Construção de uma auto-imagem positiva1
Consuelo Dores Silva
Apesar de não termos pretendido uma pesquisa do tipo intervenção, quatro alunos do sexo masculino e três do sexo feminino apresentavam sinais de uma possível aceitação de si mesmos, e se auto-representavam belos, em junho de 1991.
A auto-representação destes sujeitos é a seguinte:
1. Redação do sujeito M.N.:
"Meus olhos são castanhos. Meus cabelos são pretos crespos."
"Gosto de mim como eu sou não gostaria de ser diferente. Sim eu gosto de mim como eu sou se eu for feio ou bonito eu gosto de mim mesmo assim como sou. Não gosto de ser diferente."
2. Redação do sujeito K.C.:
"eu sou bonita para mim. Eu gosto de mim. Eu calço 33." ''A minha família gosta de mim como eu sou."
3. Redação do sujeito J.S.:
“(...) sou bonita tenho uma pintinha na testa minha pele e lisa com cabelos gosto de mim do meu geito e como eu sou eu não gostaria de ser".
"eu gosto da minha escola da minha professora da minha colega que senta atrás de mim e dos meus colegas."
4. Redação do sujeito F.G.:
“(...) Tenho 12 anos e estou na quarta série tenho 1 metro de altura calço 39-40 gosto de passear de estudar e de Brincar com menino de minha idade. "
“Meus dentes são brancos e brilhantes. Meus cabelos são encaracolados. Sou escuro mais gosto muito. Sou carinhoso. Sou educado. Sou estudioso. Minha pele e grosa. Meus olhos são castanho. tenho orelha pequena. Minha boca e pequena."
"Não gostaria que mudace nada por que sou muito feliz do jeito que eu sou. Se mudace as vezes não seria feliz como eu sou."
5. Redação do sujeito E.J.:
“(...) tenho uma pinta pra baixo da orelha e uma no braço."
“Gosto de mim como eu sou."
6. Redação do sujeito D.M.:
"Gosto de mim como eu sou. Não tenho pé grande nem mão, tenho orelhas pequenas, me acho bonita."
7. Redação do sujeito R.J.
"eu gosto do geito que eu sou. Eu não queria mudar nada do meu corpo. Eu estou satisfeito com tudo que tem no meu corpo. Eu posso fazer o que eu quero com meu corpo com minhas pernas e os meus braços. Eu gosto de ser alto negro ter os cabelos lisos. Com meu corpo mudado eu vou sentir falta de tudo que eu tinha antes. Com o corpo mudado eu não vou poder fazer o qeu fazia antes. Com meu corpo mudado as pessoas iam notar muita coisa diferente em mim. Com meu corpo mudado as pessoas iam me achar esquisito diferente ou outra pessoa. Com o meu corpo mudado eu ia me achar estranho minha mãe não ia me conhecer. Eu gosto do meu corpo como ele é."
Os depoimentos destes entrevistados confirmam a tese de APPLE (1990) de que indivíduos de grupos étnicos não-brancos podem construir a sua identidade, através de mecanismos de resistência.
Concluímos que treze alunos de nossa pesquisa têm de si a representação elaborada pelos vários grupos sociais: o negro como um indivíduo inferior.
Esta percepção é introjetada nos grupos étnicos dominados e eles, classificados, segundo a cor da pele, forjarão a sua identidade, tendo como espelho o grupo racial dominante; portanto, o ponto de referência será sempre o estrato branco da população.
Inferimos que os sete estudantes possuidores de uma auto-imagem que já se apresenta positiva, possivelmente, se identificam com seu grupo de origem, assumindo, consequentemente, a sua diferença, a sua alteridade. Logo, a identidade psicológica, "(. . .) é moldada de maneira muito mais decisiva pela raça do que pela classe." (BERGER, 1976, p.97).
Assim, o primeiro passo a ser dado pelo negro na descoberta de si mesmo, de sua identidade, é a busca de sua imagem refletida nos sujeitos de seu grupo, reconhecendo-os, primeiramente, como seus iguais.
O segundo passo é, como já dissemos anteriormente, o negro conscientizar-se de seu valor, através da crítica à sua representação social. Em seguida, este negro deve ocupar, de fato, o lugar que lhe pertence por direito na sociedade: o lugar de um sujeito histórico que se constrói passo a passo, a cada dia.
Nota
1. Originalmente publicado na obra Negro, qual o seu nome? (1995).
Referência
SILVA, Consuelo Dores. Negro, qual o seu nome? Belo Horizonte: Mazza, 1995.