Reflexões de um jovem escritor sobre as relações raciais no Brasil

Glauciane Santos*

 

O ator e dramaturgo baiano Lázaro Ramos nos últimos anos têm experimentado as múltiplas possibilidades da escrita literária: publicou os livros infantis A velha sentada (2010), Cadernos de Rimas do João (2015) e agora o livro de memórias e reflexões intitulado Na Minha Pele (2017). Sua mais nova obra não é propriamente uma autobiografia, ainda que ressoe para alguns como traços íntimos de sua vivência. A temática pungente da narrativa são as relações raciais no Brasil, especificamente o olhar crítico do próprio autor e das vozes daqueles que o circundam: sua família, amigos, atores, cineastas, escritores, desconhecidos e os entrevistados da atração Espelho, programa veiculado no canal Brasil. Neste, Lázaro, dirige e entrevista expoentes da cena cultural, e expõe temas da atualidade brasileira, considerando a cultura negra. Segundo o escritor o programa “surgiu a partir do ‘Cabaré da Raça’ (1997), espetáculo criado e encenado pelo Bando de Teatro Olodum”, grupo que o acolheu como ator aos dezesseis anos.

Na esmerada produção gráfica, a novidade é a fotografia de Bob Wolfenson, que retrata o próprio Lázaro Ramos na capa, fato que por si já constitui uma mensagem enunciativa e discursiva para o público leitor. Este pode presumir erroneamente, antes mesmo de abrir o livro, que é vaidade pretenciosa do escritor autorretratar-se. Entretanto, a imagem ilustrada nos convida a fazermos interlocuções com o título da obra, e também redimensiona a possibilidade de convergência com as memórias do autor. Tornou-se um hábito de inúmeros leitores do livro Na Minha Pele tirarem fotografias para as redes sociais retratando-se na seguinte posição: colocam sobre metade de seus rostos parte da obra literária, e fotografam-se em simbiose com esta. A leitura que fazemos é provocada pela intencionalidade da proposta, que tende, antes mesmo do abrir as páginas do livro, a fazer o leitor ter empatia e colocar-se no lugar do outro, para que de alguma maneira possa desvestir-se de ideias preconcebidas ao iniciar a leitura.

O livro inicia-se com o prefácio intitulado “A Saga do Camarão”, no qual o escritor, mesclando humor e seriedade, por meio da metáfora do desaparecimento real do artrópode, nos conta como nasceu a proposta narrativa. Vale ressaltar o conflito inicial em relação à escrita da obra, em que Lázaro admite o receio de problematizar a questão racial.

Fazer um livro sobre o ponto de vista de uma exceção não ajuda em nada a questão da exclusão dos negros no Brasil. Meu Deus, como fazer um relato quase autobiográfico sem tornar o texto uma apologia a mim mesmo e meus pares um pouco mais bem sucedidos. (RAMOS, 2017, p.11).

Em relação ao fragmento citado, cabe apontar que, ao contrário do que pensa o autor, sua escolha e objetivos narrativos não o estigmatizam. Obviamente que este fala de um lugar de privilégio econômico e cultural, mas, na condição de escritor negro, por onde quer que seu texto ecoe não deixará de ser marcado enquanto voz de uma categoria étnica historicamente subalternizada. Frantz Fanon, em sua obra Pele negra máscaras brancas (2008), ressalta que “há uma zona de não ser, uma região extraordinariamente estéril e árida, uma rampa essencialmente despojada, onde um autêntico ressurgimento pode acontecer. A maioria dos negros não desfruta do benefício de realizar esta descida aos verdadeiros Infernos.” (FANON, 2008, p. 26) Em diálogo com o excerto, quero inferir que autoafirmação do negro é necessária, não é maléfica, possibilita libertar-se.

Lázaro reconhece modestamente que é um iniciante na escrita narrativa e afirma não ser um estudioso das relações raciais. Percebemos nesta breve introdução aspectos que estarão presentes em todo livro como “fluxo de informações, sentimentos e reflexões” (RAMOS, 2017, p.13). Outra característica presente na obra, que a torna tanto prazerosa quanto curiosa, são as inúmeras referências literárias, históricas, sociológicas, musicais e cinematográficas. Para os que as desconhecem, o livro é um convite a novas descobertas e para os que as têm na memória a leitura torna-se um presente.

Cabe ressaltar, a delicadeza do autor em rememorar algumas personalidades negras em sua narrativa: o poeta Luiz Gama; as escritoras Ana Maria Gonçalves e Conceição Evaristo; a jornalista Glória Maria; o cineasta e primeiro protagonista negro da televisão brasileira, Zózimo Bulbul; o geógrafo Milton Santos; o cineasta Joel Zito Araújo; o historiador Jaime Santana Sodré, o escritor e estudioso Nei Lopes; o professor Carlos Augusto de Miranda Martins, dentre outros ilustres nomes. Estes não estão gratuitamente em sua escrita, há observações e ressonâncias de suas ricas vozes, a maioria delas originária das entrevistas realizadas no Programa Espelho.

Na minha pele constitui-se de linguagem despojada que se divide em onze capítulos, que podem ser lidos fora da sequência. Todos se complementam e retornam ao raciocínio anterior. São eles: “A ilha”, “Quero ser médico”, “Entre o laboratório e o palco”, “A ribalta”, “Conexão”, “Imaginário”, “Escolhas”, “Empoderamento e afeto”, “Quando fiquei sem resposta”, “O filtro” e “A roda”.

O primeiro capítulo, “A ilha”, rememora o lugar de infância do escritor, Ilha do Paty, distrito de São Francisco do Conde, a 72 quilômetros de Salvador. Neste lugar estão guardadas as reminiscências do primeiro afeto, da convivência com os mais velhos, da recordação da família materna e paterna, da liberdade da meninice, e também da lembrança de um país desigual, “a ilha abriga, basicamente quatro famílias – os Queiroz, os Amorim, os Ramos e os Sacramentos” (RAMOS, 2017, p. 17). Somando-se a isto há um reclame nos fragmentos pela ausência de registros dessas famílias, e da própria origem desta localidade. Na ilha, a maioria dos moradores era negra, a única moradora branca era uma curandeira. A discriminação e os preconceitos não foram vivenciados neste lugar, pelo contrário, a imagem simbólica era de pertencimento e celebração das raízes. Com doze anos de idade, “algo penetrou em sua pele sem que este notasse” (RAMOS, 2017, p. 25), o contato com canções do bloco carnavalesco Ilê Aiyê na cidade de Campo Grande o encheu de autoestima e de amor por si mesmo e sua raça.

A migração para a metrópole nos remete a Lima Barreto, que nos relata em seu romance Recordações do Escrivão Isaías Caminha (1909) a saga de um jovem negro que se muda do interior do estado do Rio de Janeiro para capital, em busca de melhores condições de vida. A diferença entre as narrativas é que o personagem de Lima Barreto perde seus ideais e suas raízes. Suas ambições pessoais estão acima de qualquer sentimento coletivista e a família, os projetos humanitários e alguns de seus sonhos, que outrora eram um anseio, são relegados por ele, e de certa forma também pela sociedade, que lhe nega oportunidades, demonstrando com esta atitude evidente discriminação por sua condição de mulato. Apesar da similaridade inicial, o destino de ambos se afasta, e ao escritor Lázaro Ramos, resta-nos desejar que prossiga em suas realizações pessoais e coletivas, para que possamos desfrutar dos contributos éticos de sua arte.

Em “Quero ser médico”, nos diz sobre a saída definitiva de seu lugar de proteção para a cidade grande, em busca de melhores oportunidades. O senso de coletividade, herança predominantemente africana em terras brasileiras, segue sendo um aliado em sua vida. Lázaro nos conta que foi recebido por sua madrinha, ex-moradora da ilha. A residência desta era local de acolhimento para aqueles que chegavam da terra natal, com a herança da afetividade materna e marcas da responsabilidade herdada do pai, as múltiplas crenças religiosas da família, o Candomblé, o Catolicismo, a cura pelas plantas, também traços africanos. O escritor iniciará sua jornada rumo a trajetórias desconhecidas, sem compreender profundamente a potência de sua ancestralidade negra vivenciada no âmbito familiar. Na escola particular em que estudou pouco se falava sobre a história africana, mas a entrada no Bando de Teatro Olodum abriu horizontes epistemológicos em relação ao negro e ao seu empoderamento. Ali interpretou Zumbi aos dezessete anos, em sua primeira atuação teatral. Neste capítulo a presença de falas e pensamentos atribuídos ao programa “Espelho” é mais profícua. Sua primeira entrevista foi com o pensador Ubiratan de Castro, que chamou a atenção do escritor para compreender a invisibilidade do negro na história brasileira, para a ausência de referência e protagonismo, para a falsa inexistência, fruto do proposital apagamento.

Alguns processos de conscientização foram assumidos pelo autor já adulto, para compreender, por exemplo, que em seu universo familiar o vocábulo negro nunca havia sido proferido, sendo algo assimilado só mais tarde. Além disso, refletir sobre as condições de trabalho de sua mãe enquanto doméstica sempre o intrigou. Correlacionar esta profissão com as estruturas historicamente estabelecidas socialmente foi um exercício da maturidade. O que o escritor declara sobre o ofício de dona Célia e o tratamento dado a esta e a ele enquanto filho da empregada revelam o que nossa sociedade dominante ainda possui de desprezível. Mas dona Célia, aproveitou sua vida, segundo o escritor “ela apontou sua vocação antes mesmo que este o fizesse” (RAMOS, 2017, p. 37), e com sua visão ele acreditou que poderia ser o quisesse. E seu primeiro desejo foi o de ser médico.

Nos capítulos intitulados “Entre o laboratório e o palco” e “A ribalta”, mais mudanças e observações: morar com Ivan, seu pai, pela primeira vez; a emoção com historiador Jaime Sodré, outro entrevistado na TV; de um jovem retraído e envergonhado a fazedor de grandes amigos que marcaram sua juventude; a escolha do curso técnico em patologia clínica, no colégio Anísio Teixeira; o Bando de Teatro Olodum; o palco e as primeiras atuações como ator; os amigos do teatro, seus primeiros ídolos; a doença degenerativa da mãe; sua inserção no cinema; a ausência de relacionamentos amorosos em sua adolescência.

Lázaro Ramos observa que ocorreram situações parecidas na juventude de sua esposa Taís Araújo, também afrodescendente. Sobre esta questão, Edward Telles, em seu livro, Racismo à Brasileira (2003) nos revela a dificuldade que mulheres e homens negros possuem ao buscarem relacionamentos amorosos. Ao contrário do que muitos imaginam, relacionamentos inter-raciais não são tão comuns e as mulheres negras mais retintas ficam ainda mais excluídas nesse contexto, mesmo entre seus pares étnicos.

Apesar do desejo de aproximar-se do teatro como uma espécie de estratagema para soltar-se e perder a timidez, a inserção do escritor no Bando de Teatro Olodum envolveu outros compromissos: “a essência da companhia é misturar humor e crítica social e contundência para falar do ponto de vista do negro no mundo” (RAMOS, 2017, p.46). Compreendemos este espaço como um lugar de aquisição de autoestima, formação e reflexão para o autor, enquanto homem. Depois da ilha de Paty, talvez este tenha sido o monumento de memória que elucidou para ele a representatividade do negro no mundo.

Já a amizade com Wagner Moura foi importante para sua trajetória enquanto ator, eles se conheceram na gravação de um filme. Foi o amigo que o encorajou a sair de Salvador e enxergar outras perspectivas de atuação teatral. Nesta etapa, e neste novo ambiente, a delicadeza foi a forma utilizada para falar sobre discriminação racial entre seus amigos brancos. Lázaro reconhecia nesta época seu despreparo político e até onde podia prosseguir. Na atualidade este admite a necessidade de provocar e incomodar para posicionar-se quanto à temática em alguns momentos. Na ocasião anterior o autor observou:

[...] que existiam questões que não precisavam ser ditas, tinham de ser pensadas. Nestas discussões e negociações, de vez em quando a preguiça impera. É mais fácil escolher um argumento – como defender que no Brasil o racismo é mais brando – e insistir nele, dizendo que tudo é mimini ou mania de perseguição. Sem assumir a complexidade, nada muda de lugar. (RAMOS, 2017, p.58).

O escritor, protagonista de Madame Satã (2002), filme que o provocou profundamente, obteve outras projeções artísticas que o fizeram crescer, mas ele compreende que é uma exceção, e não a regra, enquanto homem negro.

Os desafios de ascender socialmente e se inserir em outra realidade sendo uma exceção. Os olhares de soslaio. Os subtextos que se percebem nas entrelinhas. Os medos e as sutilezas do preconceito. A solidão. Será que consigo vencê-los? E será que consigo vencê-los suprindo também o desejo de exercer minha profissão com liberdade e criatividade? (RAMOS, 2017, p.60).

Indagações e questionamentos como estes fazem leitor e autor refletirem sobre seu próprio percurso, e também a respeito das trajetórias de outros sujeitos negros, na narrativa.

No que concerne aos capítulos “Conexão”, “Imaginário” e “Escolhas”, o primeiro título é um divisor de águas discursivo tanto para narrativa, quanto para interlocução entre narrador e leitor, pois há uma série de questionamentos sobre questões raciais direcionados ao expectador e suas reais intenções com a leitura da obra. A estratégia do autor ao estruturar a narrativa nesta altura foi alertar aos leitores que desse momento em diante, estes seriam provocados e incomodados se continuassem a leitura.

Os que prosseguiram foram instigados a refletir sobre as relações raciais e suas engrenagens, inicialmente por pinceladas de Milton Santos, Florestan Fernandes e Octavio Ianni. Segundo o escritor os questionamentos e a busca por aprofundamento a respeito destas questões se tornaram mais fortes com o nascimento de seus filhos, João Vicente e Maria Antônia. E suas preocupações quanto a eles era proporcionar a possibilidade de inundá-los com referências positivas a fim de que crescessem cheios de autoestima.

Em relação a isto, sabemos dos avanços e conquistas por uma educação inclusiva, menos racista e aberta ao Outro e à diversidade, mas reconhecemos que há muito que ser feito nacionalmente como aponta o próprio autor. A literatura infantil com personagens negros que não estejam estereotipados é uma demanda em curso, assim como a divulgação de personalidades negras presentes em nossa história e cotidiano, desenhos e heróis em que a figura do negro apareça positivamente também. A parceria com a esposa, Taís Araújo, na educação dos filhos torna-se fundamental neste contexto.

Com a paternidade, podemos inferir que ganhamos um olhar crítico e delicado ao mundo sociocultural que circunda a criança negra, a preocupação não é somente por seus filhos, mas por toda e qualquer criança em não ser nutrida por visões racistas. Resta-nos o questionamento evidente do escritor:

Se não existirem referências da cultura negra, ou se todas elas forem negativas ou por demais insignificantes, isso não impactará diretamente em nossa capacidade de sonhar, de nos sentirmos possíveis, de nos identificarmos com alguém? (RAMOS, 2017, p. 78).

Outro ponto polêmico suscitado pelo autor é “a ideia da raça negra como sinônimo de degeneração” (RAMOS, 2017, p. 81), uma acertada decisão narrativa, pois se torna impossível conhecer as questões raciais, mesmo que minimamente, se ainda estivermos presos às perspectivas racialistas do século XIX no Brasil. Muito do que se construiu sociologicamente e historicamente, ainda que teoricamente defasado na atualidade, foi absorvido em nossa sociedade, o que leva a crer que há reflexos desse período que reverberam ainda hoje. Em sua obra As raças humanas e a responsabilidade penal no Brasil (1894), o médico Nina Rodrigues utiliza fatores biológicos para explicar fenômenos sociológicos. E se vale de teorias raciais europeias, para as quais o negro era predisposto geneticamente à criminalidade. Mesmo que tais ideias atualmente sejam irrelevantes e desacreditadas, o que ocorre na sociedade brasileira em relação aos altos índices de jovens negros mortos e outros tantos presos nos leva a pensar na permanência desses engodos que só reforçam a estigmatização do passado.

Para Lázaro Ramos “o exercício de estar atento para representações danosas é importante e precisa ser feito” (RAMOS, 2017, p. 83), e não apenas no campo da descriminalização de homens, mulheres e jovens negros, mas em todos os outros, inclusive naquele em qual o autor está inserido, enquanto ator de televisivo e teatral. Os abismos são gigantescos, sem falar nas engrenagens que sustentam tais cenários. Considerando os papéis estigmatizadores na atuação artística, em que muitas vezes são relegados atores e atrizes negras, o processo de aceitação de trabalhos do escritor enquanto ator tem se tornado mais consciente, pois entende que neste universo está ocupando um lugar de privilégio, prerrogativa que o faz optar por papéis que o desloquem do lugar estigmatizador, a preocupação não é fazê-lo apenas para si, mas para os seus.

No que se refere aos capítulos “Empoderamento e afeto” e “Quando fiquei sem resposta”, inicialmente há um destrinchar a respeito da origem do léxico empoderar, palavra que o movimento negro nos últimos tempos tem se apropriado como forma de resistência. Não se trata de um movimento abstrato, o corpo e a alma dos negros brasileiros, principalmente os mais jovens, têm ousado levantar suas vozes em variados espaços. Dentre os expoentes estão a cantora Karol Conka, a rapper e adolescente Mc Soffia, sem falar nas blogueiras e blogueiros negros da atualidade e evidentemente o movimento Hip Hop.

O autor demonstra que está antenado ao movimento feminista e à afetividade, no entanto é muito superficial quanto ao assunto relacionamentos afetivo entre homem negro e mulher branca, mesmo citando a pesquisadora Claudete Alves (2010), que aborda a solidão da mulher negra em seus estudos. Existem outras pesquisas como a citada anteriormente, Racismo à brasileira (2003) de Edward Telles, que traz contribuições importantíssimas a este respeito.

No tocante à ausência de respostas, o autor reconhece que está em terreno movediço para as questões raciais que cotidianamente o cercam. Na busca por toda e qualquer identidade sabemos que os limites e o sentimento de incapacidade muitas vezes nos governam. Em seus escritos a defesa das ações afirmativas possui legitimação, não há o que discutir ante as discrepâncias do racismo estrutural e histórico, os dados disponibilizados por órgãos de pesquisas como IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), Atlas da Violência, divulgado pelo IPEA (Instituto de Pesquisas Econômica Aplicada), nos apontam, como já dito, para índices altíssimos de homicídios de jovens negros.

Quanto aos dois últimos capítulos intitulados “O filtro” e “A roda”, estes nos sugerem explicitamente sobre como descolonizar nossas relações e educar o branco para relações raciais. Ressaltamos a importância de o sujeito branco compreender a si mesmo enquanto entidade sociológica. A compreensão da teoria da Branquitude seria um avanço para a sociedade brasileira, segundo a estudiosa Vron Ware (2004), pois implica na conscientização e reconhecimento sobre os privilégios de ser branco, e também na importância de que todos assumam o lugar que ocupam socialmente. Isso quer dizer que a questão do racismo não é uma problematização relativa apenas aos negros, mas de todos.

Ao final da narrativa, retornamos às referências. Lázaro Ramos atua na linha a que alguns teóricos têm chamado “Letramento Racial” – o educar por meio das relações raciais, quer utilizando livros, artigos, filmes, materiais, sites ou qualquer outro meio, com o intuito de propor conscientizações reais por uma educação antirracista. Obviamente que há lacunas em sua narrativa, há os nãos ditos, entretanto isso não é escandaloso, o escritor no início da narrativa procura precaver o leitor de seu pouco trato com assunto, reconhece que está engatinhado neste trajeto de descobrir-se, e o mais instigante afirma que tem muito que aprender.

 

Belo Horizonte, 29 de setembro de 2017.

 

Referências

HOLLANDA, Sérgio Buarque. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

BARRETO, Lima. Recordações do Escrivão Isaías Caminha. São Paulo: Ática, 1995.

FANON, Franz. Pele negra máscaras brancas. Salvador: EDUFBA, 2008.

FREYRE, Gilberto. Casa Grande e Senzala: Formação da família brasileira sob o regime patriarcal. 34. ed. Rio de Janeiro: Record, 1998.

RAMOS, Lázaro. Na minha pele. Rio de Janeiro: Objetiva, 2017.

RODRIGUES, Nina. As raças humanas e a responsabilidade penal no Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora Guanabara, 1933.

SPIVAK, Gayatri Chakravorty. Pode o subalterno falar? Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010.

TELLES, Edward. Racismo à Brasileira. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2003.

 

 

* Glauciane Santos é professora, graduada em Letras e Mestre em Estudos Literários pela UFMG. Participa do grupo de pesquisa “Afrodescendências na literatura brasileira”, desta mesma Instituição.