ANAIS DO SIMPÓSIO


Victor Hugo: a face oculta de um gênio

Maria do Carmo M. Schneider
UFES

Provavelmente nenhum outro escritor obteve de seus contemporâneos o reconhecimento de seu talento como Victor Hugo. Ao longo de toda sua existência de quase um século, o poeta nacional francês recebeu títulos e distinções que ninguém recebeu. Este grande escritor, por seu talento, deixou de ser cidadão francês para tornar-se cidadão do mundo, uma vez que sua obra literária, suas palavras no campo da política, seus pensamentos e suas idéias filosóficas, seu ardente devotamento às causas sociais influenciaram o mundo inteiro e beneficiaram de uma maneira singular a todos os povos.

Este trabalho não tem a finalidade de descrever a vida e a obra de Victor Hugo. Inúmeras biografias, realizadas por historiadores de distintas nacionalidades, já traçaram seu perfil de gênio. Nosso propósito é apresentar o escritor como um dos precursores do espiritismo na França e no mundo, prendendo-nos ao relato de seus primeiros contatos com os postulados espíritas e as manifestações mediúnicas através das mesas girantes (ou falantes) que começavam a ser utilizadas em Paris.

Desde que ele se inteira dos princípios espíritas, torna-se um de seus mais ardentes defensores como teremos oportunidade de provar neste trabalho.

O exílio e a experiência espírita de Victor Hugo

O início da experiência espírita de Victor Hugo data de 1853. Após o golpe de estado de Napoleão III, em 2 de dezembro de 1851, Hugo se exila em Jersey, pequena ilha situada entre a Inglaterra e a França, em 5 de agosto de 1852, acompanhado de sua família e onde o acolheram Augusto Vacquerie e numerosos proscritos. Lá foram vividos os primeiros anos do exílio.

Em setembro de 1853, Delphine de Girardin, em visita a Jersey por alguns dias, iniciou Victor Hugo na experiência da consulta às mesas girantes, prática muito em voga à época, que atestava a comunicação entre os supostos mortos e os vivos, sobre a terra, revelando um novo mundo de conhecimentos até então pouco conhecidos dos homens.

As longas sessões de espiritismo se sucederam durante dois anos, até que em outubro de 1855 terminaram. Os processo verbais das mesas falantes permitiram estranhos diálogos com diferentes personagens dentre os quais se destacavam Joana D’Arc, Maquiavel, Rousseau, Marat, Molière, Shakespeare, Galileu, Ésquilo e muitos outros. Hugo abraçou o espiritismo talvez em conseqüência do sofrimento causado pela perda de sua filha, Leopoldina, afogada em um acidente no rio Sena, juntamente com o marido.

A partir das primeiras reuniões ele tornou-se obsedado pelo sobrenatural: mesas girantes, sonhos, insônia, ruídos de pancadas e outros fenômenos registrados em seus cadernos de notas particulares arquivados hoje na Biblioteca Nacional da França. Mme de Girardin consultava os mortos e comunicava-se com o mundo invisível graças às mesas girantes (ou falantes). Foi por ocasião da primeira reunião mediúnica organizada por Mme de Girardin em Marine-Terrace, que Victor Hugo acreditou penetrar nos segredos das forças obscuras, quando, interrogando as mesas falantes, o primeiro espírito que se apresentou foi o de Leopoldina, sua filha morta em um naufrágio com seu marido, irmão de Augusto Vacquerie, médium e secretário das reuniões de espiritismo.

Mme de Girardin retornou à Paris, onde morreu dois anos mais tarde, mas sua partida não interrompeu as experiências uma vez que ela enviou de Paris duas mesas girantes que permitiram o desenvolvimento das experiências que se seguiram.

As experiências mediúnicas continuaram em Marine-Terrace até o fim de 1855; as atas dessas reuniões, escritas em cadernos, teriam constituído numerosos volumes se tivessem sido impressos. Gustave Simon publica, em 1923, setenta atas dessas reuniões (extratos) com o título Chez Victor Hugo. Les tables tournantes de Jersey.

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