Quem é protagonista? Relações étnico-raciais em livros para crianças

Aracy Alves Martins *
Celia Abicalil Belmiro **

Este jeito de contar as nossas coisas
à maneira simples das profecias1
__ Karingana ua Karingana — 
é que faz o poeta sentir-se
gente2.
José Craveirinha, poeta moçambicano.

Introdução

Como tratar das diferenças em obras que desejam se mostrar organizadas e coerentes? Onde reconhecer as diferenças, além das referências étnicas, sociais, culturais? Estão em todos os lugares, em todos os momentos da nossa vida cotidiana quando temos que nos deparar diante do mundo. “Viver é muito perigoso”, como diz Guimarães Rosa. Mas perguntamos o que seria do mundo sem as diferenças, pois são elas que nos ajudam a nos reconhecermos e nos construirmos como sujeitos.

O contexto teórico contemporâneo a respeito da literatura infantil e juvenil tem apresentado propostas de elaboração de conceitos importantes para identificar o novo cenário de produção de obras e de interações entre linguagens, seja verbal, visual, verbovisual nas narrativas das últimas décadas. A variedade com que o suporte “livro” vem se oferecendo aos seus projetos editoriais mostra que alterações importantes nas concepções de leitura, de literatura, de leitura literária, de letramento literário, ocorrem no cenário editorial.

Refletindo sobre a narrativa nos livros de literatura infantil, Hunt (2010, p.178) sinaliza com duas perspectivas que deveriam correr juntas: a crítica da literatura infantil focada na criança e a focada nos livros. E afirma que “deve ser preocupação do teórico e também do mediador o que atrai na narrativa, o que mantém a página virando, como o contador conta sua história e como reconhecemos o que é importante para a narrativa (o que precisamos saber em vez de o que é bom saber)”.

Outro aspecto relevante nas discussões sobre a presença do leitor, da leitura literária e das obras é a adequação discursiva, sócio-histórica e de problematização temática para a qual as obras devem atentar (BELMIRO, 2011), no sentido de manter qualidade literária das interações.

As obras tratadas neste artigo oferecem muitas possibilidades de compreendermos as gentes e suas culturas, o mundo e suas diversidades, os embates para preservação das identidades e os constrangimentos por que passam as personagens aqui apresentadas. Diversidade, embate/enfrentamento, constrangimentos, liberdade, soluções: palavras encontradas ao longo desta escrita que é oferecida pelas autoras com olhares que desejam contribuir para que as diferenças se transformem em respeito, complementaridade e harmonia para melhor viver.

Antes de tratar de relações étnico-raciais em livros para crianças, em outros textos já produzidos, no campo da diversidade, consideramos interessante começar a tratar, de outras diferenças e de outras (in)tolerâncias humanas. Van Dijk (2008) nos traz à reflexão o fato de os seres humanos se posicionarem dicotomicamente: “Nós (modernos, avançados, democráticos, tolerantes, hospitaleiros, úteis); Eles (ignorados, não levados em conta)”.

Nesse sentido, em acervos do PNBE, que distribui livros para a leitura de crianças e jovens, para as bibliotecas das escolas públicas, foi possível encontrar preocupações de autores que tangenciaram em suas obras temáticas como: relações de gênero e problemas físicos e intelectuais (MARTINS & GOMES, 2010). Em livros mais recentes para crianças, também foi possível encontrar outras temáticas, que muitas vezes dicotomizam os seres humanos: os que veem e os que não veem, justiça e injustiças ou o campo e a metrópole.

Assim, este texto apresenta a seguinte estrutura organizacional. Em primeiro lugar, serão abordados esses três tipos de diferenças, para depois ser tratada a temática proposta: relações étnico-raciais. Esse tópico, por sua vez, será dedicado a dois povos que, na constituição da identidade brasileira, têm buscado não somente o seu lugar como protagonistas da História do Brasil, mas também como protagonistas das histórias de ficção que compõem o imaginário cultural e literário do brasileiro: os afrodescendentes e os indígenas.

Diferenças

Para tratar das diferenças acima anunciadas, apresentam-se, nesta parte do texto, três obras: a primeira, O livro negro das cores, apresenta um tratamento tão digno quanto poético aos sujeitos que, na nossa sociedade, apresentam deficiências visuais e que enxergam muito além dos videntes. A segunda, O homem que lia as pessoas, traz para os leitores um menino que se surpreende com o pai que lia as pessoas e se insurge contra suas (in)justiças. A terceira, Viagem ao outro lado do mundo, revela para os leitores as experiências de um menino do campo na cidade grande.

O Livro Negro das Cores3

Esse livro negro que fala de cores é surpreendente já pelo título que nos chama a interrogar os sentidos de uma maneira diferente, fora do conforto a que estamos habituados por uma leitura automática, através de palavras, imagens, cores. A cor preta é a ausência de luz, pois absorve todos os raios luminosos, mas não reflete nenhum. É desprovido de clareza, portanto, existe uma impossibilidade de dar visibilidade aos objetos que nos cercam. No entanto, é assim que o livro vai nos abrir os olhos para outras leituras de mundo, outras linguagens que constroem significados do mundo. O livro é escrito em braille e em escrita alfabética (com tradução do original espanhol para o português), com ilustrações em preto brilhante em fundo preto fosco, com o mesmo material usado para a escrita braille.

Dialogando intrinsecamente com a temática da obra, o projeto gráfico do livro é arrojado e pretende criar um enfrentamento com as condições tradicionais de exposição e compreensão do texto. A obra se propõe a nos despertar, leitores videntes, uma compreensão de mundo mais íntegra: atentos a uma proposta sinestésica de linguagens, somos levados a avivar em nós uma memória tátil, gustativa, olfativa, auditiva: “Segundo Tomás, o amarelo tem gostinho de mostarda, mas é macio como as penas dos pintinhos.” (COTTIN; FARIA, 2002, p. 6); ou: “O marrom faz barulhinho embaixo dos pés da gente quando as folhas estão secas. Às vezes tem cheiro de chocolate, às vezes tem um cheiro muito ruim” (op. cit., p. 10).

Depois dessa proposta desconcertante para quem vê o mundo (ou imagina que vê), será preciso também tatear para experimentar o mundo no papel, sentir os gostos táteis, as texturas palatáveis, os cheiros sonoros, uma memória de sentidos que o corpo já esqueceu. “Tomás gosta de todas as cores: ele as escuta e toca, sente o gosto e o cheiro delas” (op. cit., p. 20). Evocar e sonhar sua própria imagem- sensação: “O preto é o rei de todas as cores. É macio como a seda do cabelo da mamãe quando ela abraça a gente” (op. cit., p. 18).

Ora, esse caminho só pode ser trilhado se aceitarmos que os textos – com palavras, imagens, traços, pontos – dizem algo e nos conduzem através da nossa experiência sensível. E que pode recuperar em nós, e para nós, sensações e emoções que só uma perspectiva estética pode dar a ver.

Ao final do livro, ainda há um presente surpresa para os leitores, em braille: o abecedário, sinais de pontuação/acentuação e os números de 0 a 10 e 100, além do presente maior que é a reflexão sobre a poesia da própria obra, aproximando as pessoas entre si e com a natureza, bem como, sobretudo, sua função inclusiva e seu alcance.

O homem que lia as pessoas4

Quem é o protagonista? O homem ou o menino? O filho ou o pai? Sendo filho, o homem que escreve se lembra de seu pai e de como o seu modo de ver o mundo o ajudou a crescer e a se constituir como pessoa. Esse texto memorialístico descortina um ponto de vista muito pessoal e afetivo, o que dá liberdade ao ilustrador de também escolher um modo particular de ver o mundo.

A capa já é uma boa introdução de como se dará o diálogo entre autor e ilustrador. Letras embaralhadas em profusão e um homem que lia de um modo muito particular. Um copiando a postura do outro, filho olhando para o pai, aprendendo a ler pessoas. No interior da obra, os capítulos são nomeados por ordem alfabética, como numa ordenação cujas letras vão compondo a escrita da vida.

Dois autores premiados se juntam para realizar uma obra, que se inicia com a frase corriqueira: Tem gente que lê jornal, e percorre gêneros, como: revista, romance, linhas da mão, casco das tartarugas, nuvens, dunas, conchinhas, bula, manual, lista telefônica, passando por Tem gente que lê até o que está escrito no silêncio (segundo a Tia Lígia, primeira professora), para chegar ao mais inusitado:

Mas eu conheci só um homem que sabia ler as pessoas: meu pai. Você não entendeu mal... É isso mesmo: meu pai sabia ler as pessoas. (CARRASCOZA, 2007, p. 9).

Como queria trazer o pai para si, resolveu escrever um livro de memórias. O personagem-narrador vai se lembrando das coisas legais que, quando menino, aprendeu, de coração, com esse homem e que aparecem em partes diferentes do livro: “que a felicidade é uma coisa inesperada.” (op. cit., p. 13) / “- Ainda bem que você não é um santo.” (op. cit., p. 17) / “- Por que não poderia?” (op. cit., p. 22) /“Foi uma aula tão boa, mas tão boa, que parecia uma brincadeira.” (op. cit., p. 24) / “- Eu me trouxe pra você! – disse ele, abrindo os braços.” (op. cit., p. 34) / “Acho que, quando desejamos muito alguma coisa, ela vem devagar. Parece que é para aprendermos a ter paciência.” (op. cit., p. 73).

Entretanto o que mais marcou, em meio a uma discussão entre os ciganos e as pessoas do lugar, que os acusavam de ladrões, foi a afirmação do pai: Sou contra injustiças.

Conceitos como esse e outros que levam o menino a respeitar os seres humanos vão sendo construídos, segundo Van Dijk (2008) com os pais, com os pares, na escola, na comunicação de massa, na interação em sociedades multiétnicas, conforme argumenta o próprio menino sobre sua importância: As coisas que nós dois vivemos estão em prateleiras dentro do meu coração. Posso ir até lá quando quiser, ver todas, sem pressa, e tocar uma a uma. São minhas. Não preciso comprar. Contar histórias é um jeito de nos trazermos para as pessoas. (op. cit., p. 94).

E mostrar histórias é um jeito de o ilustrador interpretar o que leu e dialogar com o que o escritor disse. Dessa forma, Nelson Cruz ora faz um enquadramento aberto dos espaços retratados, contextualizando o cenário e ampliando a ambientação, como na loja de brinquedos, no acampamento de ciganos, ou no campo de futebol, ora apresenta apenas os personagens atuando, sem fundo, como na leitura em família, no jogo da memória, na briga com os ciganos, contribuindo para uma aproximação mais intimista da leitura. São estratégias de produção de sentidos em imagens que dialogam e se harmonizam com a proposta da escrita literária.

Viagem ao outro lado do mundo5

Nesse livro, a autoria (escritor premiado e ilustradora) consegue fazer o leitor sentir o desespero do protagonista, um menino do campo, perdido na maior cidade da América Latina (segundo a professora Urânia), por ter se desencontrado do pai, no burburinho do metrô, acolhido por meninos de rua que viviam na Praça da Sé, em São Paulo, o outro lado do mundo.

Assustado, com fome e depois cansado, desanimado e com sono, Murilo experimentou ser tratado como um “outro”, assim como também olhava os meninos como “outros”. Enquanto Cabeção perguntava: - O tal de Murilo vai ficar aqui com a gente?, o outro menino de rua demonstrava que, se tem gente que tem palavra e gente que não tem palavra. Barriga tinha. Depois de ir com Murilo até seu pai, saiu sem alarde: Barriga tinha cumprido a sua promessa e não quis esperar nenhum agradecimento (JATOBÁ, 2009, p. 50).

Os autores também fizeram o leitor sentir a grandeza do ser humano, em se relacionar com outros seres humanos, do mesmo modo que deixaram um desafio para o personagem, e consequentemente para o leitor, neste mundo globalizado, cheio de contrastes. Voltando ao seu povoado, Murilo se pergunta: Pensei naquela hora: aqui é o melhor lugar do mundo?Ainda não sei. A vida vai me ensinar. (op. cit., p. 54).

Murilo e os leitores terão muito o que refletir, sobretudo se se reportarem à plurissignificação da epígrafe da obra: Uma cidade é um amontoado de gente sem terra (Ferreira Gullar).

Compondo a ambiência para essa história, os cenários e os personagens são retratados em imagens com um estilo muito particular, marcado por uma modernidade de traços que simplificam e reduzem o excesso de representação realista, como um espelho da realidade: tanto os meninos de rua da cidade grande quanto os amigos e a família do interior são apresentados com o mesmo formato de cabeça, de olhos, semelhança de cabelos, não sendo aí a fator que distingue os personagens e o enredo da história. O medo do menino que se perde no burburinho da grande cidade e suas reações frente a esse fato é que dão indicações para as reflexões do leitor.

Portanto, o que caracteriza a produção imagética da obra? A resposta está no modo de produzir um conjunto de traços e cores, como que experimentando figuras e cenas. O que ajuda a compor esse drama são as cores das páginas do livro, a maioria com tonalidade escura e fosca. Sendo cada página de uma cor, cada representação cênica é vazada pela cor da página. O interessante está justamente aí, uma mão que denuncia o artista ao revelar o que vê. Como diz Olson (1997), não basta olhar, mas é preciso uma mente educada para saber ver. Pouca profundidade de campo, em que pernas, braços e cabeças, pratos e talheres, todos talhados com traços rápidos, e as cores achatando o desenho. O que ressalta sempre é a capacidade do artista em alcançar, com poucos elementos, resultados significativos no contexto da obra.

Relações étnico-raciais

Neste ponto, voltamos à temática deste texto, quando se trata de relações étnico-raciais. Ampliando um pouco o olhar, Van Dijk, no livro Racismo e Discurso na América Latina, afirma:

Muitos estudos mostraram que na América Latina o racismo contra os indígenas e as pessoas de descendência africana é um problema social maior. Nesse aspecto, a América Latina, infelizmente, segue os passos da Europa e da América do Norte, além de outras regiões do mundo onde os europeus brancos são o grupo étnico-racial dominante. (VAN DIJK, 2008, p. 11).

No Brasil, Rosemberg, desde 1985, em suas pesquisas sobre Literatura Infantil e Ideologia, constata que o branco, na posição de representante da espécie, teve seus atributos sendo comunicados como universais, negando o direito de existência aos não-brancos (SILVA & ROSEMBERG, 2008, p. 104).

Outras pesquisas apontam para o silenciamento, a invisibilidade, a desqualificação do trabalho, as imagens grotescas, tratamento estereotipado, personagens negros sub-representados, além do não protagonismo dos não- brancos nas histórias contadas (BAZILI, 1999; LIMA, 1999; GOUVÊA, 2005).

Silva & Rosemberg (2008, p.112), assim como outros pesquisadores, também esperam que jovens gerações de pesquisadores consigam povoar o imaginário brasileiro com novas imagens.

É justamente para essa perspectiva que este texto lança o seu olhar: apresentamos, para compartilhar com professores do Ensino Básico, leituras de algumas obras que buscam sair da timidez, marcando um protogonismo de negros e índios no Brasil.

Relações raciais – afrodescendentes

Nas três obras a seguir, – ABC do Continente Africano, Na Rota dos Tubarões e Uana e Marron de Terra, há tentativas bem sucedidas nesse sentido, trazendo um outro olhar sobre os afrodescendentes, suas raízes e sua atuação na sociedade social brasileira de hoje.

ABC do Continente Africano6

Nesse livro, o próprio continente africano toma a palavra, para se dar a conhecer, já a partir da capa com motivos africanos, nos convocando para penetrar num mundo muito especial, em que cores, em traços e movimento constituindo um campo de sentidos que se expande para a quarta capa, em uma única imagem, original. Isso porque a intenção da obra é poder apresentar o que África, em suas múltiplas formas e expressões, tem a nos dizer de dentro, a partir de suas origens. Portanto, a abertura do livro abrange dois movimentos: o de poder ver, do lado de fora, a multifacetada África em cores e formas que se apresenta na capa e quarta capa e, por outro, o de oferecer ao leitor suas histórias, suas culturas, suas faces, que serão descobertas ao folhear suas páginas.

Outro aspecto importante que faz desse livro um conjunto único e harmônico são as propostas de leitura que se encontram em cada parte da obra. O índice vem protegido sob as orelhas do livro, obrigando o leitor novamente a abrir, e a descobrir, um novo abecedário, cujas letras propõem uma escrita sobre o cenário cultural desse continente. De A a Z, vamos conhecendo costumes, alimentação, dança, lutas, trabalho, histórias dos povos daquelas terras. Por isso, cabe bem o provérbio que lhe serve de epígrafe: O forasteiro tem olhos grandes, mas não enxerga. Além disso, Rita Chaves, na orelha do livro, denunciando uma visão preconceituosa que insiste na imagem de um continente homogêneo e atrelado ao passado, confere a palavra a Mia Couto, escritor moçambicano, sobre a pluralidade da África:

Este continente é, ao mesmo tempo, muitos continentes. Os africanos são um entrelaçar de muitos povos. A cultura africana não é uma única, mas uma rede multicultural em contínua construção.

No Prefácio, Nei Lopes, compositor, cantor e enciclopedista brasileiro, dedicado às questões afrodescendentes, apresenta argumentos sobre a África da História, do Espírito e do Saber. O autor trata das imagens construídas ao longo dos tempos pela produção científica, pela imprensa e pelos meios de comunicação.

Primeiro, ela foi o território da aventura, continente selvagem, exótico e misterioso. Mais tarde, abrigou rebeldes e ingratos que implantaram o terrorismo e a guerrilha em toda a região. Hoje, é palco privilegiado das guerras, da corrupção e da crueldade. Essas são as imagens construídas ao longo do tempo sobre a África. Por gente que não soube ou esqueceu da alvorada da humanidade, do Egito faraônico, do esplendor das civilizações da Núbia e da Etiópia, da magnífica arte de bronze de Ifé e Benin, de líderes e pensadores como Kwame Nkrumah, Patrice Lumunba, Jomo Kenyatta, Julius Kambarage Nyerere, Amadou Hampâté Bâ, Théophile Obenga, Cheikh Anta Diop, Léopold Senghor e tantos outros, antigos e contemporâneos.

A África tem uma história. Como a das velhas Ásia e Europa. Com dificuldades e problemas, mas também com muitas glórias. [...] E com um presente de luta e de trabalho raramente mostrados no cinema, na televisão ou nos livros.

A África tem um espírito e um saber. (LOPES, 2007).

A partir dessas preliminares, autor, Rogério Andrade Barbosa (ganhador de prêmio, entre outros, na categoria Literatura Infanto-juvenil da Academia Brasileira de Letras), e ilustradora, Luciana Justiniani Hees, entram em cena, construindo, com textos e imagens, os cenários que contextualizam essa múltipla África. A primeira oferta é a do mapa do continente africano à esquerda da página dupla, envolto por uma composição de variados elementos que, por uma leitura atenta, vamos redescobrindo: animais, artesanato, cidade, rios, todos sobre a cor da terra, o marrom que toma a página inteira. Assim, essa proposta se repete nas páginas seguintes, a cor acompanhando o tema, as imagens tratando dos elementos que são reportados no texto, um cenário que vai se desdobrando com delicadeza e compondo leituras que só pelo prazer estético é possível de empreender: os mercados do Norte, o Nilo egípcio, os pigmeus do Centro, a mulher queniana do Oeste, Wangari Maathai, ganhadora do Prêmio Nobel da Paz pela cruzada do meio ambiente são alguns exemplos do passeio africano que tanto escritor quanto ilustradora nos convocam a realizar. Vale destacar, portanto, o caráter de descobrimento que a proposta nos leva a realizar, desvelando em cada elemento oferecido o que África tem a nos mostrar.

Os primeiros verbetes do ABC que dá origem ao título: África/Baobá/Cidades:

A

ÁFRICA

de florestas, pântanos,

desertos, estepes, savanas,

rios, mares e montanhas

infindáveis. África de

monumentos históricos

talhados em blocos e pedra.

África de modernas e

vibrantes

Metrópoles. África de povos

Urbanos, agrícolas e pastoris.

África de múltiplas etnias,

Culturas, línguas e religiões.

B

 

BAOBÁ

árvore sagrada e gigantesca

senhora das áridas vastidões.

[...]

Em algumas

Localidades, acredita-se que

Quem tomar um chá feito

Com suas folhas nunca será

Devorado por um crocodilo.

Por sua sombra acolhedora e

pela capacidade de

armazenar

água, ela é chamada também

de Árvore da Vida ou,

simplesmente, de Mãe.

 

C

CIDADES

populosas com avenidas

movimentadas, arranha-céus,

indústria e universidades

guardam marcas do passado,

expõem o presente

e apontam

para o futuro. A maioria dos

grandes centros urbanos,

assim como acontece em

outros continentes, enfrenta

problemas

de emprego, saúde,

moradia, trânsito e poluição.

A partir desse ponto, os verbetes são apresentados, envoltos em copiosas imagens que se espraiam pelas duplas páginas:

DANÇAS/ ELEFANTES/ FLORESTAS/ GRIÔ/ HISTÓRIAS/ INHAMES/ JUMENTOS/ KALAHARI/ LUTAS/ MERCADOS/ NILO/ ORNAMENTOS/ PIGMEUS/ QUIMBANDA/ RELIGIÕES/ SOWETO/ TEARES/ URUCUNGO/ VILAREJOS/ WANGARI/ XILOFONES/ YORUBÁ/ ZAIRE.

Destacam-se, ainda, dois verbetes, que também se articulam entre si. O primeiro apresenta importantes líderes e heróis que batalharam pela independência ou acompanharam o processo de descolonização, ressaltando a contemporaneidade de Nelson Mandela. O segundo apresenta o tempo presente, com aspectos cotidianos, confirmando que “O futuro vem do passado” e o modo de aprendizado das crianças, em convivência com os mais velhos, que será recuperado, mais adiante neste texto, ao se tratar dessa mesma tendência entre os indígenas brasileiros.

L

LUTAS

contra o invasor europeu,

desde a época da lendária

rainha Nzinga (1582-1663,

Matamba/Ngola, atual Angola),

Marcaram o longo período

Colonial. Líderes como Amílcar

Cabral (1924-1973, Guiné-

Bissau), Agostinho Neto (1922-

1979, Angola), Samora Machel

(1933-1986, Moçambique),

Julius Nyerere (1922-1999,

Tanzânia), Patrice Lumunba

(1925-1961, República

Democrática do Congo),

Kwame Nkrumah (1909-1972,

Gana) e Nelson Mandela (1918-,

África do Sul) tiveram papel

destacado na independência de

seus países. O eco dessas vozes

no ritmo dos tantãs, 7 anunciou

a chegada de novos tempo

V

VILAREJOS

com suas habitações de barro,

cobertos de palha, preservam

antigos costumes e rituais.

Em muitos deles, ao entardecer,

os homens jogam o awale, 8

movendo as pedrinhas ou sementes

num tabuleiro de tábua grossa,

com doze casas escavadas,

observadas atentamente pelas

crianças. É a sabedoria dos

mais velhos que dá continuidade

às tradições. “O futuro vem do

passado” é o que diz m

ditado africano.

Na quarta capa, algumas perguntas instigam a curiosidade dos leitores: Por que o baobá é chamado de mãe? Por que o Nilo é conhecido como rio da vida? Assim, os leitores podem se colocar em busca desses e de outros conhecimentos sobre as múltiplas Áfricas.

Na Rota dos Tubarões: o tráfico negreiro e outras viagens9

Este livro é uma viagem, assim anuncia o seu autor, premiado, Joel Rufino dos Santos, historiador negro, professor universitário, autor de O que é racismo?, A questão do negro na sala de aula e de obras literárias para crianças e jovens, como O Curumim que virou gigante, Gosto de África, histórias de lá e daqui, Quando eu voltei, eu tive uma surpresa, sempre atento às múltiplas possibilidades de leitura sobre a África.

O convite da imagem abaixo para pensar a dimensão negra no Brasil colonial necessita de um olhar que ultrapasse a objetividade apressada de uma leitura que busca uma descrição rápida de fatos.

Na verdade, ela é uma metáfora visual, isto é, um conjunto de elementos imagéticos que, reunidos, nos obrigam a deslocar nosso olhar mecânico, já automatizado pelo cotidiano que nos invade com imagens repetidas e sem nada a acrescentar, para reconhecer uma outra história do povo africano que veio escravo para o Brasil.

Onde estão os reis, as rainhas, os príncipes das nações negras? Onde estão caciques, os pajés, que a história oficial omitiu e desconheceu?

Para compreender essa imagem é preciso reconhecer a inversão de valores e de poder que se estabeleceu na história brasileira, na sua relação com os povos africanos. Portanto, será necessário igualmente inverter a imagem para melhor compreender a história. A página dupla nos oferece um verdadeiro quadro, como uma pintura cuja moldura negra encerra uma narrativa: conta que vieram os homens negros escravos, num caminho sem fim de correntes, de grilhões, atados uns aos outros. Também conta que estavam com as mãos descidas, denotando um caminhar sem autonomia. Agrava mais ainda descobrir que não têm rosto, não têm cabeça, só corpo acorrentado. Isso porque a linha do horizonte que corta a página está muito alta, comprimindo as pessoas, quase as deixando (ou a nós, leitores) sem respiração.

Todavia, ao inverter a ordem de leitura, invertendo a página,

Ao deixar a imagem de ponta cabeça, começamos a deslumbrar uma outra realidade: o que se vê são homens e mulheres que trabalham, caçam e lutam, carregam e cuidam de seus filhos, buscam alimentos e água para sobreviver na natureza, vestidos à maneira dos povos africanos.

Nessa posição, a linha do horizonte está abaixo da metade da página, rebaixada de tal forma que homens e mulheres caminham em sua inteireza, dando ao leitor o conforto visual necessário para realizar uma leitura mais harmoniosa.

O autor convida o leitor a largar de mão uma idéia tão arraigada quanto ingênua: a de que o Brasil é um país de civilização branca, com contribuição acessória de negros e índios (grifos nossos). Se uma visão eurocêntrica permite a leitura de que somente na Europa havia reis e rainhas a serem considerados e valorizados, a imagem acima remete a uma outra leitura dos africanos, diferente da ideia naturalizada de povos inferiores e escravizados, como a História do Brasil faz imaginar, assim como também, podemos inferir, os povos indígenas tinham e têm seus caciques e outros líderes, devidamente considerados e respeitados em seu contexto.

Pensar as tensões que essa imagem expõe é pensar as contradições das narrativas sobre negros na História do Brasil. Uma imagem, dois continentes, seres e narrativas a serem contados.

Uana e Marron de Terra10

Uana e Marron de Terra, de uma coleção de cinco livros, 11 inaugura uma atuação forte de vários personagens. A protagonista, Uana, menina de 7 anos, que se desenha negra, junto com os pais, desde a capa do livro, já vai se anunciando. Quase restabelecida de um sarampo bravo, ainda tem dúvidas se também iria morrer! Na interação com as enfermeiras, obteve respostas marcantes e significativas. A enfermeira do dia, que não sorria nunca, com uma ponta de preconceito, deixa a menina desanimada:

Sarampo não é moleza, não. Se não obedecer direitinho é bem capaz de virar anjinho... ou quem sabe um diabinho, pois anjinho preto eu nunca vi. (ZATZ, 2007a, p. 11).

Entretanto a enfermeira da noite era uma daquelas pessoas que acreditam na potencialidade dos seres humanos e na possibilidade de cada um atuar, individual e coletivamente, sobre o seu modo de ser no mundo:

“E essa força que eu posso ver no brilho destes teus olhos de jabuticaba? Será que ela não tem mais nada para fazer neste nosso mundo? Põe essa força para trabalhar, menina!” (op. cit., p. 12).

Após uma noite bem dormida, Uana se assusta com o presente que recebeu dos pais, no dia anterior. A outra personagem desta história (protagonista?) começa a surgir. Era uma boneca, à sua semelhança: olhos bem pretos, como duas jabuticabas, cabelo escuro, bem enroladinho, pele bem marrom e brilhante, igualzinha à pele de Uana [sem sarampo, claro!]. Disfarçadamente, escondeu a boneca embaixo do lençol.

...Não vou poder levar essa boneca na escola. Vão ficar gozando da minha cara, vão chamar de `boneca de piche ́ que nem fizeram com a boneca de pano, bem pretinha, que a Rosa levou. Pior ainda, só vão deixar minha boneca ser empregada na brincadeira de casinha. Nunca vão deixar a mãe, ou a filha ou a avó. (op. cit., p. 16).

Agora, Uana tem uma questão que aquela boneca-presente fez brotar: Por que minha boneca só pode ser empregada, hem? Não esperava Uana, todavia, que essa questão construída na convivência social, com práticas discriminatórias, seria desmontada pela própria boneca, que atuou, se mobilizou, se mexeu: já tinha mudado o penteado e a roupa e denuncia: Você me esconde embaixo do lençol, morre de vergonha, não sabe se me acha bonita ou feia... pois vem aqui pertinho que vou te contar uma história…

Três dias depois, na escola, Uana convida, afirmativamente: - Quem quer brincar comigo? Minha boneca vai ser uma princesa, uma princesa africana, chamada Marrom de Terra.

Teve quem não quis e arrumou logo outra brincadeira. Mas teve menina querendo ser Branca de Neve e teve menino querendo ser príncipe e teve menina querendo ser bruxa e teve menino querendo ser guerreiro. E quem brincou ficou conhecendo a história de Marrom de Terra, uma princesa muito antiga, talvez mais antiga que a Branca de Neve, mas que só agora está começando a contar sua história por aí. Quer saber como começa essa história? (op. cit., p. 23).

Essa pergunta remete o leitor para a última página do livro, que conta a história da princesa, abrindo inúmeras possibilidades de imaginação para se partilhar histórias das várias Áfricas.

Vale destacar que a visão infantil é apresentada pelo ilustrador com imagens que retratam um mundo muito próximo e imediato, característico dessa faixa etária. Círculos coloridos que inserem a menina, pensando ou se movimentando como uma boneca. Outro círculo para o texto. Praticamente sem cenário, cada página tem uma cor bem forte. Ao contrário dessa proposta geral, a página dupla em que aparece o desenho feito pela menina tem fundo branco, com pai, mãe, menina na cama do hospital coloridos pela criança. Ora, essa página não é a história narrada, mas a apresentação das personagens pela mão da menina. Esse destaque ajuda a compreensão do leitor mirim sobre de quem se está falando, a menina e sua família.

Outro aspecto que merece atenção é a falta de fisionomia das enfermeiras. A enfermeira boa da noite é gordinha, branca e usa óculos, mas as feições não são definidas; a enfermeira má do dia nem rosto tem, é mais morena e seus membros são ligados ao corpo como boneco mecânico, “mais parecendo um robô fantasiado de enfermeira.”

É um livro que apresenta uma leitura fácil para as crianças, com textos curtos e imagens de rápida compreensão que repercutem o imaginário infantil de uma criança negra diante da necessidade de enfrentamento de sua condição.

Relações raciais – indígenas

Também nesta seção são apresentados três livros – Histórias que eu ouvi e gosto de contar, Ajuda do Saci Kamba ́i: Kamba ́i nhopytyvô a regua, Massacre indígena guarani: Jurua reve nhande kuery joguero ́a a ágüe. Autores indígenas não somente tomam a palavra para contar histórias do seu povo, mas também, e sobretudo, nas duas últimas obras, cumprem essa missão muito bem, em língua materna.

Histórias que eu ouvi e gosto de contar12

Livro também de uma coleção, 13 é justamente aquele que parece se relacionar mais com uma herança cultural, de todos os conceitos e sentimentos de um povo, partilhados e internalizados emocionalmente, na socialização primária e que, por isso, segundo Berger e Luckmann (1985), têm a tendência a persistir.

São quatro interessantes narrativas que certamente povoaram a infância desse menino indígena: Matinta Perera, O Boto Tucuxi, O Vira-Porco e A Mulher do Cemitério, anunciadas pelo autor, com caráter de realidade:

O universo indígena é habitado por muitas histórias. São todas bastante vivas, porque reais, fazendo a ressalva de que infelizmente, por não entender a diversidade que existe em nosso universo, muita gente acabou por congelar as histórias, transformando-as em folclore – uma forma mascarada de manter viva a tradição. (op. cit., p. 7).

Trata-se do autor premiado, Daniel Munduruku, da nação Munduruku, que nasceu índio e gosta de ser índio e que toma a palavra, tornando-se protagonista e fazendo do povo indígena 14 e suas tradições também protagonistas.

Essa forma de pensar ajudou, e muito, o povo brasileiro a considerar os povos que mantêm vivas essas histórias como povos do passado. Como povos com uma mente infantil, que acredita em crendices. Assim os brasileiros acabaram por não compreender o universo habitado pelos povos indígenas e a sua tradição milenar. (op. cit., p. 7).

Cada história é contada por um sujeito real, concreto, deixando os leitores no limiar entre a realidade e a ficção, contextualização própria da mitologia e da literatura. O tom azulado escuro que predomina na capa e quarta capa intensifica o sentido do espaço literário, da criação literária que não se abre facilmente ao entendimento imediato. As ilustrações que abrem cada conto são em preto e branco contextualizando a personagem da história. A cor verde, símbolo universal da natureza, predomina na página de abertura e de fechamento da obra, na numeração de páginas, em desenhos esparsos que ilustram algumas páginas. O papel reciclado (ecológico) está em acordo com a ambiência das histórias, com a origem indígena do autor, inserindo o projeto gráfico e o suporte ‘livro de literatura’ no contexto da narrativa.

Matinta Perera, perversa criatura, personagem das histórias com uma ponta de suspense e terror, contadas em noite sem lua, de quem a avó, contadora dessa história, nem gostava de dizer o nome, era muito poderosa e estava sempre disposta a fazer malinagem com quem ousasse desobedecê-la.

A história do Boto Tucuxi foi Ely, colega da universidade que contou: ele mesmo disputou, certa vez, o amor de uma linda moça, numa festa de primeira, com o Boto, golfinho que se transformou num elegante jovem todo vestido de branco, trazendo um belo chapéu sobre a cabeça.

O Vira-Porco foi história contada por um amigo do autor, Osias – cujo nome indígena é Yaguarê, que é Saterê-Mauê, primeiro povo cultivador do guaraná, fruto hoje conhecido no mundo inteiro. É a história de um homem que virava porco: português que, na época da colonização, obrigou uma índia a se deitar com ele, foi forçado a beber uma erva, que não o deixa morrer, que o transforma em animal e que faz com que jamais volte a amar de novo. Nas noites escuras, ele persegue os homens solteiros, deixando-os malucos, desvairados e sem nenhum sentimento de amor. Yaguarê e seus amigos conseguiram salvar um curumim das garras desse Encantado.

A Mulher do Cemitério, história contada, em cenário real e conhecido – Colina da Serra, com indicação geográfica e website na Internet15 –, pelo nambikwara Khitaulu, de nome português Renê, ao som ritmado de um chocalho de perna, feito com sementes de castanha-do-pará, com todos de olhos fechados – história verdadeira, acontecida com ele. Encantado por um grito que vinha da mata, foi-se embrenhando mata adentro, deixando o filho sozinho, descansando na esteira, pois não conseguia se desvencilhar desse apelo misterioso. Deparou-se com uma mulher que irradiava claridade. Apavorado, petrificado, atendeu-lhe um pedido inusitado. Dois dias depois, foi encontrado por amigos da aldeia e lhes contou o acontecido. Poucos acreditaram.

Fazendo menção ao que se pode chamar de mitologia que, se é greco- romana, tem credibilidade e importância histórica, o autor denomina suas duas ações deliberadas nesse livro – resgate e desejo –, dirigindo-se ao povo brasileiro e, sobretudo às crianças e jovens, para que possam usufruir desse resgate, no campo da imaginação, do jogo e da brincadeira; da literatura, portanto – diríamos – seja ela oral, seja escrita, seja híbrida. Esse é seu grande desejo:

Este livro é um resgate e um desejo.

É o resgate de uma memória que está viva no homem e na mulher amazônicos e brasileiros [...] para lembrar que um povo só se mantém vivo se carregar em si certezas e sentidos.

É o desejo de acordar o povo brasileiro para suas raízes ancestrais. É o desejo de trazer para o coração das crianças e dos jovens a mágica da fé em seres invisíveis e encantados que habitam seus sonhos, seus jogos e suas brincadeiras.

É o desejo de lhes dizer que tudo isso é verdadeiro. Que a verdade está principalmente em coisas que nossos olhos não vêem. 16

Há, ainda, um Glossário, que nos permite entender a origem e o significado de termos utilizados nas histórias, como, por exemplo, malinagem – é como o homem amazônico define as reinações das crianças, sobretudo quando cometem alguma maldade.

Massacre indígena guarani: Jurua reve nhande kuery joguero ́a a ague17

Esta história tem como protagonistas tanto o povo guarani como um autor, nascido no Paraná, que é, ao mesmo tempo, tradutor de guarani para português e vice versa 18 e que realiza seu grande sonho, o de ser escritor.

Mas não é uma escrita qualquer; tem um tratamento muito especial: é uma edição bilíngue, em português e guarani. Essa é uma conquista digna de nota, em se tratando da construção e do fortalecimento da identidade de um povo. Segundo Oliveira (2009),

É através das línguas que as sociedades humanas, definidas como comunidades linguísticas produzem a maior parte do conhecimento de que dispõem e é através da língua que são construídos os sistemas simbólicos de segunda ordem, como a escrita ou as matemáticas, e que permitem a ação humana sobre a natureza e sobre os outros homens.

Em se tratando da obra Massacre indígena guarani, que o pajé mais velho tenha feito uma premonição, que tenha sido substituído, que uns tenham acreditado, outros não, tudo isso são ingredientes dessa história. O que não se esperava talvez seja que os dois lados tenham sido (quase) dizimados:

Vários corpos estavam caídos no chão, de índios e não-índios. Mas em meio a tantos mortos, um jurua sobreviveu. Ele levou uma flechada e saiu correndo pela mata. Ao chegar à casa do coronel, disse:

- Morreram todos os meus companheiros. E os indígenas também.

O coronel lembrou-se do que já havia acontecido tantas vezes com os indígenas, desde a chegada dos portugueses, em 1500.

Nessa história, os acontecimentos se repetem, como na época da colonização portuguesa, por ser uma história real, ensinada por meio da oralidade aos pequenos indígenas, e a narrativa demonstra as condições em que viviam e morriam, e ainda vivem e morrem os índios, sofrendo todo tipo de massacre dos jurua kuery (vários não-índios juntos), seja do ponto de vista físico, seja do ponto de vista linguístico, seja do ponto de vista cultural.

Acompanhando a proposta do escritor, o ilustrador Rodrigo Abrahim tem o cuidado de oferecer imagens que desejam retratar a história, mas com o toque de uma memória de quem ouviu “causos do interior e lendas da terra” pela avó e pela bisavó. Essa dimensão memorialística, em que a história de um povo indígena é apresentada por um autor indígena, é reforçada pela escolha da aquarela pelo ilustrador, técnica cujos contornos dos objetos são mais suaves e um pouco indefinidos; isso ajuda a construir, para o leitor, as imagens da lembrança, a interpretação dos fatos passados e sentidos, a ancestralidade e os sentimentos sobre os fatos vividos por esse povo.

Ajuda do Saci Kamba ́i. Kamba ́i nhopytyvô a regua19

O mesmo acontece com o livro “Ajuda do Saci”, de Olívio Jekupé20 e ilustração também de Rodrigo Abrahim. Como afirma o autor, na sua apresentação: 

“E foi assim, observando nosso passado difícil e lembrando de alguns índios que conheci, que se mudaram para a cidade para estudar, que escrevi a história desse indiozinho que você acabaram de ler.” Portanto, a observação, a lembrança e a vontade de contar a experiência difícil dessa população, a partir dos seus mitos e personagens, encontram eco nas aquarelas do ilustrador que seleciona poucos elementos em cada quadro, com as imagens contornadas por um fio fino e delicado que demarca o objeto.

O projeto editorial em que se inserem esses dois trabalhos envolve o leitor na ambiência da mata, do mato, com cores mais próximas da natureza, como o verde das árvores, o marrom da terra, o azul celeste, impressas em papel reciclado, compondo, no seu conjunto, uma perspectiva mais ecológica.

A narrativa deste último livro conta muito com a imaginação dos leitores, com o inusitado, com o imprevisível: é sobre o Saci, personagem indígena, protetor da floresta. Tem origem no guarani, Jaxi Jatere, ou Kamba ́i. Ele usa um colar chamado Baetê que lhe dá poderes, e ele não gosta de ver ninguém destruindo a mata.

Como que compreendendo o poder da língua para as coletividades humanas, Vera (em guarani, relâmpago) sonhava em estudar na cidade e ter também o conhecimento dos jurua, pois, aprendendo a ler e a escrever na língua portuguesa, era como se obtivesse mais uma arma para ajudar a defender o seu povo.

Com um aperto no coração, Karai, seu pai, conseguiu ajuda com um casal amigo que morava em São Paulo. Vera parecia flutuar e pensava: Como será que a gente aprende na escola. Essa pergunta tem toda razão de ser, porque, na aldeia, as crianças aprendiam ouvindo histórias e acompanhando os afazeres dos mais velhos, conforme bem pensaria Vygotsky (1989), quando diz que o conhecimento pode ser produzido entre os pares e em interação com parceiros mais experientes.

Na escola, se o kunumi (jovem índio) se indagava sobre a produção de conhecimentos, demonstrava, entretanto, algum conhecimento sobre os jurua, suficientes para levantar suposições sobre as dificuldades dos alunos para tratá-lo como igual.

Alguns garotos olharam para ele de maneira diferente.

Seria pelo corte de cabelo, pelo jeito de se vestir ou pelo seu modo de falar? As crianças perceberam que ele era diferente. Vera pensava ainda que era por causa dos filmes americanos que passam e sempre mostram o índio como um selvagem, violento, que só mata. (SILVA, 2006, p. 11).

Vera, que gostava de ler e de estudar, foi muito bem recebido e muito bem tratado por seu José e dona Lúcia, na cidade grande, saiu-se muito bem na escola jurua, conseguindo as melhores notas, partilhando sempre com os colegas curiosos os conhecimentos da língua guarani, assim como compartilhava com seus amigos da aldeia os conhecimentos sobre as crianças da cidade.

Quando voltou à aldeia, sentou-se embaixo de uma a árvore com os kunumi e falou sobre os costumes dos meninos da cidade, que passam muito tempo sentados em frente a aparelhos, assistindo a programas de televisão ou jogando videogames e cujos pais não têm tempo para ficar com eles. Depois convida: Por falar nisso, que tal nadar no rio e depois brincar de caçar? Sinto falta de brincar e correr ao ar livre.

(op. cit., p. 13).

Vera aprendeu a conviver com o diferente, consciente e orgulhoso do seu lugar, na história do seu país, brasileiro que é, embora nem todo brasileiro reconheça e valorize isso: No domingo, durante o almoço com os pais, Vera contou- lhes que São Paulo é a maior cidade do Brasil: - Lá tem gente de todo tipo: japonês, italiano, alemão, espanhol, coreano e também nativos como eu, os primeiros habitantes deste país. (op. cit., p. 13-14).

Triste, desenganado pelos médicos, sem poder se locomover, depois de um atropelamento, Vera não admitia que ficaria a vida toda, sem caçar, pescar, buscar madeira para fazer fogueira, fazer uma casa... (op. cit., p. 25).

O mais importante desta obra, entretanto, é o segredo que Vera guardou de seu José e dona Lúcia, mas deixou de presente para os leitores: a conversa com o Saci e o milagre de voltar a andar.

Quando o leitor chega ao final da narrativa, constata ser uma história escrita por um índio, sobre experiências de outros índios. O protagonista, personagem que usufruiu de tanto êxito na escola jurua e que sofreu na pele todos esses episódios, na cidade grande, é índio como o autor, rompendo com o que tem acontecido no Brasil, em que livros escritos por autores índios e tratando das temáticas indígenas são uma raridade. Felizmente, esta é uma produção de guarani, compartilhando com jurua! Melhor ainda: é um livro na língua guarani e na língua jurua! Certamente, esta é uma possibilidade de construção de uma simetria quando à valorização da história, dos costumes, mas também da língua, riqueza imaterial, que representa o poder de um povo para estabelecer relações.

Concluindo

São muitas as questões levantadas ao longo deste texto que carecem de um debate cada vez mais aberto com os professores de ensino básico, que se encontram às voltas com as tentativas de cumprimento da Lei 11.645/08 (modificação da Lei 10.639/03, para incluir os indígenas), que estabelece como fundamental, em todo o território brasileiro, o estudo da História e Cultura Afro- Brasileira e Indígena, considerando a contribuição desses dois povos para a constituição da identidade nacional.

No tocante ao tratamento das diferenças na escola, incluindo as relações étnico-raciais, com afrodescendentes e indígenas, perguntamo-nos, professores de todos os níveis de ensino, no Brasil, sobre a construção de sujeitos autônomos e críticos, protagonistas da sua própria trajetória de vida, parafraseando Peter Hunt: o que precisamos saber em vez de o que é bom saber.

Gomes, dialogando com os professores do Ensino Básico, no livro Literaturas africanas e afro-brasileiras na prática pedagógica, visa ao protagonismo das crianças e jovens estudantes:

[...] Implica também o diálogo da escola com os movimentos sociais, grupos culturais e organizações populares não mais para “conhecer a realidade do aluno”, mas para compreender que é na vivência da sua realidade que esse aluno se constrói como sujeito e produz saberes, os quais devem ser vistos, considerados, respeitados e compreendidos pelo universo escolar. Estamos diante do desafio da troca e partilha e não mais da hierarquização entre os saberes (GOMES, 2008, p. 154).

Marinho, trabalhando com projetos dos indígenas na formação de professores na universidade, em busca cada vez mais do discurso, da leitura e da escrita dos sujeitos enquanto protagonistas de sua própria história, individual ou coletivamente, indaga:

[...] como arregimentar alternativas para que os principais interessados dos projetos sejam de fato seus autores, se apropriem dessa escrita, reconhecendo-se no texto escrito e compreendendo a lógica dessa escrita, seus destinatários – locais e não locais – suas implicações e efeitos nas suas ações, no contexto da gestão coletiva? (MARINHO, 2010, p. 85).

Ao modo dessa autora, vale a pena pensar como nós, professores de vários níveis, podemos arregimentar alternativas, para, através dos livros para crianças, trabalharmos as diferenças, numa dimensão humana que amplie as possibilidades de convivência e de respeito? Existem inúmeros livros que conseguem conjugar literatura e artes com a finalidade de contar história, livros que se empenham, pelo trabalho articulado de texto e ilustração, em mostrar o que é importante de dizer para o leitor, obras que reconhecem, pelo viés da dimensão estética, a formação de leitores como um compromisso para a construção de sujeitos autônomos, de leitores que distinguem a estrutura discursiva e plástica das obras. Essa é uma das mais importantes condições de tornar professores e alunos verdadeiros protagonistas sociais. Portanto, forma e conteúdo caminham intimamente ligados, e as temáticas das diferenças, da multiculturalidade, a plurissignificação de sentidos buscam nos interlocutores o lugar de seu verdadeiro significado.

Se os livros comentados neste texto trazem como protagonistas sujeitos que nos apresentam outros modos de ver e de ler o mundo, a cidade e o campo, a África, com seus costumes, histórias e glórias, uma inversão na história dos negros africanos escravizados, narrativas ficcionais ou históricas dos povos indígenas, sobretudo em língua guarani, certamente serão possíveis outras abordagens, outras inversões, outros protagonismos em outras obras a serem produzidas, para crianças, para jovens, para adultos, a fim de serem partilhados e enriquecidos por outras leituras e interlocuções.

Referências

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VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. 3 ed. São Paulo: Martins Fontes, 1989.

Livros para crianças

BARBOSA, Rogério Andrade. ABC do Continente Africano. Ilustração Luciana Justiniani Hees. São Paulo: Edições SM, 2007.

CARRASCOZA, João Anzanello. O homem que lia as pessoas. Ilustração Nelson Cruz. São Paulo: Edições SM, 2007.

COTTIN, Menena; FARÍA, Rosana. O Livro Negro das Cores. Tradução Rafaella Lemos. Rio de Janeiro: Pallas, 2010.

JATOBÁ, Roniwalter. Viagem ao outro lado do mundo. Ilustração Lúcia Brandão.

Curitiba: Positivo, 2009.

MUNDURUKU, Daniel. Histórias que eu ouvi e gosto de contar. Ilustração Rosinha Campos. São Paulo: Callis, 2004.

MUNDURUKU, Daniel. Histórias que eu vivi e gosto de contar. Ilustração Rosinha Campos. São Paulo: Callis, 2006.

MUNDURUKU, Daniel. O olho bom do menino. Ilustração Rubens Matuck. São Paulo: Brinque-Book, 2007.

MUNDURUKU, Daniel. Histórias que eu li e gosto de contar. Ilustração Rosinha Campos. São Paulo: Callis, 2011.

RODRIGUES, Luiz Carlos Karai. Luiz Karai. Massacre indígena guarani: Jurua reve nhande kuery joguero ́a a ague. Ilustração Rodrigo Abrahim. São Paulo: DCL, 2006.

SANTOS, Joel Rufino dos. Na Rota dos Tubarões: o tráfico negreiro e outras viagens. Ilustração Rafael Fonseca. Rio de Janeiro: Pallas, 2008.

SILVA, Olívio Zeferino da. Olívio Jekupé. Ajuda do Saci Kamba ́i. Kamba ́i nhopytyvô a régua. Ilustração Rodrigo Abrahim. São Paulo: DCL, 2006.

ZATZ, Lya. Uana e Marron de Terra. Ilustração Alexandre Teles. São Paulo: Biruta, 2007a.

ZATZ, Lya. Luana, filha de Iansã. Ilustração de Alexandre Teles. São Paulo: Biruta, 2007b.

ZATZ, Lya. Manu da noite enluarada. Ilustração de Alexandre Teles. São Paulo: Biruta, 2007c.

ZATZ, Lia. Papí, o construtor de pipas. Ilustração de Alexandre Teles. São Paulo: Biruta, 2007d.

ZATZ, Lia. Tenka preta pretinha. Ilustração de Alexandre Teles. São Paulo: Biruta, 2007e.

* Professora da Faculdade de Educação/UFMG, pesquisadora do GPELL – Grupo de Pesquisa do Letramento Literário –, no interior do CEALE – Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita; pesquisadora do NERA – Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Relações Raciais e Ações Afirmativas/FAE/UFMG.

** Professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais, pesquisadora do CEALE/UFMG e coordenadora do grupo de pesquisa Literartes sobre as relações entre linguagens nos livros ilustrados.

1 Fórmula clássica de iniciar um conto e que possui o mesmo significado de “Era uma vez”.

2 CRAVEIRINHA, José. Obra Poética. Maputo: Direcção de Cultura, Universidade Eduardo Mondlane, 2002. 367 p.

3 COTTIN; FARIA. O livro negro das cores, 2006. El Livro Negro de los Colores, (Ediciones Tecolote, 2006) cujas autoras receberam o prêmio Novos Horizontes 2007 – Bologna Ragazzi.

4 CARRASCOZA. O homem que lia as pessoas, 2007.

5 JATOBÁ. Viagem ao outro lado do mundo, 2009. 

6 BARBOSA. ABC do Continente Africano, 2007.

7 Tambores.
8 Awale - Oware é um jogo de estratégia abstrata de origem Akan. Parte da família Mancala.
9 SANTOS. Na Rota dos Tubarões: o tráfico negreiro e outras viagens, 2008.

10 ZATZ. Uana e Marron de Terra, 2007.
11 Luanda, filha de Iansã (2007b); Manu da noite enluarada (2007c); Papí, o construtor de pipas (2007d); e Tenka preta pretinha (2007e).

12 MUNDURUKU. Histórias que eu ouvi e gosto de contar, 2004.
13 Histórias que eu vivi e gosto de contar (2006); Histórias que eu li e gosto de contar (2011). (Grifo nosso).
14 Os livros que trazem o selo Palavra de Índio são ligados à temática indígena brasileira e mundial.Eles buscam formar e informar os leitores, auxiliando no desenvolvimento de uma consciência crítica e participativa, na tentativa de diminuir o preconceito e a exclusão social dos povos nativos (op. cit., 2004, p. 48).

15 O Sítio Colina da Serra fica localizado em Itapecerica da Serra, a quinze quilômetros da capital de São Paulo. O local é muito bonito e acolhe projetos educativos durante o ano todo. No mês de Abril realizamos ali o Projeto “Vivendo um dia de Índio”. Visite a nossa página na Internet: <www.colinadaserra.com.br>. (op. cit., 42).
16 Cf. MUNDURUKU. O olho bom do menino, 2007.

17 RODRIGUES. Massacre indígena guarani: Jurua reve nhande kuery joguero ́a a ague, 2006. 

18 Luiz Karai, Secretário da Associação Guarani Nhe ́e e Porá.
19 SILVA. Ajuda do Saci Kamba ́i. Kamba ́i nhopytyvô a régua, 2006.
20 Presidente da Associação Guarani Nhe ́e e Porá.

 

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