Manoel de Xangô
De Manoel de Xangô distante corre a fama,
Pois dele o povo diz coisas tão singulares,
Que bem pouco há descrer do quanto se proclama
Desse babalaô de exóticos esgares.
Enquanto em se lhe vendo a vez primeira crê-se
De uma pobre criatura, apenas, se tratar,
Porque nada de mais nos falsos gestos lê-se,
Que o pai-de-santo venha ao menos revelar.
Quando na intimidade, ali, no seu terreiro,
Deixa como de parte os recatos e as manhas
Deixa, para se ver o ousado macumbeiro,
Com trejeitos expondo as múltiplas façanhas.
Fala de si com garbo e com certo entusiasmo
Descreve fatos tais que o próprio céu duvida,
Fatos que de se ouvir até se fica pasmo,
Que a glória são, talvez, maior de sua vida.
Do feitiço se preza que é temido.
E chama-o de responso o preto não papalvo,
Prevendo achar-se um dia em tramas envolvido,
Para que possa ver-se um tanto posto a salvo.
De já ter acabado um próximo casório
É o de que mais se ufana o cafuz da Tapera,
E diz que tudo fez com simples respensório,
Ancho desse poder que então Xangô lhe dera.
Caro embora pagasse a atrevida aventura,
Pela qual recebera um distinto exalçam-lhe a figura,
Se dele o caso ouvindo exalçam-lhe a figura,
Demonstra o riso alvar que um certo orgulho sente.
E o Manoel de Xangô, que não sabe ter pena,
Mas sabe na macumba o mal que vai fazer,
Tal mexeu no alguidar, que a formosa morena,
Nunca mais, nunca mais do noivo quis saber!
(Aloísio Resende, p. 58.)