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DOS HAVERES DO CORPO, de Maria Esther Maciel (Belo Horizonte: Editora Terra, 1985)
Resenhas Dizeres Críticos Manoel Lobato ________________________________________________ DOS HAVERES POÉTICOS DE MARIA ESTHER MACIEL Altino Caixeta de Castro
É nos poetas que os críticos
aprendem a crítica. O poeta cria um idioma através de idioletos líricos;
inventa uma linguagem outra, porque rara, a partir do uso criativo da
linguagem comum; reinaugura, revitaliza as palavras que estão adormecidas nos
dicionários. Lança o leitor desprevenido no lúdico e no insólito. Maria Esther Maciel possui seu jogo próprio de armar e amar o poema. Ora ousada, ora com uma timidez elegante de menina, lembra Jean Cocteau: “poesia: o simples fato de enunciar seu nome assusta-a.” Também comparo sua poesia àquela planta sensitiva chamada “maria-fecha-a-porta”. Basta aproximar-se dela para que, pudica, se recolha em seus recessos de tropismo. Mas Maria Esther não será para sempre uma “maria-fecha-a-porta”. Seu tropismo lingüístico permite uma aproximação mínima para a contemplação dos seus mistérios. Maria Esther nasce o poema do nada? Não. Nasce o poema de suas vivências violentas, de seus abismos. Mas para que assustá-la ou assustar o poema que nasce ou que mora nela? A poetisa, em seu livro Dos haveres do corpo, põe, compõe, antepõe, propõe sua armadilha de tropos como certa de reter ou libertar o canto. Sabemos pouco, sabemos que essa armação da palavra compromete conotações de verossimilhanças com as lutas lúdicas do dizer-desdizer.
Sua mensagem lírica já nascera
existencial, apesar dos Sartre e dos Heidegger. Agora, ainda jovem, fazendo
seu curso de Letras, amadurece quase de vez. Transborda o tanque de seu
quintal mineiro. Salta para as águas salgadas do alto mar. Agora na rota dos
espadartes e dos tubarões das letras. Vale lembrar ainda um tropo quase permanente e profundo na lírica desta jovem poetisa. Maria Esther safa o poema sob o signo erótico. Ela se encanta em produzir o poema sublimado pelo simbolismo erótico, amorizando as palavras. Seu poema é pulsional e tenso. Dá emoção ao homem. Dá um frenesi safado ás mulheres, provoca a fala dos deuses.
Suplemento Cultura
A
poesia dos jovens
Almeida Fischer Um livro de estréia de
poeta jovem é sempre uma esperança, que se robustece ou se anula, à leitura
de suas primeiras páginas, não tanto por seu conteúdo, quase sempre semelhante,
mas por sua linguagem, realmente poética ou prosaica, esta bem mais
freqüente. Os jovens de nossos dias, influenciados pelos instrumentos de
comunicação direta, correm o risco de transformar o poema em simples recados
prosaicos, que poderiam ser transmitidos por telefone, carta ou cabograma,
com maior economia de tempo e dinheiro. É natural, nos poemas dos
jovens, que a temática gire em
torno do amor e do sexo, pois seu mundo não vai muito além disso. Dentro
dessa limitação de conhecimento e experiência, muito poucos conhecem alguma
coisa de arte poética. Assim, quando encontramos, no livro inaugural de um
jovem, no primeiro poema, versos como estes: “Teu corpo: / um porto/ que
eterniza / meus navios / um parto / que traduz / o meu avesso / a parte /
arremata / o meu desejo.”, e natural que o leitor que sabe o que é poesia se
encha de esperanças de que um novo poeta esteja surgindo. Os poucos versos antes
transcritos são do livro Dos haveres do corpo, de Maria Esther Maciel,
mineira de Patos de Minas, 22 anos de idade, que agora faz sua estréia como
poeta. Neles se pode reconhecer, sem maior esforço, uma vocação literária
autêntica, por sua linguagem poética, tão limpa e, ao mesmo tempo, contida e
comunicativa, despida de ornatos arrefecedores do impacto lírico almejado. A
leitura de outros poemas do livrinho confirma a presença da poeta que chegou
para ficar: “Compor no ventre a textura dos lírios / para enluar os vales de
teu corpo / Revestir os seios de estrela / para a viagem lírica de teus dedos
/ Lançar canários das mãos ensandecidas / para imbuir de canto a tua boca /
Tramar nos olhos fios de palavras / para tecer em ti minha poesia”. Muitos dos poemas do
volume são de amor, quase sempre bastante eróticos, como é comum na poética
dos jovens: “Te exila em minha teia / Me define com tua senha / perenizando
em meu corpo / o teu mistério – entre cortinas / no refúgio exato dos
lençóis”. Todavia, como se pode constatar por estes versos, não só o amor
habita a poesia de Maria Esther Maciel: “Só louca / sou eterna: / em razão /
quase sempre me convenço / da minha morte – certeza imperecível / que me
anula os entressonhos / e interdita o meu possível / Só louca / sou eterna: /
sem precise / inventar / heroísmos para meu depois”. A poeta domina bem os seus
instrumentos de elaboração poética, realizando o poema, muitas vezes, através
de alegorias e metáforas de muito boa construção, que lhe marcam a dicção.
Restaria dizer, como informação, que a jovem patense é concluinte do curso de
Letras da Universidade Federal de Minas Gerais, não sendo, pois, eventual o
conhecimento de arte poética que demonstra possuir. _____________________________________________________________
José Afrânio Moreira Duarte
De
Patos de Minas, uma das diversas cidades mineiras privilegiadas em matéria de
literatura, é a jovem Maria Esther Maciel que em boa hora estreou em livro,
publicando a ótima coletânea de poemas intitulada Dos haveres do corpo, onde
dá, desde logo, a demonstração inequívoca de possuir um talento verdadeiro. Dos haveres do corpo tem
um conjunto de poemas homogêneos, primando pela seriedade e pelo bom gosto.
Alguns dos textos de Maria Esther Maciel chegam a ser sensuais e eróticos,
mas no sentido mais elevado do erotismo, não caindo nunca na vulgaridade ou
na pornografia, como exemplifica o poema que se chama “Conceito”: Teu corpo: um porto um parto a parte Com apenas vinte anos, Maria Esther
Maciel não podia mesmo deixar de ser lírica e seu lirismo, se bem que
bastante modernizado, torna-se mais patente em “Armadilhas”: Compor no ventre a textura dos lírios Revestir os seios de estrelas Lançar canários das mãos ensandecidas Tramar nos olhos fios de palavras De repente surge o gracioso
poema “Brinquedo”, que tem realmente o sabor de um doce “scherzo” musical:
O meu amor é travesso
Minha terra é a menina
inquieta do rio Paranaíba Embora muito jovem, Maria
Esther Maciel já sabe o gosto amargo da perda de um ente querido e expressa
tal sentimento no excelente poema denominado justamente “Perda”: Tua ausência Tua ausência Tua ausência Apesar de Maria Esther Maciel ser muito moça, não se pode falar em estréia precoce, pois no excelente livro Dos haveres do corpo ela demonstra, de maneira cabal, possuir, além do talento inato, também no aspecto artesanal, a maturidade e a segurança que muitos poetas veteranos ainda não conseguiram alcançar. Espero que Maria Esther Maciel não pare em Dos haveres do corpo e continue sempre lançando outros livros que por certo irão enriquecer o curriculum da autora e a boa poesia mineira.
_________________________________________________________________________ Dizeres Críticos Carlos
Drummond de Andrade, em carta de 16/08/1983, a propósito
dos originais do livro Dos haveres do corpo, de Maria Esther Maciel: “Difícil assumir a
posição de julgador, mesmo para transmitir “impressões” de leitura. É tudo
tão subjetivo, tão limitado aos nossos
sonhos e princípios! Não dê muita importância à minhas impressões. Seu
livro traz a marca de uma personalidade, e isto é o importante, a ser
desenvolvida. Mas esse desenvolvimento fica por conta exclusiva de você. A
opinião alheia não conta. Conta é o impulso interior, rumo a uma “fatalidade”
de escrever. No livro há poemas que
me parecem bem realizados, com bastante vigor expressional. O tom tem
grandeza. E a “Estorinha Matreira”, uma delícia. O abraço e a simpatia,
de Carlos Drummond de Andrade “ * Laís Corrêa de Araújo, na coluna “Roda Viva”, do jornal Estado de
Minas, em 17/03/1985: “Dos haveres do corpo,
livro de Maria Esther Maciel, confirma a minha opinião de que as mulheres
estão mais corajosos em sua fala, pela expressão livre que me metaboliza as
relações naturais do amor. Em Maria Esther já há, ainda que não vigorosamente
como em outras, a consciência de “ser com o outro”, resgatando a experiência
do sexo em seus condicionamentos e fazendo-o espontâneo e simples. Isso, é
lógico, não é o que faz boa poesia – é uma poesia. Um pouco mais de exigência
do verbo, e termos uma poeta com identidade definida. Em frente, pois!” * Manoel
Lobato, na coluna “Mural”, do Suplemento Literário do
Minas Gerais, em 16/02/1985: Em Dos haveres do
corpo, Maria Esther Maciel nos surpreende, pois – além do domínio do
vernáculo, ela tem o dom de expressar-se. Poemas impecáveis: metáforas
bonitas, sensibilidade sem limite. Até na escolha das epígrafes há coerência
e talento. Não há trocadilhos bobos nem recursos visuais, como os parênteses
que bipartem as palavras para um discutível reforço expressional. Pelo
contrário, em “Gestação” há uma disposição dos versos muito curiosa,
sugerindo o volume do ventre. Um velado erotismo em determinados poemas
demonstra a capacidade da autora em fugir da vulgaridade. Obra fora do
comum.” * Agenor Gonzaga, na coluna “Encontro Marcado”, da revista A
Debulha, em 15/03/1985: “Maria Esther Maciel é
a pessoa que tem a vocação da poesia. Seu livro Dos haveres do corpo
nos revela bem isso. Por vocação entendo aquilo que se tornou a coisa mais
importante na vida de alguém, aquilo com que se convive as 24 horas do dia e
mais as inúmeras horas do sonho. Mas Maria Esther tem os pés no chão, sabe o
que diz e o que quer dizer; estuda, lê, reflete, constrói a sua poesia muito
tempo antes que ela brote no papel. Por isso seu despojamento verbal, o
nem-mais-nem-menos com que nos fala as suas belezas. É autora consciente de
que, num mundo de tecnologia, sem a técnica é impossível sobreviver.
Portanto, a primeira característica que se poderia ressaltar em Dos
haveres do corpo é a sua qualidade técnica. As palavras são pesadas,
pensadas, gestadas, medidas, mas nem por isso se creia que falta ao verso o
lirismo.” Lázaro Barreto, no Jornal Agora (Divinópolis), em 20/01/1985: “Dos haveres do
corpo é um livro leve, airoso, como o corpo de uma bailarina em noite de
excepcional perfomance. Todas as partes se articulam em função do todo,
ritmadas, cantantes, brilhosas, despertando a primavera até mesmo no deserto
ou debaixo de chuva torrencial. Toda a leveza, a pontualidade, a geometria, o
arabesco, o ritmo da beleza e da verdade.” ** |
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