Maciel Monteiro celebrizou-se com um soneto: "Formosa
qual pincel em tela fina..." Felix d'Arvers imortalizou-se
por outro soneto: "Ma vie a son secret, mon âme
a son mystère". E Francisco Andrieux (1759-1833)
tornou-se conhecido pela poesia "Le meunier Sans-Souci".
É a história do moleiro que vivia
em Potsdam, nos tempos de Frederico II, o Grande, filho do Rei-Sargento,
amigo de Voltaire e conquistador da Silésia. Vivia aquele
amigo do pão moendo seu trigo, vendendo sua farinha e tendo
sua felicidade. Chamavam-lhe o "Sem-Cuidados".
Um dia, Frederico II mandou construir o palácio
de "Sans-Souci, Potsdam" e precisou de desapropriar o
fazedor de farinha. Sem-Cuidados não queria desfazer-se
do que lhe pertencia. Foi levado à presença del rei.
O soberano instou com ele, prometeu, lisonjeou... inutilmente. Sem-Cuidados explicava:
"Sire, je ne peux pas vous vendre ma maison. Mon vieux pere y mourut. Mon fils y vient de naítre. C'est mon Potsdam à moi..." [1]
Então Frederico II, o filósofo, ameaçou-o de desapro priação sumária. Sem-Cuidados respondeu-lhe que isso não, porque havia juízes em Berlim.
"Vous... de prende mon moulin?
"Oui, si nous n'avions pas de juges à Berlin!" [2]
Nesta altura, Frederico II ficou admirado, sentiu-se
grande com a resposta e ordenou que o homem voltasse à paz
de seu moinho. Mas quem tal ordenou, diz Andrieux, havia sido
também o conquistador violento da Silésia:
"Ce sont des jeux de prince:
On respecte un
moulin, on vole une province!" [3]
Meu colega e amigo Juarez Brant chamou-me, um dia, a atenção para a diferença de tipo moral entre esse homem de Potsdam e o homem de hoje. Essa diferença é que vos quero focalizar, no estudo da hora inquieta que vivemos.
Reparai na firmeza do moleiro! Como está integrado
na sua vida! É uma planta sadia, que ali cresceu, ali tem
ambiente, ali forma um todo harmonioso com seu moinho.
O rei tenta-o de ofertas, mas ele recusa com segurança:
"Mon moulin est à moi
Tout aussi bien au moins que la Prusse est au roi." [4]
O soberano ameaça-o de esbulho, mas ele declara que apelará para a justiça de Berlim.
Imaginemos agora que fosse um moleiro de nossos dias... Acreditaria ele na justiça de Berlim? Estaria satisfeito no seu lugar? Resistiria ele às possibilidades, porventura elásticas, de uma oferta régia?
Muito provavelmente, não. Ao aceno de uma
oportunidade, ao ensejo de uma mudança, ele atenderia sofregamente.
E ainda estaria muito bem, se não se diminuísse um
pouco, se não desgastasse, na transação, o
próprio caráter...
Este é o grande sintoma da época:
a intranqüilidade, a insatisfação, alimentada
na profunda e coletiva dor que nos suplicia com um desequilíbrio
de dias amargos e um pressentimento de tempos ameaçadores.
Mas onde a causa de tais males? Onde a causa da
diferença entre o moleiro de Potsdam e algum moleiro de
hoje?
A resposta poderia resumir-se numa afirmação: anarquia subjetiva do homem moderno.
Desde que ele aboliu, de dentro de si, qualquer governo, excluindo a regência de uns tantos princípios essenciais à conduta humana, começou ele o trabalho de nosso desequilíbrio.
Iniciado nos fins da Idade Média, esse licenciamento moral do homem progrediu, avolumou-se, ao longo dos séculos: avassalou o século dezenove, traduziu-se em prática no século vinte.
Pensando que se ia desimpedindo de amarras incômodas
e inúteis, o homem estava preparando o enredamento, em que
vive, instigado de seus instintos mal sopitos, açulado
de suas ambições insatisfeitas, inquietado de seus
inconformismos permanentes.
No seu último livro - Introdução
ao direito moderno - Tristão de
Athayde delineia a trajetória desta pseudolibertação.
E fá-lo com aquela autoridade que lhe não podem
negar nem mesmo os negadores do catolicismo, porque Tristão
de Athayde é, sem contestação, o nosso mais
profundo e largo sociólogo atual.
Foi no século treze que se começou a forjar esta filosofia que, muito mais tarde, iria desagrilhoar o Prometeu que agora morre de fome, por aí, nos pontos mais civilizados do globo.
Ao voluntarismo legal de Duns Scot (1274-1308) e
ao nominalismo de Guilherme de Ockham (1298-1350) se filia nosso
relativismo jurídico.
De Guilherme de Ockham até nossos dias vem longo o caminho, demarcado de nomes como Lutero (1483-1546), Spinosa (1632-1677), Hobbes (1588-1679), Rousseau (1712- 1778), Kant (1724-1804) e o pleno florescimento do século dezenove.
Rousseau influiu insistentemente nas teorias sociais modernas. Kant foi o homem que pregou o domínio absoluto da razão subjetiva. Note bem quanta responsabilidade não deverá caber a tal teoria, nos distúrbios e desgraças que nos advieram! É o licenciamento subjetivo, a anarquia de alma do homem século vinte.
Depois de Kant e Rousseau, o século dezenove, "ce
stupide XIX e siècle". Durante ele é que a doutrina jurídica se derrama em teorias. É o idealismo jurídico de Schelling e Hegel. É a escolha histórica de Savigny, reduzindo a "história do direito à história do espírito nacional dos povos". É a escola positiva de Spencer e Ihering, reduzindo o direito a um "produto da evolução social da humanidade". É o negativismo jurídico de Fourier e Le Branc. É o economismo de Marx. Tudo se reduziu a direito. É o panteísmo jurídico de que fala Tristão de Athayde. É o materialismo jurídico, baseando o direito numa razão objetiva, absoluta e impessoal, que os alemães encarnaram no Estado...
E aqui estamos no comum da crise atual, crise humana, crise social, em que o Estado está precisando de todas as razões para vencer as massas descontroladas.
A nossa hora é a hora da força.
Os governos, ou são discricionários
e absolutos, como na Rússia, na Itália, na Alemanha
e nas infinitas ditaduras secundárias, por aí afora,
ou tendem para a ditadura, como nos Estados Unidos, ou vivem em
crises intermináveis, se são liberais, como na França
e na Inglaterra.
São as massas das nações, difíceis de coagir.
"As massas avançam", exclamava
Hegel, cheio de pressentimentos! E elas, agora, aí estão,
desbalisadas, desregidas de princípios comuns superiores,
sofredoras, instintivas, inquietas, oscilando, murmurando, engrossando,
ameaçando tragar as instituições!
Imaginai-vos junto ao mar, numa hora silenciosa e perdida da noite. Numa hora de mar grosso. Ouvi, então, o escachôo infindo das ondas, quebrando-se nos rochedos. E pensai no vai-vem das vagas instáveis, irritadas.
A hora atual das nações civilizadas é uma
hora de mar grosso. As multidões encapelam-se. Lembram-nos
o que diz Horácio, no livro segundo das Epístolas,
quando descreve o murmúrio pesado e profundo da populaça,
no circo, interrompendo uma representação clássica,
para exigir funâmbulos e saltimbancos: "Julgareis ouvir
mugindo as florestas do monte Gárgano ou as ondas do mar
Tirreno" - Garganum mugire putes nemus aut mare Tuscum.
Escutai bem e ouvireis. Ergue-se do seio das massas
este mesmo murmúrio de floresta. Uma floresta humana de
instintos, de ambições, de anseios imediatistas,
de exigências também humanas, porque as massas sofrem!
Foi o século dezenove quem gerou os dois fatores maiores da situação de agora:
(a) o democratismo, que nos assolou com uma "invasão vertical de bárbaros", na expressão de Rathenau;
(b) a civilização mecânica, posta à disposição da incerta e móvel democracia.
A Revolução Francesa destruiu a sociedade
rija, estanque, dos povos hierarquizados, para instalar, no lugar,
a sociedade instável, misturada, multitudinária,
de organização incerta, que nos trouxe aos nossos
inquietos dias de sofrimento e anseio.
Há um trecho de Pitirim Sorokim (citado por
T. de A), no livro Social Mobility, que extrema lucidamente
as conseqüências da nossa mobilidade social.
A mobilidade social, diz ele, facilita
a desmoralização,
enfraquece a rigidez de hábitos socialmente necessários,
solapa a ordem social, decresce a intimidade e intensidade
dos laços sociais, diminui a intimidade nas relações
com as coisas, pelo trabalho quotidiano, a fadiga da monotonia
e o desejo de se libertar dela.
Na sociedade imóvel, a rigidez facilita a
estabilidade. Cada indivíduo ocupa o próprio compartimento
social, a posição predestinada a ele, antes do nascimento.
Não procura trocá-la; não procura subir de
qualquer jeito. Não teme ser ultrapassado.
Na sociedade móvel, o indivíduo não
possui essa "psicologia da predestinação". É ambicioso.
Procura subir. Teme ser ultrapassado. Não tem paciência
nem alegria com a posição que ocupa. Se está embaixo,
quer subir, se está em cima, quer subir mais ainda ou teme
cair.
A vida, assim, é uma arrancada contra os obstáculos, não importando se isso leva ou não à desordem social.
Daí o aumento das tendências centrífugas, na sociedade atual. As lutas do indivíduo contra o indivíduo, dos grupos contra os grupos, as guerras, as revoluções, as desordens. É a história das sociedades modernas. Até aqui o autor de Social Mobility.
Ouvindo falar de "psicologia da predestinação", não vos lembrais, naturalmente, do moleiro de Potsdam? Ele ocupava calmamente o seu compartimento social. Não imaginaria que pudesse ser rei.
Ora, a teoria da igualdade, mal compreendida e mal
praticada, faria achar a qualquer moleiro de hoje, que tem direito
de ser rei. Em hipótese, muito bem. Mas ser rei exige umas
tantas qualidades, supõe uns tantos deveres...
E aqui está um grande mal do homem moderno: só faz questão de seus direitos. Esqueceu-se de seus deveres. As obrigações que cumpre estão adstritas às necessidades vitais dele ou às imposições de normas inevitáveis. Sua consciência não se alarga em princípios mais altos e em ideais mais sublimes, como são os nobres imperativos de conceitos que eram antes atendidos, intimamente, pelo comum dos homens.
Relembremos a diferença entre direito e moral, muito apreciada pelos incipientes em ciências jurídicas, nos primeiros dias da Academia. Tudo que é direito é também moral, mas nem tudo que a moral manda, manda também o direito. O campo do direito é mais restrito. Se representarmos ambos por dois círculos, o círculo do direito, menor, ficará inscrito no círculo da moral, maior.
Ora, a moral é de origem religiosa, tem fundamentos transcendentes. Mas desde que o homem moderno se desligou, praticamente, de uma regência extraterrena, desligando-se de Deus, deixou também de sentir incômodos ou preocupações morais, a não ser aquelas que lhe são provocadas pela ameaça ou possibilidade de uma sanção social. Subjetivamente, dos dois círculos, ele aboliu o maior. A moral já não brota de dentro dele, completa, de uma fonte segura de convicções, mas sim lhe chega, externamente, de um conjunto de imposições sociais, que ele vai progressivamente destruindo.
Há no direito, ainda, aquela divisão clássica em direito subjetivo e direito objetivo: faculdade de fazer e obrigação de fazer, facultas agendi, norma agendi. A norma é imposta pelas leis, exteriores ao homem. Entretanto, para a faculdade de fazer, há normas impostas pela moral, interiores do homem... E esta é a parte monstruosamente prejudicada, na alma moderna. Abolindo uns tantos princípios altos, milenarmente apontados pelas filosofias e pelas religiões, o homem de agora rege-se pelo imediatismo de seus interesses, de suas paixões; pelas normas do instinto, em vez de normas da moral.
Praticamente, ele só atende à norma
agendi, às leis objetivas, impostas pela força
do Estado ou pela força da sociedade. Mesmo contra estas,
porém, atua, intensa, na hora presente, a inquietação
das massas.
Massas, massas... já alguém estará indagando o que há no espírito destas massas.
Tomemos um homem da multidão, um homem-massa e vamos a um laboratório de psicologia dissecar-lhe a alma. Vai falar, porém, não eu e sim José Ortega y Gasset, em A rebelião das massas.
Até o ano de 1800, diz o pensador espanhol,
citando um dado estatístico de Werner Sombart, a Europa
jamais conseguira elevar sua população acima de 180
milhões de habitantes. Mas, de 1800 até 1904, o índice
atingiu 460 milhões! De sorte que, num século apenas,
o aumento foi de 280 milhões!
Diante disso, a ascensão demográfica
norte-americana é menos importante. Aliás, a América
encheu-se com o transbordamento europeu.
Atentai bem nessa vertiginosidade. Durante cem anos,
a Europa deitou sobre a história montões e montões
de homens, num ritmo tão acelerado que não era fácil
saturá-los da cultura tradicional. E as massas não
puderam ser educadas, mal aprendendo a técnica da vida moderna.
Receberam instrumentos para a vida intensa, mas não receberam
a sensibilidade para os grandes deveres históricos. O homem-massa
tem o orgulho e o poder dos meios modernos, mas não tem
o espírito que tais meios requerem. Vendo todos os confortos
que o rodeiam, pensa que tudo surgiu, naturalmente, para ele. Não
se lembra dos esforços pacientes que o progresso exigiu
da humanidade. Não
sente a responsabilidade de um patrimônio que nada lhe custou,
um patrimônio que ele encontrou "como encontramos o
sol no alto, sem que o tenhamos sobre os ombros". Tem a possibilidade
fácil de muitos desejos e como não o impede a delimitação,
atira-se às expansões deles. Acha que viver é abandonar-se
a si próprio, que nada "é peri goso, nada é impossível
e ninguém é superior a ninguém".
É o homem suficiente. Nada exige de si. Tudo
exige para si. Deita-se irrefreadamente ao gozo do conforto que
a técnica lhe fornece. Não tem cultura, mas crê-se
completo, capaz de opinar a respeito de tudo. Não admite
regências que não sejam da própria impulsividade.
Não admite normas e é um bárbaro,
porquanto barbaria é uma "ausência de normas". É,
enfim, um primitivo, no meio de um mundo civilizado.
Eu vos pergunto se não compreendereis melhor
a miséria
social do momento, após um exame do desequilíbrio
enorme que o século dezenove transmitiu ao século
vinte, com esse homem não educado, subjetivamente anárquico,
produzido em massa, e rodeado de uma civilização
material fecundíssima, capaz de um conforto nem mesmo imaginado
pelos antepassados.
O império romano findou por falta de técnica,
diz Ortega y Gasset. Desenvolveu-se tanto que seria necessária "uma
vasta convivência para a solução de certas
urgências materiais que só a técnica podia
encontrar". Involveu, retrocedeu, morreu.
Mas se então fracassou a técnica diante do homem, agora é o homem que fracassa diante da técnica, incapaz de emparelhar com o progresso da civilização.
Direis vós que, hoje, a vida é incomparavelmente mais civilizada, mais humana, mais liberal, mais rica de oportunidades, completamente viável para os homens íntegros, os homens virtuosos, os grandes homens, que ainda os há, bastantes, por toda a parte.
Eu vos responderei que nem tudo está perdido,
graças a Deus. Mas boa parte da harmonia social ainda existente é mera
aparência. No fundo, a moral social está inteiramente
minada, solapada, porque lhe falta a alma dos princípios
fortes e altos. Muita coisa é virtude do hábito; é efeito
do impulso milenar de convicções desaparecidas. Como
numa máquina de que se desligou a força propulsora,
mas que ainda conserva, por algum tempo, o movimento, até que
a inércia o paralise. Na máquina do esforço
para o bem, o que está, agora, atuando, não é uma
simples força de inércia, mas uma força de
reação, com o sôfrego imediatista de nossos
tempos.
Urna característica frisada no primitivo,
rio bárbaro, é o culto da força. Por isso,
as coletividades de hoje, as massas, agem pela força.
Tomai para exemplo a democracia norte-americana,
a qual conseguiu levantar, na outra parte do continente, uma civilização
espantosamente confortável, rica, próspera, exemplo
e imitação de outras civilizações atuais.
Ora, a civilização norte americana está eivada
de falacidade. Tem, na sua composição química,
alguns elementos que a envenenarão, assim que as reações
combinadoras neutralizem a eficiência de outros elementos.
E o mais perigoso deles é o culto da força.
Eu não teria autoridade para deitar semelhante
afirmação. Lede, porém, análises da
vida norte-americana, como a de Theodoro Dreiser, no seu livro
recente - A América trágica - ou como a
de Waldo Frank, no Redescobrimento da América, ou
como a de André Siegfried, em Os Estados Unidos de Hoje...
"Afirmo, diz Theodoro Dreiser, que os negócios,
na América, são e foram sempre regidos pela força.
Denuncio todo o sistema como completamente incapaz de enfrentar
as exigências presentes, como bárbaro demais para
o nível atual da sociedade organizada."
"A Potência, diz Waldo Frank, é um
deus para aquele que não admite nada fora de si. A Potência é aquilo
por que uma unidade individual se impõe ao mundo exterior.
Na economia da Potência, o que conta é a unidade individual;
o que deve subsistir antes de tudo é esta unidade. Tudo
o mais deve submeter-se ou desaparecer. A Potência é a
expressão do animal, do selvam, do menino, de todo ser
cuja consciência não se estende para além do
domínio da vontade pessoal."
"O homem que admite o primado da Potência
escraviza-se ao desejo pessoal. É vítima de sua tendência
bárbara a reger o mundo."
"No regime da Potência, unicamente existe a Potência. Poderosos edifícios, poderosas máquinas de poderosos partidos, poderosos bancos, poderosas prisões
e homens vazios."
Sabemos como o povo norte-americano é hígido
e capaz; como tem reservas de espírito cooperador; como
trabalha para se educar. Mas, na Norte-América, o que a
democracia conseguiu, no seu mais intenso esplendor, foi simplesmente
montar o "Sacro Império do Utilitarismo", segundo
uma expressão de José Enrique Rodó.
O que até agora nos proporcionou a democracia,
na sua "invasão vertical", foi isto: a inquietação.
A inquietação trepidante em que vive o homem atual,
provavelmente pequeno, insuficiente, deseducado, para uma civilização
material maravilhosa, da qual ele não sabe aproveitar-se,
dentro da qual ele se vê infeliz pela qual ele se bate desorientadamente
e com a qual ele se acha comprimido, no regime da força,
cujo culto ele criou.
Qual o remédio?
Não comportam os limites de meu trabalho a indicação de possíveis corretivos às desgraças dos tempos. Devem estes obter, no entanto, uma coisa simples de enunciar: a reeducação do homem; a reorganização subjetiva do indivíduo, animado de uma personalidade harmoniosa, governado por princípios de sentido sublime - como os eternos princípios que se ensinam na religião e na filosofia; um indivíduo que, desfascinado do liberalismo torto e desregrado de nosso romantismo político, seja capaz de uma cooperação orientada, medida e sábia, na construção de uma nova sociedade.
A nossa hora está cheia de bárbaros
que querem aposentar o espírito; de utilitaristas que querem
desacreditar o ideal. Ela está exigindo a revolução
da inteligência. Aos jovens cabe esta revolução.
A eles é que repito, terminando, as palavras de Rodó,
na exortação de Ariel:
"Falo-vos convicto de que sois os
predestinados a guiar os demais, nas lutas pelas causas
do espírito. A perseverança do vosso esforço
deve, pois, identificar-se, no vosso íntimo, com
a certeza do triunfo: não fraquejeis ao pregar o
evangelho da delicadeza aos citas, o evangelho da inteligência
aos beócios, o evangelho do desinteresse aos fenícios!"
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