Vozes-Mulheres 

                      Conceição Evaristo

A voz de minha bisavó
ecoou criança
nos porões do navio.
Ecoou lamentos
de uma infância perdida.

A voz de minha avó
ecoou obediência
aos brancos-donos de tudo.

A voz de minha mãe
ecoou baixinho revolta
no fundo das cozinhas alheias
debaixo das trouxas
roupagens sujas dos brancos
pelo caminho empoeirado
rumo à favela

A minha voz ainda
ecoa versos perplexos
com rimas de sangue
        e
        fome.

 

A voz de minha filha
recolhe todas as nossas vozes
recolhe em si
as vozes mudas caladas
engasgadas nas gargantas.

A voz de minha filha
recolhe em si
a fala e o ato.
O ontem – o hoje – o agora.
Na voz de minha filha
se fará ouvir a ressonância
O eco da vida-liberdade.
   
(In: Poemas de recordação e outros movimentos, 3.ed., p. 24-25)

 


LIVROS E LIVROS

Ficção

José Endoença Martins - O Dom de Casmurro - Resenha
Exu, entidade do princípio e da transformação. Ele se multiplica, transmutando. Instaura o princípio da reciprocidade, da transformação e do movimento. Nem bom, nem mau: reúne em si todas as contradições do homem. Exu resolve conflitos, mas também pode provocar. Separa e une. Nas palavras de José Endoença Martins: “Exu é capaz de neutralizar polaridades e polarizações para ensejar fusões e combinações” (p. 12-13). Nada melhor do que a imagem e a ideia de Exu para perceber o objeto desta resenha: O dom de Casmurro, romance escrito pelo...

Poesia

Eliane Marques - O poço das marianas
  33 emparedadas na lamaentre as frestas das paredesemparedadassobre o sândaloo mormaço tramado pelas ranhurascom as órbitas entalhadasemparedadas nesse poçopara que em suas fendastodo murmúrio seja rocaemparedadas nesse poçosustêm a brandura da água Eliane Marques2021   Quando se lê o novo poemário de Eliane Marques, intitulado O poço das marianas, publicado pelo selo Orisun Oro, da Escola de Poesia, está-se diante de uma explosão das camadas significantes, de uma poética que se cria, p...

Ensaio

Elisa Larkin Nascimento - Abdias Nascimento: grandes vultos que honraram o Senado
Abdias Nascimento – esse é um nome que deve ser reverenciado, no Brasil e em outras partes do mundo onde existam africanos e seus descendentes! Já tivemos muitos batalhadores pela causa da igualdade racial, mas, se quisermos citar uma personalidade que se destacou e cujo trabalho significou muito para a melhora das condições dos menos favorecidos e dos negros, sem dúvida, Abdias merece ser colocado em lugar de destaque. Por isso mesmo é considerado o precursor do movimento negro no Brasil. Neste ano de 2014, comemoramos seu centenário de nascimento, já que veio ao ...

Infantojuvenil

Jorge Dikamba - Amaní
Mais de trezentos anos de escravidão marcam a história de um país. E isso se reflete na maneira como nós, da outra extremidade do Atlântico, enxergamos a África. Em geral, a vislumbramos a partir do exotismo, fruto de nosso desconhecimento e das imagens estereotipadas difundidas no Ocidente. Mesmo nas escolas, o continente africano só passa a “existir” após a chegada dos europeus. De certa forma, é outra a África representada em Amani. Historiador e pesquisador da cultur...

Memória

Júlio Ludemir (Org.) - Carolinas: a nova geração de escritoras negras brasileirasCarolina, Carolinas, e um futuro que se abre Fernanda Rodrigues de Miranda* Carolina Maria de Jesus é um signo. Uma mulher preta insubmissa. Altaneira. Um caminho luminoso que se abriu na mata fechada. Uma clareira. Uma revolução. Sabe dela quem sabe das bifurcações de cada gesto, quem sabe dos desafios de si, quem colhe vento de mudança porque antes lutou pelas mudas de ousadia. Carolina é uma estrada. Sua grande marca na literatura é aquela que sinaliza a nossa cor, a nossa cara, a nossa resistência, a nossa herança. De tudo que ela nos deixou, ficou principalmente o sim, eu escrevo.  “– ...

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