Iemanjá

Vai dançar Iemanjá, protetora bonita

Deste rico rincão de terra brasileira.

No centro do terreiro, onde o samba se agita,

Em negras ondas solta a basta cabeleira.

 

É um gosto ali se ver, toda de azul e branco,

A dona do sentir das donzelas formosas,

O corpo meneando em doloroso arranco,

Tendo a boca a sorrir em pétalas de rosas.

 

Santa dos corações que sofrem por amor,

Deusa do bravo mar, das cristalinas águas.

A um só tempo és estrela e ao mesmo tempo és flor

Que transmuda em prazer as grandes fundas mágoas.

 

A dança singular de tal modo nos prende

– Dança breve e sutil de airosa dançatriz –

Que dentro em cada qual desejo enorme acende

De cair no bembé para ser mais feliz.

 

O cântico seduz. Sobre a terra molhada

Pisa altiva e serena a sereia do mar,

Bailando ao marulhar de mareta encrespada,

O ebúrneo corpo quer nas vagas mergulhar.

 

É uma moça fidalga. O seu olhar fascina.

Tem cabelo cheiroso e lábios carminados.

Como toda galante e lépida menina,

Gosta de pós de arroz, de espelhos e brocados.

 

Quando às vezes obter se lhe pretende a graça,

Dão-se-lhe macumba os mais lindos presentes,

Pois só mesmo Iemanjá, ditosos dias traça

Aos tristes corações de amores padecentes.

 

Das ofertas gentis toda a custosa soma,

Dizem que vem buscar, quando a noite vai alta,

Cantando à fola da água, ao vento a negra coma,

Pelas praias sem fim que o luar ameno esmalta.

(Aloísio Resende, p. 52-53.)


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