Thaíse Santana

A cura

Quando me descobri água
lavei meu corpo
a minha casa
te arranquei de mim
eu que sempre fui rio
ao te ver virei represa
água contida
mas refiz o caminho
nas minhas águas de rio
lavei a ferida
me vi curada.

(Mulher-Palavra, 2021)

II

 

Minha imagem é geografia das nossas memórias

(lá) luz plana sobre o Índico

(aqui) teu silêncio

(nessa foto da Bahia) meu olhar macambúzio,

meu punho cerrado

onde guardo a Macala em brasa

que te ofereço:

segura

Guiniver

Deixa Girar

Cigana cingida
de preto e vermelho
Na encruza
com mão na cintura
Tirando sorte no baralho
Senhora das forças ocultas
Silenciando o luar, o olhar
Tramando palavras soltas no ar
Mandingueira,
preta matreira
Cruzada nas águas
Pisa firme na tronqueira
Ponta na madeira
Salva de Palmas

(Infinito Rubro-Carmim, 2019)

IV

 

Macala é o mineral da minha língua

onde apoio minha força,

 

guardo saudade entre meus anéis,

sustento a fé no volume de minha saia,

nos símbolos do meu balangandã

 

machados de ferro de esculpir coragem

gritam aos meus ouvidos:

ergue a cabeça

 

Thaíse Santana

Eu te vejo

eu te vejo na doçura que imprime na palavra
como se ela fosse música para os meus ouvidos
eu te vejo no cuidado que reveste o seu toque
como se os seus dedos fossem feitos de espumas
eu te vejo na luz que escapa dos teus olhos
como se nos meus ela achasse abrigo
eu te vejo no fogo que habita o teu corpo
como se buscasse refrigério nas minhas águas
eu te vejo nos atos de menino-homem solitário
como se no meu abraço encontrasse casa.

(Dentro da casa o vazio, 2024)