DADOS BIOGRÁFICOS

Francisco de Paula Brito veio ao mundo no dia 2 de dezembro de 1809, na cidade do Rio de Janeiro. Filho do carpinteiro Jacinto Antunes Duarte e de D. Maria Joaquina Conceição Brito. Ainda jovem, abandonou os estudos, na Corte, para dedicar-se à atividade de tipógrafo, o que lhe rendeu os primeiros passos na imprensa, fazendo carreira como ‘operário das tintas’. Desenvolveu por talento próprio e pelo contato com escritores renomados e jovens promissores, que acontecia frequentemente em sua gráfica, o prazer da leitura e o ofício da escrita. Como tipógrafo, soube atuar nos bastidores da produção literária e jornalística brasileira e, como ‘operário das letras’, foi protagonista, escrevendo artigos jornalísticos e desenvolvendo gêneros literários. Foi um dos precursores do conto brasileiro ao publicar, no Jornal do Comércio, “O Enjeitado” (28 e 29/03/1839), “A Mãe-Irmã” (10/04/1839) e “A Revolução Póstuma” (9/03/1839), que saíram sob o pseudônimo P.B.

Começou a sua carreira, atuando, em 1829, nas oficinas de Seignot Plancher, o fundador do Jornal do Comércio. Em 1831, após o período de experiência como aprendiz na Tipografia Nacional, instala a sua própria oficina gráfica. Por este feito, Oswaldo de Camargo destaca Paula Brito como o “iniciador do movimento editorial no Brasil” (1987, p. 41). Recorrendo ao vocabulário de hoje, poderíamos dizer que ele foi um empreendedor à frente do seu tempo. De empregado, passou a ser o próprio patrão, com muito sacrifício, diga-se de passagem.

Urge destacar o papel desempenhado por Paula Brito na promoção da leitura no Brasil. Com a sua loja, no largo do Rocio, ele contribuiu para a expansão comercial do livro, que, antes, era estigmatizado como 'coisa diabólica', conforme destaca Nelson Werneck Sodré (1966, p. 46). As ações comerciais e literárias do escritor romperam com a clandestinidade que marcava o universo livresco no país, em consequência dos longos séculos de passado colonial marcados pela censura à atividade impressa, que só foi permitida por aqui em 1808. De atividade perigosa, a leitura ganha o status de produto de extrema necessidade. Sodré (idem) destaca que os ‘agitadores culturais’, a exemplo de Paula Brito, acreditavam sem titubear que “ler, aprender, eram atividades que continham, em si mesmas, como sempre, um sentido anticolonialista – representavam um esforço de libertação”.

Da gráfica de Paula Brito foram impressos valiosos exemplares da cultura brasileira. Podemos elencar algumas obras, tais como: Antônio José ou o Poeta e a Inquisição (1839), de Gonçalves de Magalhães, que serviu de mote introdutório para a criação de um teatro brasileiro. O dramaturgo Martins Pena também teve suas primeiras obras editadas por Paula Brito. Foram elas: O Juiz de Paz na Roça (1838) e A Festa e a Família na Roça (1840), na categoria comédia. O poema “Ela” (1855), a tradução Queda que as mulheres têm para os tolos (1861) e a peça Desencantos (1861) foram os primeiros trabalhos de Machado de Assis e que contaram como o decisivo apoio de Paula Brito para as suas publicações.

Também foi marcante o desempenho dele em defesa da causa dos afrodescendentes. Sendo mulato e jornalista, buscou expressar, através da imprensa, enquanto instrumento de promoção da cidadania e da liberdade de manifestação, as ambições do negro enquanto sujeito, agindo, assim, na contramão da mentalidade escravocrata, que insistia em coisificá-lo. Paula Brito foi o editor-responsável pelo periódico O Homem de Cor – que depois passou a ser chamado O Mulato ou o Homem de Cor – cuja circulação se deu entre 14 de setembro e 4 de novembro de 1833. Portanto, data-se deste período o início da Imprensa Negra no Brasil.

Para se ter uma ideia de como ele foi um “homem do povo”, segundo destaca Nelson Werneck Sodré (1966, p. 223), Paula Brito trouxe para o Rio Teixeira e Sousa, marceneiro esquecido em Cabo Frio, estimulando-o a escrever romances para a Marmota. Mulato como o jornalista, o incipiente escritor, de origem humilde, conseguiu chegar à condição de professor primário e intelectual. Teixeira e Sousa teve o mérito de ser o pioneiro no gênero romance no Brasil, ao escrever O Filho do Pescador, em 1843, editado por Paula Brito. O escritor Oswaldo de Camargo, em O negro escrito, chega a nos fornecer uma informação curiosa:

a morte do amigo Teixeira e Sousa (...) apressou também a sua [a de Paula Brito]. Eram íntimos, o falecimento do antigo   caixeiro  de sua loja e jovem candidato às Letras, abalou-o. A 1º de dezembro de 1861, ao voltar do cemitério, já adoentado, caiu de cama, falecendo 14 dias depois. (CAMARGO, 1987, p. 41).

Além de alguns retratos de críticos literários a respeito de Paula Brito, há um texto em especial feito por alguém que de fato conviveu com ele. Após a sua morte, um grande amigo resolveu prestar-lhe uma homenagem. Trata-se da crônica de 24 de dezembro de 1861, escrita por Machado de Assis em sua coluna no Diário do Rio de Janeiro. Eis uma prova concreta do carinho e da admiração que o jovem cronista tinha por Paula Brito. Este foi decisivo para os primeiros passos de Machado, ao oferecer a ele a oportunidade de publicar um dos seus primeiros poemas, “Ela”, na edição de 12 de janeiro de 1855, da Marmota Fluminense. Na oficina de Paula Brito, Machadinho aprendeu o ofício de tipógrafo e, por indicação daquele, conseguiu emprego, em 1856, na Tipografia Nacional, sob a direção de Manuel Antônio de Almeida, autor do clássico Memórias de um Sargento de Milícias (1854/1855).

Na crônica em questão, Machado de Assis elogia Paula Brito “pelas suas virtudes sociais e políticas, por sua inteligência e amor ao trabalho”, o que levou a alcançar com louvor “a estima geral” (1970, p. 95). Sutilmente, Machado utiliza a “modesta posição” alcançada pelo falecido, que, em vida, foi impressor por vocação e por profissão, para destacar que, independente dos clarins da fama e do prestígio econômico tão caro aos “medalhões”, Paula Brito “tinha em roda de si todas as simpatias” (ASSIS, idem).

O jovem cronista ressalta a bondade de Paula Brito, qualificando-o como homem raro. Como jornalista de inclinação liberal, na época, Machado reconhece o valor de Paula Brito quanto à sua militância política: “Tinha fé nas suas crenças políticas, acreditava sinceramente nos resultados da aplicação delas; tolerante, não fazia injustiça aos seus adversários; sincero, nunca transigiu com eles” (ASSIS, 1970, p. 96).

Para além das qualidades intelectuais e profissionais, Machado de Assis posiciona Paula Brito como sujeito detentor de atributos nobres, salientando a sua habilidade em construir e consolidar amizades e a sua admiração pelos jovens. Motivo: “Amava a mocidade, porque sabia que ela é a esperança da pátria, e, porque a amava, estendia-lhe quanto podia a sua proteção” (ASSIS, idem). Foi o caso, como sabemos, da proteção de Paula Brito a Machado de Assis e da consequente admiração que um nutria pelo outro.

É admirável, salienta Machado, a opção de Paula Brito por se sobressair na “massa comum dos homens”. Ao invés de se projetar individualmente, buscando como causas a fortuna e o prestígio, o jornalista investia o que ganhava em ações generosas que promovessem o bem-estar cultural da Nação, a exemplo dos maquinários da tipografia, por onde foram impressas edições importantes para a Literatura Brasileira. Por agir assim, adverte Machado, Paula Brito “morreu pobre como vivera”. Parece que o ensinamento popular: “vão-se os homens, ficam as obras” constituiu a missão cultural desempenhada por ele. Os importantes livros que saíram da gráfica de Paula Brito estão aí para comprovar isso.

 


PUBLICAÇÕES

A revelação póstuma. In: Jornal do Comércio, Rio de Janeiro, 9 e 11/03/1839. (conto).

A mãe-irmã. In: Jornal do Comércio, Rio de Janeiro, 10/04/1839. (conto).

O enjeitado. In: Jornal do Comércio, Rio de Janeiro, 22 e 29/05/1839. (conto).

Fábulas de Esopo em quadrinhas. Rio de Janeiro: [s.n.], 1857.

Poesias. Rio de Janeiro: [s.n.], 1863. (poemas).

Traduções

Traduziu obras de Frederic Soulié, Pitre Chevalier, A. Dumas, Emile Souvestre e Cretineau Joly.

Editou os periódicos:

A mulher do Simplício ou A fluminense Exaltada (1822-1844).

O mulato ou o Homem de Cor (1833).

A maratona da Corte (posteriormente chamada de A maratona Fluminense e A Maratona) 1849-1861 (de janeiro de 1864 a abril do mesmo ano, segundo Afrânio Coutinho).

Arquivo Municipal, 1859-1892.

 


TEXTOS

 


CRÍTICA

 


FONTES DE CONSULTA

BROCA, Brito. Românticos, pré-românticos, ultra–românticos: vida literária e romantismo brasileiro. São Paulo: Pólis; Brasília: INL, 1979. p. 63-68.

CAMARGO, Oswaldo de. O negro escrito: apontamentos sobre a presença do negro na Literatura Brasileira. São Paulo: Imesp, 1987.

CAMARGO, Oswaldo de. Um negro histórico: Francisco de Paula Brito, primeiro editor brasileiro. In: RAMOS Jr., José de Paula; DEAECTO, Marisa Midori; FILHO, Plínio Martins (Org.). Paula Brito: editor, poeta e artífice das letras. São Paulo: EDUSP, Com Arte, 2010. 

COUTINHO, Afrânio; SOUSA, J. Galante de. Enciclopédia de Literatura Brasileira. São Paulo: Global Editor; Fundação Biblioteca Nacional; Academia Brasileira de Letras, 2001. v. 1.

FRANCISCO, Dalmir; CRUZ, Adélcio de Sousa. Paula Brito. In: DUARTE, Eduardo de Assis (Org.). Literatura e afrodescendência no Brasil: antologia crítica. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011, vol. 1, Precursores.

GODOI, R. C. de. Um editor no Império: Francisco de Paula Brito (1809-1861). São Paulo: Edusp, 2016, 392 p.

GODIM, Eunice Ribeiro. Vida e Obra de Paula Brito. Rio de Janeiro: Livraria Brasiliana Editora, 1965.

MASSA, Jean–Michel. A juventude de Machado de Assis (1839-1870). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; Conselho Nacional de Cultura, 1971.

PAULA BRITO, Francisco de. A mãe-irmã. Jornal do Comércio, 10 abr. 1839. In: LIMA SOBRINHO, Barbosa. Os precursores do conto no Brasil. Rio de Janeiro; São Paulo; Bahia: Civilização Brasileira, 1966. p. 185-196.

PAULA BRITO, Francisco de. O enjeitado. Jornal do Comércio, 28 e 29 mar. 1839. In LIMA SOBRINHO, Barbosa. Os precursores do conto no Brasil. Rio de Janeiro; São Paulo; Bahia: Civilização Brasileira, 1966. p. 197-219.

PEREIRA, Lúcia Miguel. Machado de Assis: estudo crítico e biográfico. 6 ed. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1988.

RAMOS Jr., José de Paula; DEAECTO, Marisa Midori; FILHO, Plínio Martins (Org.). Paula Brito: editor, poeta e artífice das letras. São Paulo: EDUSP, Com Arte, 2010. 

RAMOS Jr., José de Paula.  A poesia de Paula Brito. In: RAMOS Jr., José de Paula; DEAECTO, Marisa Midori; FILHO, Plínio Martins (Org.). Paula Brito: editor, poeta e artífice das letras. São Paulo: EDUSP, Com Arte, 2010. 

SIMIONATO, Juliana. A Marmota  de Paula Brito. In: RAMOS Jr., José de Paula; DEAECTO, Marisa Midori; FILHO, Plínio Martins (Org.). Paula Brito: editor, poeta e artífice das letras. São Paulo: EDUSP, Com Arte, 2010. 

SODRÉ, Nelson Werneck. História da Imprensa no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1966.

 


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