Cabaré da Rrrrraça

(Fragmentos)

Rose Marie - [...] (Mímica de tocar campainha de uma porta) Blim, blão.

Nêgo Jonh - (Abre a porta). Pois não?

Rose Marie - Boa noite, o patrão está?

Nêgo Jonh - Não estou interessado em comprar nada não. (Bate a porta. [...])

(Meirelles, 1997, p. 6)

[...]

Rose Marie - (Toca a campainha) Blim Blom.

Dra. Janaina - (Abre a porta) Pois não?

Rose Marie - Boa noite. A patroa está?

Dra. Janaina - O que faz a senhora pensar que eu não sou a patroa? A senhora sabe na porta de quem bateu? Eu sou uma advogada e a senhora pode ser presa.

(Meirelles, 1997, p. 7)

[...]

Rose Marie - (Toca a campainha). Peen

Edileusa - (Vem atender. Canta). Eu me orgulho de ser uma mulher negra / Eu tenho Kelê

Rose Marie - O patrão está?

Edileusa - Um momento, vou chamar, viu, simpática? (Dá um giro sobre si mesmo)

Pois não? Eu sou o patrão e a patroa. Agora sai da minha porta, sua derrotada, fracassada. [...]

(Meirelles, 1997, p. 10)

[...] 

Rose Marie - (Aproxima-se de Jaque, que está no palco). Ô, minha filha, você gostaria de trabalhar comigo?

Jaque - Como assim?

Rose Marie - Como diarista, só às segundas, quartas e sextas. Fins de semana livre, carteira assinada, tem outra moça...

Jaque - A senhora está me confundindo com empregada doméstica?! Eu nunca fui, nunca tinha sido discriminada.... mas reconheço a discriminação, tá? A senhora, da minha cor, morena igual a mim, está me discriminando?... Isso é um absurdo! A senhora quer empregada doméstica, vá buscar no interior, aquelas meninas... Gente, que sensação!... Ai, Flávia Karine, fui discriminada!

(Meirelles, 1997, p. 15)

[...]

Rose Marie - (Fala a atriz) Agora eu, Rejane Maia, atriz... [...] Sou mulher e sou negra e me orgulho do meu nariz largo, de minha pele escura, do meu cabelo crespo, das minhas ancas e da minha história. Sou mulher e sou negra e minha força vai ser usada para honrar a memória dos meus antepassados: reis, guerreiros e sacerdotes que foram arrancados de suas terras para trazer para este novo mundo seu trabalho, suas lágrimas e sua alegria. Sou mulher e sou negra e meu leite vai para os filhos que saírem do meu ventre ou para aqueles que eu resolva adotar. E o meu corpo vai para o homem que eu escolher e souber me amar e me respeitar. E as minhas ancas são para requebrar, celebrando a alegria, na batida guerreira da minha raça. Minha mãe não é Nossa Senhora, é Nanã Borocô.

(Meirelles, 1997, p. 5)

[...]

Ser Negro

M.C. – (Canta)

Sou negra sim
E tenho que assumir
É Por isso mesmo que existe em mim
Uma vontade tão forte
De estar sempre presente
De estar sempre atuando
Eu quero aparecer
dançar, cantar, ler
Estar sempre bem informada
Cultural e intelectualmente
Quero falar, quero gritar
Que sou negra sim
 

E hoje sou diferente
Sou diferente de ontem
porque hoje eu posso
me assumir como gente
 

Eu quero, eu posso estar
em qualquer lugar que eu desejar
Porque nós negros temos
que batalhar por nosso espaço
que ser negro não é modismo, é fato.
 

Hoje eu resolvi mudar
Vou deixar de brigar
hoje eu resolvi mudar
vou cantar, vou cantar
juro não ser mais um bobão. (bis)
 

Vou sair pela avenida
para poder proclamar
que eu amo minha cultura
e assim quero mostrar
a força desta raça
que é linda e vai brilhar iê, é!
Vou falar para o meu povo
que é preciso estudar
e ter certa consciência
pra assumir nosso lugar
porque o negro tem cultura
porque o negro tem valor
Tem negro universitário
e também negro doutor iê, É!...
(Meirelles, 1997, p. 12-13).