“Da Importância da Gramática” (do livro Ao Correr do Tempo - 2):


[1] É válido lembrar que, em textos posteriores, há passagens como a seguinte: “Quanto à fala escrita, relembre-se o nocivo descuido que dela faz a lingüística, enganada em pensar que fala é só a conversa oral. Errando no conceito, desapropriou-se na denominação, ao discriminar a língua em "língua escrita" e "língua oral". É sensível para nós que a língua é uma só, um patrimônio só; a fala é que será "fala oral" e "fala escrita". “Conceitos de Linguística Fabular”, seção 14, o impulso fabular)]


[2] “O que caracteriza a linguagem falada, é que ela se limita a destacar os pontos culminantes do pensamento. Esses engolfam-se sós e dominam a frase, enquanto que as relações lógicas das palavras e dos membros da frase entre eles, ou bem são marcados apenas incompletamente, com o auxílio, se ocorre, da entonação e do gesto, ou bem não são absolutamente marcados e devem ser supridos pelo espírito”. [Vendryes, Le langage, p. 175]

 

“A Gramática e a Lógica” (do livro Ao Correr do Tempo - 2):


[*] Leia-se: fôrmas.

 

“Romain Rolland” (do livro Ao Correr do Tempo - 2):


[*] No original datilografado do presente texto de J. Lourenço não se encontra a data. Provavelmente, no entanto, pode-se estabelecer relação entre ele e o seguinte fragmento da carta endereçada ao amigo Sr. Resende, de 25 de junho de 1935:

“Por falar em romance, gostaria que o sr. me mandasse os volumes de Jean Christophe, se me não engano os três primeiros. Devo fazer, dentro em breve, uma conferência sobre "A vida dos adolescentes, no Brasil", segundo determinou D. Helena Antipoff, naquela série em prol da criança sadia, conforme deve o senhor ter visto em jornais. Queria que eu falasse a respeito da educação dos nossos internatos congregacionais. O tema era melindroso. Em todo caso, vou encarar a assunto do ponto de vista escolar. Tenho aqui, para matéria prima literária, o Ateneu, do R. Pompéia; o Doidinho, de José Lins do Rego; La robe pretexte, de Fr. Mauriac. Queria ter também o Jean Christophe”.



“Espaço e Tempo” (do livro Da Vida à Vivência - Conceitos de Linguística Fabular):


[*] Este texto, com data de 19 de setembro de 1959, tem, em epígrafe, no original a seguinte dedicatória ao Prof. Dr. Artur Veloso: Tibi, Villoso amico, id est, Piloso, salutem plurimam dicit et hanc hirsutam meditationem mitit. Laurentius. [a ti, amigo Veloso, isto é Piloso, deseja muita saúde e envia esta hirsuta meditação. Lourenço].

“Le plus grand philosophe du monde sur une planche plus large qu'il ne faut, s'il y a au-dessous un precipice, quoique sa raison le convainque de sa sûreté, son imagination prévaudra”. [O maior filósofo do mundo sobre uma prancha mais larga do que precisa ser, se houver embaixo um precipício, embora sua razão o convença de sua segurança, sua imaginação prevalecerá. (Pascal, p. 90)]

 

“A Formação de Montaigne” (do livro Espírito Mediterrâneo - Estudos):


[1] Pintura das coisas, bem colorida, visualizante.


[2] Sobre aqueles tempos, veja-se um depoimento de Henri de Mesme: "Nous étions debout à quatre heures et, ayant prié Dieu, allions à cinc heures aux études, nos gros livres sous les bras, nos écritoires et nos chandeliers à la main. Nous oyions toutes les lectures jusques à dix heures sonnées, sans intermission. Pouis venions diner, aprés avoir en hâte conféré demie heure ce qu'avions écrit des lectures. Apres diner nous lisions, par forme de jeu, Sophoclés ou Euripidés et quelquefois de Demosthenés, Cicero, Virgilius ou Horatius.. À une heure aux etudes, à cinc au logis, à répéter et voir dans les livres les lieux allégués jusqu'après six. Lors noun soupions, puis nous lisions en grec ou en latin".

 

“Etimologia do Fabular e do Homínico” (do livro Da Vida à Vivência - Conceitos de Linguística Fabular):


[*] Este texto, longa reflexão sobre a hominidade e sua origem e sobre os fundamentos da lingüística, tem seu registro original em 13 longos fólios, alguns deles digitados em frente e verso. O quadro abaixo lista as 40 seções que dividem o texto:

título da seção

título da seção

diacronia da vida

mestiçagem

o saber espacial

senso e razão

o saber temporal

consciência

a via progressiva

signo fabular

a rampa

o sintagma

a vivência

frase nominal

a superação

fruto pós-românico

a etimologia

unidades

a hominidade

contextos

o milemilênio

o animal diacrônico

o interesse

o milemilênio

indícios

o problema

os contetos

como e porquê

a vigência

motivação canônica

estados

revisão

mais coisas

a ciência do sujeito

anamnese

não é sistema

o hiato

a etimologia

cinqüenta anos depois

a flor temporal

vocabulismo

o signo zoológico e o signo antrópico


[1] Lemaître, Georges. Astrofísico e matemático belga (1894-1966), autor de uma teoria relativista de expansão do universo.


[2] Teilhard de Chardin, Pierre. Jesuíta, paleontologista e filósofo francês. (1881-1955). Elaborou uma síntese dos fenômenos físicos e biológicos, concluindo por uma evolução do universo, que leva à unidade e à fusão com Deus. Contribuiu para a identificação do sinantropo - fóssil que apresenta simultaneamente caracteres primitivos dos símios e caracteres evoluídos dos homens.


[3] Pode-se observar, nos três últimos períodos desta seção, a presença contrastiva de construções temporais, constantes no texto original, com a preposição a, de um lado, e com o verbo haver, de outro. Dependendo da perspectiva em que o leitor se coloque, é possível entender, nas duas primeiras construções, com a, que não se trata de duração ou extensão temporal, mas de um momento no tempo. Na construção do período final, com o verbo haver, pode-se dizer que há uma mudança de perspectiva, e contempla-se o passado em sua duração e extensão temporal.


[4] “Atribui-se presentemente a H. erectus a mandíbula fóssil encontrada em Mauer, perto de Heildelberg, na Alemanha em 1908. Por muitos anos foi aceita pertencer a uma espécie humana distinta, denominada Homo heilderbergenis. Sua idade foi estimada em 450 mil anos.”

[MENDES, J. C. e PETRI, S. Paleoantropologia. In: ENCICLOPÉDIA Mirador Internacional. São Paulo, Rio de Janeiro: Brittanica, p. 8459]


[5] O homem de Steinheim tomou seu nome da localidade ao norte de Stuttgart, na República Federal Alemã, onde se encontrou um crâneo de mulher em 1933. Restos de homens de Steinheim encontrados na Alemanha, Inglaterra, França e Hungria são as primeiras evidências fósseis do ‘verdadeiro homem', o primeiro a ser chamado sapiens. Era anatomicamente similar ao homem moderno, exceto quanto às características do crânio que, embora tivesse uma capacidade de 1.200 cm³, era baixo e espesso, com largas saliências frontais. Conheceu o uso do fogo e fabricou artefatos de pedra muito elaborados (machados e raspadeiras) que usava para caçar e para cortar seus alimentos. O Homo sapiens steinheinmensis parece ser o ancestral direto tanto do homem de Neandhertal como do homem atual (Homo sapiens sapiens).

[MENDES, J. C. e PETRI, S. Paleoantropologia. In: ENCICLOPÉDIA Mirador Internacional. São Paulo, Rio de Janeiro: Brittanica, p. 8460]


[6] Homo sapiens neanderthalensis toma o seu nome do lugar onde foram, pela primeira vez, encontrados restos de sua existência, em Neanderthal, perto de Düsseldorf, na República Federal alemã. Era um homem de baixa estatura e troncudo, possuía crâneo alongado e baixo, e faces largas. Era caçador e, por vezes, antropófago, embora o tamanho de seu cérebro (o mesmo do homem moderno) e a cultura alcançada em termos de feitura de utensílios e de caça sugiram uma inteligência elevada. É parente mas não um ancestral direto do homem moderno. Viveu na Europa entre 115 e 35 mil anos.

[MENDES, J. C. e PETRI, S. Paleoantropologia. In: ENCICLOPÉDIA Mirador Internacional. São Paulo, Rio de Janeiro: Brittanica, p. 8461]


[7] Homo sapiens sapiens foi denominado Cro-Magnon por causa da localidade, no sudoeste da França, em que foram pela primeira vez encontrados seus restos. Viveu na Europa, no Oriente Próximo e na África do Norte, tendo surgido há cerca de 35 mil anos. É o primeiro representante da nossa espécie atual. Suas características diferem ligeiramente das nossas; o crânio era geralmente mais alto e mais longo e a órbita mais baixa, mas os ossos não eram tão grossos como os dos homens mais primitivos. A sua cultura mais evoluída evidencia-se por uma larga variedade de artefatos de pedra e de osso.Expressava-se artisticamente por meio de pinturas e gravações, e praticava alguma espécie de magia e religião, que era parte importante da sua vida.

[MENDES, J. C. e PETRI, S. Paleoantropologia. In: ENCICLOPÉDIA Mirador Internacional. São Paulo, Rio de Janeiro: Brittanica, p. 8462]


[8] Os seres vivos, para existir, e para exercer seus fazeres, dependem de energia extraída de substâncias orgânicas, seja em processo de síntese, incorporando a energia solar, seja retirando-a de matérias orgânicas vegetais, ou animais que, num processo de cadeias alimentares, em última instância, se nutriram de plantas. Nesse processo, há predadores, que devoram outros seres, há parasitas, que vivem às custas de outros seres, espoliando-os. E há a simbiose, caso em que alguns seres vivos se nutrem parcialmente à custa de outros, sem os prejudicar, mas colhendo benefício da presença do outro. Assim, pode haver a associação de duas plantas - é o caso dos liquens - ou de uma planta e de um animal na qual ambos os organismos recebem benefícios, ainda que em proporções diversas, como ensina o Aurélio.

Na teoria do Autor, a simbiose, ao mesmo tempo que princípio de economia, é expressão de um primeiro sistema de proceder, numa equação indivíduo-coisa [- equação ic - ], disposta pela natureza. O indivíduo reage, com sua resposta natural, ao estímulo natural da coisa. Trata-se de um fazer em função da vida. “ O estimulado, sob o estímulo da coisa, oferece um proceder que já tinha consigo, antes da experiência, na feição potencial de seu compêndio biológico .” É um plano em que não está em questão ainda o homem antrópico, mas o homem zoológico. O homem, procedendo como Objeto, no vital dos fazeres - dirá o Autor.


[9] trófico - relativo à nutrição, garantia da energia vital. Tem-se a autotrofia (predominante nos vegetais) e a heterotrofia (na maioria dos animais). Na luta pela vida e pela energia que a garanta - pervivência do indivíduo e sobrevivência da espécie - o comportamento dos seres vivos engloba tudo aquilo que ele realiza como reação a estímulos do meio, a este se adaptando, ou, nos seres mais adiantados (mamíferos, primatas), como propósito de agir sobre o meio. Nesse domínio fenomênico. o Autor sugere as ‘modulações adjetivas' no comportamento de indivíduos. Na seção próxima, ele fala de “estilizações adjetivas”.


[10] O adjetivo sodalis, (de companheiro, de amigo; companheiro) que estaria na base dos substantivos latinos sodalis,-is, sodalicium,-i, sodalitas,-tatis. Destes, nem sodal nem sodalidade são registrados nos dicionários mais comuns do português, constando apenas o substantivo sodalício, que designa a sociedade de pessoas que vivem juntas ou em comum. A forma sodalicício [ sodalíci + - icio ], radical do advérbio sodaliciciamente, não é dicionarizada. (Do latim: sodalicium. 1) sentido comum : trato, convivência, companhia, camaradagem. 2) sentido particular : sociedade secreta. Como sodalicium,-i, os substantivos sodalis,-is e sodalitas,-tatis são registrados ambos, por Ernesto Faria, como tendo um sentido próprio : Camarada, companheiro, amigo / camaradagem, companhia, amizade e um particular : amigo de membro de / corporação, confraria, círculo, associação secreta.


[11] No fólio 1, depois do título do texto, há em letra de forma a seguinte notação, feita pelo Autor: “ 5.7.68 Recopiar revendo ordenação ”. A terceira seção deste mesmo fólio tem o título: o saber temporal. À margem desta seção encontra-se manuscrita a observação: “entram aqui 9 páginas”. No fólio 2, seguinte, a primeira seção tem também por título: o saber temporal. E sobre ela a notação, também manuscrita, “3 o. título da 1 (1 a)”.A interpretação dada: “terceiro título do primeiro fólio”. Desta forma, no entendimento de que era vontade do Autor, o primeiro texto o saber temporal foi substituído pelo segundo, o do fólio 2. Abaixo encontra-se transcrita a versão postergada, para a qual não ficou claro o espaço no texto. (É fato que essa versão não sofreu, no fólio em que se encontra, nenhuma modificação ou correção por parte do Autor. Ver a manutenção das formas milimilênios e centimilênios - cf. nota 13 seguinte).

 

O SABER TEMPORAL

“O mero saber espacial da cota zoológica ficou possível de fundir-se no saber temporal da cota antrópica, iniciado talvez no derradeiro dos 500 milimilênios anteriores. Foi no fim, talvez, da era quaternária. Certo piteco destinado começou a galgar o pataréu da superação, imprimindo o ritmo pós natural do modo progressivo, no ritmo natural do modo evolutivo. Ao código natural do saber infuso fez suceder um receituário pós-natural de saber aprendido. Para tanto, foi estilizando procederes pacientemente tratados, em lentos centimilênios, enquanto criava a liberação com que foi escapando à gravidade primeira do centro zoológico. A reação elementar, própria do bruto, no aqui-agora reflexo do espaço, foi cedendo a formulações inteligentes, reflexivamente estruturadas no alhures-outrora do tempo reminiscente. Em lugar da estreita ipsidade zoológica, teimosamente iterativa, a ductilidade do proceder antrópico, subtilmente eficaz, transformando os lucros de um proceder passado em vantagens do futuro proceder. Na resposta de um ser meramente zoológico, entra um fazer que, apesar de meramente reflexo, admite estilizações adjetivas. Dá-lhes provimento o celeiro biológico de cada indivíduo, sob urgências do meio espacial, que é o grande promotor da evolução, quando altera ou sonega, ao viver costumeiro, a costumeira subvenção. Aprendendo a temporizar equações espaciais internadas na mente, a hominidade, com seu novo poder reflexivo, aprendeu a analisar os fatores de um proceder vital, melhorando assim, para o encontro seguinte, com juros colhidos na antiga, a morfia da nova resposta. Antes de repetir o proceder vital de um fazer, aprendeu a tratá-lo temporalmente, no proceder vivencial de um pensar. Como destilador de analogias fenomênicas e taxador de juros do passado, aprendeu a superar, no seu viver antropicamente temporal, a espacialidade zoológica do viver.”


[12] O texto do Autor transcrito na nota precedente refere-se a “era quaternária”. Não há possibilidade de precisão nessas hipóteses temporais. O quadro abaixo, [ver: AMARAL, S. E. e MENDES, J. C. Geologia. In: ENCICLOPÉDIA Mirador Internacional. São Paulo, Rio de Janeiro: Brittanica, p. 5273], com a divisão do tempo geológico em eras, períodos e épocas permite situar o fim do terciário, acerca de (mais de) 2 milimilênios. Os números na tabela abaixo representam milimilênios (= milhões de anos):

Eras Períodos Épocas

Pré Cambriano (± 4000)

 

Cambriano (70)

 

 

Ordoviciano (70)

 

Paleozóica

Siluriano (30)

 

(340)

Devoniano (60)

 

 

Carbonífero (60)

 

 

Permiano (50)

 

Mezozóica (167)

Triássico (50) Jurássico (50) Cretácio (72)

 

Cenozóica (63)

Terciário (61) Quaternário (2)

Paleoceno (5) Eoceno (22) Oligoceno (11) Mioceno (12) Pioceno (11) Pleistoceno Atual ou Holoceno


[13] As várias ocorrências desta forma encontram-se inicialmente grafadas centimilênios. Foram ‘corrigidas' posteriormente, à mão, para centolimênios. A mesma observação vale para as ocorrências que virão a seguir da forma milemilênio(s) inicialmente grafadas milimilênio(s).

fólio B1.2 seção: o saber temporal

 

fólio B1.2 seção: a hominidade,

 


[14] Ipsidade. [Registro no Aurélio: ipseidade (do latim medieval: ipseitate)]. Sinônimo de hecceidade (do latim medieval: hecceitate) e de ecceidade. Segundo Duns Scott, teólogo escocês (1266-1308), é o princípio de individuação: o que faz que um indivíduo seja ele mesmo e se distinga de todo outro. Trata-se da differentia individuans, diferença individuante. André Lalande (1976) considera ipseitas / ipseidade o mais feliz dos três termos. (...). Corresponde, segundo ele, ao termo usual individualidade, embora este termo possa também ser usado em sentido mais amplo que o de diferença individuante, caracterizadora do indivíduo.


[15] Para corresponder à simbiose (nota 8), o encontro de homem e coisa [- equação ic - ], num fazer vital, estabelece-se a sintonia, o encontro homem e homem [- equação ss - (sujeito-sujeito)], um contato mental, veiculado na fala, estimulado, não pela coisa, que pode estar ausente, mas pela vivência, reminiscência de alguma experiência de outrora. No ato de fala a idéia de Primo (o primeiro Sujeito) veiculada suscita a idéia de Secundo (o outro Sujeito). Tem-se o homem procedendo como Sujeito, no vivencial do pensar - dirá o Autor.


[16] Comte, Augusto. Filósofo francês (1798-1857). Fundador do Positivismo. Seu Curso de Filosofia Positiva é uma das obras capitais da filosofia do século XIX. É considerado o fundador da Sociologia., nova ‘ciência da sociedade'.


[17] Marx, Karl. Filósofo e economista judeu-alemão (1818-1883). Redator, com Engels, do Manifesto do Partido Comunista. Definiu sua doutrina em O Capital (1867).


[18] Durkheim, Emile, sociólogo francês de origem judaica (1858-1917). Subordina os fatos morais aos sociais, que considera independentes das consciências individuais. É um dos fundadores da escola sociológica francesa. Exerceu influência sobre seu contemporâneo Ferdinand de Saussure, que interpreta a língua como fenômeno social: "a linguagem é um fato social" (Saussure 1960, p. 21 / 1969, p.14); "tem (...) um lado social" (p. 24 / p. 16); “É, ao mesmo tempo, um produto social da faculdade da linguagem e um conjunto de convenções necessárias adotadas pelo corpo social...” (p. 25 / p. 17); (a língua) “é ao mesmo tempo um produto social da faculdade da linguagem e um conjunto de convenções necessárias, adotadas pelo corpo social... (p. 25 / p. 17)"Ela é a parte social da linguagem, exterior ao individuo, que sozinho não pode nem criá-la nem modificá-la;ela não existe senão em virtude de uma espécie de contrato assinado entre os membros de uma comunidade"(p. 31 / p. 22).


[19] O cavalgamento de letras do texto datilografado original permite que se leia tanto moldar quanto moldear.

fólio B1.1 seção: a superação,

 


[20] Meridianizando, isto é: o perfil animal tomando a posição do sol do meio-dia.


[21] Num dos textos do acervo do Autor, de notas sobre A Natureza Humana, de Bergson, encontram-se informações como as seguintes:

“No encéfalo, o arquipálio e o neopálio.

1. Na região do arquipálio [há] as manobras do tacto afetivo (carícia), do gosto, do odor. Captam emanações que são amostras da coisa. São antenas de carência, para assimilação ou simbiose.

2. Na região do neopálio (mais recente) [há] manobras do tacto especulativo (apalpar), da audição, da visão. Captam da coisa não emanações mas vibrações. São esculcas da defesa vital(...). Na região velha [arquipálio], com tacto, gosto, odor, [há] o interesse vital da nutrição e da reprodução, com pervivência do indivíduo e sobrevivência da espécie. (...) Na região nova [neopálio], especular, ver, ouvir, o discriminar a circunstância, o conhecer o real. (...) Se a estrutura não fosse mais que antenas, incluidoras do mundo, a vida seria só simbiose. Se só esculcas, a vida seria só oposição”.

Essas informações recebem eco nas seguintes passagens de texto enciclopédico:

“Comparado com o de outros vertebrados, o sistema nervoso dos mamíferos distingue-se pelo enorme tamanho relativo do cérebro, cuja superfície, na maioria deles, aumenta ainda mais com o aparecimento das circunvoluções. Do desenvolvimento do neopálio, que passou a dominar e controlar os centros cerebrais primitivos, adquiriram os mamíferos comportamento peculiar, que veio revelar-se de maneira mais perfeita na ordem dos primatas e, especialmente, no homem. (...) Os hemisférios cerebrais propriamente ditos - córtex ou neopálio - são constituídos de vastíssimo número de neurônios que recebem impulsos dos vários campos receptores, analisam a informação recebida e estabelecem respostas adequadas. (...) O córtex cresceu à medida que numerosos sistemas aferentes passaram a agir sobre ele. Em todos os mamíferos reconhece-se o cérebro olfativo inicial (rinencéfalo), hoje suplantado pelo desenvolvimento da parte não olfativa, o neopálio. (...) Uma das transformações físicas mais marcantes, observadas na face humana, foi a progressiva cerebralização. O aumento do tamanho do cérebro deu-se principalmente em virtude da presença do neopálio (substância cinzenta), no qual se localizaram novos centros nervosos, como o da palavra”.

[REIS, J. e FROTA-PESSOA, O. Mamífero. In: ENCICLOPÉDIA Mirador Internacional. São Paulo, Rio de Janeiro: Brittanica, p. 7173]


[22] Pertence para... Há pelo menos um outro momento em que essa regência singular do verbo pertencer é usada pelo Autor. Assim, em trabalho seu já publicado, encontra-se: “Enquanto fenômeno individual, a novidade pertence para o domínio da palavra”. (Oliveira, 1994:254).


[23] Ver nota [13].


[24] Lalicamente (do grego: lal(o) ; laléin = falar, tagarelar; lalia = palavra, loquacidade). No Aurélio, além de dislalia (perturbação da palavra, que se deve geralmente à lesão dos órgãos externos) encontram-se registrados o adjetivo dislálico (referente à dislalia) e os substantivos lalomania (loquacidade mórbida, mania oratória) e laloplegia (paralisia dos órgãos da linguagem). A expressão lalicamente intransitivo refere-se ao limite de seres que não dispõem da fabularidade, do intercâmbio da fala.


[25] Rubicone. Em nossos dicionários e enciclopédias atuais a referência a esse rio se faz sob o nome de Rubicão. Esse nome lembra um fato decisivo da história de César sobre as decisões do Senado Romano contra ele. César atravessa o rio Rubicão, pronunciando a famosa frase: Alea jacta est: os dados estão lançados.


[26] Buffon, Georges Louis Leclerc, Conde de (1707-1788). Naturalista francês. Autor de História Natural, depois de Épocas da Natureza, publicadas de 1749 a 1789. Teve a intuição da evolução das espécies e da transformação do universo. Escritor cioso do estilo, definindo-o como sendo ‘a ordem e o movimento que se põe nos pensamentos'


[27] Lyell, Charles. Biólogo britânico. Considerado o fundador da geologia moderna. Estudou as formações vulcânicas e terciária do interior da França e da Itália. Propôs divisão do sistema zoológico em três grupos: eoceno, mioceno e plioceno.Dedicou-se ao estudo da geologia estratigráfica e paleontológica. Examinou teorias sobre o aparecimento do homem na Terra, apoiando a teoria de Darwin sobre a origem das espécies.


[28] Curso é o nome de que o Autor se vale - aqui e alhures - para se referir à obra de Ferdinand de Saussure, Cours de Linguistique Générale, Paris: Payot, 1960 / Tradução brasileira: Curso de Lingüística Geral. São Paulo: Cultrix, EDUSP, 1969. As seguintes passagens [1960, p. 26 / 1969, p. 17] são relevantes aqui: “Assim, para Whitney, (...) é por acaso e por simples razões de comodidade, que nos servimos do aparelho vocal como instrumento da língua (...) Whitney vai longe demais quando diz que nossa escolha recaiu por acaso nos órgãos vocais; de certo modo, já nos haviam sido impostas pela Natureza”.


29 No texto original, há duas apresentações do contexto fabular. Esta é a segunda. A primeira tem o seguinte teor:

“3. Contexto fabular. No cenário teatral, posto ante Secundo, Primo dirige-lhe um vozeio semântico, dosado na melodia e no ritmo. Nesse dosado vozeio semântico está o contexto fabular, inteiramente auditivo, na sua estrutura sonora. Capaz de secundarizar o espacial, o vozeio mostrou-se capaz de seguir, juntamente com Secundo Primo, dos agoras vitais cheios de coisas, para outroras vivenciais cheios de idéias, por ele simbolizadas. Na medida em que se consolidou, como veículo, foi fazendo-se centro do poder fabular, embora sempre condicionado a requisitos pessoais, no modo de cada um manifestar sua hominidade: secundarizando o espacial, secundarizou também o visual, trocando a importância da fala gesticular reduzida a função adjetiva e até dispensável. Entretanto, mesmo numa fala costumeira, isenta, objetivizante, pode um devido momento a trasformar em fala dramática, participada, cheia de gestos emotivos.”


[30] Bopp, Franz. Lingüista alemão (1791-1867). Autor de Gramática Comparada das línguas sânscrita, zenda, grega, latina, lituana, eslava antiga, gótica e alemã. Estudou principalmente as relações do sânscrito com as outras línguas indeuropéias. Pode ser considerado o fundador da lingüística quanto ao método de trabalho: utilizou o estudo comparativo para propor e resolver novos problemas relativos às línguas.


[31] Schleicher, Augusto. Lingüista alemão (1821-1867). Botânico, tornou-se lingüista e deu rigor ao método introduzido por Bopp.


[32] A seguinte passagem do Curso está em questão: “A língua, distinta da fala, é um objeto que se pode estudar separadamente. Não falamos mais as línguas mortas, mas podemos muito bem assimilar-lhes o organismo lingüístico”. [Saussure, 1960, p.31) / 1969, p.22-3].


[33] “A mímica é uma linguagem visual; mas a escrita também, da mesma sorte que todo sistema de sinais ”. [Vendryes,,1950, p. 9]


[34] A referência é feita à seguinte passagem do Curso: “O estudo da linguagem comporta, portanto, duas partes: uma, essencial, tem por objeto a língua, que é social em sua essência e independente do indivíduo; esse estudo é unicamente psíquico; outra, secundária, tem por objeto a parte individual da linguagem, vale dizer a fala, inclusive a fonação e é psicofísica”. [Saussure, 1960, p. 37 / 1969, p. 27]


[35] “ Se a fala precede e a língua consegue”. Encontra-se o emprego do verbo conseguir com apoio na etimologia: a) ‘vir depois', ‘seguir alguém'; b) seguir cronológico (antônimo: anteceder); c) perseguir, procurar; d) seguir como conseqüência. Derivado: conseqüência = ‘com isso se segue'.

Há nesta passagem do texto referência à seguinte passagem do Curso : “Sem dúvida, esses dois objetos estão estreitamente ligados e se implicam mutuamente: a língua é necessária para que a fala seja inteligível e produza todos os seus efeitos; mas esta é necessária para que a língua se estabeleça; historicamente, o fato da fala vem sempre antes ”. [Saussure, 1960, p. 37 / 1969, p. 27]


[36] O Autor reporta ao capítulo do Curso, denominado “A Lingüística estática e a Lingüística Evolutiva”, onde se discute a designação dos dois tipos das duas lingüísticas. [Saussure, 1960, p. 117 / 1969, p. 96]


[37] “ Ne pouvant saisir directement les entités concrètes ou unités de la langue, nous opérerons sur les mots .” / Não podendo depreender diretamente as entidades concretas ou unidades da língua, nós agiremos sobre os vocábulos [Saussure, 1960, p. 158 / 1969, p. 132].


[38] O Autor se refere aqui ao título do capítulo V, da segunda parte do Curso, que trata da Lingüística Sincrônica. (Saussure, 1960, p. 170) / 1969, p. 142).


[39] Tomar a nuvem por Juno. Laborar em falso pressuposto. Alusão à fábula de Ixião, que, acolhido por Zeus no Olimpo, depois do assassinato do sogro Deioneu, tentou seduzir Hera. Zeus então formou de nuvens um fantasma, com o qual Ixião teve relações, na crença de achar-se com a rainha dos deuses. [N ascentes, 1986].


[40] Ignoratio elenchi = ignorância do elenco. Expressão da linguagem da Filosofia designando a ignorância do raciocínio lógico, da forma de argumentar e de refutar. Falácia ou sofisma que consiste em valer-se de argumento que prova mais, ou menos, do que é preciso, ou prova o que não se quer. [Cf. Di Napoli. 1955: 161, v. I].


[41] Uma combinação de vocábulos. [Saussure, 1960, p. 147 / 1969, p. 122]. Para corresponder a ‘mot', do francês, o Autor adota o termo ‘vocábulo' e a tradução brasileira usa o termo ‘palavra'.


[42] O Autor reporta-se aqui às definições: “O signo lingüístico une não uma coisa e um nome, mas um conceito e uma imagem acústica” [Saussure, 1960, p. 98 / 1969, p. 80] e “Chamamos signo a combinação do conceito e da imagem acúscita” [idem, p.99 / p.81].


[43] Santo Agostinho (354-430). Atraído para a vida religiosa, depois de agitada juventude, foi teólogo, filósofo, moralista, bispo de Hipona. Em seus escritos, procura conciliar o dogma cristão e o platonismo, a inteligência e a fé. Exerceu grande influência na teologia ocidental e tornou-se o mais célebre Doutor da Igreja. A Cidade de Deus, As Confissões e o tratado Da Graça são suas principais obras.


[44] Valéry, Paul. (1871-1945). Poeta e pensador francês. Orientado inicialmente para a poesia, numa rede de contatos com, entre outros, Mallarmé, Heredia, Gide, Debussy, escreve uma centena de poemas, sob influxo de Mallarmé e Verlaine. Uma crise o leva a renunciar à criação literária. Consagra-se a valores que considera superiores na atividade intelectual: o conhecimento de si mesmo, o rigor e a sinceridade do pensamento. Volta-se para a matemática. Consagra-se ao “exercício do intelecto”, esforçando-se para surpreender os segredos da atividade intelectual. Escreve então Introdução ao Método de Leonardo da Vinci, A Noite em Companhia do Sr. Edmond Teste. Suas reflexões sobre os fenômenos mentais, sobre a atenção, o eu pensante, o tempo, o sonho, a linguagem são registradas, na extensão de sua vida, em numerosos Cadernos. Nos vinte anos de “claustro do Intelecto”, Valéry de fato não se desligou das artes, e de seus contatos com artistas. Tendo ”permanecido lírico”, voltou à poesia com A Jovem Parca. Sob o título de Charmes [ Encantos ] reuniu outros principais poemas que compôs depois. Abundante obra póstuma (Meu Fausto, Cadernos) consagra-o ainda. Ocupou, na Academia Francesa, a cadeira de Anatole France. Considerado o maior dos poetas de seu tempo, fez conferências (muitas delas, e outros artigos, publicadas em Variedade) em universidades, nacionais e estrangeiras. Ensinou no Colégio de França. Quando da ocupação alemã, depois de 1940, Valéry pronunciou, na Academia, considerado como um primeiro ato de resistência, o elogio fúnebre de Bergson.


[45] No original, este parágrafo é marcado e, à margem, está escrito: “refundir”


[46] À margem, uma versão alternativa: “a indigestão, a dor, a náusea do existencialismo”.


[47] Numênico, relativo a númeno. Do grego nooúmena, termo empregado por Platão, falando das Idéias. E transcrito por Kant, filósofo alemão (como noúmenon). Realidade inteligível, objeto da razão (noús), oposto à realidade sensível; e, em conseqüência, realidade absoluta, coisa em si. “A tradição que identifica o conhecimento vulgar à aparência e à ilusão, o conhecimento racional ao pensamento das coisas em si, não me parece, propriamente dever ser atribuída a Platão. Trata-se antes do pseudo-platonismo cristão, do qual a escolástica transmitiu a noção a Kant (...)”. [R. Berthelot, apud LALANDE, 1976, p. 693]


[48] No fólio B1.6,, sob o título O desvio, encontra-se projetada a seção seguinte, não desenvolvida. O Autor limita-se a anotar os seguintes registros: “Bopp - Schleicher - Brugmann - Saussure. Faltam ainda os fundamentos, Curso. Lançou-os?”.


[49] Harúspice: Trata-se do sacerdote romano que, no sacrifício, adivinhava o futuro com base no exame das entranhas das vítimas. Os dicionários de Língua Portuguesa registram “arúspice” (latim: haruspice).


[50] Referência é feita à seguinte passagem do Curso : “O liame que une o significante ao significado é arbitrário, ou mesmo, uma vez que entendemos por signo o total que resulta da associação de um significante a um significado, podemos dizer simplesmente que o signo lingüístico é arbitrário. (...) Queremos dizer que (o significante) é imotivado, isto é, arbitrário em relação ao significado com o qual ele não tem nenhuma vinculação natural na realidade.” [Saussure, 1960, p. 100-1 / 1969, p. 82].


[51] O Autor se refere aos agrupamentos associativos [Saussure, 1960, p. 175 - na tradução brasileira encontra-se uma adaptação - 1969, p. 146 ], representados nos esquemas seguintes:


[52] A seguinte passagem específica do Curso é mencionada no texto: “Propomos conservar a palavra signo para designar o total e substituir conceito e imagem acústica respectivamente por significado e significante. Estes últimos termos têm a vantagem de marcar a oposição que os separa, seja entre eles, seja do total de que fazem parte.” [Saussure, 1960, p. 98 / 1969, p. 80].


[53] O Autor refere e comenta a seguinte passagem do Curso : “ Le syntagme se compose donc toujours de deux ou plusieurs unités consécutives (par exemple : re-lire; contre tous; la vie humaine; Dieu est bon; síl fait beau temps, nous sortirons, etc.). [O sintagma se compõe assim sempre de duas ou mais unidades consecutivas (por exemplo: re-ler; contra todos; a vida humana; Deus é bom; se fizer bom tempo, sairemos, etc. [Saussure, 1960, p. 170 / 1969, p. 142]


[54] A seguinte passagem é evocada: “ On pourrait faire ici une objection. La phrase est le type par excellence du syntagme. Mais elle appartient à la parole, non à la langue (...); ne s'ensuit-il pas que le syntagme relève de la parole? Nous ne le pensons pas. Le propre de la parole, c'est la liberté des combinaisons; il faut donc se demander si tous les syntagmes sont également libres ”. [Poder-se-ia fazer aqui uma objeção. A frase é o tipo por excelência de sintagma. Mas ela pertence à fala e não à língua (...); não se segue que o sintagma pertence à fala? Não pensamos assim. É próprio da fala a liberdade das combinações; cumpre, pois, perguntar se todos os sintagmas são igualmente livres]. Depois de argumentar em favor de que o sintagma pertence à língua, valendo-se de recursos como o de frases feitas e o de certas construções regulares, Saussure conclui: “ Mais il faut reconnaître que dans le domaine du syntagme, il n'y a pás de limite tranchée entre le fait de langue, marque de l'usage collectif, et le fait de parole, qui dépend de la liberte individuelle. Dans une foule de cas, il est difficile de classer une combinaison d'unités, parce que l'un et l'autre facteurs ont concouru à la produire, et dans des proportions qu'il est difficile de determine”. [Cumpre reconhecer, porém, que no domínio do sintagma não há limite categórico entre o fato de língua, testemunho de uso coletivo, e o fato de fala, que depende da liberdade individual. Num grande número de casos, é difícil classificar uma combinação de unidades, porque ambos os fatores concorreram para produzi-la e em proporçòes impossíveis de determinar. - Saussure,. 1960, p. 172-3 / 1969, p. 144-5].


[55] À margem do texto, manuscrita, encontram-se as notas seguintes: 1) “/202'/ firmou-se no pós-românico”; 2) “A glotologia vocabulista, além de fraca em definir a unidade frase, não vinca metodicamente o discrime frase infra-fabular, sem verbo e forma de oração, e frase intra-fabular, com verbo e forma de oração”, e a seguinte, com formulação incompleta: 3) “o descuido de negar a ser o antigo valor verbal: nox est / é noite à moldes /21/ e /12/. Aparência /202'/, il est nuit - o falso il francês, ou impessoal. Tolice nossa ver o é sem sujeito.


[56] Em outra pasta do acervo do Autor, encontrou-se a seguinte versão alternativa desta seção:

“O verbo esse romano era, com os outros, um verbo verbal, noticiando um proceder mais de entender que de sentir; com os outros verbos, no seu teor vivencial, continha também aquela intenção dinâmica da língua indeuropéia, veículo fabular de inquietas tribos belicosas, mais diligentes no fazer que no contemplar. Desenvolvendo a sua língua dinâmica, aberta para demarcações temporais que a diacronia foi definindo, evitaram a parálise estática de certas línguas nominalizadas, como o chinês, que vogam leves junto às praias do agora, na epiderme do tempo.

O normal de esse, pois, era entrar em frases verbais : erat nox /12/, erat luna plena /12/, est homini anima immortalis /142/. (Encha-se a forma verbal com o sentido de “existir” para se ver que noticiava o proceder /1/, do procededor /2/, em: “era noite” - “era lua cheia” - “é para um homem uma alma imortal”).

A estrutura /202'/ (homo est mortalis) armada para noticiar juízo sobre o procededor, representa uma diligência mental aristotélica, superior ao poder de exercício da mente infra-aristotélica, limitada ao pecúlio de certos juízos comuns, não lógicos mas empíricos ou fantásticos, próprios da sabedoria vulgar: em vez de fazer juízos, noticia fazeres, dizendo de cada um que ele morre”, sem chegar à conclusão judiciária “é mortal”. Para os juízos comuns que conserva, no pecúlio da fala gnômica, serve-se da estrutura nominal /22'/, melodicamente tonalizada: homo prudens, Fabius [homem prudente, Fábio]. A igreja preservou para nós, e até nós, a intenção paremíaca da estutura /22'/, constante e freqüente nos seus textos: “militia vita hominis super terra” [luta a vida do homem sobre a terra] - “omnis homo mendax” [todo homem mentiroso] - “dies irae, dies illa” [ dia de ira, dia aquele ], enquanto foi também cultivando, na rotina escolástica, a disponibilidade filosófica da estrutura /202'/, amadurada, como fruto diacrônico, pela semantização negativa do molde /212/, onde /1/ tendeu para zero, trocando por uma função conectiva a sua velha função de noticiar um proceder: “Deus est bônus” - “homo est mortalis” - “anima est immortalis” [Deus é bom.- o homem é mortal - a alma é imortal].

Foi sob a eficácia da helenizaçào, no costume romano de pensar logicamente, que o molde /202'/ começou a firmar-se. Mas tudo se foi fazendo devagar. Quem estuda o latim daquela fase, vê como predominava, na presença de esse, a sua costumeira função de verbo verbal. Em frases do tipo “luna erat plena”, que lemos e acentuamos com o sentido /202'/, basta uma redistribuição prolatória para que se restabeleça o poder veicular da estrutura /212'/: “luna erat, plena” - “homo est, mortalis” (“a lua, cheia, era” - “o homem, mortal, é”). Séculos de cogitação ordenadora fizeram do verbo ser um verbo conector, lançado como ponte entre o sujeito e o predicado, e reduzido a zero como centro semântico. A Idade Média mobilizou-o, para a filosofia do ser, confiada no poder racional de emitir juízos sobre o procededor, sob o aval de Aristóteles. A ciência de agora, esmerando-se em ordenar procederes, confia menos em ajuizar procededores.

O tratamento geral da estrutura /212'/ produziu outros efeitos analógicos, facilitados, no pós-românico, pela própria fixação topomorfêmica da ordem /212'/. Para canseira inglórica [sic] do gramático, teimoso caçador de categorias, a semantização negativa, embora sem perfeição de eficácia, atingiu certos verbos outros que, por desvios da fala metafórica, esmaeceram no ofício de noticiar procederes: tendem para um zero a que não chegaram, sustentados ainda por alguma dinamia verbal. Confronte-se, na série, a gradação semântica de “ele é bom” - “está bom” - “continua bom” - “ficou bom” - “parece bom”. Só no primeiro exemplo, “ele é bom”, a frase é perfeitamente estática, exaustamente desverbalizada. Nos outros, embora mais ou menos apagada, move-se a força de um proceder que noticia, do estado de “bom”, o fato de ser transitório - continuado - mudado - aparente. O símbolo / 1 / (/1/ cancelado) pode representar a imperfeita assemiação de tais verbos, participantes da estrutura / 2 1 2' /.

A morfemação fabular do latim, concentrada na desinência, facilitava largamente as possibilidades estruturais de uma frase, menos sujeita, por isso, a fixações topomorfêmicas. Com intenções que se fariam subtis e até nulas, um molde como /212'/ podia trocar-se em /22'1/ - /122'/ - /12'2/: homo stat tremulus (o homem pára trêmulo) - homo trémulus stat - stat homo trémulus - stat trémulus homo. Cf. ainda viator sedet fessus (o viajor senta(-se) cansado - amicus vênit tardus (o amigo chegou atrasado).

A progressiva diluição do morfema desinencial, romanicamente intensificada, forçou o aumento da fixação topomorfêmica, a ponto de a responsabilidade funcional se acostumar a posiçòes da estrutura, como no trinômio /213/ - o menino viu o cão - onde os lugares /2/ e /3/ correspondem à função de Nominativo e Acusativo.

Essa fixação topomorfêmica, gerando um efeito transverbal, determinou, pós romanicamente, a típica veicularidade do trinômio especial /212'/: o homem parou trêmulo, o amigo chegou atrasado. Como prova da fixação, tente-se trocar a ordem dos fatores, e veja-se como pode mugar a fidelidade semântica. O efeito transverbal, com seu fio de projeção, influi adverbalização no adnominal /2'/. Não é indiferente dizer /22'1/, “o amigo atrasado chegou”, em vez de “o amigo chegou atrasado”. Cf. ainda: “ele partiu soldado e voltou herói””.


[57] Nota manuscrita em folha anexa, colada ao texto:

nox est - amatus est - est mortalis

A fala noticia e situa o proceder de um procededor

 

frase constelar: centro /1/, rodeado de /2/, /3/ e /4/.

Função dinâmica do verbo indeuropeu. Dinâmica mais para entender do que sentir. Em nox est o uso racional, já infra-aristotélico, firmou o verbo conectivo, esvaziado de dinâmica:

erat luna plena /1 2/ e /0 2 2'/

sentido ou intenção e moto-rítmica

/1/ = centro do predicado; /0/ = conector de predicação, inércia no tempo - idioma nominalizado como o chinês.

Predicação que identifica Caio é romano é professor

Quem é Caio? - Caio é este /2'02/ - /202'/ Quem é o chefe? - Riobaldo é o chefe. Que é plebiscito? /2'02/ - é o voto do povo /02'/ (scisco scitus = procurar saber} scitus? decisão.

 


[58] À margem do texto, manuscritas, encontram-se a seguinte nota: “ paralysis parálise ˜ paralisia solução do vigor dinâmico laxice”, e a versão alternativa seguinte desta passagem do texto: “a parálise ou inércia dos idiomas nominalizados (como o chinês) vogando leves, na epiderme do tempo, em agoras de aorísticas praias. Tendo por missão indeuropéia noticiar um proceder, o verbo ficou reduzido à missão temporal da predicação.”


[59] - ptose / ptoseo- (do grego ptôsis, eos). Queda; (Elemento composicional) caso, flexão. Ptoseonomia (ou campenomia: do gr. kampé (curvatura, flexão) + nom(o) + ia) Parte da gramática que trata da flexão das palavras.


[60] Referência é feita aqui à seguinte passagem do Curso, p. 177: “ Le tout vaut par ses parties, les parties valent aussi en vertu de leur place dans le tout, et voilà pourquoi le rapport syntagmatique de la partie au tout est aussi important que celui des parties entre elles. C'est là un principe général, (...). La langue présente, il est vrai, des unités indépendantes, sans rapports syntagmatiques ni avec leurs parties, ni avec d'autres unités. Des équivalents de phrases tels que oui, non, merci, etc., en sont de bons exemples. Mais ce fait, d'ailleurs exceptionnel, ne suffit pas à compromettre le principe général. Dans la règle, nous ne parlons pas par signes isolés, mais par groupes de signes, par masses organisées qui sont elles-mêmes des signes .» [O todo vale pelas suas partes, as partes valem também em virtude de seu lugar no todo, e eis por que a relação sintagmática da parte com o todo é tão importante como a das partes entre si. Aí está um princípio geral, (...). A língua apresenta, é verdade, unidades independentes, sem relações sintagmáticas nem com suas partes, nem com outras unidades. Equivalentes de frases tais como sim, não, obrigado, etc., são bons exemplos disso. Mas esse fato, aliás excepcional, não basta para comprometer o princípio geral. Regularmente, não falamos por signos isolados, mas por grupos de signos, por massas organizadas que são signos elas próprias. ]


[61] Meillet, Antoine. Lingüista francês (1866-1936). Escreveu trabalhos de gramática comparada. Autor, entre outros trabalhos, de Lingüística Histórica e Lingüística Geral. Em colaboração com Marcel Cohen, organizou a primeira edição de As línguas do Mundo (Paris, 1924), obra de que escreveu a “Introdução”, que cuida da classificação genealógica.

 

“Etimologia do Poder Fabular” (do livro Da Vida à Vivência - Conceitos de Linguística Fabular):


[*] O título dado ao texto encontra-se no verso do fólio B2.4, o último da série, em anotação manuscrita copiada abaixo. Este texto, certamente incompleto, é a reprodução de material contido em 04 fólios. Na nota, o Autor registra “8 fs”.

As seguintes seções organizam o texto:

título da seção

título da seção

O modo zoológico

Eficácia do poder fabular

condicionamento

Hic-nunc-ismo zoológico

O terceiro sistema

Posse e consciência

Fala - tempo -socialidade -hominidade

Vito-vivencial

Resumo

 


[i] Passagem de difícil leitura, no original:


[ii] À margem do texto, lê-se a seguinte nota:

“O leão sente a zebra no espaço, mas o homem, no tempo, retém a idéia zebra.”

Em outra margem também se encontram essas outras: Leão não tem remorsos, homem tem. E essa citação de A.H. [ Alexandre Herculano ], extraída de E.C.P 220 [ Eduardo Carlos Pereira ]: O leão devora a sua presa e dorme; os homens tornam-se assassinos e velam.


[iii] No final do fólio B2-1 encontra-se manuscrita a seguinte nota:

Nesta passagem do texto [fólio B2-4], e no parágrafo seguinte, encontra-se o nome “coequação” [ sic ].

 

“Disquisição do vocábulo ‘critério'” (do livro Conceitos de Linguística Fabular):


[1] À falta de caracteres próprios, vão representados em latinos os vocábulos gregos.


[2] De gredo não oferece dificuldade como variante arcaica de decreto. Mas não é líquida a etimologia de degredo "desterro", nem a de degredar. O dicionário etimológico de Nascentes, ancípte entre degredar e degradar, apresenta a hipótese de A. Coelho, para quem as duas formas são variantes sincréticas de degradare e a de Cornu, para quem o são de decretare.

Morais não averba degredar, embora consigne degredado comentando que Barros distinguia, assim, o degredado "desterrado" daquele que o é "da honra".

Parece tratar de dois verbos que o tempo contaminou.

Decretare, evolvido para degredar, nomearia primeiro o ato da auto ridade que desterra, para depois significar o próprio desterrar, num sentido especial que se guardou - após o restabelecimento erudito de decretar, para os outros sentidos de degredar, arcaizado.

Por outro lado, o latim jurídico, através do direito canônico, teria introduzido degredar, do baixo latim degredare “ rebaixar de grau", forma involutiva e técnica, de uso restrito.

A paronímia degredar-degradar gerou a contaminação, levando-se em conta, ainda, que o degredo é uma espécie de degradação, como bem imaginou o arguto Morais. Daí a coexistência do sentido "desterrar" tanto em degredar, corro em degradar, em degredado como em degradado. Era o ca minho aberto para a etimologia semântica, explicada a origem pela apro ximaçâo do sentido. A. Coelho tirou as duas formas por degradare. Cornu, por decretare.

Nascentes não registra degredo. Isso foi por prudência, lapso ou de dução. Se lhe escapou o verbete, foi lapso. Caso o haja omitido porque nada tinha que dize r, foi prudência. Mas pode ser que fosse dedução: de gredo seria um deverbal ou regressivo de degredar, ficando, pois, dispensada a dicionarização. De fato, se degredo, com seu único sentido atual de “ des terro”, não é forma avançada de decreto, tem de ser um deverbal. Acho, porém, que a omissão de Nascentes é lapso ou prudência.


[3] Os dicionários evitam discreção, indiscreção, registrando discrição, indiscriçã o. Até o de Aulete, inculpado por ter escrito discreção acabou registrando as duas grafias, mas punindo por discrição conforme pode ver-se no comentário a discreção. Está contra esta o geral parecer dos filó logos, em opinião que julgo merecer revista, apesar de Gonçalves Viana, Sousa da Silveira, Otoniel Mota, Aires da Mata Machado Filho, o ousado Cândido de Figueiredo, e outros.

Os argumentos pró-discrição podem ver-se no Escrever certo de mestre Aires da Mata. Ou antes, o argumento, que é um só, repetido por todos. Sendo Gonçalves Viana uma grande e merecida autoridade, era natu ral que se louvassem nele.

O argumento é o seguinte: discrição está para o étimo discretione como confissão, profissão, procissão para confessione, professione, proces sione.

Ora, ele é um argumento enganado. Jogou no mesmo cadinho um vocábulo de gabinete, que é discreção, e três outros de praça - confissão, profissão, procissão.

Um vocábulo de letrados é vocábulo que sai do latim por decreto de mera transferência: recebe conformação vernaculizante, mas escapa aos azares da deformação evolutiva. Processão, por exemplo, tendo andado em uso vulgar, é procissão. M as o e pretónico não se alterou em ascessão, con cessão, precessão, recessão, sucessão, todos cognatos de procissão, preservados pelo uso discreto.

Nota-se o mesmo contraste nos adjetivos correspondentes aos três nomes do argumento, pois o uso vulgar introduziu o efeito de profissão em profissional, mas o uso restrito conservou o e de confessional e processional.

Discreção é de uso letrado. Se há de guardar analogia, melhor a guar dará com secreção, de sua família legítima, e concreção, de sua família ilegítima (pois concreção descende de concretio, que descende de concretus, que descende de concréscere). Com acessão, concessão, processão, recessão, sucessão, parentes legítimos de procissão; com progressão, regressão, transgressão, compressão, expressão, opressão, repressão, obsessão, possessão.

Ao fato de Morais e os clássicos terem escrito discrição responde-se que não tinham boa "discreção" ortográfica, anteriores que foram à eti mologia, à filologia, à ciência fonética, enfim, à grafia racional de Gonçalves Viana. Muita coisa emendou a retificação moderna, em questões de mor fologia. No caso versado, é fácil de imaginar uma reação provocada pela consciência etimológica, pela presença intelectual do francês discrétion, pelo contraste entre discreção e descrição - assinalado por João Ribeiro - pelo prestígio antigo de Aulete, que indiscretamente albergara a forma impugnada.

A prosódia normal brasileira deixa perceber o e pretónico.

Resolva o bom leitor, à discreção, a respeito do que lhe pareça mais discricionário ou... discrecionário.


[4] Não é demais prevenir que a palavra ária, tão malsinada pelo ra cismo contemporâneo, aqui tem apenas alcance lingüístico: nomeia os vagos filhos dessa vaga gente que espalhou, no mapa do mundo, as chamadas línguas arianas ou indo-européias ou indo-germânicas.

Depois daquele ariano austríaco, o qual foi chefe do povo alemão e, dizem, descendia de judeus, tem sido muito relembrada a cáustica sentença de MAX MULLER: "To me an ethnologist who speaks of an Aryan blood, Aryan eyes and hair, is as great a sinner as a linguist who speaks of a dolichocephalic dictionary or a brachycephalic grammar"

 

“A hora inquieta que vivemos” (do livro Ao Correr do Tempo - 2):


[1] “Senhor, eu não quero vender minha casa. Meu velho pai morreu lá. Lá meu filho acaba de nascer. É o Potsdam meu...”


[2] ‘Vós... tomardes meu moinho? Sim, se não tivéssemos juízes em Berlim.


[3] “São jogos de príncipe. Respeita-se um moinho. Rouba-se uma província.”


[4] “O moinho é meu, tanto, pelo menos quanto a Prússia é do rei”.

 

“Para ouvir Marouzeau” (do livro Ao Correr do Tempo - 1):


[*] Alusão ao livro célebre e muito lido nos anos 40, de Nicolas Berdiaef: Uma Nova Idade Média, lançado no Brasil em tradução de Tasso da Silveira, José Olympio, 1936.

 

“Saudação ao Prof. Velloso” (texto avulso):


[*] Comentário do Autor, à margem do texto: “Vi atribuir o dito a Eduardo Prado”.

 

“Variações sobre a Arte Poética” (do livro Espírito Mediterrâneo - Estudos):


[1] O episódio referido se teria passado com Bérard e não com Herriot.


[2] OTTO BAUER. Capitalismo y Socialismo. Trad. espanhola, Madrid, 1932


[3] Conversations avec Goethe - Eckermann


[4] A Poética de Aristôteles foi conhecida dos romanos, mal compreendida dos árabes, esquecida dos escolásticos e parcialmente reconstituída pelos renascentistas. Chegou-nos truncada.


[5] Benedetto Croce, Breviário de Estética.


[6] René Fulop Miller - Espirito e fisionomia do bolchevismo.


[7] Id., ib.

 

“Estrutura da Frase” (do livro Da Vida à Vivência - Conceitos de Linguística Fabular):


[*] O texto Estrutura da Frase corresponde a conteúdo de três fólios originais, com notações manuscritas feitas à margem, ou em folhas anexas coladas ao texto. As seções que perfazem o texto assim se denominam:

título da seção

título da seção

[introdução]

sintagma 6

monofrástica

sintagma 7 - sub-sintagma 7 latino

sintagmas situadores

Resumo

sintagma /4/

lição geral

sintagma /5/

análise binominal

 


[1] À margem do texto datilografado, o Autor acrescentou as seguintes notas:

•  adnominal coordenado leva o número do coordenante: aposto e adjetivos

•  adnominal subordinado é que tem o número 7

uma resolução agradável a todos

uma : adnominal situador coordenado

agradável : adnominal aspectivo

a todos : adnominal situador subordinado

O Autor envia à lauda 3, onde se encontra o esquema seguinte:

I. elemento adverbal (sintagma) a) coordenado: N ou A de /NVA/ i.é: 2 e 3.

b) subordinado: 4 e (5); ac / ab (dt)

II. elemento adnominal (subsintagma) a) adnominal adjetivo / coordenado

b) 4 (5) 7 : ac/ab gt

gt primário (trocado por ab)

ac/ab secundário (semantizado)


[2] (N.ed.) No original, o título é introduzido em dois anexos manuscritas colados sobre o texto original. Trata-se de duas folhas de uma agenda (com datas de fevereiro de 1966) Muitos dos parágrafos seguintes encontram-se nesses anexos, o primeiro datado de 28 de fevereiro, e o outro, de 24 de fevereiro, contém os esquemas de estruturas binomiais apresentados no final do texto.


 

À margem do texto lê-se a seguinte anotação: “ a estrutura é economia diassintágmica satélites, órbita verbal, órbita nominal, functores, economia endossintágmica”.


[3] Nota anexa acrescentada pelo Autor, digitalizada abaixo:

Meillet LGI: mot : “association d'un sens donné à un ensemble donné de sons, susceptible d'un emploi grammatical donné” [“associação de um significado dado a um conjunto dado de sons, susceptível de um emprego gramatical dado”]

S[anto] Ag[ostinho], De magistro 7.9 : nomen: nihil praeter litterarum sonum ; 8.23: nom enim quae res significatur sed signum quo significatur loquentis ore procedit.. (N. ed. Sublinhando a expressão quae res e signum, o Autor redige a anotação: “já bem mas ainda ambígua”).

“Intervalo” (do livro Da Vida à Vivência - Conceitos de Linguística Fabular):


[*] Trata-se de título postiço dado pelos organizadores. Este texto apresenta-se sem título no original e é feito de dois fólios, com o conteúdo distribuído em dez partes [numeradas], listadas abaixo.

1. a função fabular

6. a estrutura fabular

2. etimologia

7. definição de sintagma

3. o ato fabular

8. o molde frástico

4. os contextos

9. a estrutura infra-fabular

5. o contexto fabular

10. a frase nominal


[i] O Autor usa quase sempre a forma “infra-fabular”, valendo-se de um hífen. Em raros momentos, vale-se também da forma “infrafabular”. A fidelidade ao original foi mantida com respeito a esses registros.


[ii] No final do segundo fólio, o Autor apresenta, escrita à mão, a análise das frases de 1 a 4, todas de estrutura fabular. O seguinte quadro de correspondências, em forma abreviada, oferece economia na análise:

1 V [/1/ representa o V(erbo)]
2 N [/2/ representa o N(ominativo) sujeito]
3 A [/3/ representa o A(cusativo) paciente]
4 ac ab [/4/ representa os adverbais acusativo e ablativo]
5 dt [/5/ representa o dativo]
6 voc [/6/ representa o vocativo]

1 - choveu /'V /
choveu muito à / 1 4 /
choveu muito aqui ontem de tarde à /14444/
1 4 4 4 4

2 - Caio veio à / 2 1 /
Caio veio da fazenda à cidade em quarenta minutos à /21444/
2 1 4 4 4

3 - Caio comprou casa à / 2 1 3 /
Caio comprou uma casa ontem das mãos de Lúcio por um milhão à /213444/
Caio comprou uma casa ontem das mãos de Lúcio por um milhão
2 1 3 4 4 4

4 - Caio no aniversário de Lúcio deu- lhe um valioso presente à / 2 4 1 5 3 /
2 4 1 5 3

5 - Caio, dá- lhe um presente pelo aniversário à / 6 1 (2) 5 3 4 /
6 1 (2) 5 3 4

 

“Método Linguístico” (do livro Da Vida à Vivência - Conceitos de Linguística Fabular):


[*] Este texto, datado de 30.10.1962, corresponde a conteúdo de dois fólios originais, com notações manuscritas feitas à margem.


[i] As anotações manuscritas, embora dificultem enormemente a leitura do texto original, revelam a criteriosa atenção do Autor para com os elementos, da língua, revelados pela anatomia da frase - a frase unidade da fala. O fragmento digitalizado abaixo o revela:


[ii] A nota seguinte, no rodapé do fólio 1, embora esquemática, esclarece pelo menos parte do que está exposto na seção 5. A cor da tinta pode revelar que a anotação foi provavelmente feita em diferentes momentos.

Pode-se oferecer a seguinte leitura desta nota:

Nota manuscrita em anexo:

1. morfema desinencial - relação endossintágmica
dissintágmica
(apomorfema e conectivo pro-morfema cf. morfema vocabular e fabular)

2. [morfema] conectivo a) endossintágmico - prep[osição]
b) diassintágmico - prep[osição]
c) diafrástico - conj[unção]

apomorfema sintágmico
conectivo pro-morfema prep[osição] sintágmico e diassintágmico
pro-morfema conj[unção] diafrástico

Conectivo diafrástico (conj[unção] conectivo metassêmico “Caio e Lúcio” passou a endossintágmico.


[iii] À margem do texto, lê-se o exemplo em latim, e a tradução:

Heri a Tusculo, via Latina, venit Caius Romam celeriter
(?) Ontem de Túsculo, pela via Latina, chegou Caio a Roma, depressa.

 

“O modo e o tempo na expressão fabular” (do livro Da Vida à Vivência - Conceitos de Linguística Fabular):


[*] Notas à margem do texto:
presente - impretérito - pretérito - antepretérito - futuro - antefuturo
viera antes de mim
viera junto comigo è as três são antepretéritas no contexto.
viera depois de mim


[1] "O modo e o tempo na expressão fabular" assimila duas das preocupações básicas do Autor: a estrutura da frase indeuropéia e a etimologia do poder fabular. É um ensaio distribuído em três grandes partes separadas pelos algarismos romanos I, II e III e repartido em 26 seções, bem marcadas com algarismos arábicos. Encontram-se duas versões datilografadas desse texto no acervo, a primeira versão podendo considerar-se como rascunho da outra, esta tomada como base do texto aqui apresentado. A matéria ocupa cinco faces de três fólios.

parte

seção

Tema da seção

I

1

simpatia vital vs. sintonia mental

 

2

espaço vs. tempo

 

3

o ato fabular e seus momentos

 

4

o destilo do tempo na língua indeuropéia

II

5

tempo fabular vs. modo fabular

 

6

os cinco modos admitidos

 

7

a fala volitiva - imperativo e optativo

 

8

O imperativo

 

9

o optativo

 

10

a fala intelectiva - indicativo, potenciativo e subjuntivo

 

11

o modo potenciativo vs. modo indicativo e modo subjuntivo

 

12

Em resumo

 

13

capacidade veicular vs. hominidade - progresso

 

14

o modo verbal na temporização intelectiva

 

15

a analogia

 

16

o progresso da analogia no imperativo indeuropeu

 

17

o imperativo ético

 

18

o subjuntivo

 

19

valores persistentes nos indícios do modo

 

20

o conjugado verbal da fala indeuropéia

III

21

A dimensão "tempo", a hominidade do Sujeito e a conjugação verbal

 

22

os desajustes e os idiomas da língua indeuropéia

 

23

a hominidade, um princípio que cresce, a cota antrópica e o sociologismo espacialista e mecânico

 

24

a visão primeira, cheia de agora, a segunda visão, de outroras condensados no tempo e a riqueza desinencial indeuropéia.

 

25

mudanças da forma veicular

 

26

a rotina vocabulista, a atualidade fabular. Falar: construção ou repetição? A fala e a língua, etc.


[2] Esse é o tempo original, o tempo tempo, que não deve ser confundido com um derivado seu, o tempo crônico ou mecânico.


[3] A) Formas do tipo canta cantou cantará podem bastar, como suficientes, à perfeição de uma estrutura monofrástica. mas formas como cantara, cantava, cantaria, afeiçoadas para um segundo momento, fazem pensar com molde fabular difrástico. Essa idéia, entretanto, de forma suficiente e forma relacionável se limita ao campo da fala intelectiva, pois na fala volitiva a forma relacionável pode ocupar um centro monofrástico: "Mísera, tivesse eu aquela enorme, aquela / claridade imortal que toda a luz resume!" (MA)

B) Mesmo na fala intelectiva, uma sucessão de momentos verbais, anaforicamente compensada, pode absolver uma forma relacionável. O imperfeito narrativo, por exemplo, imerso na concomitância mental, tomou daí suficiência monofrástica. Veja-se o diálogo da formiga e da cigarra: - "Que fazia no estio?" - "Cantava." - "Cantava? Pois dance agora!"


[4] Uma frase do tipo "não falou de você" é tão afirmativa como a do tipo "falou de você". Indica-se um evento de sinal menos ou de sinal mais, sendo impróprio falar-se em frase negativa e frase afirmativa. Afirma cada uma o sim ou o não do evento.


[5] A) Fora do grego, o optativo costuma ser objeto de alusão metafórica, sem entrar como classificação num quadro metódico. Mas isso é rigor de um morfismo que não convence.

B) Baseia-se numa hipótese etimológica a ordem de citação dos modos. Primeiro deve ter sido, na diacronia da hominidade indeuropéia, a fala pragmática ou volitiv a, cheia dos agoras de um fazer, imperativa ou optativa. Depois é que foi surgindo, reflexiva, em lentos outroras reminiscentes, a fala intelectiva de um pensar, indicativa, subjuntiva ou potenciativa.

C) O chamado modo infinitivo não é um modo. Fica-lhe bem a designação de forma infinita, por não ter o endereço pessoal das formas finitas, ou de forma nominal, por ter, como os nomes, endereço casual, podendo funcionar adverbalmente, como substantivo, a adnominalmente, como adjetivo.


[6] A) A frase imperativa, explorando a espacialidade teatral, recebe subvenção visu-auditiva do porte, do gesto, e do tom em que Primo se manifesta. Daí a economia de sua estrutura, possível de se reduzir ao teor visual de um gesto díctico.

B) O sintagma central de seu contexto fabular é uma base de verbo, sem aumento morfêmico: ama - dele - lege - fac - veni [ama - apaga - lê - faze - vem]. Se descarece de mais endereço é por não haver outro procededor senão Secundo. Não é como em discriminações do tipo lego - legis - legit [leio - lês - lê], endereçadoras da conveniência entre o proceder e o procededor.


[7] A) O grego sabia usar, no modo potenciativo, do aoristo gnômico, enganadamente havido como intemporal por tratadistas que lhe não souberam ver a pertemporidade. Dizia, por exemplo "ninguém enriqueceu depressa, sendo honesto" / oudêis eplóutEse takhéOs, díkaios Ón (quase como quem dissesse nemo auxit repente, bônus [ninguém se tornou bom de repente])

B) Com o mesmo estilo de experiência, escreveu um poeta nosso do século passado, Francisco Otaviano: "quem passou pela vida em branca nuvem, quem passou pela vida e não sofreu... só passou pela vida, não viveu".

C) Pelo fato de sugerir, não diretamente o proceder, mas o propósito de um proceder, também o imperativo ético toma feição gnômica: "não furtarás", "ama com fé e orgulho a terra em que nasceste". O imperativo ético, por ser teórico, difere do imperativo urgente ou pragmático, determinador de proceder: "saia já", "não fique aí".

D) É tão eficaz o modo potenciativo que reduz a potência mental até um proceder permanente, como na frase "a terra gira no espaço", teoricamente referida, não ao proceder da terra, mas ao seu poder de fazer.

E) O modo gnômico, sem forma sua, tinge morfias de outros modos: "o seguro morreu de velho" -"não matarás" - "ama a Deus sobre todas as coisas".


[8] Sobre Secundo coletivo. Assim como não é, o vocábulo nós, um plural feito de eus, mas tão somente um Primo que fala por si e por outrem, assim também o vocábulo vós não é um plural feito de tus, pois alude a um Secundo coletivo, distribuído nos ouvintes de Primo.


[9] O caso de uma estrutura do tipo talvez chegue hoje, exceção de uso (cf nota 10) representa um contrabando movido por "talvez", depois que "talvez" passou a dubitatvo. Basta trocar o molde da frase /414/ pelo molde /144/, e logo se vê surgir o indicativo: chega hoje talvez.


[10] Exceção do uso. Convém lembrar que uma exceção do uso não é exceção de alguma regra logicamente pré-fabricada. A lingüística é uma ciência recenseadora de existências diacrônicas e não de deduções categóricas. Não confere sentido à palavra "exceção", ou melhor, a palavra "exceção" não tem aquele sentido de preconceito com que entrou na gramática normativa. Exceção do uso, repita-se, não é exceção da regra.


[11] Uma forma verbal indeuropéia, no seu estado romano, oferece boa facilidade anatômica. Deixa ver uma base geral (dele-), própria do infecto, morfemicamenta determinável, (delev-) para o perfecto. Conjuga assim dois temas vocabulares que um morfema especial transforma na base particular do tempo requerido, pronta para se completar num sintagma verbal, mediante a determinação do endereço fabular: delebam - delebas - delebat...


[12] A) A frase, podendo ser polissintágmica, pode também, monossintágmica, oferecer coincidência com o sintagma. "Venha", por exemplo, é um sintagma e uma frase. Mas pode não coincidir com uma prolação, como logo lhe vê, na frase "venha", quem lhe suponha os vários tons prolatórios que lhe podem caber, conforme o diferir do conteúdo semântico. Portanto, cumpre notar a prolação como terceira unidade, junto ao sintagma e junto à frase.

B) Convém notar que não só de morfia fônica vive o sintagma, pois recebe também subvenções de seu lugar, no molde frástico, e até reforço visual dos moldes gesticulares. Além ainda, flutua aquela irrecenseável subtileza que o hábito fabular refina, por costumes do uso, entre Primo e Secundo. Veja agora o leitor se é tarefa qualquer distribuir responsabilidade veicular aos sintagmas da frase. De certo que não é muito pelo contrário, pois é tarefa de delicada observância. Somente por muita coragem, na coragem do governo, é que um tratadista sairá ditando as exatas minúcias, localizando em átomos fingidos uma energia infusamente frástica, na incerta densidade das moléculas. Espanta, por exemplo, essa nova moda que, após talhar cadáveres de falas, tratadas com o formol do opositismo, desce à microscopia do vocábulo, em busca de lugarinhos fônicos predestinados.

 

“Prol” (do livro Da Vida à Vivência - Conceitos de Linguística Fabular):


[*] Este texto apresenta-se transcrito em duas faces de um só fólio. Manteve-se-lhe o título “Prol” - provavelmente abreviação de “Prólogo” - tal como se encontra, a lápis, no original.


[i] No original encontra-se: “Até o começo deste século vinte,...”.


[ii] Como será mostrado nos textos a seguir, o Autor toma a língua como sendo um patrimônio individual, feito desde a infância, um patrimônio de meios, um patrimônio virtual das falas inter-individuais.


[iii] A reprodução deste texto mantém-se fiel à pontuação feita pelo Autor no original datilografado.


[iv] À margem do texto, uma outra versão, manuscrita: “ pois embora sendo duas existiam vivencialmente como cada uma. Não se usa dizer ‘as igrejas'. Dizia-se: a igreja nova / velha ”.


[v] O Autor se refere a Franz Bopp, lingüista alemão (1791-1867). Autor de Gramática Comparada das línguas sânscrita, zenda, grega, latina, lituana, eslava antiga, gótica e alemã. Estudou principalmente as relações do sânscrito com as outras línguas indeuropéias. Pode ser considerado, quanto ao método de trabalho, o fundador da lingüística comparada: utilizou o estudo comparativo para propor e resolver novos problemas relativos às línguas. Com o “bidimensionismo da comparação boppiana”, o Autor pode estar-se referindo às dimensões do som e da estrutura gramatical, ou pode estar considerando o método do confronto e da reconstituição lingüística por meio do qual as pesquisas de parentesco lingüístico buscavam origem comum (proto-língua).


[vi] No verso do fólio, encontra-se o comentário seguinte, que pode ser tomado como estendendo as idéias deste parágrafo: “A história dos dialetos ocidentais admite uma diacronia de 40 séculos, em cujo bojo ressoam formas da língua em que se diz pai, mãe, terra, vida, ir, vir, ser, correr. Diz Saussure que 80% do francês é indeuropeu: “ Les quatre cinquièmes du français sont indo-européens” [“ Quatro quintos do francês são indeuropeus” - Saussure, 1960, p. 235 / 1969, p. 200 ]. Tome o pesquisador esse dialeto neolatino e lhe vá inventariando o patrimônio, retrospectivamente, configurando-lhe estados de língua entre o século XX e o século I. Chegando, pelos estados de língua da língua, àquele que serviu ao romano (Latim) continue a recessão ...”

 

“Estética” (do livro Espírito Mediterrâneo - Estudos):


[*] “A vulgaridade prevalecerá... A era igualitária é o triunfo das mediocridades. É deplorável, mas é inevitável e é uma vingança do passado. A humanidade, depois de ter-se organizado na base das dessemelhanças individuais, organiza-se agora na base das semelhanças... A arte sairá perdendo...”

 

“Introdução” ao livro Da Vida à Vivência – Conceitos de Linguística Fabular:


[1] Maturana, Humberto. A Ontologia da Realidade. Belo Horizonte: Editora da UFMG, 1999, p.175.


[2] O texto foi transcrito do livro Conceitos de Lingüística Fabular, p. 45-6. Outra versão dessa fábula, encontra-se a seguir, transcrita da margem de um fólio inédito [F2], ao lado de notas sobre Cassirer:

“No princípio era o Objeto. O sol o monte o rio a planta o peixe o animal o homínida. Mas eram coisas ainda sem nome. Adhuc sine nomine res. Isso porque ainda não existia o Sujeito. Sujeito é aquele que interna em si o mundo, veiculado em nomes. Um dia, na paciência genésica das origens, dois homínidas, Primo e Secundo, aprenderam a “manifestar pela voz” a representação de uma idéia. Então começaram a existir os seres: o sol, o monte, o rio, o peixe, o animal e o homínida se fez homem. Et homo factus est. E o homem se fez Sujeito, ao se fazer capaz de se opor ao Objeto. E transformou o objeto em reais internados no espírito, o seu espírito de Sujeito. Esses reais eram repercussões de procedimentos do Objeto, repercussões vivencialmente associáveis a vozes que a fala de Primo produz, dirigida a Secundo, veiculando as imagens do mundo.”


[3] Oliveira, Alaíde Lisboa (1996: 120).


[4] Conceitos de Lingüística Fabular (p. 127)


[5] Essa pontuação se encontra na versão da mesma fábula apresentada na nota 2.


[6] O dicionário do Aurélio registra, derivado de homem, o adjetivo hominal e o nome correspondente hominalidade. O termo hominidade, exprimindo o caráter e a essência de seres humanos mentalizados e espiritualizados, é criado pelo Prof. J. Lourenço, assim como o verbo hominizar, que define o progresso do homem Sujeito, em seu processo de mentalização e de espiritualização.


[7] Conceitos de Lingüística Fabular (p. 100)


[8] Conceitos de Lingüística Fabular (p. 83)


[9] Conceitos de Lingüística Fabular (p. 83)


[10] O Espírito Mediterrâneo (p.122)

 

José Lourenço de Oliveira, Educador / capítulo 01. a cultura:


[*] BUTLER, N. M. The meaning of Education, 1915.