Ao final da fala de Antônio, os sons de violinos vão sumindo lentamente, sendo substituídos por sons de turbinas de avião ligadas. Antônio levanta-se atônito, olhando ao longe. Tudo escurece, ficando apenas um foco de luz no rosto do primo sozinho, que ouve atentamente uma voz ruidosamente microfonada de uma aeromoça.

 

AEROMOÇA (OFF) – Atenção senhores passageiros do Vôo M1888. Bem-vindos ao último voo da África Linhas Aéreas Tribais, uma empresa criada especialmente para as Missões Sociais Para Um Mundo Melhor. Nosso tempo estimado de voo é de 11 horas. Com previsão de chegada ao Aeroporto Internacional da Namíbia por volta das 18h. A temperatura do local de destino é de 42°.

ANTÔNIO (surpreso) – Namíbia?

AEROMOÇA (OFF) – (debochada) Ora, não venha com essa, Antônio! Você fala muito bem o alemão, que eu sei! (voltando ao trabalho) Temos uma previsão de voo estável. E o nosso comandante sugere que, na chegada ao aeroporto da Namíbia, os passageiros observem pela janela esquerda do avião a incrível região desértica encontrando o mar. A Namíbia é o único lugar no mundo onde o Deserto Árido encontra o Mar Oceânico. Um fenômeno somente divulgado depois da chegada dos alemães no local...

 

O som das turbinas do avião vai suplantando a voz da aeromoça até dominar completamente o ambiente. De repente o som ensurdecedor das turbinas silencia-se por completo. Transpassado por um pequeno facho de luz que ainda consegue iluminar seus sufocados olhos e boca, Antônio recita "O Navio Negreiro", do poeta Castro Alves, em tradução na língua alemã. Seus olhos veem a Namíbia.

 

Antônio – "Estamos em pleno mar,

Die zwei unendlichkeiten machen eine

Verruckte Umarmung.

Blaue, golden, ruhige.

Welche vom beiden ist der Himmel?

Welche ist der Ozean?

Welche vom beiden ist der Ozean

Welche vom beiden ist der Himmel?

Estamos em pleno mar!"

(Namíbia, não!, p. 122-123.)


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