
        levar um negro ao tronco 

 levar um negro ao tronco
e cuspir-lhe na cara.

 levar um negro ao tronco
e fazê-lo comer bosta.
levar um negro ao tronco
e sarrafiar-lhe a mulher.

 levar um negro ao tronco
e arrebentar-lhe os culhões.

 levar um negro ao tronco
e currá-lo no lixo             

(VENTURA apud PEREIRA, 2010, p. 46). 

 

          Nestes versos venturianos, a rememoração traumática da escravidão ressurge na revelação da prática da violência e da humilhação desferida contra os negros e os seus descendentes ao longo da História do Brasil. A temática, de certo modo, é retomada no poema Comensais, à medida que não só a surpresa relacionada ao pouco tempo que nos separa da Abolição da Escravatura, como também a constatação do lapso que nos aparta da expansão europeia no Novo Mundo são ironicamente evidenciadas por meio da indignação do eu poético quanto à manutenção da condição de exploração imposta aos afrodescendentes no país por tantos anos.

Comensais

A minha pele negra
servida em fatias,
em luxuosas mesas de jacarandá,
a senhores de punhos rendados
há 500 anos (VENTURA apud PEREIRA, 2010, p. 37). 

 

            Dessa maneira, tal como podemos notar na poesia de Solano Trindade, para quem Zumbi encontra-se redimido, a poética de Adão Ventura, além disso, volta-se para o exercício da rememoração do líder negro e da resistência inspirada por sua personalidade.

 

Zumbi

Eu-Zumbi
Rei de Palmares
tenho terreiros e tambores
e danço a dança do Sol.
Eu-Zumbi enfrento o vento
que ainda tarda
dessas cartas de alforria.

Eu-Zumbi jogo por terra
a caneta de ouro
de todas as Leis-Áureas.

Eu-Zumbi
Rei de Palmares
Tenho terreiros
e tambores
e danço a dança do Sol  (VENTURA 2020. Não paginado).

 

            A temática social do enfrentamento étnico entre afrodescendentes e indivíduos da sociedade brasileira que não se reconhecem como tal aparece na poesia inicial de Adão Ventura, em seu primeiro livro, intitulado Abrir-se um abutre ou mesmo depois de deduzir dele o azul (1969). A poesia venturiana surge, assim, reveladora de situações que ainda se fazem presentes no dia a dia de afro-brasileiros e de afro-brasileiras, premidos e premidas de alçarem melhores condições de vida e de acesso a determinadas instâncias da sociedade por questões relacionadas à aparência e à etnia. Vejamos, por exemplo, o poema Noite no passaporte:

 Noite no passaporte

cada uma das mãos o dividiu em viagens. as flores estavam fatigadas com o desconsolo das declarações de amor. não havia relógios nem outras perfurações que os identificassem. lygia enxugou os pratos com o último dos envelopes. era expressamente proibida da entrada de pessoas de cor naquele REI-cinto de segurança. vendem-se empregadas domésticas que saibam descascar BACH. ou ainda: sensacional liquidação de lilases especializados em pacto com o amanhecer. Tergal serve para encadernações de corpos humanos (VENTURA apud PEREIRA, 2010, p. 80, grifos nossos).

 A expressão em torno da proibição de pessoas de cor no recinto do rei, possivelmente relacionado a um local de privilégios ou estrato social ocupado pelas elites, lembra-nos, por associação, os históricos anúncios de emprego em que se demandava do candidato a astuciosa condicionante denominada porte de boa aparência, estabelecida a partir do ponto de vista excludente do opressor, de tal exigência podendo-se, por isso, interpretar uma única característica: não ser negro.

Acerca dessa fase da poesia venturiana, Maria José Somerlate Barbosa (2020), no artigo a que dá o título de Adão Ventura e o (con)texto afro-brasileiro, afirma que podemos perceber

[...] na poesia de Adão Ventura que mesmo que raça e raízes africanas não constituam o eixo condutor dos seus primeiros poemas, a preocupação com a posição sócio-cultural do negro no Brasil e com repressão/liberdade está também presente nos seus versos iniciantes. Ao lado do aparente desprezo pelos encadeamentos lógicos e construções “refletidas” surge uma (des)ordem centrada na denúncia das condições econômicas, políticas, raciais e sociais no Brasil. Ventura busca definir-se como poeta, ao reconstruir a sua própria história através da cor da sua pele e da trajetória afro-brasileira (BARBOSA, 2020. Não paginado, grifo da autora).

Dentro da anunciada aproximação entre as temáticas abordadas pelos poetas afro-brasileiros, não poderíamos deixar de trazer para a análise ora empreendida mais dois emblemáticos poemas venturianos:  Meu pai (I) e Corrupção.

 

MEU PAI(I)

meu pai está velho
e cansado
em Serro ou em Soweto.

meu pai está velho e cansado
ainda que faça sol
em Johannesburgo.

mas,
as suas mãos
ainda não estão
tão trêmulas
a ponto de errar o corpo
de um Mr. Vorster          

(VENTURA apud PEREIRA, 2010, p. 50).   

 

         Os versos de Meu pai (I) fazem parte do aludido livro A cor da pele (1988). Neles podemos notar a remissão que o eu poético faz aos antepassados negros, referenciados na figura de um pai que habita lugares de luta, o Serro, terra de origem do genitor do poeta, ou Soweto, cidade próxima a Johannesburgo, habitada por negros e símbolo da resistência contra o rigoroso e excludente regime do apartheid na África do Sul. Com efeito, a referida luta e a resistência aparecem na representação do velho pai, cansado e de mãos trêmulas, mas que apesar de tê-las nessas condições, não se furta à mira certeira do corpo do opressor.

        Em Corrupção, poema inscrito em Litanias de cão, livro de Adão Ventura lançado em 2002, evidenciamos a aproximação com o engravatado que é alvo da crítica refinada em Solano Trindade. Na lida com o poder, a corrupção faz com que  indivíduo, segundo o eu poético, principie por ser corroído pelo nó da gravata, em um envolvimento que o atingirá até os ossos.

Corrupção

primeiro
o câncer começa a roer
o nó da gravata.

depois
os óculos
depois
os ossos 

(VENTURA apud PEREIRA, 2010, p. 39).   

 

         Vale salientarmos que o poema ganha nuances emblemáticos se o associarmos aos tempos em que Adão Ventura esteve próximo ao centro político-administrativo da capital brasileira durante os anos em que presidiu a Fundação Cultural Palmares (1990 -1994)[ix].

         Por fim, a aproximação que fazemos entre as poesias de Solano Trindade e de Adão Ventura evidencia a necessidade de organização de antologias capazes de, respectivamente, reunirem as obras desses dois importantes autores da Literatura Afro-brasileira, dada a forma esparsa com que – principalmente no caso de Adão Ventura, cuja maioria dos livros foi editada com recursos do próprio autor –  encontram-se disponibilizadas aos pesquisadores e aos demais interessados.

3 ACABOU A ESCRAVIDÃO? OU DOS SEUS EFEITOS DURADOUROS

Um grito feito pele do tambor
Deu no noticiário, com lágrimas escrito
Um rito, uma luta, um homem de cor[x]

 

         Ainda a respeito de aspectos socioculturais da contemporaneidade brasileira tocantes à temática em questão, ou seja, a memória e a (pós) memória da escravidão no Brasil, é válido tecermos algumas considerações a partir de elementos presentes no enredo do Grêmio Recreativo e Escola de Samba Paraíso do Tuiuti, agremiação vice-campeã do Carnaval carioca em 2018, o qual trouxe para o centro de uma das maiores manifestações culturais nacionais a indagação Meu Deus, meu Deus, está extinta a escravidão?

         Empreendermos uma reflexão a respeito da escravidão no Brasil, assim como  sobre os efeitos da mesma sobre a constituição de um imaginário ora presente, ora aparentemente ausente no cotidiano da população e da cultura brasileiras, implica um trabalho com a noção de memória e de (pós)memória e também com a vinculação destas ao esquecimento e à lembrança.

         Clóvis Moura (2013), em seu Dicionário sobre a escravidão negra no Brasil, no qual expõe os resultados de pesquisa histórica, etnográfica e cultural de largo fôlego, conceitua a escravidão[xi] como sendo um:

Modo de produção que surgiu com o mercantilismo e a expansão do capitalismo, sendo um dos elementos básicos da acumulação primitiva de capital. Embora com diferenças tangenciais, o escravismo moderno, também chamado de escravismo colonial,  reproduziu na sua estrutura e refletiu na sua dinâmica as leis econômicas fundamentais do  modo de produção escravista antigo, sendo a mais importante a situação do escravo como instrumentum vocale, isto é, sua equiparação às bestas, existindo por isso a redibição em caso de  defeitos físicos, quando o vendedor não os comunicava ao comprador. A escravidão moderna expandiu-se nas colônias da Inglaterra, Portugal, Espanha, Holanda, França etc., tendo como elemento escravo os filhos do continente africano (MOURA, 2013, p. 149, grifo do autor).

 

         Um questionamento que se instaura, a princípio, relaciona-se à rememoração da experiência traumática da escravidão no Brasil, em um processo que chega ao ponto de trazê-la para a circunstância de exibição como parte de um espetáculo no desfile carnavalesco de 2018. A escritora e crítica argentina, Beatriz Sarlo (2007), na obra Tempo passado: cultura da memória e guinada subjetiva, argumenta que o ato de rememorar o passado nem sempre se aproxima do fato de ser uma ação libertadora, podendo, contrariamente, constituir-se em um conjunto de questões de ordem psicológica, moral ou intelectual que implicam em certa repressão. Vale salientarmos que, conforme a autora, “O passado volta como quadro de costumes em que se valorizam os detalhes, as curiosidades, a exceção à regra, as curiosidades que já não se encontram no presente” (SARLO, 2007, p. 17). Nesta ordem de ideias, julgamos pertinente a asserção de Kilomba (2019), quando reflete sobre a memória da plantação, uma vez que vai exatamente nesse sentido de ocorrência de uma impactante revisitação ao passado. Assim,  Kilomba (2019) explicita que:

A ideia da “plantação” é, além disso, a lembrança de uma história coletiva de opressão racial, insultos, humilhação e dor, uma história que é animada através do que chamo episódios de racismo cotidiano. A ideia de “esquecer” o passado torna-se, de fato, inatingível; pois cotidiana e abruptamente, como um choque alarmante, ficamos presas/os a cenas que evocam o passado, mas que, na verdade, são parte de um presente irracional. Essa configuração entre passado e presente é capaz de retratar a irracionalidade do racismo cotidiano como traumática (KILOMBA, 2019, p. 213, grifos da autora).

 

         Ressaltamos que o enredo carnavalesco do Grêmio Recreativo e Escola de Samba Paraíso do Tuiuti, assim como o desfile e as alegorias na passarela, traziam severas críticas à política nacional e às atitudes dos governantes em suprimir direitos de trabalhadores e de cidadãos brasileiros, evidenciando a possibilidade da associação de tal procedimento à ideia de que as autoridades governamentais estariam reduzindo os integrantes de setores da sociedade à suposta condição de escravizados. A despeito de haver conseguido o vice-campeonato do Carnaval carioca naquele ano, o Grêmio Recreativo e Escola de Samba Paraíso do Tuiuti passou por momentos de repressão e de velada censura, os quais resultaram na determinação por parte de autoridades de que certas alegorias fossem retiradas do enredo por ocasião do desfile das Escolas de Samba eleitas campeãs.

        Não houve, no entanto, recomendações de parte alguma ou de autoridade qualquer para que se retirasse, da comissão de frente do Grêmio Recreativo e Escola de Samba Paraíso do Tuiuti, a representação de negros acorrentados e chicoteados pelo feitor à frente de uma senzala. Reduzidas à condição de curiosidade que já não se encontram no presente, tais imagens por repetidas vezes vêm à tona nos objetos culturais da contemporaneidade, tratando-se, pois, de uma pós-memória.

         A par disso, observemos, por exemplo, a afirmação de Edimilson de Almeida Pereira e Núbia Pereira de Magalhaes Gomes (2001), em ensaio chamado Ardis da imagem: exclusão étnica e violência nos discursos da cultura brasileira. Segundo os autores:

          A ênfase nos elementos étnicos gerou padrões estéticos do negro brasileiro aos quais é necessário fazer referência se se pretende pensar paradigmas alternativos. A ética patriarcal reduziu a importância dos aspectos estéticos para alimentar a imagem do negro-objeto. O interessante é que os negros, muitas vezes, reduplicam essa imagem, sem no entanto, arranhá-la com as perspectivas de novos sentidos (PEREIRA; GOMES, 2001, p. 226).

Pereira e Gomes (2001) ainda acrescentam que isso ocorre porque a sociedade não tem demonstrado interesse suficiente para “[...] estimular as relações entre diferentes grupos e suas respectivas inter-relações entre os diferentes grupos e suas elaborações discursivas” e também em decorrência de que “O que se observa é o aperfeiçoamento de uma lógica patriarcal que permeia a apregoada modernidade da lógica capitalista, isto é, prevalece a elaboração de perfis estéticos segundos as orientações de uma ética dominante” (PEREIRA; GOMES, 2001, p. 226).

            Dentro dessa perspectiva, é possível compararmos algumas das imagens do Carnaval de 2018 a antigas imagens da história da escravidão no Brasil, para chegarmos à noção de que, mesmo decorridos cento e trinta e dois anos da extinção da escravatura, o trauma deixado por esse regime na cultura e na sociedade brasileiras ainda gera seus efeitos. Nesse sentido, referimo-nos, a título de exemplo, à ação de fotógrafos radicados no Brasil da segunda metade do século XIX que, uma vez dedicados a registrarem imagens de escravizados, em espaços muitas vezes recriados nos estúdios ou fora deles, faziam-no com variados objetivos, dentre os quais o de oferecê-las como souvenir à sociedade escravocrata da época. Observada a lógica inscrita na produção e no consumo do souvenir,  a crítica contida nas alegorias do Carnaval apresentado pelo Grêmio Recreativo e Escola de Samba Paraíso do Tuiuti terá transparecido como tal aos setores elitistas ainda presentes na sociedade brasileira, historicamente habituados às cenas de negros acorrentados e subalternizados. Talvez na mesma tônica, não terá gerado surpresa, em certas esferas da sociedade brasileira, o noticiário internacional mais recente em torno do assassinato de um afro-americano por policiais em Minneapolis ou, de volta à nossa realidade, o extermínio de jovens afro-brasileiros na periferia da capital do Estado do Rio de Janeiro[xii]. Tais aspectos não somente nos sugerem pensar, mas particularmente demonstram essa indiferença ante a exibição de imagens de corpos negros acorrentados, asfixiados e violentados pelas estruturas de poder[xiii].

            Não obstante o jogo de desigualdades que há muito se encontra estabelecido na sociedade brasileira, no campo da Literatura Brasileira e da boa Literatura Afro-brasileira, a releitura memorialista ou pós-memorialista dos tempos do regime escravocrata vem sendo realizada por escritores de desde antes, com notável força e crítica, forma com que a trouxeram a efeito Solano Trindade e Adão Ventura.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

[…] no son viejas formas con un nuevo aspecto sino formas nuevas que en el processo de su propia reconstrucción asumen elementos selectivos de las viejas.

 Avtar Brah

            Considerando o contexto histórico brasileiro de cento e trinta e dois anos da Abolição da Escravidão Negra, iniciamos o percurso teórico do presente artigo buscando uma reflexão sobre o regime escravista e a memória estabelecida por afro-brasileiros em relação às marcas que tal regime terá deixado nos quadros da sociedade brasileira, nos quais a necessidade de estudos e de ações que façam reverberar a importância de africanos e afrodescendentes na conformação da população e da cultura brasileiras tem se mostrado a cada dia mais urgente.

            Acerca da referida memória da escravidão, à qual somamos a noção já de uma pós-memória desse período, remetemo-nos à poesia do poeta pernambucano Solano Trindade, bem como aos versos do também poeta Adão Ventura, mineiro de Santo Antônio do Itambé. Aliando a poesia desses dois significativos representantes da Literatura Afro-brasileira, propusemo-nos a refletir a respeito dos aspectos da rememoração da escravidão e sobre a maneira como se dá a recepção desse rememorar por parte de determinados setores da sociedade brasileira, tomando por base de análise elementos do enredo do Grêmio Recreativo e Escola de Samba Paraíso do Tuiuti no Carnaval carioca do ano de 2018, o qual coloca sob questionamento o fim da escravidão e apresenta diversas leituras de situações sociais da contemporaneidade no sentido de que o duro regime escravocrata revela-se transmutado em novos modos a partir da perpetuação de seus indignos efeitos.

            Em todos esses referidos objetos culturais, o rememorar da escravidão negra no Brasil dá-se de forma traumática, à medida que remonta velhas cenas do passado, as quais ainda se mostram como feridas abertas no tecido social brasileiro. Por outro lado, tanto a poesia de Solano Trindade e de Adão Ventura, quanto os versos do samba enredo do Grêmio Recreativo e Escola de Samba Paraíso do Tuiuti, não poderíamos deixar de destacar, a despeito da memória traumática da escravidão, reafirmam o espaço de luta, de resistência, de força e de valorização da identidade afro-brasileira, revelado no orgulho da negritude e da consciência da importância de seus antepassados. A crítica contra os nefastos efeitos da escravidão, presente no material analisado neste artigo, revela que os afrodescendentes precisam manter-se atentos às práticas de exclusão e de reificação que historicamente nortearam o discurso hegemônico das elites e que ainda apostam na imensidão dos abismos sociais como forma de manutenção de condições de vida que atentam contra uma igualdade de direitos que precisa ser efetivamente usufruída por todos aqueles que aspiram participar da sociedade brasileira.

            Incidentes recentes no âmbito das sociedades mundial e brasileira, nos quais vemos cruelmente envolvidos representantes do arcaico olhar branco colonizador e afrodescendentes estigmatizados pelas estruturas racistas que se instauraram em países varridos pelo antigo regime escravagista, demonstram a validade e a atualidade da reflexão encetada nas linhas deste artigo, que se mostrou capaz não só de evidenciar que a vigilância acerca do fato de que os embates étnico-raciais em todo o mundo encontram-se longe de alcançar o seu tempo de arrefecimento: o racismo, em suas múltiplas formas, ainda circula em nosso meio.

            Decorre disso a relevância de trazermos à baila a poesia de autores como Solano Trindade e Adão Ventura, combativa e ao mesmo tempo de uma excitante beleza decorrente do precioso labor com a linguagem, cuja força e resistência entregam fôlego para aqueles que como George Floyd não podem respirar.

REFERÊNCIAS

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NOTAS

[i] In: Verbo de Minas,  Juiz de Fora-MG, V. 21, n. 37, jan./jun. 2020. O presente artigo está vinculado também ao projeto CONICYT+PAI/CONVOCATORIA NACIONAL SUBVENCIÓN A LA INSTALACIÓN EN LA ACADEMIA, CONVOCATORIA 2018, Folio 77180056 e à Cátedra Fernão de Magalhães vinculada ao Instituto Camões – Portugal.

[ii] Daiana Nascimento dos Santos é Doutora em Estudos Americanos pela Universidade de Santiago, com pós-doutorado pela Universidad de Playa Ancha. É docente e pesquisadora do Centro de Estudios Avanzados da Universidad de Playa Ancha, Chile, vinculada ao Programa de Doctorado en Literatura Hispanoamericana Contemporánea. Coordenadora da Cátedra Fernão de Magalhães vinculada ao Instituto Camoês - PT.

[iii] Édimo de Almeida Pereira é Doutor em Letras: Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Professor do Programa de Mestrado em Letras do Centro Universitário UniAcademia. Autor de: Metamorfoses do abutre: a diversidade como eixo na poética de Adão Ventura. (2010); e dos volumes infantojuvenis Sabugo, o porquinho que descobriu o sabonete. (2. ed., 2003); O menino assentado no meio do mundo & outros contos (2004); Contos de Mirábile (2. ed., 2007); O telefone de latas (2. ed., 2008); Nikké (2010); e O mercador de sorrisos (2020).

[iv] Arquiteto soteropolitano que foi convidado, com outros 149 afrodescendentes, a participar de um teste genético, em 2013, com o objetivo de identificar de quais regiões africanas teriam vindo seus ascendentes no período da escravidão. Ver: GOMES, Laurentino. Escravidão: do primeiro leilão de cativos em Portugal até a morte de Zumbi dos Palmares. v. 1. Rio de Janeiro: Globo Livros, 2019. A fala de Zulu Araújo, na íntegra, encontra-se em (GOMES, 2019, p. 175).

[v] Cabe salientarmos que, por muito tempo Solano Trindade foi relegado ao esquecimento. Situação que foi revertida ao ser recuperado por trabalhos importantes como os de Eduardo de Assis Duarte no Brasil e os de Niyi Afolabi nos Estados Unidos, referenciados na bibliografia do presente artigo.

[vi]A título de exemplo, citamos algumas vozes que abordam esse assunto na sua obra poética: Nicolás Guillén e Nancy Morejón (Cuba), Nicomedes Santa Cruz e Victoria Santa Cruz (Peru), Oscar Maturana e Mary Grueso (Colômbia), Cristina Rodriguez Cabral (Uruguai) etc. Por outro lado, esse tema não é só abordado por poetas das Américas, nota-se também uma efervescente produção na África, a partir de nomes como os de Kanguimbu Ananaz (Angola), Donato Ndongo (Guiné Equatorial), entre outros.

[vii] Esse liame temático poderá ser observado quando da abordagem da poesia do mineiro Adão Ventura, como por exemplo no poema Meu pai (I).

[viii] O eu poético remete-nos àqueles que portam gravata, peça que compõe e tipifica a usual indumen-tária (terno, grava e camisa de colarinho branco) daqueles que, em geral, ocupam as instâncias sociais consideradas importantes.

[ix] Para ver a linha do tempo com os principais presidentes da Fundação Cultural Palmares, consultar: http://www.palmares.gov.br/?p=33171. Acesso em: 1 jun. 2020.

[x] Versos da Letra do Samba-enredo Meu Deus, meu Deus, está extinta a escravidão?, do Grêmio Recreativo e Escola de Samba Paraíso do Tuiuti, Carnaval de 2018. Composição: Cláudio Russo / Anibal / Jurandir / Moacyr Luz / Zezé. Disponível em: https://www.letras.mus.br/gres-paraiso-do-tuiuti/samba-enredo-2018-meu-deus-meu-deus-esta-extinta-a-escravidao/. Acesso em: 2 jun. 2020.

[xi] No que diz respeito à escravidão no Brasil, particularmente sobre as várias conotações que esta assume na atualidade, vale conferir o livro El océano de fronteras invisibles: relecturas sobre (¿el fin? de) la esclavitud en la novela contemporânea (2015), referenciado na bibliografia desse artigo.

[xii] No dia 25 de maio, na cidade de Minneapolis (EUA), o afro-americano  George Floyd foi brutalmente asfixiado por um policial branco. As palavras pronunciadas por Floyd durante a violenta ação para sua contenção, Eu não consigo respirar, permanecem ecoando durante os protestos contra o racismo por cidades de todo o mundo. No Brasil, à morte da menina Ágatha Félix, de oito anos de idade, em setembro de 2019 (https://www.youtube.com/watch?v=i-X2CTEahFA), somaram-se, dentre  outras, a de João Pedro, jovem de 14 anos, assassinado durante uma operação policial no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo (RJ) (https://www.hypeness.com.br/2020/05/joao-pedro-morto-em-operacao-policial-no-meio-de-pandemia-levou-tiro-nas-costas-diz-laudo/).

[xiii] Importante notar também como a pandemia do covid-19 tem afetado as comunidades afrodescen-dentes no Brasil e nos Estados Unidos, não só em números de mortos como também na lista de desempregados.

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