A Sesta
Na rêde, que um negro moroso balança,
Qual berço de espumas,
Formosa crioula repousa e dormita,
Enquanto a mucamba nos ares agita
Um leque de plumas.
Na rêde perpassam as trêmulas sombras,
Dos altos bambus;
E dorme a crioula de manso embalada,
Pendidos os braços da rêde nevada
Mimosos e nus.
A rêde, que os ares em 'tôrno perfuma
De vivos aromas,
De súbito pára, que o negro indolente
Espreita lascivo da bela dormente
As túmidas pomas.
Na rêde suspensa dos ramos erguidos
Suspira e sorri
A lânguida môça cercada de flôres;
Aos guinchos dá saltos na esteira de cores
Felpudo sagüi.
Na rêde, por vêzes, agita-se a bela,
Talvez murmurando
Em sonhos as trovas cadentes, saudosas,
Que triste colono por noites formosas
Descanta chorando.
A rêde nos ares de nôvo flutua,
E a bela a sonhar!
Ao longe nos bosques escuros, cerrados,
De negros cativos os cantos magoados
Soluçam no ar.
Na rêde olorosa, silêncio! deixai-a
Dormir em descanso! ...
Escravo, balança-lhe a rêde serena;
Mestiça, teu leque de plumas acena
De manso, de manso ...
O vento que passe tranqüilo, de leve,
Nas fôlhas do ingá;
As aves que abafem seu canto sentido;
As rodas do engenho não façam ruído,
Que dorme a Sinhá!
(Agir,1967)