A palavra em preto e branco

                                                      Lílian Paula Serra e Deus

 

Como se escreve a palavra preto?
À revelia da folha de papel em branco?
À revelia das muitas páginas em branco da história? História que não conta, história não contada, história que ‘desconta’ séculos e séculos de omissão?
 

Como se escreve a palavra negro?
Tinta preta sobre o papel branco?
Tinta branca sobre a pele negra?
Timbre claro sobre a voz de Anastácia amordaçada?
Tom escuro que resiste ao timbre branco?
Tom negro tingido de branco?
 

Quem descolore os fatos?
Para quê maquiar a história?
Quem desmancha a paleta?
Por que preterir a aquarela em nome de uma única cor?
 

Como se escreve a palavra preto?
Tinta preta que rasura a superfície branca?
Sobram tintas ou faltam cores?
 

Por quantos séculos?
Até que século?
Até que sequem as tintas?
Até que escorram as feridas?
 

Ferida em branco e preto?
Ferida em preto e branco?
Ferida sobre preto?

E depois?
Apartam-se as cores?
 

Quem sabe um dia a palavra em cores
e não mais em preto ou branco? 

                          (In: A palavra em preto e branco, p. 25-26)

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