DADOS BIOGRÁFICOS

Manuel Raymundo Querino nasceu no município de Santo Amaro da Purificação, no Recôncavo Baiano, em 28 de julho de 1851, filho de Luzia da Rocha Pita e do carpinteiro José Joaquim dos Santos Querino. Em 1855, uma epidemia de cólera assolou a região e provocou a morte de seus pais. A criança foi então acolhida em Salvador aos quatro anos, ficando aos cuidados de uma amiga da família. Manuel Querino teve como tutor e mestre de primeiras letras o bacharel e professor Manuel Correia Garcia. Aos 17 anos, com o Brasil em guerra contra o Paraguai, e tendo apenas o curso primário, alista-se como recruta. Em 1868, viaja pelos sertões de Pernambuco e do Piauí, agregado a um contingente que se destinava ao Paraguai. Mas devido a problemas de saúde, não é enviado ao front e permanece no Rio de Janeiro, onde trabalha na “escrita do batalhão”. Em 1870, é promovido a Cabo de Esquadra, mas dá baixa nas forças armadas e retorna a Salvador.

Trabalha inicialmente como pintor e decorador enquanto estuda Humanidades no Colégio 25 de Março e no Liceu de Artes e Ofícios, do qual termina sendo um dos fundadores. Com sua forte inclinação para o Desenho Geométrico, matricula-se na Escola de Belas Artes e obtém o diploma de desenhista em 1882, sendo em seguida aprovado para o curso de Arquitetura, no qual se destaca recebendo medalhas e distinções. Mais tarde, torna-se Lente de Desenho Geométrico do Liceu de Artes e Ofícios e do Colégio dos Órfãos de São Joaquim e publica em 1903 o manual Desenho linear das classes elementares.

No campo político, tem atuação de destaque ao se engajar na luta pelo fim da escravidão e do império. Integra a “Sociedade Libertadora 7 de Setembro” e assina em 1870 o “Manifesto Republicano”. Está entre os fundadores dos periódicos A Província e O Trabalho, nos quais escreve artigos combativos em favor da Abolição e da República. Participou também do semanário Liga Operária Baiana, resultado da mobilização de trabalhadores urbanos e publicou diversos artigos na Gazeta da Tarde, sendo considerado por Bradford Burno (apud Oliveira, 1998) o “primeiro historiador negro do Brasil”. Em 1890, adere ao recém-fundado Partido Operário e, antes de abdicar da carreira política, integra o Conselho Municipal de Salvador (atual Câmara Municipal).

Ao pesquisar e divulgar a contribuição dos povos africanos no Brasil, Manuel Querino demonstra a seus iguais a sua importância na construção do país e ao mesmo tempo alerta os descendentes brancos sobre a dívida histórica que possuíam. Querino foi um dos primeiros brasileiros a apresentar uma visão histórica do Brasil que leva em conta as contribuições dos africanos, fazendo-lhes justiça.

Sua obra se divide em duas fases: a primeira, entre 1903 e 1916, versa sobre os artistas e as artes no Brasil, dando a devida importância para trabalhadores - em sua maioria negros - constantemente desprezados pelo avanço das técnicas e dos monopólios. É uma fase que compreende crônicas, ensaios e artigos. Merece destaque o estudo “Os Artistas Baianos”, artigo de 62 páginas publicado na revista do Instituto Histórico e Geográfico da Bahia, em 1906. A que se seguem As artes na Bahia, de 1909, Artistas baianos: indicações biográficas, de 1911, e “Bailes Pastoris”, de 1914, entre outros.

Na segunda fase, que vai 1916 a 1922, Querino se dedica ao estudo dos costumes oriundos da presença afro-diaspórica na Bahia. E se debruça sobre as práticas culturais recuperadas pela pesquisa de fontes primárias presentes da memória coletiva e inscritas na oralidade. Em 1916, teve participação de destaque no 5º Congresso Brasileiro de Geografia, no qual apresentou seu estudo “A raça africana e os seus costumes na Bahia”, publicado nos anais do evento e posteriormente incluído no volume A raça africana, edição póstuma de 1955. Ainda em 1916, publica A Bahia de outrora: vultos e fatos populares (reeditado em 1922 e 1946), no qual reúne escritos anteriores acrescidos de novos textos. Em 1918, vem a público O colono preto como fator da civilização brasileira, obra extremamente significativa no processo de dignificação do contingente negro brasileiro. Publica também uma série de artigos e crônicas, como “Homens de cor preta na história”.

Manuel Querino faleceu em 14 de fevereiro de 1923.  Seu trabalho de resgate da contribuição cultural da diáspora africana na Bahia é pioneiro e se contrapõe aos discursos oriundos da colonização, com toda carga de preconceitos que ainda carregam. E ressurge na contemporaneidade movido pela atualidade histórica de suas reflexões sobre essa porção ainda marginalizada na sociedade.

Fontes:

OLIVEIRA, Eduardo (Org.). Quem é quem na negritude brasileira. 3.ed. São Paulo: Congresso Nacional Afro-brasileiro; Brasília: Ministério da Justiça, 1998, v. 1.

PINTO DE AGUIAR, Manuel Querino e sua obra. In: QUERINO, Manuel. A raça africana e seus costumes. Salvador: Livraria Progresso Editora, 1955, p. 5-11.


PUBLICAÇÕES

Obra Individual

Desenho linear das classes elementares. Salvador: S/I, 1903.

Artistas baianos: indicações biográficas. Rio de Janeiro: S/I, 1909.

Elementos de desenho geométrico: comprehendendo noções de perspectiva linear, teoria da sombra e da luz, projeções e arquitetura. Salvador: S/I, 1911.

Artistas baianos: indicações biográficas. 2. ed. rev., com 36 ilustrações. Salvador: S/I, 1911.

As artes na Bahia. Salvador: S/I, 1909; 2. ed. rev. e ampl. Salvador: Officinas do Diário da Bahia, 1913.

Bailes pastoris. Salvador: S/I, 1914.

A Bahia de outrora: vultos e fatos populares. Salvador: S/I, 1916; 2. ed. ampl. Salvador: S/I, 1922; 3. ed. Salvador: Livraria Progresso Editora, 1946; 4. ed., com ilustrações de Caribé e Ligia. Salvador: Livraria Progresso Editora, 1954.

O colono preto como fator da civilização brasileira. Separata dos Anais do 6º Congresso Brasileiro de Geografia, Belo Horizonte. Salvador: S/I, 1918.

Publicações póstumas

A arte culinária na Bahia. Edição a cargo de Alberto Morais Martins Catarino e José Teixeira Barros. Salvador: Livraria Progresso editora, 1928.

Costumes africanos no Brasil. Volume ilustrado, com organização e prefácio de Artur Ramos. Rio de Janeiro: S/I, 1938, 351 p.

A Bahia de outrora. 2. ed. Salvador: Livraria Progresso Editora, 1946, 332 p.; 3. ed. Ilustrações de Carybé e Ligia, Salvador: Livraria Progresso Editora, 1954, 352 p.

A raça africana e os seus costumes. Salvador: Livraria Progresso Editora, 1955, 174 p.

Artigos

Os artistas baianos. In: Revista do Instituto Histórico e Geográfico da Bahia, n. 31, 1906, p. 43-115.

Contribuição para a história das artes na Bahia – Joaquim José da Rocha. In: Revista do Instituto Histórico e Geográfico da Bahia, n. 34, 1908, p. 79-82.

Teatro da Bahia. In: Revista do Instituto Histórico e Geográfico da Bahia, n. 35, 1909, p. 117-133.

Contribuição para a história das artes na Bahia – Os Quadros da Catedral. In: Revista do Instituto Histórico e Geográfico da Bahia, n. 36, 1911, p. 59-63.

Contribuição para a história das artes na Bahia – Notícias Biográficas de Manoel Pessoa da Silva. In: Revista do Instituto Histórico e Geográfico da Bahia, n. 36, 1911, p. 137-144.

Episódio da Independência. In: Revista do Instituto Histórico e Geográfico da Bahia, n. 37-39, 1913, p. 221-230.

A litografia e a gravura. In: Revista do Instituto Histórico e Geográfico da Bahia, n. 40, 1914, p. 36-38.

A raça africana e os seus costumes na Bahia. In: Anais do V Congresso Brasileiro de Geografia. Salvador, 1916.

Primórdios da Independência. In: Revista do Instituto Histórico e Geográfico da Bahia, n. 42, 1916, p. 41-47.

Candomblé de caboclo. In: Revista do Instituto Histórico e Geográfico da Bahia, n. 45, 1919, p. 235-236.

O dois de julho e a sua comemoração na Bahia. In: Revista do Instituto Histórico e Geográfico da Bahia, n. 48, 1923, p. 77-105.

Antologias

Antologia do negro brasileiro. Organização de Édison Carneiro. Rio de Janeiro; Porto Alegre; São Paulo: Editora Globo, 1950.

Costumes africanos no Brasil. Organização de Artur Ramos. 2.ed. Recife: Fundação Joaquim Nabuco, Massangana, 1988.


TEXTOS 


FONTES DE CONSULTA

BACELAR, Jeferson; PEREIRA, Cláudio (org). Política, Instituições e Personagens da Bahia (1850-1930): EDUFBA, 2013.

GLEDHILL, Sabrina. Travessias no Atlântico Negro: Reflexões sobre Booker T. Washington e Manuel R. Querino: Funmilayo Publishing, 2018

LIMA, Vivaldo da Costa. A Anatomia do Acarajé e Outros Escritos: Corrupio, 2010

NASCIMENTO, Jaime; GAMA, Hugo (Org). Manuel R. Querino: seus artigos na Revista do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia. Salvador: IGHB, 2009.

OLIVEIRA, Eduardo (Org.). Quem é quem na negritude brasileira. 3. ed. São Paulo: Congresso Nacional Afro-brasileiro; Brasília: Ministério da Justiça, 1998, vol. 1.

PINTO DE AGUIAR, Manuel Querino e sua obra. In: QUERINO, Manuel. A raça africana e seus costumes. Salvador: Livraria Progresso Editora, 1955, p. 5-11.


LINKS


Verbete do autor para download