A ORTOGRAFIA ESTÉTICA
OU ARTÍSTICA
(O critério biológico
e estético de Teixeira de Pascoais)
Para aqueles a que de todo repugna
a grafia científica e simplificada da reforma, seria aconselhável,
ao menos, para se não ficarem na mixórdia da velha
escritura, adotassem um critério artístico e estético.
Vimos como Latino Coelho falava
em estética das palavras. A mais original teoria gráfica,
na espécie, entretanto, é a de Teixeira de Pascoais
(Joaquim Pereira Teixeira de Vasconcelos), um dos melhores poetas
contemporâneos, de Portugal. O maior dentre os vivos, dizem
alguns críticos.
Transmito aos estetas o que vejo
em Álvaro Pinto A nova ortografia e o desacordo reinante
(1931) e que os poderá guiar, numa grafia artística.
É de 1911 a teoria. Diz Teixeira de Pascoais:
"É realmente necessário estabelecer-se
uma ortografia definida que faça a harmonia neste caos
ortográfico em que se encontra a nossa língua..."
Sigamos nós - diz o poeta
- outro critério, dentro da concepção moderna
da natureza e da vida: um critério biológico
e estético.
Partamos do princípio, hoje
indiscutível, de que as línguas são organismos
vivos...
As palavras são seres.
Compôem-se portanto de duas partes: uma objetiva e
outra subjetiva. E como tais as devemos considerar quanto à
Ortografia, porque ela implica com sua aparência corpórea
e, por conseguinte, com sua beleza plástica.
Como entre o corpo e a alma, existe uma relação
de harmonia e intimidade, é claro que a ortografia, constituindo
a parte externa ou material das Palavras, implica igualmente
com a sua expressão interior e psíquica.
Portanto, o que é necessário,
antes de tudo, é que a ortografia a adotar não contrarie
a beleza física das Palavras, a sua expressão íntima
ou moral, nem a relação de harmonia que deve existir
entre aquela beleza física e sua expressão íntima.
A forma gráfica das
Palavras deve estar em harmonia com o seu sentido
íntimo ou parte subjetiva e com as leis da estética;
deve ser bela e verdadeira.
Desta regra geral derivam duas
regras especiais
1. Simplificar a fórma
gráfica das palavras cujo sentido é
simples, definido ou concreto.
A palavra crystallino, por
ex., deve escre ver-se cristalino; o y e os
dois ll deformam-lhe o corpo, tornando-o confuso e torvo,
ao passo que o i latino e um l apenas, fazem
a palavra simples, clara, cristalina, como é a
própria idéia que ela traduz. Pelas mesmas razões
deve escrever-se janela, e não janella; fruto
e não fructo; coleção e não
collecção; ortografia e não orthographia;
teatro e não theatro; inocencia, e não
innocencia, etc.
2. Não simplificar a
forma gráfica das palavras que encerram um sentido
profundo, abstrato, misterioso.
Vejamos, por exemplo, a palavra
Peccado: escrevendo-se com um c apenas, o sentido
íntimo desta palavra altera-se imediatamente, e quebra-se
a relação de harmonia entre o seu corpo e a sua
alma, o que é uma ofensa aos princípios da
Biologia e da Estética.
Olhemos a palavra escrita de duas
maneiras Peccado e Pecado. Logo ressalta aos
olhos o enigma penal que os dois cc revelam
e que esta palavra, na verdade, contém..."
Deve escrever-se, pelos mesmos
motivos, afflicto e não aflito, bocca e
não boca, espectro e não espetro, occulto
e não oculto, etc., etc.
Todavia, palavras há que
têm um sentido misterioso e se escrevem como se pronunciam,
o que não quer dizer que a sua forma gráfica
contradiga o seu espírito. Nestas palavras, a
verdadeira harmonia existe entre o seu sentido e a sua expressão
sônica.
Por exemplo, nevoeiro. O sebastianismo
da palavra está na surdez das duas primeiras sílabas
e no prolongamento mais alto e nubloso da terminação.
Na palavra luar, a idéa
que traduz casa-se perfeitamente com a primeira sílaba
muda e a segunda aberta. Aquela é feita de sombra, esta
é feita de luz. Reunidas, dão realmente a luz difusa
do luar."
O y deve introduzir-se na palavra
lágrima...
Na palavra lágryma...
a forma do y é lacrymal... ”
(NOTA - Esqueceu-se Pascoais (ou não
o quis fazer) de citar as palavras lyrio e cysne.
Em lyrio, no y é que se concentra
toda a grácil e clara beleza daquela flor, na haste!
E como o y de cysne imita o longo e recurvo
pescoço da ave, nadando no "manso lago azul"
do poeta Júlio Salusse!}.
"Na palavra abysmo. é
a forma do y que lhe dá profundidade, escuridão,
mistério... Escrevê-la com i latino é fechar
a boca do abysmo. é transformá-la numa
superficie banal."
"Vejamos agora o emprego do
h na nalavra homem, por exemplo. Tirem-lhe
o h, como tantos Herodes das palavras inocentes têm
feito, e fica uma palavra horrivelmente mutilada! Faz-me lembrar
um homem sem nariz, sem orelhas ou sem pernas!"
"A palavra Phantasma,
escrita com f perde todo o seu aspecto espectral
e misterioso. Theologia escrita só com t perde
seu sinal de transcendência divina."
Etc., etc., etc.
Quem ama a complicação,
ou tem alma de artista, pelo menos se complique segundo o
critério biológico e estético do poeta
Teixeira de Pascoais. Quanto a mim, declaro-o candidamente, se
ainda fôra simbolista, estava adotada, na certa, a grafia
estética... Com que sede esguia de beleza, eu falara em
lyrios e em abysmos!
Foi, possivelmente, no critério
de Pascoais, que Álvaro Moreyra achou o y do
nome.
Se o adotára, eu aperfeiçoaria
ainda, segundo a vitalidade subjetiva, o critério.
Quando, por exemplo, falasse de pessoa tísica havia
de diferençar assim: pintava tysica, com y, quando
falasse de menina pálida e afinada, esbelta e transparente,
que o bacilo tivesse invadido. E escreveria thisica - ou até
mesmo phthisica - se o sujeito da palavra fosse
um tuberculoso próspero e engordado, como os que, não
raro, a gente encontra por aí. Isto, quando não
preferisse deixar a palavra tysica unicamente para o
primeiro caso, reservando para o segundo a palavra tuberculoso,
cujo volume bem exprime a idéia do qualificativo físico
desejado.
E como a educação
da subjetividade é coisa muito difícil, eu proporia,
como legislação do ensino, que o critério
biológico e estético só fosse lecionado,
ao discente, entre os dezoito e vinte anos...
"Que idade flórida
e bela
a dos vinte anos, não é?"
(Tomaz Ribeiro).
FORMULÁRIO DA ACADEMIA BRASILEIRA
DE LETRAS
Vão aqui, sistematizadas
por mim, as regras ortográficas do Formulário,
pela Academia aprovado em junho de 1931.
Nota - Não se respeitou
nem à ordem, nem à redação acadêmicas.
[Nota do organizador: mantém-se aqui o texto tal qual se
encontra no original. Nenhuma atualização (orto)gráfica
foi feita]
I. ABECEDÁRIO
É o seguinte o
abecedário português:
a, b, c, ç, ch, d, e, f, g, h, i, j, l, lh, m, n, o, p,
q, r, s, t, u, v, x, z.
Como póde ver-se, o k,
o w, o y, foram banidos do alfabeto.
Em logar do k, escreve-se qu (antes de e
e i) - querosene, quilo;
ou c (em qualquer outra situação)
- calendas, cágado, etc.
K
1. Por cortesia internacional, é conservado o k
para sinal de abreviação das palavras quilo,
quilogramo, quilolitro e quilómetro: k, kg, kl, km.
2. Entra, tambem como hóspede, em palavras estrangeiras
e respectiva família: Kant, kantismo, kaiser, kapa
(letra grega) kepleriano, etc.
COMENTÁRIO - É estranho que o Formulário
haja incluído na lista do k a palavra quermesse,
portuguesa já, e mande escrever kermesse.
W
1. O w substitue-se por u ou v,
segundo a pronúncia : vigándias, valsa, Osvaldo.
2. Conserva-se, porém, o w como símbolo
denotativo de oéste.
COMENTÁRIO- Diz uma nota do Formulário
que, com o som de u, não figura em vocábulo português
ou aportuguesado. Quer dizer isto que, em palavras como wilsônia
(uilsônia) - nome de planta, wellingtônia
(uelintônia) - nome de planta, wesleyano (uesleiano)
- sectário de Wesley, wiclefismo (uiclefismo)
- doutrina de Wiclef, darwinismo, wilsonismo - doutrinas
de Darwin e de Wilson, etc., o w, apesar de origem inglesa,
não sôa como u.
Ou, de outro modo, tais palavras não são portuguesas
nem aportuguesadas.
O que é, tudo, absurdo, da Academia.
Y
O y substitui-se por i : juri, mártir,
tupi, Andaraí.
COMENTÁRIO - O Formulário não
cogita do y em palavras originadas de nome estrangeiro,
como fez para o k . Naturalmente, porém, que se
há de continuar a escrever byroniano, carlyleano, taylorismo,
etc.
II - DITONGOS E FINAIS EM ÃO E Ã
DITONGOS ORAIS
AI, OI - Os ditongos ai, oi. assim mesmo
se grafam: pai, animais, amai, boi, herói. rói,
anzóis, etc.
UE - O ditongo ue, assim mesmo se escreverá:
possue, azues, etc.
NOTA - O Formulário não o diz, mas a forma
verbal fui, não perdeu o i, pelo e...
ÉU, EU - Grafam-se com u os ditongos éu e
eu: céu, seu, chapéu, meu, etc.
IU - Com u se escreve o ditongo iu: feriu, partiu,
viu, etc. (cf. frio, rio)
DITONGOS NASAIS
ÃE. ÕE - Com e se escrevera os ditongos
na sais ãe e õe: mãe, tabeliães.
pões, anões.
Hiato - Ouando
não formem ditongo, as vogais imediatas a-e, a-o, i-o,
se escreverão como de costume. Exs. : aéreo.
cáos, rio, etc.
Também se continúa a escrever
ao, na combinação a (preposição)
com o (artigo).
O DITONGO ÃO
Escrevem-se com ão e não am:
(a) os monossílabos: cão, chão,
vão, etc.
(b) as palavras agudas: corarão, alcorão, etc.
(c) as fórmas verbais do futuro: amarão,
de verão, etc.
(d) as palavras em ão, anoxítonas: acórdão,
bênção, etc. (acentuada a sílaba
tónica)
O SOM DITONGAL AM
Escrever-se-á com am o final átono
dos verbos: amam, amaram, disseram, etc.
O FINAL Ã
Escrevem-se com ã
(a) as palavras oxítonas: amanhã, Traça,
etc.
(b) as palavras monossílabas: lã, vã,
sã.
(c) as palavras femininas das terminadas em ão : aldeã,
cristã, orfã, etc
(NOTA - O Formulário não cuidou
da pala vra ímã, que Gonçalves
Viana manda pronunciar imã (com a ultima
tônica), sendo a pronúncia ímã
um erro crasso. Creio que não poderá ser
corrigida, no Brasil, tal pronúncia}.
III - H
A- Permanência
1. O h inicial - É mantido
o h inicial das palavras, quando de acôrdo com a etimologia:
hoje, homem, honra, hora, etc. Não deverá
continuar, portanto, em palavras onde figurava por engano e ignorância:
ontem, ombro, úmero, úmido, umectar.
2 - O h nos vocábulos prefixais - Tambem
se conserva o h nos vocábulos compostos por prefixação,
quando o elemento a que se une o prefixo existe autônomo,
na língua: deshabita, deshonra, deshumano, rehaver.
COMENTÁRIO - Infere-se daí, que palavras como inibir,
inerente, assim se escrevem e não: inhibir, inherente.
3 - O h diacrítico - Continúa
o h, como si nal diacrítico, nas combinações
ch, Ih, nh : cha ve, malha, lenha.
COMENTÁRIO - Não sei por que proprie dade chama
o Formulário de diacrítico o h dos
grupos ch, lh, nh.
4 - O h interjecional
- Tambem persiste o h para as interjeições:
ah!, oh!.
B- Desaparecimento
1 - Não se escreverá
o h, no meio das pa lavras, salvos os casos acima: sair,
compreender, coórte, cair, exumar, anélo, etc.
2 - Nas fórmas pronominadas (pronome intercalado por tmése)
do futuro e do condicional, tambem não se usará
o h : ver-se-á, ter-se-ia.
3 - Não se empregará, tão pouco, no
fim das palavras: Jeová, rajá.
CONSOANTES
IV - CONSOANTES MUDAS
Nenhuma palavra se escreverá
empregando consoante que nela se não pronuncie: autor,
sinal, adesão, aluno, salmo, e não auctor,
signal, adhesão, etc.
É ocioso acrescentar que, pronunciada ou viva, a consoante
continuará no seu lugar: egiptólogo (cf.
Egito), abdicar, acne, caractéres (cf. caráter)
optar, expectativa, secção, pacto, etc.
V - GEMINAÇÕES OU LETRAS DOBRADAS
Não se duplicará nenhuma consoante. Escrever-se-á:
sábado, acusar, adido, efeito, sugerir, belo, chama,
pano, aparecer, etc.
Exceções
1 - Continuam, pela sua força especial, as geminações
rr e ss: carro (cf. cara) cassa (cf.
casa), etc.
2 - Continúa o grupo cc quando ambos se pronunciam: seccionar,
infeccionar. Cf. secção, infecção,
etc.
3 - Tambem se duplica o s ou o r, se a pronúncia
o exige, nas palavras de composição prefixal: prorrogar,
prerrogativa, pressentir, ressentir, ressoar, ressalva, etc.,
que antes se escreviam prerogativa, presentir, resoar, etc.
COMENTÁRIO- O FORMULÁRIO nada fala sôbre
os casos de composição vernácula, em que
os dois êmes se proférem: emmaçar,
emmadeirar, emmalhar. Mas como a regra geral é a de
não letras dobradas, parece querer o acôrdo que se
escreva: emaçar, emadeirar, etc. Assim, manda,
com efeito, o VOCABULÁRIO da Academia Brasileira.
VI - O GRUPO SC
Fica eliminado o s:
(a) do grupo inicial sc: ciência, cena, cetro,
etc.
(b) dos compostos de vocábulos com sc inicial:
conciêncía, preciência...
COMENTÁRIO - Mantém-se, porém, o s
no grupo médio: nascer, descer, descendente, adolescente,
etc.
VII - A LETRA G (palatal)
É conservado o g, inicial
ou médio, nos seus valores usuais: gente, imagem, eleger,
fugir, etc.
VIII - AS LETRAS K, W, Y
(Vide supra, divisão I, abecedário).
IX - Os GRUPOS GREGOS CH, PH, RH e TH
São proscritos os grupos
gregos ch (duro), ph, rh e th.
(1) O ch fica substituído:
(a) por qu, antes de e e i : traquéa, quiméra,
química;
(b) por c, nos outros casos: caldeu, cáos, cromo,
Cristo, técnica...
(2) Os diagramas ph, rh, th, simplificam-se em f,
r, t: filosofia, fósforo, retórica, reumatismo,
tesouro, atmosféra, aritmética, etc.
X - O M ANTES DE P
Continúa a escrever-se o
m antes de b e p.
Mas, nas palavras em que se não escrever mais o p
etimológico, o m cederá seu lutar ao n:
pronto, assunto, isento...
XI - A LETRA S
A - O S FINAL:
Escrever com s final
e não com z :
1 - Os pronomes nós e vós.
2 - A 2ª
pessôa do singular do futuro do indicativo: amarás,
ofenderás, irás, porás.
3 - A 2ª
pessôa do singular do presente do indicativo dos verbos
monossilábicos e seus compostos: dás, desdás,
vês, crês, revês, descrês, ris, sorris.
4 - O plural das palavras terminadas em vogal longa: pás,
cafés, frenesis, teirós, perus.
5 - Os adjetivos gentílicos e palavras outras, formadas
com o sufixo ês (latim ense): aragonês,
barcelonês, berlinês, borgonhês, francês,
holandês, inglês, burguês, camponês, montanhês-
etc.
6 - Os latinismos de uso comum, que ainda mantêm a fórma
originária - bis, jus, plus, virus, pus (subst.)
7 - As palavras seguintes: aliás, ananás, após,
arnês, arrás, arriós, ás, atrás,
através, calcês, camoês, catrapús, convés,
cós, cris, daruês, dês (desde), detrás,
enapupês, enxós, filhós, freguês, gilvás,
grós, linaloés, luis (moeda), macís,
mês, obús, pardês, paspalhós, pavês,
piós, princês, rês, rés, resvés,
tornês, trás, tris, viés, zás-trás,
etc.
B -O S MÉDIO:
Escrever com s médio
1 - As fórmas femininas (de substantivos) que tiverem a
desinência esa ou isa: baronesa, duquesa, princesa,
consulesa, prioresa, sacerdotisa, poetisa, diaconisa,
profetisa;
2 - Os adjetivos formados de substantivos com o prefixo abundancial
oso: animoso, doloroso, formoso, populoso, teimoso.
3 - Os diversos tempos dos verbos querer e pôr,
com seus compostos: (quis), quisera, quisermos ;
(pus), puseram, puserem, compusestes ...
4 - As palavras em eso ou esa, que, em
português, são primitivas, consoante suas correspon
dentes de origem (elas e suas derivadas ou compostas) - empresa,
despesa, defesa, mesa, surpresa, framboesa,
presa, devesa, represa, toesa, aceso, ileso, coeso, defeso, obeso,
teso, empresário, mesário ...
5 - Os verbos oriundos do latim, terminados em sar -
acusar (accusare), recusar (recusare).
6 -Os substantivos, adjetivos e particípios terminados
em aso, asa, iso, oso, osa, uso, usa - caso, aso, vaso, asa,
casa, brasa, viso, conciso, aviso, graniso, paraiso, siso, guiso,
liso, friso, narciso, brisa, frisa, camisa, divisa, espôso,
glosa, rosa, raposa, grosa, entrosa, tosa, prosa, uso, abuso,
luso, fuso, escuso, infuso, concluso, contuso, musa.
7 - O prefixo trans nesta como nas formas
tras e tres e, coerentemente, as suas derivadas
- transação, transigir, tresandar, transandino,
transição, trasante-ontem, traseiro, trasordinário...
8 - Os nomes em ase, ese, ise, ose - crase, frase, fase,
tese, diátese, diurése, génese, apófise,
diagnose...
9 - Os vocábulos compostos, derivados do grupo com
isos, chrysos, lysis, mesos, nesos, physis, ptosis, stasis,
thesis - isócolo, isódico, isodinâmico, crisóptero,
Crisóstomo, crisântemo, análise, mesarterite,
mesáulio, quersoneso, fisiologia, ptoseonomia, êxtase,
síntese.
10. os verbos em isar, cujo radical termina em s,
formados com o sufixo ar - avisar (avis ar), precisar
(precis ar) analisar (analis ar) irisar (iris
ar).
XII - O EMPREGO DO Z:
A - z FINAL:
Escrever com z final as palavras agudas em az, ez, iz, oz,
uz (excéto as já indicadas no s) -
assaz, xadrez, perdiz, veloz, arcabuz.
B - z MÉDIO
Escrever com z médio:
1. as palavras, derivadas do latim, em que o z provém
de c, ci, ti - azedo (aceto), fiuza (fi ducia),
juizo (judiciu), vizinho (vicinu), razão
(ratione), prazo (plácitu), prezar (pretiare),
mezinha (medicina);
2. os verbos em zer e zir - aprazer, dizer, jazer, cozer (ao
lume), conduzir, induzir, luzir, produzir e seus compostos;
NOTA - Escrever-se-á coser, com s, quando significar
ligar por meio de pontos, e do mesmo modo seus compostos
- descoser, recoser...
COMENTÁRIO - Cozer vem de cocére (por
cóquere), e coser, de consuére (por
consúere).
3. as flexões zinho e zito dos diminutivos - florzinha,
mãezinha, paizinho, avezita, pobrezito;
4. as palavras de origem arábica, oriental e italiana,
que entraram na língua - azáfama, azeite, azul,
azougue, azar, azeviche, bazar, ogeriza, gazúa, vizir,
bezante, bizantino, bizarro, gazeta e seus derivados;
5. os verbos em izar (lat. izare) - autorizar, batizar,
civilizar, colonizar;
6. os substantivos formados dos adjetivos com o sufixo
eza (lat. itia) - beleza, fereza, firmeza, madureza,
moleza, pobreza;
7. as palavras derivadas de outras que terminam em z - apaziguar,
avezar, cruzado, dezena, felizardo;
NOTA - Sôbre nomes próprios com z ver a divisão
XX.
COMENTÁRIO - A questão do s e do z
é a mais complicada da ortografia portuguesa.
Todas as regras acima podem firmar-se
num princípio geral:
(a) escrevem-se com s os vocábulos que, pela etimologia,
assim devem ser escritos;
(b) e escrevem-se com z, também, os que, pela etimologia,
assim devem ser escritos.
XIII - A LETRA X.
São mantidos os valores
prosódicos que, no português, tem o x :
s, z, cs, ss, ch: excelente, exato, fixo, próximo,
nexo, faxina.
COMENTÁRIO - Não confundir o justo valor de x
com falsos valores, que têm sido comuns na cacografia
que ainda nos assoberba: extranho, extrangeiro, exgotar, explendor,
expontaneo, palavras que devem ser escritas: estranho
(cf. esp. estraño, italiano strano, fr.
étrange); estrangeiro (que vem do francês
étranger; cf. esp. estranje ro, it. straniero);
esgotar (c. esp. agotar) ; esplendor (do
latim splendore); espontâneo (do la tim
spontaneu).
XIV. O PRONOME LO.
Manter-se-á a escrita lo,
la, los, las :
1. com o infinitivo dos verbos: amá-lo, ofendê-la,
possuí-los, repô-las;
2. com as fórmas verbais em s : âma-lo,
amâmo-lo; e com aquelas que acabam em z - di-lo,
fá-los;
3. com os pronomes nos, vos e a fôrma eis:
vo-lo, no-la, ei-los.
XV. GRAFIAS DUBITATIVAS:
Fixar a grafia, usualmente dubitativa,
dos seguintes vocábulos, seus derivados e afins:
1. Brasil e não Brazil;
2. idade, igreja, igual e não: edade, egreja,
egual;
3. sossegar, pêssego, dossel, jovem, almaço,
maciço, além de outras, e não socegar,
pecego, docel, joven, almasso, massiço;
4. ânsia, ascensão, cansar, farsa, pretensão
e não ancia, cançar, farça, pretenção...
COMENTÁRIO - As reproduções que por aí
andam, do FORMULÁRIO da Academia, consignam as palavras
alvíssaras e assucar, no item 3, das
"grafias dubitativas". (Ver, por exemplo,
o folheto A Nova Ortografia, muito divulgado em Belo-Horizonte).
Mas a edição do FORMULÁRIO, que precede o
VOCABULÁRIO oficial da Academia, não inclue mais,
as referidas palavras, bem como as diferenças crear
e criar e as palavras rossío e xeque.
O mesmo VOCABULÁRIO manda escrever alviçaras,
açúcar e só regista criar.
Como se vê, a Academia Brasileira reportou o seu conceito
sobre tais palavras. Parece, contu do, que não foi completamente
feliz. Se fez muito bem em corrigir: açúcar
(e não assucar), já não se compreende por
que manda escrever alvíçaras, quando a
etimologia
e as autoridades estão com a fórma alvíssaras.
Quanto à diferenciação crear e criar,
que é muito brasileira já, não sabemos
por que não continuou mantendo o VOCABULÁRIO oficial.
NOTA - Ver no capítulo JUSTIFICAÇAO o que se explica
a respeito de tais grafias.
XVI. APÓSTROFO.
O apóstrofo está
quasi de todo eliminado, na grafia simplificada. Sem apóstrofo
há de escrever-se: dele, daquele, daquilo, duma, daqui,
dentre, nele, essoutro, outróra...
COMENTÁRIO - Só se usará para o caso de elisão
(por sincope) - espérança; ou por sinaléfa,
com substantivos, como d'alma, d'Almeida; ou por
ectlipse - hom'essa...
XVII - HIFEN
Separar-se-ão com hífen
os vocábulos compostos, cujos elementos conservam sua independência
fonética: para-raios, guarda-pó, contra-almirante.
NOTA - Não raro o uso dispensa
o hífen e reúne os elementos - claraboia, parapeito,
malmequer, malferido.
COMENTÁRIO - Poderá acrescentar-se
que o VOCABULÁRIO oficial da Academia Brasileira manda
separar com hífen elementos de composição
prefixal que o uso juntava num só vocábulo, como,
por exemplo: sub-reptício (que se escrevia costumeiramente
subrepticio), bem-aventurado (que se es crevia bemaventurado);
e manda juntar, pelo hífen, elementos separados,
pelo uso, sem traço de ligação, como à-baixa,
a-caválo (expressões costumeiramente escritas,
à baixa, a caválo).
XVIII. ACENTUAÇÃO
GRÁFICA.
Ainda aqui, as reproduções
correntes do FORMULÁRIO não acordam com a que precede
o VOCABULÁRIO oficial. A Academia alterou seus preceitos,
para simplesmente adotar, na integra, a preceituação
portuguesa.
Diz o FORMULÁRIO oficial:
A rigorosa acentuação
gráfica das palavras portuguesas deve satisfazer as condições
se guintes:
1. Indicar, com a maior segurança para quem lê, quais
são os vocábulos átonos e quais
os tônicos, e nestes qual seja a sílaba
predominante, quando tenham mais de uma;
2. diferençar entre si vocábulos que se escrevem
com as mesmas letras, mas divergem na pronúncia e na
significação, ou função gramatical.
Os vocábulos portugueses
são: de uma sílaba, monossílabos; de
duas, dissílabos; de mais de duas, polissílabos;
ex.: pá, pára, parada.
Há nos monossílabos
e dissílabos vocábulos tônicos, dá,
pára, e vocábulos átonos, da, para.
Os dissílabos tônicos
podem ter como sílaba predominante a primeira, mares,
ou a segunda. marés. Os polissílabos
podem ter como predominante a última, falará,
a penúltima, falára, ou a antepenúltima,
faláramos. Os vocábulos cuja última
silaba é a predominante denominam-se agudos ou oxítonos;
se a sílaba predominante é a penúltima,
dizem-se graves, inteiros, ou paroxítonos; se
a predominante é a antepenúltima, recebem o nome
de esdrúxulos ou proparoxítonos.
Nenhum vocábulo português,
de per si, pode ter como sílaba predominante qualquer outra
antes da antepenúltima, conquanto haja dicções
formadas por linguagens verbais, acompanhadas de pronomes, a elas
unidos por hífen (-), em que a sílaba predominante,
que é a da fórma verbal fica sendo a quarta ou a
quinta a contar do fim; ex.: dávamos-to, dávamo-vo-lo.
Tais dicções em nada modificam na escrita,
a acentuação gráfica da fórma verbal,
a qual permanece.
A sílaba tónica,
quando se torna necessário indicá-la na escrita,
assinala-se com o acento agudo (') sobre a vogal dominante dela,
se esta é a, e, o, abertos, i ou u
; com o acento circunflexo (^), se é a, e, o,
fechados. O til (~) vale por acento tônico, si outro
não está marcado no vocábulo; ex.: fará,
maré, portaló, difícil, útil; câmara,
mercê, avô, ânsia, indulgência, brônzeo,
fímbria, núncio; varão, maçã,
capitães; órgão, órfã; munícipe.
O acento grave (`) serve para designar,
quando seja necessário ou conveniente à pronunciação
de um vocábulo ou forma verbal, o valor alfabético
de qualquer das vogais a, e, o, indepen dentemente de
serem tônicas, e principalmente quando o não são,
ex.: à, pègada mòlhada, sòzi nho,
fàcilmente, etc.
O trema (¨), sobreposto no
i ou u átonos, serve para indicar que
êstes fonemas não formam ditongo com a vogal que
os precede : saïmento, saüdar. Se são
tônicos, sobrepõe-se-lhes o acento agudo: saída,
saúde. Sobrepõe-se igualmente o trema ao u
(se seguido de e ou i) dos grupos gu e
qu, quando o u se pronúncia: freqüencia,
argüir.
Estabelecidas estas premissas,
pode preceituar-se uma rigorosa acentuação gráfica,
inteiramente sistemática, a qual, sem ser
profusa ou ociosa, deixe bem patentes os fátos apontados,
quer seja expressa, quer omissa a sua notação.
(Segue-se, no Formulário, uma longa especificação
dos vocábulos que se devem e dos vocábulos que se
não devem acentuar, graficamente).
XIX - DIVISÃO SILÁBICA
A divisão de um vocábulo
em sílabas far-se-á fonèticamente, pela soletração,
e não pela separação dos seus elementos de
derivação, composição ou formação
- subs-crever, sec-ção de-sarmar, inha-bil,
bi-savô, e-xército, ex-ceder.
Para mais fácil aplicação
desta regra, observem-se os preceitos seguintes:
1. Separar pelas duas sílabas sucessivas as letras que
se duplicam : ar-rastar, pas-sagem, suc-ção;
2. O s dos prefixos des, dis, separa-se
da con soante que se lhe segue - des-dizer, dis-continuar;
mas si se lhe segue vogal, desta se não separa e com
ela forma sílaba de-senganar, de-senvolver, de-silusão;
3. Conservar na sílaba que a precede, a consoante
que se lhe segue - des-dizer, dis-continuar;
4. Não separar ditongos - neu-tro, nai-pe, rei-nado,
i-gual (i-guais).
5. Separar vogais iguais - co-orte, co-ordenada, e
vogais consecutivas que não formem ditongo - vo-ar,
po-eira, pro-émio, me-údo, ci-úme.
XX - NOMES PRÓPRIOS
1. Os nomes próprios, portugueses
ou aportuguesados, quer pessoais, quer locativos, serão
escritos com z final, quando terminados em sílaba
tônica - Garcez, Queiroz, Luiz, Tomaz, Andaluz, Queluz;
e com s final quando terminados em sílaba
átona - Álvares, Dias, Fernandes, Nunes, Peres,
Pires.
2. Conservar. em nomes proprios estrangeiros, as fórmas
correspondentes vernáculas já vul garizadas: Antuérpia,
Berna, Bordéus, Cherburgo, Colônia, Escandinávia,
Escalda, Florença, Londres, Marselha, Viena, Algeria.
[NOTA - Por que não Argélia, que é
o legítimo português?]
NOTA - Sempre que existirem formas
vernáculas para nomes de outras línguas, devem elas
ser preferidas. Conservarão, portanto, a sua grafia original
os que se não prestem à adaptação
portuguesa: - Anatole France, Byron, Conte Rosso, Carlyle,
Carducci, Musset, Shakespeare, Southampton.
COMENTÁRIO - Reproduzi,
em outra parte, a mui justa crítica levantada contra o
z final ab soluto. Será preciso escrever - Mercez,
Assiz, Moizez, etc., pelo mandamento acima. Bem me lhor andára
a Academia Brasileira, respeitando o uso e a etimologia, - si
escrevesse Assis, Luís, Tomás, etc.
JUSTIFICAÇÃO
GLOTOLOGICA DA GRAFIA SIMPLIFICADA
"Todos os estudos modernos
de lingüística positiva e científica destruíram
para sempre as explicações fundadas na lógica.
A língua é um fato social: como todos os fatos sociais,
é o produto do passado... Quem quiser saber porque é
que ela é o que é, ao passado é que tem de
pedir a explicação.A língua não é
uma criação propositada e refletida; a
gramática não é uma forma de lógica,
é uma ciência de observação,
que deve ser construída por indução,
nunca por dedução."
(Alberto Dauzat - Ap. Mota Assunção, Origem
e ortografia da língua brasileira).
E este conceito de Dauzat é
completado por estoutro de Meillet, sobre a ciência gramatical
à velha moda:
"A velha gramática
geral caiu em justo descrédito porque não era mais
que uma aplicação desastrada da lógica formal
à lingüítica, na qual as categorias lógicas
não têm aplicação. A nova lingüística
geral, fundada sôbre o estudo preciso e minucioso de todas
as línguas, em todas as fases do seu desenvolvimento, enriquecida
por observações pacientes e por medidas precisas
da anatomia e da fisiologia, esclarecida pelas teorias objetivas
da psicologia moderna, trouxe completo renovamento aos fatos e
às idéias; aos fatos particulares ela sobrepõe
uma doutrina de conjunto, um sistema."
(Ap. Mota Assunção - Ib.).
E Gonçalves Viana, encaminhando
para a questão ortográfica:
"As antigas hipóteses
dos humanistas sobre a formação das línguas,
engenhosas hipóteses em que imperava o raciocínio
e minguava a observação, e que entre nós
ainda desfrutam de certo crédito, caíram já
perante o exame conciencioso, paciente e refletido dos fatos e
a reformação dos métodos. O público
não pode perder o tempo em investigar para cada vocábulo
as origens remotas, que hajam de obrigá-lo a empregar letras
inúteis em português, ou outro qualquer idioma, ou
em fazer que dependa de tal investigação a escrita
da palavra mais trivial..."
(Ortografia nacional).
É nesta lingüística
moderna e positiva que está a justificação
completa e irrefutável, da simplicidade ortográfica.
Vimos como a boa tendência da escritura foi sempre para
tal simplicidade. E vimos como a ignorância, e um engano
presunçoso de erudição, eivou a ortografia
dos desconchavos que a anarquizam.
O bom senso de um conhecedor da
língua, como foi Morais, nos começos do século
passado, levava-o àquela profissão de grafia "filosófica",
atrás mostrada.
E é muito para se notar
o fato de a simplificação ortográfica, nos
bons termos em que deve tomar-se, ter nascido justamente com o
desenvolvimento filológico, nos estudos da língua
portuguesa, feitos por aquele notável e insuperado grupo
de 1911, já anteriormente apontado.
É que os filólogos
encontraram, na verificação judiciosa dos fatos,
um motivo invencível e histórico, para a simplificação
que todos eles têm aconselhado, em Portugal e no Brasil.
Quem ler o trabalho de Gonçalves
Viana - a Ortografia Nacional - sentirá como lhe
cairão dos olhos as escamas, feito a S. Pauto aconteceu,
e acabará convencido reformista. Verá como as formas
da língua evolveram; como é superficial e forçada,
contrária às leis da linguagem, a aproximação
que os latinizadores afrancesados tentaram, entre as palavras
da língua e as originárias latinas, eriçando-as
de durezas e complicações jamais ouvidas, porque
a realidade fonética
já mais não as conhecia ou jàmais conhecera.
Vamos tentar aqui uma explicação
justificativa da simplicidade ortográfica. Seguiremos,
principalmente, o tempo todo, a Gonçalves Viana. Discutiremos,
em favor, as principais divisões do Formulário,
na ordem da sistematização que atrás
deixamos.
I. - K, W, Y
K - O k entrou em desuso
no próprio latim e foi sempre mal visto em todas as línguas
românicas. Até o século 18, foi muito parcamente
empregado, em concurrência com o c e o qu.
Nunca foi letra portuguesa. Usou-se
para nomes aportuguesados. Ficou mais em moda com o sistema métrico-decimal,
importado da França com sua nomenclatura etimológicamente
defeituosa.
A cortesia e prática internacional
levou os reformistas a o conservarem para símbolo, no referido
sistema métrico. Mas, justamente em toda a família
de quilo, o k entrou por um descuido e erro, hoje insanável,
de derivação. Em vez de kilo, devia escrever-se
chilo, do grego chilioi (mil), com chi
(pronuncie-se ki) e não kapa.
A influência inglesa e alemã
nos trouxe o coke, o nickel, o stock, e inúmeras
outras palavras, que em português se haviam e se hão
de grafar: coque, níquel, estoque, etc.
Tambem nos bons tempos, diz Gonçalves
Viana, sempre se escreveu cágado, quisto, caleidoscópio,
grafias em que o k usurpou, modernamente, o lugar que lhe
ofereceram os amigos.
W - É símbolo alemão
e inglês. Entrou mal, mal escrito e mal pronunciado, em
mais de uma palavra aportuguesada. Do inglês waggon,
por exemplo, fizemos a palavra que a velha grafia pintava
e pronunciava: wagon,(vagôn), que nos veio pelo
francês.
A palavra Venceslau é talvez polaca. Os boêmios
a escrevem com V. Entretanto, fazíamos - e farão
muitos ainda - tanta questão de a escrever com W.
Fez bem a simplificação em conceder ao w,
no alfabeto da língua, a aposentadoria que merece, com
o único posto diplomático de símbolo internacional
de oéste: W (da palavra inglesa West).
Y - O ípsilon ou úpsilon
ou i grego foi sem pre um disturbador da boa grafia.
Tem um uso largamente histórico, na língua. Mas
quase todo incongruente. Os antigos abusaram dele, na incerta
grafia de que se serviram. A confusão entre i
e j levava-os a lançar mão do ípsilon,
para diferenças. Atribuiram-lhe um valor de i
consoante, numa posição intervocálica
em que o Morais, no DICIONÁRIO, ainda o exige ideya,
feyo, praga...Em Fernão Mendes Pinto se encontra (ap.
Gonç. Viana) Metropoly, concluyo, sayda, yr, tra seyra,
fiquey, foy, etc., etc.
Dos incômodos ortográficos, trazidos pelo ipsilon,
à boa escrita, no sistema usual ou disparatado, são
exemplos a vulgarice de grafias como phylosophia, lythographia,
lyrio, Sylvestre, Sylvio, ou até typoia e jurysprudencia,
forma pintada por um sujeito que a supunha veniente de jury.
Foi o amor intempestivo do y que alastrou, com ele,
toda a nossa terminologia bugre. O simbolo helênico invadiu
a selva brasileira. E com tanta fôrça que José
Veríssimo, em 1907, assinando a reforma da Academia, suplicava
uma exceção para o ípsilon das palavras
indígenas.
Os italianos escrevem admiravelmente
bem sem h, nem k, nem x e nem y tampouco.
Passaremos, nós outros, muito bem sem ele. E o ESTADO DE
MINAS, do dia em que adotar ou readotar a nova grafia, poderá
anunciar a Policlínica dos Diários Associados,
com um bom i em policlínica, sem
briga de sistema e censura de ninguém.
II. - DITONGOS
Os inimigos da simplificação,
em geral, são tolerantes para com ela, no que se refere
à escrita dos ditongos. Efetivamente, é muito mais
simples e lógica a sistematização proposta
pela reforma do que a vacilação e desacordo da velha
grafia. Pronuncio-me em favor da grafia i e u,
para as subjuntivas de todos os ditongos orais decrescentes, seguindo
nisto a escrita antiga predominante, diz Gonçalves Viana.
O acento faz a diferença
entre céu e seu, réis e reis,
herói e boi, combóio e joio.
Escrever pães, mães,
ao lado de pais, mais, é coisa muito simples,
muito clara, que oferece facilidade e não repugna a ninguém.
O FORMULÁRIO mantém
o ditongo ue, mandando escrever possue, azues, etc.
Não sei para que assim fez. Enfim, não é
violenta a imposição e servirá de ensejar
oportunidades para alguns erros. (Os professores, nos ditados,
terão por onde pegar os alunos).
O grupo am, do fim dos
verbos: amam, amaram (com som ditongal ãu)
foi condenado por romanistas como Epifânio Dias, Leite de
Vasconcelos e Júlio Moreira. De fato, é uma representação
imprópria. Não se pode mais corrigir, como também
se não corrigirá a representação em
(ditongo ei - e-til-i) de palavras como bem,
ninguem, etc.
III. - H
O agá não
tem valor próprio nem em italiano, nem em português,
e nem o tinha no latim vulgar.
Foi utilizado de três modos:
1 - à provençal, para representar sons
palatais : lh, nh, ch.
2 - Para desunir vogais, como em sahir.
3 - Como inicial, para dar mais corpo a monossílabos,
como ho (o) e hum (um) ou diferençar
de outros, como he (é), ao lado de e.
O emprego do h para desunir - possuhia,
dohia (dos antigos), sahir, cahir, bahú,
atahude, ahi - seria sensato, mas então houvera
de ser adotado de maneira sistemática, escrevendo-se, por
exemplo, sahude, etc., diz Gonçalves Viana. Mas
o acento, perfeitamente o substitue.
Nas palavras ombro, ontem, úmido, umectar, úmero,
o h entrou por abuso e constituía etimologicamente
uma errônea.
A palavra Espanha, sem h a escrevem os espanhóis,
italianos, franceses e ingleses.
O h médio foi incondicionalmente abolido pela
reforma portuguesa de 1911. O acôrdo de 1931 tolera-o em
palavras compostas de outras em que ele exista, inicial: inhumano,
deshonra, etc.
Em palavras como filarmônica, desarmonia, diz Gonçalves
Viana que é barbaria intrometer o h - filharmônica,
desharmonia - porque, no grego. o espirito forte (que o h
muito inutilmente representa) desaparece do meio dos vocábulos
compostos. Filarmônica, desarmonia, filelenos, é
que se há de escrever.
O VOCABULÁRIO oficial da Academia Brasileira manda escrever
desharmonia, mas, por outro lado, filarmônica
e fileleno.
Além do h inicial, mantido, quando de bom
uso, a simplificação conservou tambem o h
final e enfático, das interjeições: ah!
oh!.
IV. - CONSOANTES MUDAS
Os únicos grupos de consoantes,
iniciais de sílaba, realmente portugueses, são:
br, cr, dr, fr, gr, tr. Posteriormente, por influência
erudita, se introduziram bl, cl, gl, p1, tl.
Os demais são usados em vocábulos de origem
artificial, que ainda se não acomodaram à fonologia
portuguesa, apesar de alguns se terem tornado populares.
Neles, o grupo (1) ora se pronuncia: percepção,
secção (que outros dizem seção),
preceptor, (2) ora se não pronuncia: a(c)ção,
dire(c)tor, fa(c)to, Egi(p)to... Na mesma família,
o grupo vale integralmente numas palavras e não vale noutras:
Egi(p)to, egipcio; ado(p)tar, ado(p)ção, optar,
opção; es pe(c)táculo, expectador, expectativa...
A simplificação portuguesa
de 1911 mandou conservar a consoante de tais grupos, mesmo não
pronunciada, porque (para os lusitanos) ela influi na vogal anterior.
Assim, eles escrevem - facto, espectáculo, carácter,
etc. Sômente o i e o u se não
alteram, de sorte que a consoante, não influindo sôbre
eles, também se não escreve em palavras como - escrito,
produto, instrução. É sabido, porém,
para os brasileiros, não existe essa influência retroativa,
da consoante, sôbre a vogal. De sorte que escrevemos muito
bem - ato, fato, espetáculo, carater. Podia o
FORMULÁRIO, como fez, mandar cortar toda consoante inútil,
escrevendo nós ato e escrevendo os lusitanos acto,
pois que o c não é inútil para eles.
No grupo subseqüente a vogal
nasal, processou-se a mesma redução evolutiva. De
sanctu, promptu, unctu, defunctu, exemptu, etc.
(e a simplificação iniciou no próprio latim
vulgar) forma ram-se no português as palavras santo,
pronto, unto, defunto, isento. De damnu, solemne, mulcta,
auctor, Magdalena, Ignacio, Ignes (Agnes), assignar,
tivemos - dano, solene, multa, autor, Madalena, Inácio,
assinar. De fructu, exsuctu, tivemos - fruito,
enxuito e, depois, fruto. enxuto... tudo pela tendência
ao abrandamento, pela lei do enfraquecimento sucessivo, de
que logo adiante se falará.
V. - GEMINAÇÕES
As únicas consoantes que
têm razão de dobrar-se, em português, são
o érre e o ésse; carro, cassa. Todas
as mais se devem reduzir a singelas, porque, escrita uma ou escritas
duas, a pronúncia é a mesmíssima.
Nenhuma razão de ser têm
as geminações e complicações consonantais,
na língua portuguesa. E o motivo glotológico de
tal simplicidade está na LEI DO ENFRAQUECIMENTO SUCESSIVO
ou lei do abrandamento progressivo, de que falam Gonçalves
Viana e Leite de Vasconcelos.
Veja-se este trecho, tomado ao
dr. Sílvio de Almeida (ap. F. T. D., Gr. hist.)
"A relação que
vai de acutum para agudo é a mesma de
accusare para acusar. Também a razão
que leva a anular-se um l intervocálico - malum
> mau - faz que se reduzam dois a um - collum >
colo. Esta LEI DO ENFRAQUECIMENTO SUCESSIVO tanto se verifica
ao passar-se de cc para c, como de c
para g; ou de ll para 1, como de 1
para zero. Assim não se justificam os que
escrevem lettra com dois tt, sob o pretexto
de que em latim era littera; porque. segundo acabamos
de notar, dois tt dão um só, do mesmo modo
que um só dá d: vita > vida; e se em
latim fosse litera, como pondera LEITE DE VASCONCELOS,
o português seria ledra, em vez de letra; e
a prova está em Pedro < Petru."
Diz Gonçalves Viana. no
Ortografia nacional:
"Aprende-se que nos vocábulos
de origem evolutiva, popular. herdados, o t e os tt latinos
permaneceram em italiano, como em latto, latim, Latus;
gotta, latim, gutta; ao passo que, em castelhano.
êsse t se abrandou em d, lado, e dos tt
resultou um único t, gota. É fácil
reconhecer que nessa transformação. evolução
ou o que quiserem, o português é ao castelhano absolutamente
comparável,lado, gota, desviando-se do italiano,
que, mais de perto, acompanha o latim."
No tratamento dos vocábulos
de origem artificial ou erudita, o espanhol seguiu o mesmo critério
simplificador: deu ao t e aos tt latinos idêntico
valor. Assim ignotus e attribuere dão ignoto
e atribuir. O tratamento português é o mesmo.
"pois não existem, nem existiram jamais, na nossa
língua,no inferior da palavra, consoantes duplas, geminadas,
na pronúncia, como se observam em toscano, e existiam no
latim." (Gonçalves Viana) .
Darei alguns exemplos de enfraquecimento
sucessivo, pelos quais se verificará a clareza da referida
lei fonética. Temos, do latim para o português: plattu
> prato e pratu > prado; vitta > fita e
vita > vida : bucca > boca e baca
> baga ; vacca > vaca e vacat > vaga; sicca
> sêco e coecu > cego.
Diante do enfraquecimento sucessivo,
cuja atuação tanto ressalta do confronto acima,
per guntaremos se, glotologicamente, pode ser defendida a permanência
das geminações na grafia da língua?
VI. - SC
Já Gonçalves Viana
aconselhava o corte do s, no grupo inicial sc,
imitando-se a grafia espanhola: ciência, certo, cintilar.
A reforma portuguesa de 1911 manteve o s. O acôrdo
de 1931 preferiu ficar do lado de Gonçalves Viana.
Mantém-se, entretanto, o
sc no corpo das pa lavras que não sejam compostas
de alguma das que começam por sc ; ex.: abscesso,
abscissa, adolescente, apascentar, ascender, ascese, asceta, cognoscível,
descendência, discente, disciplina, fascinar, fluoresceína,
irascível, isósceles. lactescente, etc., etc.
Não se quis anular, de todo,
uma tradição.
VII. - G
Gonçalves Viana aconselhava
a substituição dos valores ge, gi, no corpo
das palavras. por je, ji: orijem, viajem, etimolojica, imajinar.
Também assim queria a reforma brasileira de 1907.
Mas o acordo preferiu não tocar no g, conservando-lhe
os valores, dentro do bom uso e da boa origem: gente, ginásio,
vertigem, origem, etc. Não se escreverá, entretanto,
geito, magestade, abusos que se corrigirão para
jeito, majestade: do latim jactu, majestate.
VIII. - K W Y
(V. supra, divisão I)
IX. CH PH RH TH
A conservação dos
grupos gregos ch, ph, rh, th, era um francesismo anacrônico,
já abandanado em Espanha e nas nações escandinavas,
e nunca seguido na Itália, diz Gonçalves Viana.
Era uma herança incômoda do pedantismo séculos
XVI e XVII. Nenhum valor jamais tiveram esses grupos, na língua,
a não ser o de fonte confusa para cacografias: systhema,
cathegoria, author, Athayde...
Jamais influiu o h, para
a transformação das palavras em que entra; assim:
cathédra > cadeira; apothéca > bodéga;
chirurgione > cirurgião; phantasma > avantesma; Stephanu
> Estêvão; scariphare > escarvar.
A boa tendência da língua
sempre foi simplificá-los. Para comprovação,
bastará um exame da escrita de palavras vernáculas
em que, pela mais legítima grafia, eles não existiam,
nem mesmo antes da reforma: carta, escola, tio, cântaro,
talo, carácter, época, cólera, catecismo,
cirurgião, fantasma, fantasia, faisão, frenesi,
fleugma, freima, frase, órfão, farol, fanal, frêmito,
filtro, Delfim, Eufrásio, Felipe...
X. - M ANTES DE P
Nas palavras em que se não
escreve mais o p etimológico, o m cederá
logar ao n: pronto, assunto, isento. Muito lógico.
É uma questão simples de fonologia. A labial m
não se harmoniza com alguma dental ou gutural, mas
sim com outra labial. Se o latim proferia promptus, a
representação escrita da nasal estava bem feita
pelo m (labial) junto da labial p. Se nós, no
entanto, passámos a falar pronto, o p era inútil;
a prolação
nasal pron junta-se com a dental to: e só
o n pode bem servir, antes desta.
XI e XII. - S FINAL E
S MÉDIO; Z FINAL E Z MÉDIO
O acordo havia de simplesmente
rezar o seguinte: "O emprego do s e do z, finais ou médios,
pela etimologia
se regerá, e pela boa formulação das palavras".
A legislação do FORMULÁRIO, a respeito
do s e do z, dispensa qualquer justificação,
porque é cuidadosamente etimológica.
XIII. - X (xis)
Gonçalves Viana queria que
o x fosse reduzido ao único valor que tem, na
palavra xarque. Mas a reforma preferiu não tocar
nele, conservando-lhe os vários sons usuais.
XIV - O PRONOME LO
Têm pretendido alguns gramáticos
que nas combinações amá-lo, amâmo-lo,
houve uma paragramatise ou substituição
eufônica de uma letra por outra; amar - o, amamos -
o teriam dado amál-o, amâmol-o, com
substituição, pelo 1, do r e do
s. Outros, como Otoniel Mota, pretendem ter havido assimilação;
e buscam prova na forma, graficamente indisciplinada - amallo,
dos antigos.
Gonçalves Viana, com sua
autoridade incontrastável, mostra que não houve
paragramatise nem assimilação.Há de escrever-se
amá-lo, amamo-lo, etc., com base na história
da língua. Em amá-lo, amamo-lo, di-lo, houve
simplesmente uma queda do r, do s e do z,
diante do lo.
Isso de escrever amal-o, dil-o,
amâmol-o, foi inovação fantasiosa de
após 1850, por uns gramáticos "que estudaram
a língua, não pelos seus monumentos escritos ou
pela fala viva do povo, mas por filosofias abstrusas e sínteses
arquitetadas no ar, ou armadas na sua imaginação"
XV - GRAFIAS DUBITATIVAS
BRASIL - Não vou renovar
aqui a discussão a respeito da grafia de Brasil. A
melhor opinião manda escrever com s. E é
bem que, ao menos sobre o nome de nossa terra, nos fixemos de
uma vez. Não vou dizer que já chega o ter sido descoberta
por acaso, porque Cortesão e os portu gueses todos se zangariam
comigo e demonstrariam, historicamente, que Cabral muito bem sabia
para onde viravam os narizes. Houve intenção definida,
houve intento claro, embora secreto. Não escrevamos, pois,
ao acaso, um nome que tanto precisa ficar definido diante da civilização.
IDADE, IGREJA, IGUAL - Ficou discutida,
em outra parte, a evolução destas palavras.
AÇÚCAR - Felizmente,
o VOCABULÁRIO reconsiderou o que parece ter, primeiro,
constado do FORMULÁRIO, a respeito de açúcar,
quando mandou grafar assúcar. Açúcar
(com ç cedilha ou ç plicado,
ç com cercilho ou cifra), manda escrever
Gonçalves Viana, manda Cândido de Figueiredo, manda
Antenor Nascentes e manda toda boa autoridade. Em espanhol é
azúcar e em italiano zucchero. Em francês
é que é sucre. Veio-nos do sânscrito,
a palavra, diz Gonçalves Viana, através do árabe
assukar. Sôbre como os dois ésses árabes
deram em português ç e em espanhól
z, pode ver-se a explicação do mestre, em sua Ortografia
Nacional, pags. 111 e seguintes.
ALVIÇARAS - Alvíssaras
mandou escrever o FORMULÁRIO, ao que parece, na sua
primeira divulgação. Mas alviçaras
traz o VOCABULÁRIO oficial da Academia Brasileira. Não
compreendo a corrigenda, pois alvíssaras manda
escrever Gonçalves Viana, alvíssaras traz
e explica Antenor Nascentes, alvíssaras muito
se escreveu pelos antigos, segundo o afirma o primeiro destes
autores e segundo o regista também o Morais, que consagra
alvíçaras e alvíssaras.
Devia, pois, o VOCABULÁRIO optar pelas alvíssaras
com dois ésses, porquanto, a crer nos mestres é
a forma acorde com a etimilogia do árabe albishara.
À nossa Academia, não lhe dou as alvíssaras,
pela mudança. E nem lhe dou as prolfaças.
SOSSEGAR - Do latim sessicare.
PÊSSEGO - Do latim pérsicu,
com assimilação do r pelo s.
DOSSEL - Do latim dorsale ou
dorsellu, com assimilação do r pelo
s.
ROSSIO e ROCIO - Também
a palavra rossio, que ainda corre nas divulgações
do FORMULÁRIO, foi eliminada do FORMULÁRIO oficial.
E com razão, porque, si há rossio e rocio,
como se fixar a escrita por um só?
ROSSIO é o terreiro, o lugar
espaçoso, o logradouro público, diz Cândido
de Figueiredo. Antigamente se falava ressio, o que faz
supor que venha de ressa - calor do sol, diz Antenor
Nascentes, citando Cândido de Figueiredo.
ROCIO, que muito errôneamente
se costuma pronunciar rócio, é o orvalho,
e nasce do latim roscivu.
ALMAÇO - De a-lo-maço,
alusão ao modo de fabricar o papel, diz C. de F.
MACIÇO - De origem discutida.
Em espanhol é macizo. Pelo espanhol se pode moldar
a grafia portuguesa.
ÂNSIA - Do latim ânxia.
Cf. esp. e it. ânsia
CANSAR - Do latim quassare.
DANSAR - Não sei porque
preferiu o VOCABULÁRIO a forma dansar,se a etimologia
da palavra não é líquida, e se o espanhol
e o italiano escrevem danzar e danzare. Possivelmente,
para agradar, alguma vez tambem, aos franceses ... Chega de espanhol,
arre!
(NOTA - Littré teria provado que deve
escrever-se com ésse e não com cê,
a palavra dansar...}.
XEQUE e CHEQUE - São palavras
diversas, na escrita, na origem e no sentido.
O FORMULÁRIO oficial não
inclue mais xeque, entre as palavras de grafia dubitativa.
Xeque é (1) lance, no jogo do xadrez, e vem do
persa, ou (2) é governador, para os árabes, e deles
vem a palavra.
Cheque vem do inglês check e é
ordem de pa gamento (1), ou (2), em Antenor Nascentes, é
o natural da Checo-Eslováquia.
Anda-nos o inglês tão avassalador, hoje em dia, que
a palavra xeque, no sentido de governador, está
quase desconhecida, porque o que voga é o sheik dos
romances traduzidos e dos letreiros de cinema.
CREAR e CRIAR - Parece-me que o
FORMULÁRIO e o VOCABULÁRIO não estiveram
brasileiros, registando unicamente a forma criar e desconsagrando
(isto, atrás, já ficou dito), a tão brasileira
diferença entre crear (fazer alguma cousa) e
criar (nutrir).
Estas e outras palavras tinham
grafias dubitativas, diz o FORMULÁRIO, e o acordo
indicou a maneira escrita em que se devem fixar. Não acho
que fora melhor chamá-las de grafias duvidosas, como
pareceu a um comentador do FORMULÁRIO. Entre assucar
e açúcar, almasso e almaço, pêssego
e pêcego, etc., uma grafia será certa e
outra errada, mas nenhuma duvidosa. Duvidoso
ficava ou podia ficar o indivíduo, diante das duas
formas. .. dubitativas, para ele.
XVIII. - ACENTUAÇÃO
GRÁFICA
A acentuação gráfica
foi sistematizada pela reforma portuguesa de 1911, em regras que
adotou o acordo de 1931.
O excesso de sinais diacríticos irritará, um pouco,
no começo. Principalmente a quem escreva à máquina,
suposição muito natural hoje, por quanto a máquina
de escrever se vulgarizou e se vulgariza, mesmo fora dos escritórios.
Minha Rémington, por exemplo, não possui o trema
ou diérese (cimalhas ou ápices, como o denomina
Gonçalves Viana). De sorte que, se tenho de reproduzir
a palavra lingüística ou conseqüência,
cada vez, sou obrigado ao retrocesso e à utilização
das aspas, que fazem o papel dele. Não é prático,
bem se vê. Entretanto, copie uma página de francês,
ou muitas páginas de francês, quem for inimigo da
acentuação gráfica sistematizada... e ficará
curado.
SINAIS ORTOGRÁFICOS
Acento agudo
|
á
|
é
|
ó
|
í
|
ú
|
Acento circunflexo
|
â |
ê |
ô |
|
|
Til |
ã
|
|
õ
|
|
|
Acento grave
|
à
|
è
|
ò
|
ì
|
ù
|
Trema |
|
|
|
ï |
ü |
O ACENTO AGUDO marca a vogal tônica
e aberta: álgido, maré, tópico,
saída, saúde.
O ACENTO CIRCUNFLEXO marca a vogal
tônica e fechada: flâmula, mercê, endôsso.
O TIL marca vogal ou ditongo nasais,
tônicos ou não: coração, órfão,
maçã, ímã.
O AGENTO GRAVE marca vogal aberta,
não tônica: àquele, pègada, prègar,
mòlhada.
O TREMA separa o i ou o u, não
tônicos, em grupos vocálicos: saüdar,
tranqüilo.
O acento agudo, o
acento circunflexo e o til são mais importantes
e mais freqüentes. Marcam, em geral, sílaba tônica
e caem, principalmente, sobre o a, o o
e o e.
O acento grave e o trema
distribuem, entre si, a tarefa de marcar vogais de síladas
não tônicas: à, é, ô, abertos,
o acento grave; ï, ü, o trema.
NOTA - O acento circunflexo
marca sílaba não tônica, fechada: cortêsmente,
secamente...
O ACENTO GRAVE denota
(1) crase, atual e perceptível,
na pronúncia, como em à, àquele, àparte;
(2) crase, remota e apagada, como
em mèzinha, bèsteiro, còrar,
crèdor;
(3) vogal átona que, originariamente,
era tônica e aberta; mòlhada, pègada (de
pé), sòmente (de só), màzinha
(de má), ràpidamente (de rápido),
benèficamente (de benéfico) ...
O TREMA indica:
(1) hiato, em grupos vocálicos,
de sílaba não tônica : saïmento,
païsagem, saüdar (cf. saúde, país)
;
(2) a prolação
do u, seguido de e ou i, nos grupos
gu e qu : agüentar, argüir, tranqüilo, con
seqüência (cf. apazigúe, etc.)
.
VOCÁBULOS NÃO
ACENTUADOS GRAFICAMENTE
(Regras tiradas do FORMULÁRIO, mas com outra sistematização).
1. MONOSSILABOS
Não se acentuam graficamente:
(a) monossílabos átonos : o, a, me,
te, se, nos, vos, de, em, com, por, sem, sob, mas, que, etc.
(b) os monossílabos tônicos que não
termi nem em a(s), e(s), o(s) : bem, tens, cem, vi, vis, crus,
lã, som, mão, mau, seu, reis, boi, dor, mar...
EXCEÇÕES - Acentuam-se
os monossílabos em a(s), e(s), o(s) : pá, pé,
pó...
Acentuam-se tambem os monossílabos ditongais em éis,
éu, ói (abertos) : réis, réu,
rói...
2. DISSILABOS
Não se acentuam gràficamente
(a) os dissílabos ÁTONOS: para, porque,
pelo...
(b) dissílabos OXÍTONOS que terminem:
(1) por vogal nasal: maçã, atum;
(2) por ditongo: sarau, varão, correis ...
(3) por qualquer consoante, exceto s: canal, painel,
Artur, capaz...
3. POLISSÍLABOS
Não se acentuam graficamente
polissílabos OXÍTONOS que terminem:
(1) por vogal nasal: bergantim, catalã;
(2) por ditongo: Galileu, constituição;
(3) por qualquer consoante, exceto s : pa nta nal,
coronel, arcabuz, Gibraltar...
4. PAROXITONOS
Não se acentuam graficamente
os paroxítonos em a, e, o, u, i, - venha, ou
não, seguida de s a vogal: camada, paredes,
devoto, louvo, louvaria, juri, quasi, tribu, Venus, onus.
VOCÁBULOS ACENTUADOS
GRAFICAMENTE
MONOSSILABOS - Acentuam-se gráficamente:
(1) monossílabos TÔNICOS, terminados em
a(s), e (s), o(s): pá, sé, vês,mês,
pó, pôs...
(2) monossílabos ditongais em éis,
éu, ói, abertos: réis, véu,
sói...
DISSILABOS E POLISSILABOS - Acentuam-se gràficamente:
(1) dissílabos e polissílabos OXíTONOS,
terminados em a(s), e(s), o(s), i(s), u(s); em, ens, éis,
éu, ói, (ditongos abertos) : jatobá,
poracés, enxó, aqui, escrevi, colibris, funis, perú,
vintém, conténs, chapéu, corrói...
(2) dissílabos e polissílabos, PAROXÍTONOS
terminados:
(a) por vogal nasal: ímã, órfã;
(b) por ditongo: órgão, louváreis,
fáceis, sáveis;
(c) por qualquer consoante: gérmem, alcáçar,
consul, sílex...
AMOS - Acentua-se o a de
ámos, no pretérito perfeito do indicativo:
louvámos (cf. louvamos, presente do indicativo).
PROPAROXITONOS.- Acentuam-se TODOS OS VOCÁBULOS
PROPAROXITONOS : prática, ânimo, ânsia,
pêssego, fêmea, próprio, lúgubre, único,
núncio, cadáveres, múltiplos, louvaríamos,
devêramos, fizéssemos...
HIATOS - Distinguem-se, gràficamente,
os hiatos:
(a) se a vogal é tônica, com acento
agudo : país, saída, Taígeto, saúde;
(b) se a vogal é átona, com o trema ou diérese
: saïmento, païsagem, saüdar.
NOTA - Outra função
do trema : conseqüência, argüir...
HOMOGRAFOS
1. REGRA GERAL - duas palavras
homógrafas distinguem-se pelo acento gráfico, dentro
das indicações acima: quê (monossílabo
tônico) e que - pôr e por - réis e
reis - contém e contem - louváreis e louvareis
- pára e para - pêlo (subs.) pélo
(v.) e pelo (combinação de per com
o artigo lo) - mòlhada e molhada - médico e
medico...
2. Entre o ê e o ô (fechados)
e o é e ó (abertos), marcam-se
os fechados, nos homógrafos: rôgo e rogo - dêmos
e demos (pret.) - sêde e sede - côrte e corte...
3. Se a sílaba não é tônica,
o à o è, e o ò (abertos) recebem
acento grave, no homógrafo que deve ser marcado: á
e a - àquele e aquele - àparte e aparte (v.)
- prègar e pregar...
VOGAIS DE SILABA NÃO TÔNICA
Como se acentuam:
1. ACENTO GRAVE
(a) Ver o item 3 dos homógrafos.
(b) Se, originàriamente, a sílaba era tônica,
aberta e gràficamente acentuada, a vogal. não
mais tônica, passa a marcar-se com acento grave: pàzinha,
pèzinho, avòzinha, anèizinhos, lìcitamente,
ùltimamente.
2. TREMA
(c) Si o í ou o ú, em grupo vocálico
de hiato. passou de vogal tônica a vogal não tônica.
qualquer se marca pelo trema : contraído, contraïdamente;
miúdo, miúdamente.
3. CIRCUNFLEXO E TIL
(d) Si o som é fechado ou nasal, permanecem o circunflexo
e o til: cortêsmente, sêcamente, sôfregamente,
cristãmente...
OBSERVAÇÃO - Se o
motivo da discriminação desaparece, deixa de acentuar-se
a palavra, mesmo dentro de família em que alguma seja acentuada.
Assim: português e portuguesa ou portugueses - pôr
e dispor, propor, compor - palavras em que não há
razão para acento.
CRITICA
"Todos emendam o alheio
e poucos sentem o seu."
(João de Barros)
Como pode ver-se, os dispositivos
do FORMULÁRIO, a respeito da acentuação gráfica,
desceram a muita minúcia. Esperamos que o tempo vença
a primeira repugnância, em cada um de nós, de tanto
sinal gráfico, em tanta palavra. Talvez que fôra
mais prático o FORMULÁRIO ter destacado duas ou
três grandes regras, subcolocando certas miudezas em plano
de mera opção - provisoriamente - com um caráter
ape nas indicativo, para aqueles que desejassem atingir a perfeição
diacrítica.
As regras gerais poderiam ser:
I - Continua em vigor a acentuação
usual: mercê, avó, avô, cecém, porém,
colibri, perú, pôs, etc.
II - Acentua-se todo vocábulo
proparoxíto no: lâmpada, lépido, lírico,
lôbrego, lúgubre, etc.
III - Diferençam-se, pelo
acento, os vocábu los homógrafos, não homófonos
: réis e reis; sede e séde, médico e
medico, louváreis e louvareis, etc.
IV - Acentuam-se os vocábulos
passíveis de má pronúncia, já porque
menos vulgares ou mais raros, já porque menos firme o uso:
sável, rábão. alcáçar,
Setúbal, táctil, téxtil, contôrnos,
espôsos, novél, etc.
(Seguir-se-iam as sub-regras ou
regras de minudências...)
NECESSIDADE DA ACENTUACÃO
GRÁFICA
É redundar, encarecer a
necessidade da acentuação gráfica. Como pronunciará,
alguém, fàcilmente certo, encontrando-os pela primeira
vez, num livro, a vocábulos como Zêzere, Ílhavo,
Pontével, Setúbal? (Gonç. Viana) Ou,
ainda: Coromândel, Madagáscar, Quíloa,
Õbidos, pudico, rubríca, epôdos, êxodo,
etc., etc.?
A ausência de sinais diacríticos
tem sido causa da desorganização, dos desvios, dos
viciamentos, dos sincretismos prosódicos, na ortoépia
ou... ortoepía da lingua. Uma utilização
regular dos acentos gráficos, de há muito, haveria
corrigido, em boa parte, a cacoépia alastrada de que sofre
o idioma. Um inventário das más pronúncias,
entre nós, quer as ainda corrigíveis, quer as já
incorrigíveis, fôra matéria para outro livro,
outra tese.
Tentemos um leve ensaio.
NOMES PRÓPRIOS
(Necessidade da acentuação gráfica)
Vêm de longe os abusos e
licenças, ou as ignorâncias da boa forma e ortofonia
dos nomes próprios, na prosa como na poesia.
Na poesia têm o nome de licença
poética. Delas se valeu o Camões, quando escreveu
Anibál, Dário, Demodóco, Semirâmis,
Zopíro, em vez de Aníbal, Dario, etc.
Na poética, ao menos, o
metro ou o ritmo força a quantidade, por modo que a prosódia
da palavra se reconhece, mesmo desacentuada gráficamente.
Já na prosa, entretanto,
como descobrir a boa prolação, deste ou daquele
nome, quando não é fácil ou não convidativo,
para o menor esforço, a consulta a uma fonte?
Francisco José Freire (1719-1773),
o conheci do CANDIDO LUSITANO, em suas Reflexões sobre
a Língua Portuguesa - 2ª
parte - faz reparo acerca da prosódia de alguns nomes
próprios, correntemente deturpada, no seu tempo... "algumas
vozes, cuja pronunciação corre errada, fazendo-se
umas vezes breves e outras longas, contra a sua derivação
e origem".
Enumera palavras proparoxítonas
a que muitos fazem a penúltima longa, errôneamente,
dizendo: Climéne, Democrátes, Herodôto,
Iôlo, Patróclo, Praxitéles, Telemáco,
Numída, etc., em vez de Clímene, Demócrates...
Cita outras, paroxítonas,
em que, inversamente, a ignorância fez a penúltima
breve, dizendo: Árquia, Andrónico, Heráclito,
Ifigênia, Copérnico, Gárgano, Cleóbulo,
Tessalônica, Selêucia, Nicomédia, em vez
de Arquía, Androníco, Heraclíto, Coperníco,
etc.
Como corrigir, hoje, pronúncias
quais Ifigênia, Heléna, Heráclito, Copérnico?
Quem falaria Hélena ou Ifigenía ou Heraclíto,
como bem mandariam as quantidades gregas e latinas destas
pa lavras?
Copérnico diz hoje
todo mundo. Copérnico, acentua o VOCABULÁRIO
da Academia.
Também Androníco, Teodúlo, Cleobúlo,
Trasibúlo, Tessaloníca, etc., devem assim pronunciar-se
paroxítonas, como o querem as quantidades gregas e latinas,
que bem vejo aqui no Calepinus septem linguarum, de Jacobi
Facciolati. E já a estas palavras, de uso mais restrito
e mais alto, nada impede que lhes evitemos a errônea e viciamento.
Creio não ficar fóra
de lugar, uma lista de no mes proparoxítonos, e outra de
paroxítonos, que tomo à autoridade de Mário
Barreto, nos Novos Estudos
"Nomes com a antepenúltima
predominante, isto é, proparoxítonos, esdrúxulos
ou dactílicos Abdénago, Andrómaca, Antístenes,
Antímaco, Átropos, Átila, Agátocles,
Areópago, Antíoco, Aristófanes, Anaxímenes,
Aristócrates, Arquíloco, Andrómeda, Aristóteles,
Antígone, Cimódoce, Cécrope, Cérbero,
Calíope, Cánace, Cassíope, Cícladas,
Calígula, Calícrates, Cleómenes, Clímene,
Calístenes, Calístrato, Demóstenes, Diógenes,
Dámocles, Dálila, Demódoco, Dédalo,
Desdémona, Érebo, Esténelo, Encélado,
Empédocles, Euménides, Espártaco, Eróstrato,
Eratóstenes, Eurípides, Erígone, Euríalo,
Eurídice, Éfeso, Ésquilo, Etéocles,
Górgonas, Hécuba, Hesíodo, Heródoto,
Híadas, Hipótades, Hipómaco, Heliogábalo,
Hécate, Ínaco, Íaca, Ícaro, Isócrates,
Lámpsaco, Laódice, Lápitas, Láquesis,
Líbano, Mégara, Ménades, Ménalo, Mérope,
Melpómene, Mnemósina, Nínive, Némesis,
Níobe, Neoptólemo, Nictímene, Néocles,
Niágara, Númidas, Órcadas, Oréades,
Pégaso, Parténope, Pérgamo, Pisístrato,
Praxíteles, Pílades, Policrates, Príamo,
Prosérpina, Píramo, Penélope, Perséfone,
Pericles, Pátroclo, Ródano, Ródope, Sármata,
Sálmace, Semíramis, Socrates, Simónides,
Sófocles, Sísifo, Síbaris, Soneca, Segóvia,
Tênedo, Terpsícore, Tisífone, Temístocles,
Triptólemo, Útica, Véneto, Xenófanes,
Xenócrates, Zópiro, etc. ...
"Nomes próprios acentuados
na penúltima, isto é, paroxítonos ou graves:
Adonis, Aganipe, Agapito, Alarico, Alemena, Anfitrite, Alcides,
Andronico, Admeto, Aristipo, Arquimedes, Aristides, Aristobulo,
Abdera, Berenice, Cirene, Citera, Cocito, Cleobulo, Diomedes,
Dione, Dario, Euclides, Eufrates, Eurotas, Epictéto, Gargano,
Ganimedes, Ismeno, Latona, Leucipo, Mausolo, Messala, Mileto,
Mitridates, Nasica, Nicetas, Nicomedes, Pandora, Policleto, Polidectes,
Palamedes, Polinice, Pactolo, Priapo, Serapis, Sinope, Samaria,
Sardanapalo, Talia, Trogloditas, Trasimeno, Tessalonica, Trasibulo,
Verona, Veronica, etc.".
No mesmo estudo em que Mário
Barreto nos apresenta a lista aqui reproduzida, êle prova,
com abundância de autoridades, que deve pronunciar se
Cleopátra. Entretanto, o VOCABULÁRIO da Academia
acentua Cleópatra.
NOMES COMUNS
(Necessidade da acentuação gráfica)
Já o Carneiro Ribeiro, nos
Serões gramaticais, citava, nos barbarismos, prosódias
como crisantêmo, pensíl, textíl, hipodrômo,
ductíl, tactíl, etc.
PROPAROXITONOS - Vai aqui uma lista
de palavras proparoxítonas, tomadas sobretudo a Ed. Carlos
Pereira, e cuja pronúncia vulgarmente se deturpa, no uso:
Anódino, arquétipo, bímano, êxodo,
epíteto, hégira, horóscopo, ínterim,
orquídea, pródromos, quadrúmano, zéfiro,
amálgama, revérbero, anêmona, aerólito,
aeróstato, hipódromo, murmúrio, velódromo,
crisântemo, protótipo, linótipo, espécimen,
plêiade...
PAROXÍTONOS - Eis alguns
exemplos de vocábulos paroxítonos, que a pronúncia
popular, não raro, altera:
Batávo '(que o próprio Carlos Pereira traz
como devendo proferir-se bátavo), pênsil, téxtil,
projéctil, espiríta (o mais usual é
dizer-se espírita, por analogia com espírito;
mas a palavra nos veio do francês spirite), decâno,
rubrica, pudico, etc., etc.
NOMES EM Ô (FECHADO),
NO PLURAL
É coisa dificil, no português, saber qual palavra
paroxítona, com ô tônico, o tem aberto
ou fechado, no plural. Eis várias delas, que conservam
o ô inalterado: (só daremos o plural): arrôjos,
almôços, bôlos, chôros, contôrnos,
colôssos, endôssos, engôdos, esbôços,
estôjos, estôrvos, ferrôlhos, gôstos,
jôrros, pescôços, etc. (Tomadas a E. C.
Pereira)
TERMINOLOGIA TÉCNICA
(Necessidade da acentuação gráfica)
Onde, porém, a questão
da pronúncia assume um aspeto complicado e diverso, é
na terminologia técnica. Aliás, não só
a pronúncia, mas a propria formação das palavras.
Na medicina, principalmente. Sob o ponto de vista lingüístico,
é desolador verificar como os nossos profissionais tratam
as palavras técnicas que constituem a gíria da classe.
O desleixo e ignorância são enormes. A ausência
de umas indispensáveis noções de grego e
o desconhecimento mais ou menos profundo do latim - geral, como
se sabe, em nossas classes de profissão liberal - devastou
e desorganizou, alarmantemente, a prosódia de tais vocábulos.
Pelas aulas das academias, correm as pronúncias defeituosas
e desencontradas, numa deturpação ortoépica
de palavras, as mais vulgares ou claras, sob o ponto de vista
da quantidade silábica, como libido, hipóstase,
parênquima, leucócito, epêndima, pólipo,
etc., que não raros de nossos esculápios, e
seus discípulos, proferem errôneamente: líbido,
hipóstáse, paranquíma, leucócíto,
ependíma, polípo, etc. Sem contar a bifurcação
prosódica das palavras em ia: autópsia e autopsia,
albuminúria e albuminuria, etc. Ou ainda o valor do
x: epistaxe (cs) e epistaxe (ch), caquexia (cs) e (ch).
Quantas dúvidas, hesitações, sincretismos,
a acentuação gráfica teria evitado, mesmo
consa grando prosódias errôneas!
Um confronto entre o Dicionário
de termos médicos, de Pedro A. Pinto, o Dicionário,
de Cândido de Figueiredo, o Dicionário etimológico,
de Antenor Nascentes, o Vocabulário, da
Academia e o de Ramiz Galeão (palavras gregas) mostrará
quanto anda dificil de deslindar, a matéria, que nosso
desleixo complicou profundamente, levando a desacordo as próprias
autoridades e pessoas que trataram dela. A adoção
do acento gráfico, é de esperar, virá, possivelmente,
facilitar uma resolução, encaminhando a terminologia
técnica para uma sistematização digna de
classes que têm obrigação de ser letradas
e manejar bem o idioma em que divulgam conhecimentos.
Eis uma lista de palavras que freqüentemente,
se ouvem mal proferidas, sobretudo algumas.
PROPAROXÍTONAS
Cardiólise, electrólise, hemólise, hidrólise
e as mais, que são várias, compostas de lise,
como segundo elemento ou elemento final; clorofílase,
diástase, epístase, hipóstase, láctase,
midríase, etc.; fagócito, leucócito,
telécito, etc. ; acônito (que se devia
dizer aconíto, mas agora incorrigível),
bálano, êmese, epêndima, epífise,
hepatólito, gastrólito, hipógala, índigo,
parênquima, pólipo, etc., etc.
PAROXITONAS:
hidrocéle, diapedése. es táse, etc.
PAROXÍTONAS em ia
Os vocabularistas não se acordam, na pronúncia
das palavras técnicas em ia. O melhor, creio,
fôra seguir ou definir uma sistematização
de todas, como o parece quererem Pedro A. Pinto, no Dicionário
de termos médicos, e Antenor Nascentes, nas palavras.
pelo menos, que registra o seu Etimológico. Já
o Vocabulário, da Academia, nos dá idéia
de que nenhum critério teve, tentando, talvez, ficar com
algum uso... Mas que uso pode existir, na anarquia de que vimos
falando?
Vejamos alguns exemplos:
abasia, ablepsia, abulia, acomia, albuminuria (para Nascentes,
Pedro A. Pinto e Cândido de Figeiredo) e albuminúria
(para o Voc(abulário), da Academia), alopecia,
anectasia, anuria, (anúria, para o Voc.),
atelectasia, autopsia (autópsia, para
o Voc. Cândido de Figueiredo regista as duas, preferindo
a primeira), biotaxia, disuria, docimasia (docimásia
para o Voc. e C. F.), eclampsia (até
o Voc., apesar de eclâmpsia ser muito
corrente), euforia, eugenia, eulalia, glossoplastia, helioterapia,
hematia, hematuria (hematúria, Voc.),
iridoplegia, linfectasia, miopragia (e não meiopragia),
oxiestesia, polaquiuria (polaciuria, P.A.Pinto
e polaquiúria, Voc.), quimiotaxia,
xantocromia, etc.
Alguns dos vocábulos acima
e outros que inda vou citar, naturalmente, são encontráveis
só em dicionários técnicos, como v. g., o
de Pedro A. Pinto, ou, sob forma francesa - e de lá é
que nos vieram tais palavras gregas - com a exibição
dos elementos gregos, no Dictionnaire des termes techniques
de Médicine, de Garnier e Delamare.
O x NAS PALAVRAS TÉCNICAS
É cousa verificável e fácil de explicar,
na filologia, que as palavras chamadas de corrente erudita, ou
não evolutivas, conservam grande proximidade de suas fontes
etimológicas. Não as desgasta e muda o uso popular,
porquanto elas não caem na corrente, e são manejadas
pelos letrados, classe de nata, supostamente. Maior é ainda
a limitação, para as palavras de gíria científica.
E se tais palavras guardam aproximação das fontes,
sendo bem e bom que o guardem, tenho uma idéa de que as
palavras de x deviam conservar, para esta letra, o valor
etimológico. Não tenho agora tempo, espaço
e material para discussão do assunto, mas acho que é
um abuso a corrigir, o som de ch que se dá ao
x da palavra epistaxe, tornada igual, pelo caso,
à palavra xarque, por exemplo. Parece-me que estou
indo além de autoridades, como as dos dicionários
que venho citando, sobretudo o Vocabulário, da
Academia, o qual me dá, entretanto, a impressão
de que teve medo do imperativo e até do optativo, na questão
de prosódia de certas palavras ... mas creio que, a bem
da linhagem e uniformidade das palavras técnicas de x,
em todas elas o x havia de sempre valer cs
e não ch
Eis algumas delas. Para as que
o Vocabulário regista, ora ele indica o cs,
ora não indica, deixando ver que, então, a
pronúncia é ch:
alexia, aloxuria, ataxia, axantopsia, axônio, biotaxia,
catataxe, epistaxe, oxálico, oxalexia, oxiestesia,
paralexia, quimiotaxia, simpéxio, toxina, tóxico,
xantelasma, xantóxilo, etc.
Na palavra xantóxilo,
por exemplo, Cândido de Figueiredo indica o valores,
para o segundo x (chantócsilo). Por que há de o
primeiro valer ch e o segundo cs? Não
têm ambos a mesma ori gem, o mesmo valor e a mesma força
etimológicos?
Assim como falo toxina (es),
biotaxia (cs), alexia (cs), etc., fale eu também aloxuria
(cs), aloxana (cs), aloxanato
(cs), epistaxe (cs), xantelasma
(cs), xantocromia (cs), etc.
NOMES EM IL (do latim
ilis, breve)
A acentuação gráfica poderia ter evitado,
existisse ela de tempos, na língua, a hesitação
[de pronúncia] : dúctil, grácil, fóssil,
pênsil, projéctil, púgil, réptil, táctil.
Esta última, que a psicologia experimental anda pondo
em moda, cá em Belo-Horizonte, corre o perigo de se viciar,
entre nós, sob a prosódia tactíl...
É prático, e útil
para a língua, sistematizar a acentuação
gráfica. Fez bem o acordo, adotando a que instituíra
a simplificação de 1911.
CONCLUINDO
Pela simplificação
Tentei mostrar, com a pressa e
aperto de circunstâncias inevitáveis, quanto é
razão que se adote a grafia simplificada. Mesmo como a
quer o acordo de 1931.
Não foi feliz o professor
Alfredo Gomes, quando, em polêmica com Silva Ramos, afirmava,
da neografia portuguesa, que ela era baseada em "critério
convencional, falso, incoerente".
Não só é lógica,
racional, fácil, como também glotológica,
tradicional, respeitadora da etimologia, colocando-se, pela segurança
e prudência com que foi feita, acima de qualquer termo de
comparação com a velha, usual ou mista, e esta,
sim, convencional, falsa, incoerente.
Que se proceda com o bom senso,
das circunstâncias exigido, na aplicação do
decreto n. 23.028, por que o governo provisório mandou
obrigar, no ensino e nas relações oficiais, o uso
da nova grafia. Que haja firmeza e calma, na manutenção
de tudo, e, dentro em pouco, veremos como toda a gente escreverá
melhor, mais livre, menos trabalhosamente.
Os teimosos se hão de ir
ficando sozinhos. E desaparecerão em pouco tempo, porquanto
são, em geral, velhos, que se não querem deslocar
de velhos hábitos. E os que não são velhos,
mas, talvez, envelhecidos da inteligência, acabarão
cedendo. E a imprensa que ainda resiste, tambem mudará
de prática. A imprensa, a que uma campanha misteriosa de
politiquice tem impedido de se por à frente do movimento.
Tudo há de vir, é
o que muito espero.
FECHO
Esta é a tese que ponho
nas mãos da comissão examinadora.
Melhor se hajam os doutos. E mais
calmamente os menos ocupados, os de tempo à sobra. Que
a mim. a empresa me valeu boa canseira e labuta, nos retalhos
de tempo tomados às obrigações de uma vida
atarefada.
Não maldigo, porém,
a sobrecarga de trabalho, quando ainda me existem forças.
Atendo, enquanto são horas,
o conselho do poeta:
"Dum vires annique sinunt, tolerate
labores;
Jam veniet tácito curva senecta pede” - (Ovídio)
Exercei-vos no trabalho, enquanto o querem os anos e as forças;
pois não tardará, com seu pé silencioso,
a curvada velhice.
Belo-Horizonte, setembro de 1933
B I B L I O G R A F I A
GONCALVES VIANA - Ortografia nacional - Vocabulário
- Palestras filológicas.
CÂNDIDO DE FIGUEIREDO - Ortografia no Brasil - Dicionário.
ANTENOR NASCENTES - Dicionário etimológico.
F. T. D. - Gramática histórica - Gramática
expositiva - Literatura.
ED. CARLOS PEREIRA - Gramática histórica Gramática
expositiva.
ACADEMIA BRASILEIRA - Vocabulário oficial.
MÁRIO BARRETO - Novos Estudos.
REVISTA DA LINGUA PORTUGUESA - (passim) Trabalhos sôbre
ortografia, de Castro Lopes, J. L. de Campos, Júlio
Nogueira, Laudelino Freire, Lindolfo Comes, etc.
OTONIEL MOTA - Meu idioma.
ÁLVARO PINTO - A nova ortografia e o desacordo reinante.
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brasileira.
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Portuguesa (Ed. de 1837).
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ao estudo dos clássicos gregos e latinos
ENCICLOPEDIA ESPASA-CALPE - nas vozes: Lingüística
- Filologia - Glotologia - Escritura - Ortografia . . .
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PEDRO A. PINTO - Dicionário de termos médicos.
GARNIER et DELAMARE - Dictionnaire des termes techniques
de médicine - 1927.
RAMIZ GALVÃO - Vocabulário etimológico,
ortográfico e prosódico das palavras portuguesas
derivadas da língua grega.
MORAIS - Dicionário.
JOSÉ JOAQUIM NUNES - Crestomatia arcaica.
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