O Verbo usurpado

Wesley Correia

Reaver o Verbo usurpado,
moldá-lo
com mãos de poesia,
promovê-lo uterino
e no vinco do seu afeto mais íntimo
depositar a luz de teus resíduos.

Devassar o Verbo usurpado,
lamber-lhe a boca
de muitos mistérios,
mordê-lo no gozo
e a ele se fundir
como que a tecer liberdades.

Mirar o Verbo usurpado,
plantar na sua paisagem inóspita
um outro horizonte,
feito do revés do silêncio
de quando arrancaram tua língua.

Desanuviar o Verbo usurpado,
expulsá-lo da espessa garganta,
prenhe de desejos,
e contemplar a ranhura
que seus pés dançantes realizam
na roda do tempo.

Sangrar o coração do Verbo usurpado,
ser fluxo descontínuo
em suas entranhas,
ser dele o transe
e remover a sua tez opaca:
anoitecê-lo, salvá-lo.

   (In:
Laboratório de incertezas, p. 27-8)

 

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