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Vida: 1948

Carta à filha Abigail

 
 

B.H. 19.1.1948

 

Querida Abigail

acabo de ler sua carta que nos encheu de prazer. Henriqueta, achando-se aqui, na hora, também a leu. Lemos ainda a que você escreveu para Alaíde. Estou satisfeito de ver que a letra está cuidada sobretudo na primeira página. Também está sem erros. Assim, vai tudo muito bem. Na sua idade, eu era muito baixo de escrever uma carta bem escrita como a que me mandou. Com dois anos mais do que os que você tem agora, eu, indo para o Caraça, ainda escrevia 'dentiflicio' e outras coisas do mesmo jaez. Mas eu era caboclo do mato e só não perdia escola porque Maria Chaves me vigiava muito. Custou-me ficar um pouquinho civilizado. Se escrevo corretamente, só o consegui depois de muito esforço e muito exercício, principalmente depois que me fiz professor de português. - Só lhe peço, outra vez, que capriche na caligrafia. Aprenda aí com a tia e com as primas, enquanto é tempo. Ter letra bela é uma vantagem, máxime para ûa moça. Os homens costum ter letra feia e às vezes dão desculpas de que são intelectuais, de que são médicos, etc... mas ainda não vi nenhum gabar-se de ter letra inestética. Pergunte a tio Carlucho ou a tio João e Vera se não é verdade o que digo. Com o adiantamento que já tem, depois que você fizer a cultura inglesa, a cultura francesa e a cultura latina, certamente que vai ficar bem preparada, munida de uma sólida base para iniciar o curso ginasial. - Espero que já tenha visto, outra vez, o prof. Basílio de Magalhães e o dr. Ivã Lins. Peço-lhe que me recomende a ambos. - Também não entendi aquela história sôbre a rua Tomé de Sousa. D. Sinhá levara Sílvio e Maria para a rua Fernandes Tourinho. Foi a notícia que meu cérebro ordenou; mas a máquina de escrever, creio eu, nem sempre é muito obediente. Ou ela precisa de mais disciplina ou meu cérebro está carecendo de fósforo. Compreendeu? - Tudo vai bem aqui, felizmente. Alaíde está boa de todo, apenas sujeita ainda a um regime de repouso. Tem ficado no quarto, em cima. Diz ela, porém, que vai descer com muita disposição e vontade de trabalhar. - Estamos sem chuva há uns quatro dias. Mas o calor que faz prenuncia novas águas. Maria, Sílvio e José Carlos têm ido passar dia e até dormir na casa da avó. O álbum do cinqüentenário e o ioiô continuam na moda, para eles. José Carlos se queixa de que não tem passeado bastante. - Tenho dado aulas diárias, na Faculdade, movimentada com o curso de férias dos professores. No começo achei boa a novidade, mas tenho sentido que isto me preocupa e estraga um pouco as minhas férias. Dentro de 12 dias tenho de me apresentar no D. I. - Fiquei satisfeito (ficamos satisfeitos) com as notícias a respeito dos êxitos do dr. João no congresso de Poços. Transmita-lhe nossos cumprimentos. Espero que tio Felício, tia Maria e as primas estejam tendo a paciência necessária com a hóspede (que é você) - Mande noticias do tio Carlucho. - Abraços a todos. Para você um muito especial do

Lourenço.

 

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