“Ser mãe é padecer no paraíso”: a tematização do amor materno em Não vou mais lavar os pratos, de Cristiane Sobral

Franciane Conceição da Silva*

“Ser mãe é padecer no paraíso” diz o ditado popular. Essa famosa frase carrega em si a ideia de maternidade enquanto um sacrifício, um padecimento sagrado a qual todas as mulheres devem se submeter para alcançarem a plenitude. Essa visão da maternidade como um ato quase religioso propagou-se durante boa parte da história. Desse modo, durante muito tempo, o discurso predominante era de que os homens deviam dominar, e as mulheres serem dominadas; os homens deviam trabalhar, e as mulheres cuidarem da casa; os homens eram os progenitores e as mulheres instintivamente maternas, sua função primordial era parir para perpetuar a espécie. As mulheres tinham nascido para serem mães, e se recusar a cumprir esse papel era considerado uma grande heresia, uma agressão contra a sua natureza. Desse modo, ter filhos era o papel central da mulher na sociedade, “qualquer mulher apta a procriar os tinha sem se colocar grandes questões prévias. A reprodução era simultaneamente um instinto, um dever religioso e um dever para com a sobrevivência da espécie” (BADINTER, 2010, p. 17).

No entanto, com as reivindicações do Movimento Feminista, especialmente a partir da década de sessenta do século XX, as mulheres obtiveram inúmeras conquistas, que mesmo não sanando a desigualdade entre os sexos, diminuíram significativamente as diferenças. A partir de então, as mulheres foram conquistando um espaço cada vez mais amplo no mercado de trabalho e nas mais variadas profissões, passaram a ter mais espaço na vida acadêmica, ocupando as cadeiras dos mais diversos cursos, conquistaram a liberdade de decidirem sobre o seu destino, sobretudo, o direito de deliberarem sobre o seu próprio corpo. Desse modo, a famigerada teoria do instinto maternal foi colocada em xeque, visto que, com a criação dos métodos contraceptivos, as mulheres passaram a decidir se queriam ou não ter filhos, e, principalmente, quando queriam tê-los. Assim, é possível afirmar que, a partir da década de setenta, a maternidade:

Deixara de ser o alfa e o ómega da vida feminina. Para as mulheres abriu-se uma diversidade de modos de vida desconhecida das suas mães. Podiam dar prioridade às suas ambições pessoais, desfrutar o celibato e uma vida a dois sem filhos ou então satisfazer o desejo da maternidade, acompanhando ou não a atividade profissional. (BADINTER, 2010, p. 11).

Essa polêmica temática da maternidade, como instinto ou escolha, aparece com recorrência na produção poética de Cristiane Sobral, escritora afro-brasileira que vem se destacando nos últimos anos tanto na produção em prosa, quanto na poética. Dessa forma, nesse trabalho pretendemos analisar alguns poemas do livro Não vou mais lavar os pratos (2011), de Cristiane Sobral, com o intuito de investigarmos como a temática da maternidade é enunciada na voz do eu-lírico feminino, mostrando quando o discurso apresentado reforça a concepção da maternidade como um instinto de toda mulher; ou quando essa é representada como algo não inerente à condição feminina, devendo ser uma escolha e não uma imposição. Para fazermos essa investigação, selecionamos quatro poemas da obra em estudo: “Caminhos”, “Parindo Poesia”, “Materna Idade” e “Abrúptero”. Feitas essas considerações, vamos à análise dos poemas, e para iniciar essa viagem seguiremos pelos “Caminhos”:

Caminhos
 
Os filhos que eu não pari
fizeram-me de outra forma existir
Os filhos que eu nunca pari
fizeram-me seguir
Os filhos que não terei
vão me levar aonde não sei
No meio do caos encontrarei a saída
Onde outros filhos me esperam
Parir é dor 
Criar é produzir amor 

Com outros olhos enxergarei os caminhos abertos
Estradas surgirão nos trilhos do universo
Agradeço aos filhos que não tive...
Por eles construirei pontes
a um novo coração.
(SOBRAL, 2011, p. 33).
 

Na primeira estrofe do poema “Caminhos”, o sujeito poético feminino fala da sua impossibilidade de ser mãe de um filho biológico. Os filhos não vieram, mas é preciso seguir, mesmo sem saber aonde irá chegar, o caminho mais certo seria o da maternidade, mas já que esse não se concretizou, há que se buscar outros caminhos. Na segunda estrofe, diante da real constatação da impossibilidade de ser mãe, o eu-lírico feminino tenta encontrar uma saída, já que para esse sujeito poético não poder gerar os próprios filhos é contra a ordem natural, é o caos. Porém, há uma alternativa, se não é possível ter os filhos frutos do próprio ventre, é possível criar os filhos de outra pessoa, doar afeto a um filho mesmo que não seja biológico, “produzir amor”. Na terceira estrofe, o eu-lírico feminino, consciente da sua infertilidade, mas também da sua capacidade de se doar a outrem, aponta os novos caminhos, “novos trilhos do universo”, conforma-se por não poder ter filhos biológicos, e agradece “aos filhos que não teve”, sem eles pode ser mãe de outra criança e construir pontes “a um novo coração”.

Conforme mostramos na análise acima, podemos perceber que no poema em estudo há um lamento do eu-lírico feminino ao constatar que não poderá gerar os seus filhos. O natural é que as mulheres possam procriar para perpetuar a espécie, e já que não pode parir os próprios filhos, torna-se necessário buscar outros caminhos para exercer a tão sonhada maternidade, como se o amor materno fosse um sentimento inerente a toda mulher. Essa manifestação do eu-lírico feminino do poema “Caminhos”, que trata da maternidade como um instinto, nos remete à tese do filósofo Diderot.

Para Diderot, as mulheres se reduziam a um útero e, por isso, eram essencialmente inferiores aos homens. Tinham nascido para procriar e para serem servas do marido. Ser mãe era o caminho natural de toda a mulher, procriar para preservar a espécie era uma das suas poucas utilidades. Fora isso, servia também para ser objeto de prazer dos homens, que as descartariam logo que essas envelhecessem (BADINTER, 1991). A vida de toda mulher era assim marcada pela dor e pela servidão. Deveriam servir ao marido e aos filhos e estarem sempre prontas para sofrerem a dor do parto e da rejeição.

Em consonância com o discurso essencialista de Diderot, o filósofo Rousseau, no século XVIII, publicou o livro Émile. Nessa obra, que se tornou uma espécie de bíblia para as mulheres da época, Rousseau defendia que a existência de toda mulher estava naturalmente ligada ao casamento e ao instinto maternal. Para o filósofo, toda menina deveria ter como futuro certo o papel de mãe e de esposa. Nesse contexto, “a maternidade, tal como concebida no século XVIII, a partir de Rousseau, é entendida como um sacerdócio, uma experiência feliz que implica também necessariamente dores e sofrimentos. Um real sacrifício de si mesma” (BADINTER, 1985, p. 249).

Nesse sentido, no livro Não vou mais lavar os pratos, além do poema “Caminhos”, que, de algum modo, trata da maternidade como um sacerdócio, dialogando com o discurso misógino dos filósofos Diderot e Rousseau, outros poemas dessa obra, em alguma medida, também trazem essa ideia da maternidade como essência de toda mulher. O poema “Parindo Poesia” é um exemplo disso.

Parindo Poesia
 
De repente aquela dor
Aumentando a cada instante
Umedecendo os meus olhos
Aquela sensação sem palavras
 
De repente meu coração dilatou
Senti um calafrio e um medo desconfortante
A bolsa estourou
Todos os papéis, rascunhos e anotações não couberam
Tudo o que vi neste mundo louco de cada dia
Transbordou
 
Parindo poesia
Vou morrer filha da letra e nascer mãe da palavra
Jogar o meu ego ladeira abaixo
Espremer o que de melhor houver de mim
E dar à luz
 
[...]
 
Pão para quem fome
Parindo poesia
Trazendo palavras ao mundo
Para a preservação da espécie.
(SOBRAL, 2011, 105).

No poema “Parindo Poesia”, o eu-lírico feminino compara o processo de criação literária ao parto. Além dos filhos, é possível parir verbos, fazer eclodir uma profusão de palavras. Assim, o ato de criação literária se mostra tão doloroso quanto o parto. Muitas vezes, para que as palavras fluam no texto, é preciso que haja muito esforço, algumas delas precisam ser espremidas, forçadas a sair. Elas são tão difíceis de serem concebidas, que depois que surgem a pessoa que as idealizou precisa passar por um longo processo de recuperação, tal qual as mulheres que são submetidas a um parto cesáreo. No entanto, nem sempre dar à luz as palavras é um processo doloroso, às vezes elas surgem de maneira repentina, assim como em alguns partos, em que os bebes nascem de modo discreto e tranquilo, sem provocar muito sofrimento para as suas mães. Desse modo, depois de concebidas, as palavras alimentam os leitores famintos, do mesmo modo que os filhos matam a sede de algumas mães sedentas por dar e receber afeto.

No poema em estudo, em um primeiro momento, como mostramos acima, o eu-poético feminino prega um discurso que trata da maternidade como uma escolha e não como uma obrigação. Não é preciso parir filhos, quando é possível parir palavras. No entanto, o último verso do poema “Para a preservação da espécie”, vai de encontro a essa concepção inicial de maternidade como alternativa e se relaciona com a teoria de Darwin, de procriar para preservar a espécie. Diante desse fato, faz-se necessário advertir que esse discurso do eu-lírico feminino, reforçando o “tão gasto conceito de instinto maternal, fazendo o elogio do masoquismo e do sacrifício femininos, constitui o maior perigo para a emancipação das mulheres e para a igualdade dos sexos” (BADINTER, 2010, p. 156).

No entanto, é importante ressaltar, que mesmo que alguns poemas de Cristiane Sobral reforcem, como já mostramos, o discurso naturalista que trata da maternidade como um sacrifício ao qual toda mulher deveria se submeter; outros poemas de Não vou mais lavar os pratos, ao trazerem a questão da maternidade como tema central, apresentam uma locução bem distinta dessa estudada até aqui. Dentre esses poemas, destacamos os títulos “Materna Idade” e “Abruptero”. Continuaremos a nossa análise com “Materna Idade”:

Materna Idade

A biologia manda parir.
A metaplasia diz que não vai ser fácil.
A psicologia dá tempo ao tempo:
Cá estou

Uma multidão de flancos,
Alguns cabelos brancos no meio das pernas.
Na fila de espera de mais um dia fértil
Ainda sou filha do medo
Em meio ao caos dos meus ovários
Decreto a minha maioridade
A minha infinita capacidade
A espontânea vontade para o que vier
 
Serei mãe.
Das minhas próprias ideias,
Das escolhas
Do progresso.
Está bem doutor, a consulta é semana que vem
Resolvi marcar com a minha consciência 
Ela diz que vou parir, mas não posso parar agora.
(SOBRAL, 2011, p. 41).

No poema em destaque, a tematização da maternidade feita pelo sujeito lírico feminino vai ao encontro às novas concepções a respeito do papel da mulher, depois da revolução feminista. Nesses termos, ao conquistarem o direito de fazer as suas próprias escolhas, ao optarem por dar prioridade à sua vida profissional, em vez de assumirem o papel de mãe, as mulheres começaram a ter filhos cada vez mais tarde.

Nesse contexto, podemos afirmar que o discurso sobre o instinto maternal, tão presente até a década de setenta, perdeu força, e hoje, mesmo que ainda sirva de inspiração para algumas mulheres, está cada vez mais fraco. Assim como o eu-lírico do poema “Materna idade”, nos dias atuais, as mulheres têm filhos com idade cada vez mais avançada, quando já aproveitaram bastante a liberdade de não terem filhos e já se sentem realizadas profissionalmente. Ao resolverem ser mães com uma idade mais avançada, muitas mulheres, assim como o sujeito lírico feminino do poema, precisam se submeter a tratamentos de fertilização “na fila de espera de mais um dia fértil”. Contudo, tanto para as mulheres que resolvem se submeter a procedimentos de fertilização, quanto para as que são estéreis, o fato de não conseguirem engravidar, não as deixam com o sentimento de inferioridade, ou de frustração, pois sabem que, mesmo sem filho, há um mundo de possibilidades à sua frente. Como se comprova no fragmento que segue:

Em meio ao caos dos meus ovários
Decreto a minha maioridade
A minha infinita capacidade
A espontânea vontade para o que vier
 
Serei mãe
Das minhas próprias ideias
Das escolhas
Do progresso.
Está bem doutor, a consulta é semana que vem
Resolvi marcar com a minha consciência 
Ela diz que vou parir, mas não posso parar agora.
(SOBRAL, 2011, p. 41).

Diante disso, cabe ressaltar que além das mulheres que decidem adiar a maternidade ou que não conseguem engravidar por algum problema de infertilidade, é cada vez maior o número de mulheres que decidem não serem mães. Algumas rejeitam a maternidade porque não encontraram um companheiro ideal, outras porque resolveram priorizar a vida profissional, algumas porque decidiram priorizar o casamento, a intimidade da vida a dois, em que a chegada de um filho poderia significar um grande transtorno. E mesmo que seja considerado indizível em nossa sociedade, há muitas mulheres que se recusam a serem mães simplesmente porque não gostam de crianças. Para um número significativo dessas mulheres, a maternidade deixou de representar a sua realização. “Não somente rejeitam a essência maternal tradicional de feminilidade como também se consideram mais femininas do que as mulheres realizadas na sua maternidade” (BADINTER, 2010, p. 143-144).

Essas mulheres que optam por não terem filhos, ainda são olhadas com desconfiança. Para a maioria das pessoas é inconcebível se pensar numa mulher sem filhos, a não ser que a mesma sofra algum problema de fertilidade, caso contrário, ela é vista como individualista, insensível, frustrada. No entanto, não ter filhos por opção é uma escolha corajosa de muitas mulheres, que não se submetem ao discurso naturalista que trata da maternidade como um ato quase religioso. Para melhor discutir essa questão, vamos à análise do poema “Abrúptero”, de Cristiane Sobral, texto que se configura como um grito de revolta do eu-lírico feminino contra as imposições do patriarcado.

Abrúptero

Quem disse que são infelizes as mulheres inférteis?
Quem disse que são felizes as mulheres com as suas mamadeiras?
É preciso muito peito para não parir e não parar
É preciso ter muito peito para enfrentar as surpresas da vida

Abaixo os inacreditáveis roteiros com final feliz
Vaias amplificadas para a tendência latina aos melodramas...
Viva a coragem de encarar os próprios problemas!
Algumas dores jamais serão resolvidas
Abrúptero
Viva o direito às novas formas de vida
Abaixo o saber pelo sofrer
Abrútero
Não é preciso crer na falta como um defeito
Viva o saber pelo sentir e a esperança das portas abertas.
(SOBRAL, 2011, 43).

O tom de protesto de “Abruptero”, como se o eu-lírico feminino tivesse gritando em uma praça, alude ao poema “Poética”, de Manuel Bandeira, quando o sujeito poético gritava “Abaixo os Puristas”, protestando contra as formas fixas e engessadas, defendendo a liberdade temática e formal na construção poética. O protesto do eu-lírico feminino de “Abrúptero” é contra a alienação das histórias românticas com sabor açucarado, na literatura e no cinema, que faz com que as pessoas, especialmente as mulheres, fiquem na constante expectativa de um final feliz, em vez de encarar os problemas de frente. O título do texto “Abrúptero” se converte em “abrútero”, ambas as palavras nos remetem ao útero, um útero que vai sofrendo uma metamorfose. “Abrúptero” vem de abrupto, o que dá a ideia de um parto violento, que tem como resultado não o nascimento de um bebê, mas o nascimento de versos, palavras, de “novas formas de vida”.

Em tom de revolta, o eu-lírico feminino protesta contra o discurso que demoniza as mulheres que decidem não ter filhos. Essa crítica à maternidade imposta é feita de maneira incisiva logo na primeira estrofe do poema, quando o eu poético feminino questiona: “Quem disse que são infelizes as mulheres inférteis? ∕ Quem disse que são felizes as mulheres com as suas mamadeiras?”. Dessa forma, há uma contestação dos valores da sociedade patriarcal que condena as mulheres que não podem ter filhos, como se todas as mães fossem felizes e a infelicidade só atingisse as mulheres que resolvem não ser mães. Essa ideia de considerar a maternidade um caminho para a felicidade foi reforçada pela literatura canônica, que sempre representou as mulheres celibatárias e\ou sem filhos como solteironas infelizes, mal amadas, condenadas à eterna solidão. Para Elisabeth Badinter:

A não procriação é um desvio à norma que tem um custo: a desaprovação social. [...] A não - mãe é constantemente instada a justificar-se, como se não houvesse mães com problemas ou com características psicológicas inquietantes [...]. Ela é objeto de pressões por parte dos pais, da família, dos amigos (que tem filhos), dos seus colegas de escritório, em resumo, de toda a sociedade, a ponto de se poder legitimamente perguntar se não seria melhor falar de “dever” em vez de “desejo de ter filhos”. (BADINTER, 2010, p. 141).

Em “Abrúptero”, o eu lírico feminino condena essa eterna exigência pela procriação e a opressão sofrida pelas mulheres que não querem ser mães, pois “É preciso ter muito peito para não parir e não parar”. Desse modo, exalta as mulheres que são julgadas por não serem mães, mas não param sua caminhada, lutando contra o discurso que as querem subjugar, sempre prontas “para enfrentar as surpresas da existência”. Pois, diferente do que se propagou durante séculos:

O amor materno é apenas um sentimento humano. E como todo sentimento, é incerto, frágil e imperfeito. Contrariamente aos preconceitos, ele talvez não esteja profundamente inscrito na natureza feminina. Observando-se a evolução das atitudes maternas, constata-se que o interesse e a dedicação à criança se manifestam ou não se manifestam. A ternura existe ou não existe. As diferentes maneiras de expressar o amor materno vão de mais ao menos, passando pelo nada, ou a quase nada. (BADINTER, 1985, p. 22-23).

Diante disso, admitir que o amor materno não seja um instinto, não faz parte da natureza da mulher e é um sentimento como qualquer outro, que pode se manifestar ou não, ainda é considerado uma grande anomalia para a maioria das pessoas. No entanto, mesmo que só uma minoria de mulheres se recuse a ter filhos, esse discurso ganha cada vez mais força. Assim, ao analisarmos alguns poemas de Cristiane Sobral, no seu livro Não vou mais lavar os pratos, observamos que há uma diferença no discurso dos seus sujeitos poéticos femininos quando se trata da representação da maternidade. Nos poemas “Caminhos” e “Parindo poesia, o eu-lírico feminino tem uma alocução que reforça os estereótipos que tratam da maternidade como uma condição inerente à natureza feminina, como o único caminho para a felicidade das mulheres; Já nos poemas “Materna Idade” e “Abrúptero”, a enunciação desses sujeitos poéticos femininos é totalmente diferente, e em consonância com o discurso feminista que se fortaleceu significativamente a partir da década de sessenta, desconstrói a ideia de que ser mãe é o único caminho para a realização feminina, mostrando que há muitos outros caminhos que as mulheres podem seguir, muitas outras maneiras de encontrar a felicidade e essa não precisa estar atrelada à concepção de um filho. Pois, nem todas as mulheres querem padecer no paraíso e, ao contrário do que diz a canção, as mulheres que não tem filhos também são felizes. Portanto, convém deixar em paz àquelas que não querem ser mães.

Referências Bibliográficas:

BADINTER, Elisabeth. Um amor conquistado: o mito do amor materno. Tradução de Waltensir Dutra. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.

BADINTER, Elisabeth. O conflito: a mulher e a mãe. Lisboa: Relógio D’Água Editores, 2010.

BADINTER, Elisabeth. Prefácio. In: THOMAS, Antoine Léonard. O que é uma mulher? um debate. Tradução de Maria Helena Franco Martins. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1991.

SOBRAL, Cristiane. Não vou mais lavar os pratos. Brasília: Dulcina, 2011.

 

* Franciane Conceição da Silva é licenciada em Letras (Português-Espanhol), pela Universidade Estadual de Santa Cruz – UESC. Mestra em Estudos Literários pela Universidade Federal de Viçosa – UFV. Doutora em Literaturas de Língua Portuguesa pela PUC Minas. Integrante do Grupo de Estudos de Estéticas Diaspóricas da PUC Minas e do Núcleo de Estudos Afro-brasileiros – NEAB Viçosa. E-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo..