biobibliografemas 

um fio delgado ligando-me ao mundo dias-

pórico das letras

há sempre muito entulho mas

umas vezes o acaso outras rastros recentes

levam-me a poemas de homens e

mulheres que exigem atenção

 

folheei o continente africano

sua culinária mental cabinda

que não cabe inteiramente nos

vocábulos da expressão lusitana

lácio daninho

pode-se entender um pouco melhor

nossos condimentos ingredientes

negros islâmicos

mangas de goa

jorge de sena um e. pound polemista

megalômano mano belicanoro

ou o que quer que isso signifique

num lusíada ulisseida da gema

 

e depois a súbita aparição dessa face

escoando por entre os volumes

esta figura feminina aos poucos por linhas

de poemas se delineando para o meu apetite

para a minha curiosidade de cupim de biblioteca:

irene lisboa

uma definição fescenina para sua a poesia:

é como se ela dera a concha bivalve

um pouco para o pessoa e um outro tanto

para o bandeira mas gozando o melhor de ambos

lantejoulas sobre línguas e felatio

irene lisboa

sem os antiumectantes da metalinguagem masculina

masturba-se com delicadeza e depois

cheira os dedos da mão

úmidos de investigar as origens da vida

irene boa

(No assoalho duro, 2007).

 

 

o retorno

 

o preconceito racial vive abre

os olhos hiberna numa zona intermédia

entre o costume história como texto divino

hábito treta milenar e o reino da estupidez

congenial ao nascimento

sentimental intelectual da

alma sopro do macaco desnudo

depelado

 

mas a audácia o topete a afronta

afro do negro aquele um que responde

retruca em legítimo ataque

e de maneira sem papado na língua

sem travas na

e não engolindo mais a meia-idéia

de que para um limbo

tenha sido conduzido o racismo

 

um limbo murando-o

para que borrascas borra

de negrada não o reduzisse a pó branco

imêmore marmóreo

um limbo que servisse servindo

de abrigo ao racismo

para então alguma vez última-forma e meia-

volta re-tornar em visitação pública

farejando o ar revigorado de novas folhas

e disposto a não ver os negros espaços infinitos

onde coruscam ínfimas

estrelas

 

 

Dois do dois: olomí


mar em festa as gentes
   infestando as águas da mãe grande
o sentamento das coxas encimadas
   por quadris de contrabaixo o velido
vestido com vida própria que se
   sustenta nas próprias barras
longo-cerúleo
   a escorrer do colo até os tornozelos
lambendo rente suas curvas
   untuosas sempre recomeçadas
deambula senhora dona sobre escuma de flores
   deslinda-se lisa
bailadora de melífluo pensamento
   fleuma de chama branca
pétalas verdes um pé após outro
   olho alongado apenas para o que está
à altura dos seus olhos se espraia
   vai-vai (esteira de aeroporto) incansável
ou como que pousada em andor
   suspensa acima de dor e adoração
serena sereia sarada
   avião levando a pique cópia de barcos
de brinquedo objetos do artesanato mercante
   desova de coisas baratas
na praia clara
   odalisca de todas as luas loas e olas
olorosa bunda barroca
   suas ancas justificam o epíteto:
sacudidora da terra
   sovaco nu polido como a concha
pelo lado côncavo
   se homero conhecera iemanjá iorubá
talvez conformara mais doce
   o mar de odisseu filho de laertes

Pesadelo da história

 

para o mundo não pisar às avessas

o negro que sou inclusive em alma

a custo forçaram a ver navios

 

apartando-o da selvagem terra

dos inimigos e dos seus de palma

não há como não tosar-lhe o pavio

daí para que tento e estética

troque ele como quem troca casaca

será nada e bom ao senhorio

 

mau negócio senhor via diversa

(na regra novos fatos) fui com calma

até onde marra bem alto o rio

tornei com dentes mais alvos de serra

talo de arruda na orelha macaca

agora a goela do teu sonho trincho

 

envoi

 

pois muitos dormem temendo o escuro

crucifixo ao colo quase absurdo

os que ainda acordam vivos dão graças

sentem-se pagados a flor da raça

(Confissões Aplicadas, 2004).

 

 

 

 

escarnecer per parávoas encubertas

refurtar por meias fintas analfabetas

indiscretos abertos dígitos que

 

tenham ajam dois

ou mais dous (colhoneira) entendimentos

para que velido vilagre

 

pera lhe (ho)lo nonão entendam

ligeiramente entenderem se entendentes

de imediato para que não entesourem

 

com lixeireza e vá que encareça

e desy aborreça sem çopegar cabeças

de prego sem cós em cozinha voodoo

 

cristas que logo van eno prego

 

(Confissões Aplicadas, 2004).

 

 

Reconhecimento de firma

 

esperto ciumento peripatético

alinham-se como que progredindo

para um a prancha cubista

 

parentes disparatados-toantes de

mário de andrade (a meditação

 

sobre o tietê) pessoas paranormais e

paronomásticas clemantes e

cínicas ou metafísicas ainda

 

signatários da função poética da linguagem

assim alberto ass. adalberto ass. Dagoberto

 

(Vá de Valha, 1992)

 

 

5.

 

fílmico fantasmático cacos

de vidro piscando peixes solertes

na cisterna sombreada

ventas que parpadean farejando

vendetta

 

ciúmes signans funes o

fanopeuta com razão agora me lembra

ganho duro (: lamba)

 

este signo não é mais aquele

qualquer pessoa não é mais aquele

ninguém é signo de nada

entrudo

 

(Vá de Valha, 1992).

 

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