A poética de protesto de Márcio Barbosa

Riverson A. Silva*

O que esperáveis que acontecesse,

Quando tirastes a mordaça que

tapava estas bocas negras?

Que vos entoariam louvores?

Jean-Paul Sartre

 

A literatura afro-brasileira, via de regra, transpassa os limites do imaginário e aborda a realidade no que diz respeito ao indivíduo negro. Não diferente, a obra de Marcio Barbosa é construída de ficção e de fatos extraídos do cotidiano, que mostram as dificuldades e lutas do povo de cor numa sociedade que ainda mantém resquícios de uma mentalidade presa ao século XIX.

Um dos principais escritores dos Cadernos Negros, Márcio Barbosa pontua sua escrita de forma engajada, transformando a temática racial em uma constante da sua obra. De uma forma politizada, aborda as tensões que acompanham os afro-descendentes, conscientes ou não da herança étnica e cultural proveniente dos antigos escravos e da dignidade que até hoje lhes é negada.

Em sua novela Paixões Crioulas, de 1987, o autor narra a história de um grupo de afro-brasileiros, que após uma semana marcada pela violência contra pessoas negras, resolvem se manifestar e denunciar a impunidade dos culpados e o descaso por parte de imprensa e das autoridades, que nada fizeram a respeito. Consideravam que a não-punição se dava pela falta de protesto contra tais ações violentas, tais como a discriminação de duas atletas por causa da cor, o assassinato de um homem a sangue frio em um bar, o fato de jovens serem barrados num single-club e o desaparecimento e assassinato de um operário.

Logo nos preparativos do protesto, o receio de se envolver e a discriminação social ficam evidentes, quando Glória das Tranças e Velho Benevides sofrem a recusa das gráficas em fazer os panfletos. Numa delas, o homem que os atende demonstra um misto de ignorância e preconceito, quando declara: “Olha, ‘morena’, nós podemos fazer isso, mas esse texto... nós achamos isso daqui meio racista...” (BARBOSA, 1987, p. 17).

A afirmação demonstra o desconhecimento do homem quanto aos direitos dos afro-descendentes, como se o clamor por justiça fosse uma forma de exaltar o indivíduo negro sobre as outras raças. Já o termo “morena”, comum em nosso falar cotidiano, se configura como forma de delicadeza hipócrita, que tenta ser “gentil” em não evidenciar o fato da personagem ser negra. Entretanto, sua cor em nada a ofendia e era por atitudes semelhantes que a levavam (e também os outros membros do grupo) a protestar contra tal visão, que endossa a crença de que a melanina seja um indicativo de defeito moral e físico.

O planejamento para a manifestação resultou em sucesso, já que três mil pessoas, envolvidas pelas palavras de ordem e dispostas a protestar, se apresentaram no dia. Contudo, estavam sob os olhares atentos dos policiais, que estavam no local mais para vigiar os manifestantes do que para protegê-los, já que a aglomeração de negros era vista, potencialmente, como uma ameaça à ordem estabelecida. Havia também a presença de políticos oportunistas, que agiam como se tudo aquilo fosse obra deles, não diferente dos muitos que se aproveitam das necessidades das minorias para angariar votos e boa imagem junto à sociedade.

Centrado na denúncia, o texto de Paixões crioulas alia os fatos que dão início à ação ao resgate de casos anteriores de racismo presentes na memória do narrador. Este lembra de Pacífico que, ainda criança e vivendo uma infância pobre, fica marcado pelo dia em que presenciou seu pai chegar em casa após ter sido expulso do clube em que jogava futebol, uma vez que não queriam jogadores negros. Relata também como Bélico Iorubano tentou, ingenuamente, seguir carreira como professor universitário.

 

Cinco anos antes, Bélico Iorubano começara a dar aulas numa Faculdade e teria uma carreira brilhante pela frente, pois era inteligente e ambicioso. Não acreditava que sua pele marrom fosse um sério empecilho. No entanto, aos vinte e nove anos, reformulava diariamente essa concepção. Haviam-se levantado obstáculos mesquinhos a sua volta, tramas dos colegas de profissão, ciúmes indefinidos, e houve até o caso de um Superior que lhe prometera uma promoção caso satisfizesse seu desejo de se deitar com um mulato. (BARBOSA, 1987, p. 18).

 

Dessa forma, além de demonstrar a condição cíclica do racismo, evidencia que não há distinção entre negros e mulatos diante de um pensamento que os aproxima pela discriminação. Apesar de terem também ascendência branca, estes últimos são identificados por suas características negróides, o que faz deles vítimas do mesmo preconceito destinado aos negros. Outro fator a ser ressaltado é a imagem sexista que paira sobre os afro-descendentes, principalmente as mulheres, reduzidas, desde os tempos de escravidão, a mera força de trabalho e a objeto sexual. A novidade do texto de Barbosa é esse olhar reducionista voltar-se também para o homem, o que mostra uma transformação frente ao discurso falocêntrico mais evidente na literatura brasileira.

Movido pelo ideal de justiça e igualdade racial, o personagem Pacífico se vê responsável por criar as bases de uma sociedade que passe a aceitar o negro de forma digna, considerando-o cidadão como qualquer outro. Com isso, sabe da importância do Grupo e de suas ações, verdadeiras sementes para o tempo futuro, onde via inserido seu filho, com quem não queria ficar em dívida.

Sabendo que essa luta pela dignidade parte da conscientização do povo negro, Barbosa introduz o personagem Kiluanji, que se constitui como uma alegoria de reconhecimento e aquisição da consciência, de passar do “somente ser” para o “sentir-se negro”. O rapaz se encontra com os membros do Grupo durante a manifestação e encanta-se com Nailá, irmã de uma das organizadoras:

 

Kiluanji não sabia. Ao primeiro olhar, achou-a estranha. Não estava acostumado com aquela beleza extremamente escura. Mas, no mesmo instante, foi derrotado. E viu ser necessário reaprender a olhar, e olhar Nailá muitas vezes para reaprender seu fascínio. (BARBOSA, 1987, p. 35).

A descoberta da beleza negra faz com que o personagem tenha que reeducar sua percepção, desprendendo-se da estética hegemônica, fundada no padrão branco. Com isso, o jovem se descobre não apenas como afro-descendente, mas também como possuidor de uma história que até então desconhecia. É quando resolve frequentar a biblioteca para ler sobre o seu povo, para lá encontrar, dentro e fora dos livros, a elementos que demonstram a realidade do negro no país:

 

Na Biblioteca, os funcionários do atendimento, com a assiduidade daquele crioulo barbudo, mas com jeito de moleque, passaram a tratá-lo mal. Pareciam assumir uma autoridade que permitia a eles barrá-lo. E Kiluanji foi notando uma divisão interessante. Os funcionários do atendimento eram bem claros e, à medida que o serviço tornava-se mais escondido e braçal, à medida que se aprofundava no interior da Biblioteca, em seus trabalhos menos evidentes e mais pesados, os funcionários iam escurecendo. (BARBOSA, 1987 p. 35).

 

A cena cumpre o papel de denunciar a condição afro-descendente na sociedade brasileira e as oportunidades precárias que são dadas aos negros. Kiluanji estuda a vida sob a escravidão ao mesmo tempo em que sofre na pele os seus resquícios. Constata a importância dos antepassados na construção do país, e, também, o estigma do trabalho forçado estendendo-se até a marginalização e o pouco reconhecimento existentes no presente. A partir desse doloroso aprendizado, Kiluanji se destaca nas discussões e ganha a admiração de Pacífico durante um Congresso.

Ao fim de tal evento, um fato inusitado ocorre. Uma loja tem a vidraça quebrada e imediatamente surgem acusadores que imputam a culpa aos militantes, afirmando que aquilo seria uma tentativa de roubo, mesmo sem terem certeza de quem teria sido a autoria do ato. Após agredirem Pacífico, pedaços de madeira caem apodrecidos, o que mostrava a condição de abandono em que se encontrava o lugar. Entretanto, fica evidente a predisposição de ver o negro como uma pessoa de má índole, sempre pronto a cometer algum crime, já que é desprovido de civilidade e apto à violência e ao desrespeito.

À medida que intensifica suas reuniões, o grupo amplia as diferenças entre seus líderes. Pacífico se interessa pelos congressos e discursos de conscientização, já Bélico Iorubano considera a via política e a ligação partidária como forma de combate. Com o tempo, as atividades diminuem e o que pode parecer o fracasso de um ideal, segue como o início de uma luta por uma causa mais ampla, já que a conscientização fora iniciada.

Barbosa também faz uso do fantástico, que indica desde o caráter de uma pessoa a uma possível afinidade amorosa entre os personagens. Além disso, inicia as três partes da narrativa destacando no título o termo “Laroiê” – conhecida saudação a Exu, palavra advinda do iorubá Laróyè, que é também um dos nomes de Exu – e essa ênfase revela uma estratégia textual, podendo funcionar também como invocação, não apenas saudação. E, ao longo do texto, o autor faz emergir todo um universo paralelo que interfere no sentido das ações narradas: luzes coloridas, aromas e outros elementos de um mundo invisível que se torna presente. Exemplo disso são as sombras estranhas que acompanham algumas pessoas durante a narrativa. Uma dessas persegue Mike e seria, supostamente, de Macarrão, amigo assassinado que estaria clamando por vingança. Outra surge em proteção de Kiluanji durante uma visão:

 

Era alongada e de cada lado saíam seis dúzias de braços. Segurava o que parecia serem revólveres e exala uma fumaça verde. O corpo franzino da sombra começou a deslocar-se e estendeu uma das armas a Kiluanji. Um homem veio andando na direção deles. A sombra esperou-o chegar perto e atirou. O homem caiu sangrando. Mais dois homens apareceram e a sombra os matou. (BARBOSA, 1987, p. 76).

 

No sonho de Kiluanji, a figuração das centenas de braços remete tanto ao sentido de proteção, como também, pode ser interpretada como um incentivo à luta, a se comprometer com o coletivo, com a união dos que tinham a dignidade negada e viviam sem perspectivas ou esperanças, restando apenas a marginalidade de quem foi criado sem rumo certo. Ao final, o personagem acorda mas não esquece a visão. E afirma seu compromisso de permanecer no Grupo: “deveria continuar pela simples consciência do dever, e aqueles sentimentos davam-lhe a certeza de poder fazê-lo” (BARBOSA, 1987, p. 76).

Seguindo sua poética de protesto, a autor constrói seus contos a partir de elementos afro-descendentes que se chocam com o preconceito étnico compartilhado pelo o senso comum. Em “Espelho”, publicado nos Cadernos Negros 16, Barbosa combate a mentalidade hegemônica que adota como belo apenas o padrão estético branco. Conta a história de uma pequena garota negra, que sonha em ser modelo e vive o devaneio de receber visitas do seu galã de TV preferido. Porém, certo dia sua mãe a surpreende desfilando pela casa e se irrita pelo que vê. Afirma que trabalhar de verdade e ter um bom casamento seria a única garantia de futuro para a menina.

 

– Não pode! – a mãe gritou. Tentou explicar que precisaria trabalhar em alguma coisa séria. Além do mais estava tudo tão caro: comida, roupas, aluguel, remédios do pai. Como iria sustentá-la? Não, não podia. A mãe só rezava para que ela fizesse um bom casamento, um casamento digno. Com um branco, ia dizer, talvez, quando o rosto da vizinha aproximou-se, amarelado e arredondado... (BARBOSA, 1993, p. 71).

 

A falta de perspectiva da mãe faz com que ela acredite na possibilidade de ascensão social para a filha, apenas por meio de casamento com um homem branco. Este pensamento denuncia a forma subserviente de seu pensamento, pois a personagem descrê não somente na probabilidade de mudança de condição social, mas na capacidade dos homens de sua própria cor. Consciente das poucas oportunidades que desfrutam os negros, ela acredita que é mais cômodo ter a pele clara ou se ligar a alguém que a tenha.

Em seguida, a amiga recém chegada, elogia a pequena sonhadora, ressaltando que ela não tinha o cabelo “tão ruim” e que seu nariz era “bonitinho”, contrapondo-o com o do seu irmão, grande e feio. Dessa forma, a visitante faz uma tentativa de “consolar” a garotinha, encontrando traços em seu rosto que fugiam às feições características dos afro-descendentes, como se tivesse conseguido perceber elementos de brancura, mesmo na pele escura. Isso parte de uma falsa piedade, que insiste em maquiar as características faciais dos negros, como se fosse uma espécie de cura para um defeito físico, ou um modo de ajudar a carregar o “duro fardo” de ser afro-brasileiro, uma vez que o preconceito estigmatiza a fisionomia.

Magoada, a menina rasga o retrato da figura loura, semelhante a uma apresentadora de TV, pregada no espelho do guarda-roupa. Abatida, ela se desfaz do ideal de uma estética branca que a televisão havia ensinado a desejar. Desconstrói seu modelo de beleza, que nada mais era do que a forma com que se via. À medida que estilhaça a foto, a personagem se liberta e passa a se enxergar negra como de fato era. Nesse momento, o irmão, que antes ria dos seus devaneios, se envergonha de sua atitude debochada e é tomado por um sentimento de solidariedade e de pertencimento identitário, e compartilha com ela a capacidade de sonhar e de descobrir a beleza em sua própria cor.

 

– Eu gosto do seu cabelo, do seu nariz... e sua pele é bonita.

– Mas não tem modelo preta na TV.

Ela não entendia porque o mundo lhes negava espaços para desejos.

– Então vai ter você!

(BARBOSA, 1993, p. 73).

 

A voz de incentivo reabre as possibilidades de sonho para a garotinha, entusiasmada num misto de ingenuidade e esperança, porém desta vez consciente da sua própria beleza e de quem ela realmente era.

Em outro conto, “O odu caiu bom”, o autor narra o relacionamento entre Luis Fobeda e Guatumbé, seu patrão e futuro sogro. Numa espécie de paternalismo moderno, o jovem negro é cobrado pelo empresário por ter lhe dado emprego e ainda por cima pagar seus estudos, numa atitude clara de quem se sente no direito de exigir a submissão do outro. O discurso que apontava a ingratidão do jovem toma maior abrangência e passa a se destinar a todos os negros quando Raquel, filha de Guatumbé, entra na conversa e reproduz um discurso típico dos senhores de escravos do século XIX.

 

– Admiro mesmo os negros. Pela cor e pelo ritmo. E essa energia... Pena que sejam tão impulsivos! E tão espontâneos! São mesmo muito naturais, muito animais. Macacos? Não! Panteras, talvez... Selvagens, brutos! Que seria de vocês se não fossemos nós? Ensinamo-lhes a falar, tiramo-lhes do seu mundo bárbaro e amparamo-lhes. Demo-lhes casa e comida, ensinamo-lhes o mundo civilizado. É verdade que às custas de uns pequenos sacrifícios... E depois? Depois demos-lhe todas, todas as oportunidades. Ah meu negro, meu negro! Quão bons fomos! Quão compreensivos e caridosos! E em troca recebemos a revolta, o desprezo, a mão que mata pelas costas, o ódio atirado no rosto. E agora, eis-nos aqui a carregar esse fardo... (BARBOSA ,1983 p. 35).

 

As afirmações da personagem remetem à inversão de sentidos e valores no que diz respeito à história do negro no Brasil. A referência ao trabalho de amparo, assistência e ensinamento que teria beneficiado os afro-brasileiros ganha um relevo fortemente irônico se confrontada com a diáspora e escravização dos que foram trazidos para servirem de mão-de-obra gratuita para os grandes proprietários de terra. Os “pequenos sacrifícios” aos quais a personagem se refere, à luz dos fatos históricos, revelam novamente os procedimentos irônicos adotados no conto, já que o cativeiro, a chibata, o estupro, a mutilação e a perda de sua identidade nada tiveram de “pequenos”.

Ao ouvir o discurso de Raquel, seu interlocutor é tomado de indignação. Luís afirma não estar mais iludido com a reconstrução, evidenciando ideais comunitários que confrontavam com o caráter capitalista do empresário racista e de sua filha. Contudo, o jovem, por mais que estivesse determinado, retrocede ao ver seu progenitor, Pai Francisco ser agredido por Guatumé. Com a volta daquele que considerava ser um “negro de valor”, o industriário oferece uma festa para o moço afro-brasileiro. Dentre os convidados, estava Moacir Muqueque, político negro que pregava a “individualização para o progresso” e a miscigenação.

 

Cada negro de bem deveria isolar-se do restante da plebe de marginais e entregar-se ao estudo e ao trabalho exaustivos. Pregava ainda a miscigenação como única forma de ascensão social. (BARBOSA, 1983, p. 36).

 

Neste fragmento, Barbosa se posiciona contra os negros que, ao invés de fortalecerem a luta por direitos dos afro-descendentes, optam por permanecerem sob o jugo da classe dominante. Pela ótica política, os movimentos que buscam igualdade racial são considerados subversivos; e os desfavorecidos, marginais e preguiçosos por natureza. Além disso, a defesa da miscigenação configura-se em uma traição ao seu próprio povo, por considerar sua cor como um empecilho incontornável para a ascensão do afro-descendente, o que remete ao apagamento da “mancha negra” de que fala Cuti.

 

No Brasil, a escravização ganhou, no período abolicionista e subseqüente, a expressão “mancha negra”, que era preciso ser apagar. Não é mera coincidência que o contingente escravizado fosse denominado pelo mesmo adjetivo “negro”. (CUTI, 2002, p. 20).

 

A mesma mancha citada por Luiz Cuti, que necessitava ser apagada pelo branqueamento no século XIX, ainda incomoda àqueles que sonham com um país mais claro, não apenas na cor da pele, mas também na cultura. Dessa forma, estes se envergonham da escravidão não pelas atrocidades cometidas pelos antepassados, mas pelo fato de o Brasil ser, visivelmente, um país construído a partir da grande influência africana.

No entanto, para surpresa de todos, durante um espetáculo, Exu se manifesta no evento infringindo a moral e os costumes hipócritas dos que estavam presentes comemorando a volta do rapaz negro que se desviara do bom caminho. O orixá não apenas afronta Guatumé, mas também age em defesa de Luís.

 

– Ô exu, exu, ô!

Agora que tenho lhe encontrado, nunca mais a vergonha

a cabeça baixa, o gesto dócil do sim sinhô!

Nunca mais o desespero, os tiros, os cães. Nunca mais o medo ô!

E que mil vezes me matem, mil vezes renascerei!

E mais mil vezes me matem, outras mil renascerei!

O ô exu, exu ô! Agora que tenho lhe encontrado.

(BARBOSA, 1983, p. 38).

 

A aparição do orixá da transformação e transgressão, equivocadamente interpretado como um demônio, marca o momento de libertação de Luís Fobeda, que se fortalece nas palavras de Exu e rompe as correntes do medo e da submissão, que conformam a mentalidade cativa. Assim como uma de suas características, a divindade afro-brasileira abre os caminhos para a “alforria” completa e definitiva do rapaz.

Dessa forma, Márcio Barbosa resgata a necessidade de dignidade e de direitos do afro-brasileiro, valorizando a luta e organização dos negros que, uma vez conscientes de sua cultura, estética e valores, passam da condição de subordinados para se reconhecerem como donos do seu próprio futuro. A inserção de nomes de origem africana evidencia a ligação de sua literatura com as raízes do continente ancestral. O autor também não negocia em sua obra com posicionamentos diluídos que primam por um bem-estar ilusório entre um ideal de reconstrução do indivíduo afro-descendente e uma visão preconceituosa, que não se admite, mas continua operante.

 

Referências

BARBOSA, Márcio. Paixões Crioulas. São Paulo: Quilombhoje, 1987.

BARBOSA, Márcio. “O odu caiu bom” In: Cadernos Negros 6: contos. São Paulo: Quilombhoje, 1983.

BARBOSA, Márcio. “Espelho” In: Cadernos Negros 16: contos. São Paulo: Quilombhoje, 1993.

CUTI, Luiz. “O leitor e o texto afro-brasileiro” In: Poéticas afro-brasileiras. Belo Horizonte: Mazza, 2002.

* Graduando em Letras pela Universidade Federal de Minas Gerais.

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