Sou negro

                      A Dione Silva

Sou Negro
meus avós foram queimados
pelo sol da África
minh'alma recebeu o batismo dos tambores
atabaques, gonguês e agogôs

Contaram-me que meus avós
vieram de Loanda
como mercadoria de baixo preço
plantaram cana pro senhor do engenho novo
e fundaram o primeiro Maracatu.

Depois meu avô brigou
como um danado nas terras de Zumbi
Era valente como quê
Na capoeira ou na faca
escreveu não leu
o pau comeu
Não foi um pai João
humilde e manso.

Mesmo vovó
não foi de brincadeira
Na guerra dos Malês
ela se destacou.

Na minh'alma ficou
o samba
o batuque
o bamboleio
e o desejo de libertação. 
             (Cantares ao meu povo, 1961)