Terra

Isidoro, boçal fugido, de noite ouvindo os cães:

mete na terra.

João, nagô escravo, quando está saudoso:

corre na terra.

José, banto, quando sozinho fica:

ouve a terra.

Ester, negra velha, sabida de ervas e mandingas:

cheira a terra.

Justino, da casa, quando recebe um dengo:

dança na terra.

Miriam, negrinha nova, depois da chuva:

brinca com a terra.

Manuel, crioulo, depois de apanhar muito:

bate na terra.

Mariana, da cozinha, andar fogoso e faceiro, quando disse não:

varada na terra.

Nair, prenha do sinhozinho, destemperada:

enfia terra.

Placides, escravo faiscador, para saldar a vida:

briga com a terra.

Paulina, escrava velha, que quando cachaça bebe:

embala a terra.

Sara, a nega do cabelo duro, para não encerrar a conversa:

cospe terra.

Zulmira, quando seus filhos são vendidos:

come terra.

(Outras Vozes: contos sobre o negro escravizado no Brasil, p. 26-27).