DADOS BIOGRÁFICOS

Dom Silvério Gomes Pimenta nasceu em 12 de Janeiro de 1840, em Congonhas do Campo (MG), filho de Antônio Alves Pimenta e Porsina Gomes de Araújo. Seu primeiro contato com os estudos, que consistia em aprender o catecismo, a ler e a contar, aconteceu na cidade natal, com os mestres Manuel Seabra e Antônio Gurgel, que logo se encantaram com a desenvoltura e a inteligência do menino. Órfão de pai aos nove anos, Dom Silvério viu-se na obrigação de trabalhar para assegurar o sustento da família, que se constituía da mãe e de sete irmãos. As lembranças dos tempos difíceis da infância nunca o abandonaram. Quando já era Arcebispo comentou certa vez, em conferência com outros bispos do Brasil e Exterior, o quão sofrido haviam sido seus primeiros anos: “às angústias da pobreza, e não qualquer pobreza, senão uma indigência, na qual correram parelhas a fome, a nudez e o desagasalho” (SOUZA:1927,12). Aos nove anos, empregou-se numa casa comercial da cidade, de propriedade de José Basílio, para prover o sustento dos seus.

Nessa mesma época, veio em seu auxílio o alferes Manuel Alves Pimenta, seu tio e padrinho, que conseguiu, junto aos padres lazaristas, diretores do Colégio de Congonhas, que o afilhado frequentasse as aulas como externo. Lá, aplicou-se ao estudo do latim, francês, geografia e filosofia. Eram muitas as dificuldades para o prosseguimento dos estudos. Faltavam-lhe livros, vestuário, calçados e comida. Certo dia chegou a desfalecer na sala de aula, quando recebeu alimento de um dos alunos. Para concluir os estudos do terceiro ano de Latim, recorria a algumas casas comerciais à noite, para aproveitar a luz local e repassar as lições, alheio às conversas dos fregueses. Mesmo diante de todos os infortúnios, o menino chamava a atenção dos mestres pela determinação e inteligência. Concluído o curso aos quinze anos de idade, Dom Silvério recebeu o primeiro prêmio em cada uma das matérias estudadas, com o título de Benemérito do Colégio.

Em 1855, o seminário foi fechado, ficando a continuidade dos seus estudos ameaçada. Diante da impossibilidade de estudar, o jovem Silvério Gomes Pimenta empregou-se como sapateiro. Mais uma vez veio em seu socorro o padrinho que, em conversa com Dom Viçoso, bispo de Mariana, relatou a ele dificuldades pelas quais passavam a família de Silvério, remetendo-se, várias vezes, à inclinação do menino para o sacerdócio. Assim, pediu ao bispo que aceitasse o jovem como seu afilhado de crisma. Em setembro de 1855, Dom Viçoso envia uma carta a Silvério, recomendando-lhe que se integrasse ao Seminário de Mariana. A notícia foi recebida com tamanha alegria que ele manteve a correspondência guardada entre seus pertences mais valiosos, durante toda a vida. Já no Seminário em Mariana, estudava e trabalhava, como nos relata Castro:

Os seminaristas internos, que pela sua pobreza não podiam concorrer para de numerosos empregados. Silvério, havendo conquistado, logo ao chegar, a confiança dos superiores, foi encarregado do mister de porteiro. Não parecia por certo um encargo à altura de suas aptidões intelectuais, mas o moço, sem pretensões, humilde por natureza e virtude, aceitou-o alegremente. Ei-lo, pois, a dar recados, a chamar este ou aquele, a entregar toda a sorte de objetos, a recolher a roupa servida para a lavagem e a distribuí-la quando de volta. Era um vaivém contínuo em que só pode avaliar quem exerceu um ofício como esse em casa daquele gênero. (CASTRO, 1954, p. 10).

Aos dezessete anos tornou-se professor de latim da Instituição, ofício que exerceu por quase duas décadas, sendo também professor de História Universal. Aos vinte e dois anos foi sagrado Sacerdote, e logo depois foi enviado à Europa para recuperar a saúde já debilitada pelos trabalhos que realizava no Seminário. Ao ser recebido pelo Papa Pio IX, em Roma, comenta-se que o Sumo Pontífice teria perguntado em que idioma deveria se comunicar com ele, ao que respondeu o padre Cornagliotto que, o acompanhava, que poderia falar-lhe “em latim, grego, hebraico, francês, alemão...” (CASTRO: 1954, 15). O Papa manifestou então o desejo de que Silvério pregasse em Roma, fato que muito orgulhou o jovem sacerdote. Depois da pregação, um cardeal, estupefato diante da capacidade do brasileiro, haveria murmurado cheio de pasmo: “- Niger, sed sapiens!” ("Negro, porém sábio!"). (CASTRO: 1954, 15).

Em 1890, foi sagrado Bispo Auxiliar de Mariana e, nessa época, começa a redigir suas célebres cartas pastorais (datadas de 24 de novembro de 1890 a 10 de fevereiro de 1922). Tais cartas, que constituem a maior parte da produção literária de Dom Silvério, lhe deram acesso, em 30 de outubro de 1919, à cadeira número 20 da Academia Brasileira de Letras, consagrando-o como o primeiro prelado a ocupar um lugar entre os consagrados escritores da ABL. Em 1897, sucedeu Dom Bevenides no bispado de Mariana, e, em 1907, foi sagrado arcebispo com a elevação da Diocese de Mariana para Arquidiocese, sob determinação do Papa Pio X. Tornou-se, assim, o primeiro arcebispo negro da história do país.

Foi ainda responsável pela fundação do periódico católico O Bom ladrão, em 1873, em que reunia artigos de autoria de eclesiásticos brasileiros e estrangeiros, e pela instituição do Dia da Boa Imprensa, em 1918, para defender a existência de diário católico no Brasil. Publicou o livro A vida de Dom Viçoso, considerado como um primor literário, e construiu várias escolas agrícolas e seminários, em cidades do interior de Minas Gerais.

Muitas foram as dificuldades encontradas por Dom Silvério, até ingressar na vida religiosa. Uma vez disposto a entregar sua vida a Deus e ao próximo, caminhando rumo ao topo da hierarquia da Igreja Católica, os infortúnios não cessaram de acompanhar o homem que viria a ser o primeiro Arcebispo negro do Brasil. Conta-se que, quando da sua indicação para Vigário Capitular de Mariana, após o falecimento de Dom Viçoso, a notícia havia sido recebida com alegria pelos fiéis, embora houvesse, entre os leigos, “uma outra voz contrária, movida sem dúvida, embora não confessadamente, pela cor e berço pobre do sacerdote.” (CASTRO, 1954, p. 23).

Certa vez, em visita à Basílica de Lourdes, na França, foi impedido de entrar na igreja, pelo pároco, quando o secretário explicou ao sacerdote quem era o homem parado à porta: Dom Silvério, bispo de Mariana... Em outra ocasião, foi caluniado e acusado por um sacerdote, de ter pecado contra a castidade, fato que logo depois foi desmentido pelo próprio caluniador, diretamente ao bispo Dom Benevides. De outra vez, um senhor a quem Dom Silvério se recusou a receber na paróquia, por estar reunido com outros sacerdotes, saiu porta afora a “gritar ultrajes e impropérios, ajuntando referências ao acidente da cor”, simplesmente por sentir-se ofendido pelo fato do padre não poder recebê-lo naquele momento. (CASTRO, 1924, p. 28).

Homem resignado, Dom Silvério nunca se deixou abalar pelos infortúnios de sua vida. Soube, inclusive, driblar as “dificuldades” que lhe eram impostas pela cor da pele – tarefa dura, naqueles idos da segunda metade do século XIX. Posicionou-se politicamente favorável ao fim da escravidão; foi ao socorro dos pobres, construindo escolas e seminários, em várias cidades de Minas Gerais, com o objetivo de facilitar o estudo dos desprovidos.

Em 20 de outubro de 1918, foi eleito membro da Academia Brasileira de Letras, ocupando a cadeira de número 19. Tornou-se assim o primeiro prelado a ter assento entre os nomes consagrados da literatura brasileira. Orador, poeta, conferencista, biógrafo, jornalista e professor, Dom Silvério Gomes Pimenta faleceu em 30 de agosto de 1922, em Mariana-MG.

Referência

CASTRO, Fernando Pedreira de. Dom Silvério Gomes Pimenta: um Santo Arcebispo Brasileiro. Rio de Janeiro: Vozes, 1954.

 


PUBLICAÇÕES

Obra individual

Resposta ao discurso de Saldanha Marinho. [S.I.]: Tipografia d'o Apostolo, 1872.

A prática da confissão: estudos de moral e dogma. Rio de Janeiro: B. L. Garnier, 1872.

O Papa e a revolução. [S.l.]: [s.n.],1873. (Sermão).

Dom Antônio Ferreira Viçoso, Bispo de Mariana, Conde da Conceição. [S.l.]: [s.n.], 1877.

A vida de Dom Viçoso. 3. ed. Mariana: Tipografia Arquepiscopal, 1920.

Discursos nas exéquias de Pio IX. [S.l.]: [s.n.], 1877.

A morte de minha mãe. [S.l.]: Opúsculo, 1885.

Peregrinação a Jerusalém. [S.l.]: [s.n.], 1897.

Sermão da Páscoa. [S.l.]: [s.n.], 1899.

Recepção do exmo. e revmo. sr. Dom Silvério Gomes Pimenta, Arcebispo de Mariana, na Academia Brasileira de Letras. Rio de Janeiro: Drummond, 1920. (Discurso de Recepção na ABL)

Cartas pastorais: 1890-1922. Rio de Janeiro: Leite Ribeiro e Maurillo, 1921. 199p.

Antologias:

Literatura e afrodescendência no Brasil: antologia crítica. Organização de Eduardo de Assis Duarte. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011, vol. 1, Precursores.

 


TEXTOS

 


CRÍTICA

 


FONTES DE CONSULTA

BLAKE Sacramento, Dicionário Bibliográfico Brasileiro. Rio de Janeiro: Conselho Federal de Cultura, 1970, v. VII, p. 228.

BARROSO, Gustavo. Discurso de Recepção. In: Revista da Academia Brasileira de Letras, n. 25-6, p.166.

CASTRO, Fernando Pedreira de. Dom Silvério Gomes Pimenta. Rio de Janeiro: Vozes, 1954.

FIDELIS, Silviano Clarindo. Silvério Gomes Pimenta. In: DUARTE, Eduardo de Assis (Org.). Literatura e afrodescendência no Brasil: antologia crítica. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011, vol. 1, Precursores.

LAET, Carlos de. O frade estrangeiro e outros estudos. Rio de Janeiro, s/e, 1953.

MOTTA, Artur. O Perfis Acadêmicos. In: Revista da Academia Brasileira de Letras, vol. XXXV, 423-430, 1931.

OLIVEIRA, Eduardo de. Quem é quem na negritude brasileira. São Paulo: Conselho Nacional Afro-brasileiro; Brasília: Ministério da Justiça, 1998, vol. 1, p. 81.

ORTIZ, Benedito. O arcebispo negro - ensaio de uma síntese de vida e obra de Dom Silvério Gomes Pimenta. Petrópolis: Vozes, 1942.

PRISCO, Francisco. O mundo literário. 2º Vol., n. 6, p. 359.

SOUZA, D. Joaquim Silvério de. A vida de Dom Silvério Gomes Pimenta. São Paulo: Lyceu Coração de Jesus, 1927.

 

 


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