VIGILIA DE PAI JOÃO 

 

A sombra bem sei que sou  

Daquele que aqui chegou  

 Com saúde e mocidade.  

 E assim mesmo, no infinito,  

Há de ressoar o grito  

De Pai João: Liberdade! 

 

         Mas enquanto a Liberdade  

         Não vinha, a minha saudade  

         Curtia no eito, a cantar...  

         O trabalho me fazia  

         Esquecer durante o dia  

         As noites de meu penar... 

 

No terreiro da fazenda,  

Como se fosse uma lenda,  

Bate e rebate o pilão,  

E ao som da música triste  

A gente sente que existe  

Em tudo um "quê" de emoção. 

 

           - "A Liberdade está perto!  

           Malungo, sê mais esperto,  

           Malungo, soca o pilão!  

           Estás tal qual um novato!  

           Temos trabalho de fato,  

           Malungo, força na 'mão"! 

 

E essa fala que se dava  

Quase que sempre, animava  

Aquela gente sem fé,  

Que até ao findar do dia  

Tulhas de café fazia,  

Café, café, mais café... 

 

            E ao som dos bordões sonoros  

            E dos batuques e coros  

            Da africana sinfonia,  

            Os pobres homens trocavam 

           Pelo suor que derramavam  

           A angústia de todo dia... 

 

-"Vai com força, negraria!" 

-"soca pilão!", repetia 

 O eco: - "soca pilão!"  

E Pai João derreado:  

"Este café foi regado  

co'o sangue de Pai João..." 

 

(Vigília de Pai João, 1938)