Será?!...
Tudo pode acontecer.
Mas esta de me dizer
Que a um branco... eu seja igual...
Negro cansado de guerra
Que conhece sua terra,
Acha a pilhéria genial
(Negro preto cor da noite, 1932)
Será?!...
Tudo pode acontecer.
Mas esta de me dizer
Que a um branco... eu seja igual...
Negro cansado de guerra
Que conhece sua terra,
Acha a pilhéria genial
(Negro preto cor da noite, 1932)
Sem algemas?
Dictinha, escute uma história
Muito nossa: antigamente
Não faz muito tempo ainda,
Foi escrava a negra gente;
Os mais pesados castigos
Lhe deram impunemente.
Mas um dia a realeza
De nossa sorte condoída,
Cujo crime consistia
Em ter pele enegrecida,
A liberdade nos deu;
Belo gesto, não, querida?
O que depois ocorrera,
É de ontem, por que falar?
Mas, eu ainda, Dictinha,
Preciso me libertar
Do penoso cativeiro,
Em que me trás seu olhar.
(Dictinha, 1938)
Negrinha
Li um conto de Lobato
Que muito me entristeceu...
Negrinha, remanescente
Da era triste em que viveu
A pátria amada, que nunca
Um carinho mereceu
Via com notada inveja,
A criançada que brincava,
E se lhe dava por troça
Um boneco, o segurava
Com certo medo, e com o espanto
Nos grandes olhos o olhava.
Esse conto tem um pouco
Do viver desventuroso
Meu. Deus é pai, porém, quando
Num abraço afetuso
Prendo a Dictinha, duvido,
Que seja tão generoso!...
(Dictinha, 1938)
Novo rumo!
Negro preto cor da noite,
Nunca te esqueças do açoite
Que cruciou tua raça.
Em nome dela somente
Faze com que nossa gente
Um dia gente se faça!
Negro preto, negro preto,
Sê tu um homem direito
Como um cordel posto a prumo!
É só do teu proceder
Que, por certo, há de nascer
A estrela do novo rumo!
(Negro preto cor da noite, 1932)
Dictinha
Penso que talvez ignores,
Singela e meiga Dictinha,
Que desta localidade
És a mais bela pretinha:
Se não fosse profanar-te,
Chamar-te-ia... francesinha!
Então, quando vais à reza
Com teu vestido de cassa,
Não há mesmo quem não fale,
Orgulho da minha raça:
– Olha que preta bonita
E que andar cheio de graça!...
Se as vezes sorrio, a esmo,
Não me tomes por caduco.
Com teu vulto nos meus olhos,
Ando como aquele turco
Que, doloroso destino,
Ao te ver, ficou maluco...
Ah! Se souberas, Dictinha,
Que por sob essa aparente
Frieza, (quem tal diria!...)
Eu peço constantemente,
A Deus que um dia nos ponha
Numa casinha sem gente...
(Dictinha, 1938)