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VÔO TRANSVERSO – poesia, modernidade e fim do século XX,
de Maria Esther Maciel (Rio de Janeiro: Editora Sette Letras, 1999) ORELHA: PREFÁCIO: RESENHA: Eduardo Szklarz
_____________________________________ Eneida Maria de Souza
Por acreditar ser a poesia, ao longo de todos os tempos, “uma voz interrogante”, ao despertar no leitor o sentimento de inquietação e o exercício de uma linguagem que foge aos parâmetros estereotipados da mídia, Maria Esther Maciel se inscreve na linhagem crítico-teórica de Octavio Paz, de cuja poética é conhecedora. De seus parceiros nacionais, Haroldo de Campos é um dos interlocutores, não só pela reconhecida importância no meio acadêmico, mas pela posição ímpar que ocupa na crítica e na literatura brasileiras, ao ser o responsável pelo direcionamento poético conferido à poesia neovanguardista da atualidade. No campo da literatura estrangeira, Fernando Pessoa, Sor Juana Inés de la Cruz e Mallarmé compõem o elenco de autores que, com precisão, elegância e sensibilidade, são visitados pela ensaísta no seu trajeto crítico. Dentre os brasileiros, merece destaque a análise da visão alegórica da cidade criada pelo nosso Augusto dos Anjos ou da atitude atópica assumida pelo poeta mineiro Altino Caixeta de Castro diante da linguagem, poesia que exige ‘uma leitura de gozo, capaz também de recriá-la, preservá-la em mobilidade”.
Mas a graça e o talento de Maria Esther se encontram com os da poeta, ao
fechar-abrir o Vôo transverso com a instigante e fingida entrevista realizada
com o professor dinamarquês Lars Olsen, tradutor e estudioso de Borges e
Kierkegaard. À maneira das artimanhas ficcionais do escritor argentino,
constrói-se o novo para logo em seguida desmontá-lo, pois o procedimento
burlesco e artificioso da literatura impele o movimento repetitivo dos temas
e exige a leitura igualmente desconstrutora da tradição. ___________________________________ VÔO TRANSVERSO: DO VERSO AO UNIVERSO (Prefácio)
Donaldo
Schüler
Prefácios, notas preliminares...Tenho dúvidas quanto a. Abrem caminhos? Deploro os caminhos que deixam de abrir. Há autores que desprezam títulos. O título assegura autoridade sobre o texto. Ora, o texto tem sua própria dignidade. Sabe o que diz. Como suportaria o peso de um título? Pois o prefácio tem a pretensão de ser um título ampliado. O motivo que levou Joyce a desprezar títulos foi este. Rosa no Grande Sertão também. Veja os títulos de jornal. Leitores ocupados se bastam com as manchetes e algumas palavrinhas mais. Há os que vão ao diário para matar o tempo. Matar o tempo... é uma forma de suicídio socialmente aceitável. Se você dá com um pacato leitor de jornal, sabe que ele não tem nada a fazer. Lembrado de Machado, eu poderia recomendar que você salte estas páginas de vestíbulo e vá direto ao texto. É o que de mais inteligente no momento me ocorre. Supanhamos
que você não queira saltar. Nesse caso eu o convido a acompanhar-me. Você me
presta um favor. Sua companhia me livra desse intolerável sentimento de
abandono. Em vez de prefaciar, vamos conversar com Maria Esther. Conversa de
amigos, nada de muito sério. Sugiro que comecemos pelo título. Conhecendo
o perigo dos sobrescritos, Maria Esther oferece um título vago. Vôo
transverso nos faz voar. “Transverso”diz mais que a palavra dicionarizada.
Transverso lembra transgressão. Do quê? Do verso! Maria Esther sai do verso
para entrar no universo da prosa. Ouço você argumentar que como universo a
prosa ainda é verso, no que lhe dou inteira razão. Poderíamos dizer, então,
que só há verso – idéia que não pode ser abandonada sem exame. Fiquemos por
aqui. Isso já é matéria para outros vôos. Fiquemos no Vôo transverso. Você
sugere a possibilidade de estabelecer relação de “vôo” com o que Maria Esther
diz sobre ironia romântica, que abre distância para criticar. De fato, o
“vôo”deixa a terra longe. Vôo e fluir não é a mesma coisa. O fluir é, desde
Heráclito, a própria existência. O vôo por se distanciar é mais e menos. Vou
lembra pena, lembra voar pelo papel. Vôo é menos do que vida porque lhe falta
o sangue que flui nas feias, é mais do que sague por que dura na tinta. Não
estamos autoridazados a dizer que seja perpétua, mas resiste à corrosão de
séculos, de milênios. Veja vem, a ironia crítica que Maria Esther analisa se
alimenta de tinta. Com a ironia crítica, Maria Esther nos faz entender a
Modernidade. Não toda a eternidade, um pedaço dela, ela insiste em
Kierkegaard, mas começa antes, no século XVIII. Há quem diga que devemos
procurar as raízes da Modernidade no século XVIII, quando surgem as primeiras
universidades. A universidade foi crítica desde suas origens. E não faltou
ironia. Você se lembra de Boccaccio. Seja! A partir do século XVIII a irononia
se acelera. Vem o romantismo. Vêm Baudelaire, Mallarmé, Joyce? E com a
revolução romântica vêm o fragmento, o inacabado, o grotesco, o disforme...
Quando é que deixaremos de ser românticos. Parece que o romantismo é doença
incurável. Com
a ironia romântica já estamos na poética da lucidez. Isso soa a novidade. Os
leitores de Platão sabem que para o autor da República, ébrios, estão longe
da luz. Ele os degrada a imitadores de sobras. Aos poetas opunham-se os
filósofos. Estes ainda não eram iluminados, mas buscavam a luz, busca sem
fim, porque a luz não brilhava no âmbito de sua experiência. Quando é que a
poética se tornou lúcida? Com a
falência das essências, uma das marcas da modernidade. Poesia e filosofia
selaram pacto de amizade. Pensadoresfazem textos poéticos: Nietzsche,
Heidegger, Foucault...Poetas refletem enquanto poetas: Mallarmé, Drummond,
Cabral. Octavio Paz não pára de refletir quando faz poesia. O que é lucidez?
É, paradoxalmente, a visão das sombras. Hoje, fora da caverna, não há nada. Maria
Esther coloca em epígrafe a serpente que devora a cauda que se regenera,
uroboro, processo sem princípio nem fim, o eterno retorno teorizado por Vico
e Nietzsche. E
a história? História conflita com eternidade. Ou a poesia é histórica e
perece com o momento que a produziu, ou ela é eterna, de todos os tempos. Há
outra solução. Ainda que seja histórica, ela se desprende da história para
falar a leituores de outras époicas. Esta é a posição de Maria Esther via
Paz. Poderíamos relacioná-la com uroboro. Quando devorada ela se regenera,
renascendo diferente do que foi. Inclua-se esta observação no capítulo da
antropofagia. E
somos levados à periferia, a nossa e a de outros. Periferia é conceito
periclitante? É. Como insistitir em periferia, no momento da proliferação de
novos centros e no enfraquecimento dos que polarizavam o mundo? Mas o
descentramento é um processo que a modernidade apenas esboçou. Centro e
periferia entram no jogo de espelhos. O centro é necessariamente afetado
pelas periferias que gera. Vôo
transverso está entre os livros que fazem pensar. O ensaio realiza o que
promete: a crítica como espelho da poesia, o texto, significativo em dado
momento, a falar em outros contextos. Do verso alçamos vôos rumo ao universo.
O vôo vertiginoso da alma de Sor Juana se faz textual na prosa de Maria
Esther. ____________________________________
o espaço da poesia no final do
milênio
EDUARDO SZKlARZ Num
momento em que o consumo
é a medida de todas as coisas, o território da poesia parece cada vez mais
reduzido. Mas em vez de transformar os versos em tl'ineheiras' de-1Julto ao
passado, o interessante é fazê-Ios veículos de uma visão crítica sobre sua
própria identidade e seu tempo, como mostra a professora de literatura e
escritora Maria Esther Maciel em "Vôo Transverso - Poesia, Modernidade
e Fim do Século XX" (Sette Letras e Fale/UFMG). A obra que será lançada
hoje, às 19h30min, na Livraria Ouvidor Savassi, reúne textos publicados entre
1994 e 98 em livros, jornais e revistas. Anunciada pelos românticos,
junção entre criação poética e reflexão crítica confirmou-se a partir de
Baudelaire, tornandose uma prática bastante disseminada no início deste
século. "Hoje, muitos desses poetas-críticos estão nas universidades, e
essa aliança criação-reflexão continua, só que já não mais com aquela
intensidade moderna", diz Maria Esther. Ela lembra que durante algum
tempo e até mesmo por efeito das vanguardas e dos valores que nortearam a
modernidade - alguns poetas levaram essa prática crítica às últimas
conseqüências. "Neste final de milênio, eles estão atentando mais para
outros aspectos da criação, como a intuição", ressalta. A autora observa que o poeta
sempre teve uma ligação contraditória em relação à sua época. O avanço da
revolução tecnoló gica, por exemplo, gerou uma função marcadamente utilitária
atitude dúbia: se por um lado os autores buscaram reforçar a autonomia dos
poemas diante da realidade,
por outro passaram a incorporar os recursos que a própria tecnologia
oferece. “O contexto
atual da poesia está marcado pela presença efetiva dos meios de comunicação e
do consumismo – e é em relação a isso que o poeta se detabe”, explica a
escritora. Maria Esther reconhece que é inevitávél
que a poesia, como qualquer outra arte, sofra processo de mercantilização.
"O poeta
depende das editoras e da midia para se fazer conhecido", justifica.
"No entanto, é necessário saber aproveitar isso tudo de forma
criativa." Ela sustenta que a poesia sempre foi uma prática
marginalizada, já que não tem função marcadamente utilitária e pragmática. No
entanto, salienta que os poetas sempre foram importantes para
constituição dos
povos. Basta lembrar de Homero, Camões, Pessoa, Drummond e Borges, só para
citar alguns. "Como disse Octavio Paz, as socidades decaem e a poesia
permanece", revela.
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