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PENSAR –Estado de Minas (21/02/2009)


ESCRITORES MINEIROS - MARIA ESTHER MACIEL

Pensamento com emoção

 

Maria Esther Maciel mergulha fundo na prosa de ficção depois de publicar livros de poesia e trilhar carreira sólida na área de pesquisa em literatura e sobre o cinema contemporâneo

 

Carlos Herculano Lopes

 

 

 

 

 

Ela começou fazendo poesia, como várias mulheres de sua geração. Depois passou para o ensaio, em seguida para o romance e, hoje, é craque em todos esses gêneros. Ela é Maria Esther Maciel, mineira de Patos de Minas, que nos anos 1980 veio para Belo Horizonte estudar letras e, desde então, vive aqui, onde é professora de teoria da literatura e literatura comparada na Faculdade de Letras da UFMG. Mas o gosto pela escrita, como lembra, começou na sua terra, onde teve o incentivo de alguns professores, escritores e dentro da própria família. Com o seu último romance, o belo e bem costurado O livro dos nomes, lançado no ano passado, a escritora continua a carimbar seu nome, cada vez com mais força, no universo da literatura brasileira contemporânea. Como ensaísta, Maria Esther Maciel lançou, entre outros, As vertigens da lucidez - poesia e crítica em Octávio Paz, um dos seus textos mais conhecidos. Infatigável na busca de novas possibilidades da literatura, a escritora está envolvida com nova pesquisa, que pode surpreender quem conhece seus trabalhos voltados para autores sempre sofisticados e eruditos, como Jorge Luis Borges, Octávio Paz e Peter Greenway. “Atualmente estou desenvolvendo novo trabalho sobre a presença dos animais na literatura”, conta a escritora em entrevista ao Pensar.



Quando estudava na Faculdade de Letras da UFMG você escrevia poemas. Depois passou para o ensaio e em seguida para o romance. Como se deu essa metamorfose literária?

Na realidade comecei escrevendo prosa, quando eu tinha por volta de 15 anos, e publiquei em capítulos, em um jornal de Patos de Minas, uma novela inspirada em As mil e uma noites. Depois passei a fazer poemas, alguns contos e escrevi resenhas, que também foram publicadas na imprensa local. Quando vim para Belo Horizonte, para estudar letras, continuei me exercitando nesses gêneros, até me voltar também para o ensaio, em função dos meus estudos na faculdade. Devido a isso, fiquei durante um bom tempo afastada da poesia e da ficção, até finalmente retomá-la com o lançamento de O livro de Zenóbia, que é uma espécie de prosa híbrida. Mas na qual a poesia, de certa maneira, também está presente. Agora, com O livro dos nomes, me voltei especificamente para a narrativa.

Como se deu sua iniciação literária ainda em Patos de Minas?

Minha mãe e algumas tias tinham um gosto muito grande pela leitura. Na nossa casa sempre existiram livros, que comecei a ler ainda bem nova. Tive estímulos muito fortes de vários professores, como Paschoal Borges de Andrade, Salvador Rodrigues de Souza, Ricardo Marques, além do grande poeta Altino Caixeta, “O leão de Formosa”. Ele foi uma espécie de mestre que tive ao longo da adolescência. Conheci-o em uma livraria lá em Patos, e daí nasceu a nossa amizade. Ele me apresentou a uma série de escritores e críticos literários, o que influenciou na minha decisão de estudar letras. Anos depois, tive a alegria de escrever alguns ensaios sobre sua obra, além de organizar um livro, Sementes de sol (7 Lettras), com poemas inéditos dele, que me foram passados pela sua família depois de sua morte. Também em Patos escrevi alguns dos poemas de Dos haveres do corpo, o meu primeiro livro, lançado três anos depois da minha chegada a Belo Horizonte.

Em relação ao ensaio, como foi que se deu a sua aproximação com a obra de autores como Jorge Luis Borges, Peter Greenway e Octávio Paz?

Conheci a obra de Octávio Paz muito cedo, quando ainda vivia em Patos. Anos depois, para realizar o meu trabalho sobre ele, estive no México, onde o conheci. Já os primeiros contos de Borges li aqui em Belo Horizonte, e fiquei fascinada. São autores que vêm me acompanhando esses anos todos. Por isso mesmo, são as minhas maiores referências. Quanto aos outros, que estudei posteriormente, como Peter Greenway, isso se deu naturalmente, como desdobramento desses primeiros. Greenway, que é um cineasta, mas muito ligado à literatura, tem muito apreço por jogos de classificação, pelas enumerações, pelos catálogos, coleções, enciclopédias, como Borges. Isso tudo também me interessa. Tanto que há uns cinco anos comecei a fazer uma pesquisa, Poéticas do inventário, justamente sobre esses intelectuais que se valem criativamente desses sistemas de classificação do mundo, para a partir daí tentar criar novos mundos e novos sistemas ou antissistemas de classificação. Meu estudo incluiu também George Pérec, que escreveu os livros A vida modo de usar e Pensar-classificar, explorando esses recursos da chamada taxonomia. E ainda Ítalo Calvino, que lidou com essas questões com muito humor e inventividade, além do artista plástico brasileiro Artur Bispo do Rosário. Esse viveu durante 50 anos em um hospital psiquiátrico, no Rio, e compôs uma obra fantástica, que também poderia ser tomada como um inventário do mundo.



"Passei a estudar o cinema a partir da obra de Peter Greenway. Desde então tenho realizado uma série de trabalhos sobre a relação entre o cinema e a literatura"

"Comecei a fazer uma pesquisa sobre esses intelectuais que se valem criativamente de sistemas de classificação do mundo, para a partir daí tentar criar novos mundos"


Além da literatura em si, você estudou muito o cinema, tendo inclusive feito seu doutorado sobre o tema na Universidade de Londres. Quando foi que a sétima arte passou a lhe interessar?

Voltando outra vez a Patos de Minas, lá havia ótimas salas de cinema, nas quais, até me mudar para Belo Horizonte, assisti a dezenas de filmes e fiquei conhecendo a obra de grandes diretores. Mas passei a estudar mesmo o cinema a partir do momento em que me interessei pela obra de Peter Greenway. Desde então tenho realizado uma série de trabalhos sobre a relação entre o cinema e a literatura. Interessei-me, especialmente, pela maneira como os dois dialogam, fora dos limites da chamada adaptação. Ou seja: tentei buscar relações mais oblíquas, subterrâneas e menos previsíveis entre essas duas artes.

Como escritora, de que maneira você vê esse debate que sempre volta à tona sobre a literatura feminina?

Sempre fui avessa a essas classificações da literatura em categorias. No caso da chamada literatura feminina, a meu ver, isso é bem problemático. Claro que todo escritor, na sua obra, imprime as suas marcas de vida, de experiência, do seu corpo, do seu imaginário. No caso da literatura feita por mulheres, isso, inevitavelmente, faz com que ela contenha mais elementos que dizem respeito ao nosso próprio universo. Mas isso não quer dizer que a literatura entre ou se confine nesse registro. É simplesmente a marca que ela deixa e que, não necessariamente, vai definir o literário, pois esse está além dos rótulos.

Literatura feminina à parte, quais são as autoras brasileiras contemporâneas que você citaria?

Além de Clarice Lispector e Cecília Meireles, que são dois grandes ícones, das escritoras atuais eu mencionaria Maria Valéria de Resende, que vive no Nordeste e escreveu um livro que me instigou muito, O voo da guará vermelha; tenho muito apreço pela escrita de Lúcia Castelo Branco, carioca que há muitos anos vive em Minas; e Ruth Silviano, que é daqui. A meu ver, elas estão entre as autoras mais inventivas de hoje. Inclusive, a respeito da chamada escrita feminina, elas se dedicaram muito a discussões sobre o tema. Citaria ainda Zulmira Ribeiro Tavares e Beatriz Bracher.

Como você tem visto a difícil separação entre a crítica acadêmica, cada vez mais afastada do público, e as resenhas dos jornais, quase sempre superficiais?

Esse realmente é um problema em relação à crítica contemporânea. Por um lado, vejo que está sendo feito, no meio acadêmico, um esforço de verticalização da leitura, e de se elaborar conceitos em torno do que se produz hoje. E, por outro, percebo uma conivência com certos imperativos do mercado editorial. Com isso, as resenhas dos jornais, atualmente, estão muito mais superficiais no que diz respeito à literatura, exatamente por estarem, de certa forma, atreladas a esses interesses mercadológicos. Mas apesar dessa tendência geral, existem muitos jornalistas no Brasil que conseguem produzir um tipo de texto que fica justamente na interface de uma leitura mais aprofundada e dirigida ao grande público.

Voltando à obra de ficção, em O livro dos nomes os personagens são múltiplos, todos têm suas histórias, que se entrelaçam no final. Como se deu o processo de criação desse romance? Ele nasceu a partir d’O livro de Zenóbia?

O livro dos nomes veio, sim, de O livro de Zenóbia. Curioso é que comecei a escrevê-lo não a partir da ordem que ele passou a ter depois de pronto. Não segui a ordem alfabética dos nomes. Ative-me, no entanto, às relações entre eles: comecei com Antonio, mas, antes de passar para Beatriz, preferi escrever sobre Silvia, e assim por diante. Fui estabelecendo as relações entre os personagens à medida que fui escrevendo. Caso contrário, eu corria um risco de me dispersar no correr da trama, além de cair em incoerências. Quanto à escolha dos nomes, antes eu criei uma lista e depois me ative àqueles que ficariam definitivamente na história, um para cada letra. Depois, ainda fiz algumas trocas, quando percebi que esse ou aquele nome não combinava bem com determinado personagem. No final tudo deu certo.

Quais projetos você vem desenvolvendo atualmente?

Depois de publicar O animal escrito, pela Lume Editora, sobre a presença dos animais na literatura, estou dando sequência a esse trabalho. Para poder realizá-lo estou de licença na Faculdade de Letras, e minha pesquisa tem o apoio do Instituto de Estudos Avançados Transdisciplinares da UFMG. Esse trabalho, que tem me fascinado, diz respeito às maneiras como escritores contemporâneos representam os animais em suas obras. O trabalho foi dividido em duas partes: na primeira, dei um enfoque mais voltado para o fantástico, para o alegórico, para simbólico. Na segunda vertente, me centrei nos animais de carne e osso, mostrando como eles aparecem na literatura, e em que medida os escritores de hoje manifestam pelos mesmos algum tipo de preocupação, seja de ordem ética, ecológica ou filosófica.

 



OBRA ESCOLHIDA

• Dos haveres do corpo, poesia, Editora Terra, 1984
• As vertigens da lucidez: poesia e crítica em Octávio Paz, ensaio, Editora Experimento, 1995
• Triz, poesia, Orobó Edições, 1998
• Lição de fogo: amor e erotismo em Octávio Paz, ensaio, Editora Memorial da América, 1998
• Voo transverso: ensaios sobre poesia, modernidade e fim do século XX, Editora Sette Letras, 1999
• O livro de Zenóbia, romance, Editora Lamparina, 2004
• A memória das coisas - ensaios de literatura, cinema e artes plásticas, Editora Lamparina, 2004
• O livro dos nomes, romance, Editora Companhia das Letras, 2008
• O animal escrito, um olhar sobre a zooliteratura contemporânea, ensaios, Editora Lumme, 200

 

 
 
 
 

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