Política e religiosidade nos escritos de D. Silvério Gomes Pimenta

 

O pobre filho de Antônio Alves Pimenta e Porsina Gomes de Araújo é hoje o Bispo de Mariana. Altos juízos de Deus

Carta pastoral comunicando aos diocesanos sua eleição, 
confirmação e posse, como Bispo de Mariana.
Cartas pastoraes, 9.3. 1897

 

Elisângela Lopes*

 

A produção intelectual de Dom Silvério Gomes Pimenta iniciou-se por volta de 1860, quando retornou da Europa e passou a publicar artigos de natureza religiosa e política. Uma das suas maiores preocupações, enquanto Vigário Capitular, foi a extinção da escravidão no Brasil, pois antes mesmo da aprovação da Lei do Ventre Livre, em 1871, o sacerdote “vinha esclarecendo o assunto e preparando a opinião pública para o fim, coligindo (sic) vários escritos, discursos, memórias, representações, programas, projetos de notáveis brasileiros.” (SOUZA, 1927, p. 50).

Dado o primeiro passo para a libertação dos escravos, com a aprovação da Lei do Ventre Livre, em 28 de setembro de 1871, Silvério dedica uma página do livro A vida de Dom Viçoso, a “patentear bem ao vivo os males da nefanda instituição que nos humilhava à face do mundo civilizado” (Idem). Neste texto, ele apresenta em tom incisivo a condenação do regime escravocrata através da descrição de seus males, aos quais se juntavam, segundo o arcebispo, “as tentações contínuas entre senhores e escravas, achando aqueles no domínio azo para o abuso e a violência, e diminuindo nestas a sujeição as forças para a resistência; ajuntem-se a cobiça dos donos interessados, e talvez empenhados nas desordens das escravas, porque com frutos criminosos aumentam a fazenda e a riqueza, e faremos ideia de quão poderosa agente é a escravatura para estragar os costumes de um povo.” (In: SOUZA, 1927, p. 51)

O direito de propriedade que irá reger as relações entre os senhores e os escravos era o pensamento que promovia e, ao mesmo tempo, justificava o abuso sexual e a punição física dos cativos. Como denuncia Silvério, a violência contra as escravas tinha como objetivo principal o aumento da mão-de-obra e, além disso, reforçava a dominação e a dependência desta em relação à casa senhorial, pois com um filho nos braços, a fuga e o sustento próprio se tornariam mais difíceis.

Comenta-se que, durante as aulas, o arcebispo fazia uso de anedotas e alusões capazes de prender a atenção dos distraídos e estimular o aprendizado, e que promovia discussões a respeito da escravidão e do mal que causava para a sociedade. Dessa forma podia fazer proliferar o discurso político, que saía do papel para as salas de aula.

Em 1873, a conselho de D. Viçoso, o padre Silvério funda o periódico religioso O Bom Ladrão, espaço onde derramava a doutrina cristã, desfazia mentiras e calúnias que eram direcionadas à Igreja, refutava erros, arrancava as máscaras daqueles que, sob o pretexto de servir aos católicos, desviavam da Igreja os incautos ou ignorantes. O nome do periódico, que durou quatro anos, alude ao fato de que se destinava não somente à publicação de artigos escritos por religiosos brasileiros, mas à tradução de publicações de outros países – textos dos quais o padre se apropriava, como bom ladrão, para melhor difundir o catolicismo.

Suas Cartas pastorais, escritas entre 24 de novembro de 1890 e 10 de fevereiro de 1922, dirigidas aos párocos e fiéis da diocese, são marcadas pela variedade temática e permitiam ao Arcebispo explanar suas idéias e sustentar suas doutrinas. A respeito da produção literária de Dom Silvério Gomes Pimenta, destacamos o seguinte comentário:

A personalidade literária de Dom Silvério ficou marcada por seus livros e cartas pastorais, gozando o arcebispo acadêmico da fama de poliglota [...] Publicou poesias em latim. Sua obra maior é a Vida de Dom Viçoso. Como jornalista, Dom Silvério fundou e dirigiu, em Mariana, O Bom Ladrão, O Viçoso, O Dom Viçoso e o Dom Silvério, editados sob sua orientação e dirigidos pelos padres Severiano de Resende e Luís Espechit. (camaracongonhas.mg.gov.br/dom_silverio.htm).

 

Referências

SOUZA, D. Joaquim Silvério de. (Primeiro Arcebispo de Diamantina). A vida de Dom Silvério Gomes Pimenta: Primeiro Arcebispo de Mariana. São Paulo: Lyceu Coração de Jesus, 1927.

CASTRO, Fernando Pedreira de. Dom Silvério Gomes Pimenta. Rio de Janeiro: 1954.

<camaracongonhas.mg.gov.br/dom_silverio.htm>

Nota

* Elisângela Lopes é Mestre em Estudos Literários pela UFMG, Doutora em Letras - Literaturas de Língua Portuguesa pela PUC Minas e professora de Língua e Lliteratura do IFSULDEMINAS.

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