N. Poussin - Uma dança para a música do tempo

 

Poussin em muitas telas(1)


Carla Viana Coscarelli(2)


Carla Viana Coscarelli é doutora em Estudos Lingüísticos pela Faculdade de Letras da UFMG, onde é professora, fez pós-doutorado em Ciências Cognitivas na University of California, San Diego, participa do Programa A tela e o texto e é colaboradora do CEALE/FAE.


Resumo

Neste trabalho apresentamos os resultados de um experimento em que foi feita uma comparação da leitura de um mesmo texto em dois formatos: o hipertexto digital e o contínuo, a fim de verificar a influência do formato de apresentação do texto na compreensão dele. O texto usado nesse experimento traz explicações sobre o quadro Uma dança para a música do tempo pintado por Poussin e foi analisado à luz da Teoria dos Espaços Mentais proposta por Fauconnier e Turner (2002).

Palavras-chave: leitura, hipertexto, Poussin



Ler um hipertexto é diferente de ler um texto “contínuo”? O hipertexto é mais difícil? Em que aspectos o hipertexto pode colaborar para a compreensão de um texto? Como o leitor de um hipertexto conecta as partes que compõem esse material?


Essas são algumas das perguntas que procuramos pesquisar e para isso fizemos alguns experimentos para verificar a influência do formato hipertextual na compreensão. Descreveremos nesse artigo um desses experimentos.


Construímos duas versões diferentes de um texto: uma em formato de hipertexto e outra em formato contínuo, a fim de verificar a influência do formato na compreensão. Chamamos de contínuo o texto a que muitos chamam de linear ou impresso, em que as informações são apresentadas uma após a outra numa seqüência preestabelecida, como acontece nos livros, artigos e em grande parte dos textos impressos. A versão hipertextual, é composta de um texto base, no caso o quadro Uma dança para a música do tempo pintado por Poussin em 1638, um dos gêneros
(3) escolhidos para esse experimento, e vários links que partiam do quadro e ofereciam explicações de elementos componentes dele, bem como informações sobre o autor e seu estilo. Neste formato, o leitor poderia escolher a ordem em que exploraria os links.


Partimos da hipótese de que não há razões muito fortes para acreditarmos que haja diferenças substanciais na leitura nesses dois formatos, uma vez que o leitor domine os mecanismos de navegação comuns no texto digital, pois nenhum texto é linear e toda leitura é um processo hipertextual. Ou seja, todo texto lida, inevitavelmente, com uma pluralidade de dimensões (lexical, morfo-sintática, semântica, discursiva, entre outras). E a leitura, por sua vez, depende das atividades de inúmeros domínios cognitivos que se articulam para viabilizar a construção do(s) sentido(s) do texto.


Para compreender o quadro escolhido para esse experimento - Uma dança para a música do tempo de Poussin, reproduzido acima - o leitor precisa perceber o simbolismo que cada uma das figuras carrega e, com a ajuda das informações do texto verbal, dar a elas um valor, de forma a mesclar a figura e o que ela representa. Precisa, além disso, reunir as figuras e seus significados, construindo assim um sentido global para o texto. Dessas mesclas vão emergir muitos significados e conseqüências possíveis.
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A vida é uma dança é a grande metáfora desse quadro (5). As figuras que dançam no quadro são, de acordo com o texto: o Trabalho, o Prazer, a Riqueza e a Pobreza. Esses elementos representam “a roda da fortuna”, que mostra a instabilidade da vida, e a nossa impotência diante das escolhas do destino. A forma como essas figuras se olham e se dão as mãos é um dado que pode contribuir para a compreensão da imagem mostrando as relações de afinidade entre o Trabalho, o Prazer e a Riqueza, e o afastamento entre a Riqueza e a Pobreza. Esses dados podem gerar outras inúmeras interpretações e questionamentos, se transferidos para nossa vida humana, entre as quais podemos citar as diferenças sociais e os fatores que justificam o fato de um ser rico, outro ser pobre, um ter trabalho e outro não, de uns enriquecerem e outros empobrecerem e os diferentes níveis possíveis de dependência entre o prazer e esses outros elementos. Podemos também fazer muitas inferências a partir da posição de cada uma das figuras: o Trabalho, por exemplo, está de costas para o Prazer e ambos olham em direções opostas, uma vez que o Prazer olha para fora do quadro e o Trabalho tem seu olhar voltado para a Riqueza, mas segura no alto a mão da Pobreza. O Prazer e a Riqueza também estão de mãos dadas. Essas posturas podem ser transferidas para o nosso cotidiano em que nem sempre o trabalho é tido como fonte de prazer, mas está diretamente relacionado à idéia de evitar a pobreza e construir a riqueza. Por outro lado, a Riqueza e a Pobreza não se dão as mãos. Se projetada para nossa vida, essa postura pode sugerir a incompatibilidade dessas duas situações bem como a idéia de que a riqueza de uns pode ser causa da pobreza de outros; e pode ainda gerar um mundo contrafactual em que elas se dariam as mãos, gerando possivelmente a igualdade social e inúmeras conseqüências que adviriam disso.


As outras figuras da imagem são igualmente importantes, a começar pelos elementos que representam o tempo ou a passagem dele - os meninos e o velho – e que sugerem também a idéia da morte. Os instrumentos carregados por eles – a ampulheta, o instrumento de fazer bolhas e a harpa - complementam o valor simbólico das figuras, sugerindo as idéias de fugacidade, brevidade e fragilidade da vida. O fato de o velho ter asas também confere a ele o poder sobrenatural de, juntamente com o instrumento, poder controlar a duração, o ritmo e o tom da dança, o que gera um rico espaço contrafactual em que o velho pára de tocar. Se a música acabar, acaba a dança, acaba a vida, acaba o trabalho, o prazer, a riqueza e a pobreza (figuras que dançam), não há mais o tempo (velho e as crianças), acabam-se o passado e o futuro (Janos), mas a eternidade continua (o cortejo de Apolo), pois é uma dança à parte. As figuras do quadro têm cada uma seu valor individual, mas elas precisam ser consideradas também em seu conjunto, sendo entendidas como metáforas para a fugacidade da vida, para o destino e a nossa falta de controle sobre a morte, nos fazendo lembrar, no entanto, que há música, ou seja, que a vida pode ser alegre, divertida e precisamos aproveitá-la enquanto a temos, entre outras inferências possíveis.


Também faz parte desse simbolismo o cortejo de Apolo, composto por Apolo, deus do sol, da profecia, da música e da poesia, que representa a eternidade, acompanhado das Horas, deusas das estações que “dançam um eterno círculo, paralelo à dança representada no primeiro plano do quadro”. Esse paralelismo, no entanto, traz um ponto contrastante que é a eternidade de um em relação à efemeridade do outro. Temos aqui dois espaços (6): o cortejo de Apolo e a dança “terrena” (em oposição à dança dos deuses). A comparação dessas duas danças nos faz perceber várias diferenças (disanalogias), dentre as quais podemos citar a ausência da figura do músico (ou do instrumento musical) uma vez que Apolo por si é deus da música e teria a lira já incluída em seu simbolismo, a presença de um deus e de uma carruagem, com cavalos robustos, que conduzem o cortejo: elementos que sinalizam para a eternidade dessa dança. Há também um elemento responsável por abrir o caminho para que o cortejo possa passar sempre, ao passo que na dança “terrena” existem em contraposição, elementos que sinalizam a brevidade da dança (as crianças). Essa disanalogia entre as duas danças também faz emergir muitas interpretações possíveis, entre elas a de que nossa passagem pela vida é muito breve em relação ao caráter eterno do universo e do mundo extraterreno, para o qual “os portões da manhã” estarão sempre abertos.


Completa esse cenário a “figura de duas cabeças sobre o pilar de pedra” que é o deus romano Jano. Essa figura condensa a juventude e a velhice, relacionando-as ao passado e ao futuro e é em si uma rica compressão de uma pluralidade de sentidos possíveis, como a inevitável passagem do tempo e, conseqüentemente, o nosso inescapável envelhecimento, a possibilidade de conservarmos um espírito jovem mesmo quando o corpo traz sinais de envelhecimento, a idéia de que nós somos constituídos de nosso passado e nossas projeções para o futuro, entre outras.


Nesse texto, a vida é projetada em uma peça musical ou numa dança, nos fazendo ativar um espaço mental em que temos a música e a dança, e outro espaço mental em que temos o tempo e a vida. Há uma projeção entre os elementos desses dois espaços e da relação analógica entre eles é construído um espaço mesclado em que dança e vida se integram, bem como música e tempo. Dessa rede de espaços, projeções e integrações vão surgir várias interpretações das relações entre dança/vida e música/tempo, dentre as quais podemos citar a idéia de que a vida tem ritmo e duração determinados. Apesar de a dança ter quatro participantes, ela parece representar a vida de uma pessoa só, ou de cada um de nós individualmente. A música está tocando para cada um e a dança vai acabar para cada um em um momento diferente. Cada um tem sua vida e seu tempo, embora esses elementos façam parte da vida de todos nós.


Considerados em seu conjunto, esses espaços e integrações parecem convergir para a idéia que pode ser condensada em “carpe diem”, expressão latina que significa “aproveite o dia”, não desperdice tempo, viva bem a vida porque ela pode acabar a qualquer momento ou, como apresentado no texto, esse quadro “é um tratado em miniatura sobre o tempo, o destino e a condição humana” e para compreender esse tratado o leitor precisa encaixar as diversas partes do quadro e o que elas parecem significar, como se estivesse montando um “quebra-cabeça”.


As figuras que dançam no primeiro plano, bem como a presença do músico e das crianças, trazem conceitos e relações abstratas para uma escala humana, ou seja, os traduzem em situações familiares e acessíveis para os seres humanos. Essa escala humana nos faz ver o quadro, num primeiro olhar, como uma dança comum: pessoas dançam ao som da música tocada pelo instrumentista. Perceber detalhes, como as asas no velho que toca o instrumento, nos leva a iniciar uma busca por outras realidades e significados neste quadro. As asas, bem como a nudez, funcionam como um construtor de espaços mentais
(7)sinalizando que outros espaços precisam ser ativados e integrados. O cortejo de Apolo é um desses elementos. Temos então dois espaços que se projetam aqui: a dança e o cortejo de Apolo, e que, dado o seu caráter simbólico, nos fazem criar um terceiro no qual vão se projetar, que seria a vida (as asas do velho Tempo talvez sejam a marca de que ele transita entre os mundos, ou seja, há uma conexão entre eles). Juntos esses espaços se projetam num espaço genérico da dança e geram um espaço integrado (mescla) em que a articulação dos elementos desses espaços faz gerar muitas estruturas emergentes, como a fugacidade, a brevidade e a fragilidade da vida; o destino e a nossa falta de controle sobre a morte; o envelhecimento inevitável; a idéia de que a vida pode ser alegre, divertida e de que precisamos aproveitá-la, além da instabilidade e paradoxos da vida, da nossa impotência diante das escolhas do destino e das inúmeras razões para as diferenças sociais encontradas em nossa sociedade.


Tanto o texto quanto o quadro - intitulado Uma dança para a música do tempo do francês Nicolas Poussin - foram retirados do livro Para entender a arte
(8). Nesse livro, vários quadros são apresentados e têm muitas de suas partes comentadas de forma didática, uma vez que o objetivo desse material, como o nome do livro esclarece, é fazer com que o leitor compreenda diversas obras de arte. Traços finos e retos saem dos quadros e levam a pequenos comentários que contornam as obras. Outros comentários sobre o autor e a obra são apresentados em boxes ou na lateral esquerda do quadro.


Este material foi escolhido por apresentar, no papel, uma estrutura parecida com a que encontramos em hipertextos digitais, ou seja, por apresentar fragmentos de texto sem articulação explícita, ao contrário do que normalmente acontece nos textos contínuos ou “lineares”.


O quadro e os comentários foram transportados para uma estrutura hipertextual em que, no lugar das linhas, os leitores tinham um link no próprio quadro que levava a uma página em que aquela determinada parte do quadro era apresentada em zoom ao lado dos comentários tal como estavam no livro. Essa era a versão hipertexto digital que foi apresentada para um grupo de informantes.


Na versão contínua que foi apresentada a outro grupo de informantes, os pequenos comentários que circulavam o texto original foram reunidos e transformados em um texto contínuo. Para isso, o texto dos links sofreu adaptações a fim de constituir um texto contínuo bem articulado. Mesmo com as modificações feitas, as informações presentes nos links estavam também presentes nessa versão do texto.


Depois da leitura do texto, na versão hipertextual ou na versão contínua, o leitor respondeu a algumas perguntas com o objetivo de verificar a compreensão do texto nos dois formatos. Cada uma das perguntas visava a verificar uma habilidade de leitura, dentre as quais podemos citar: compreensão global, depreensão do tema, localização de informação explícita, inferência causal, inferência relacional (relação entre partes do texto) e manifestar opinião.


Foi feita primeiramente uma análise quantitativa das respostas dadas pelos estudantes. Essas análises revelam, de modo geral, uma leve vantagem do formato hipertextual sob o contínuo, na maioria das habilidades verificadas.


É importante notar, no entanto, que os resultados encontrados por habilidade são diferentes do que podemos chamar de compreensão do texto. A análise quantitativa, de acordo com a qual os resultados do formato hipertextual são um pouco melhores que os resultados do formato contínuo, é baseada numa chave de resposta mais fechada e menos flexível em que uma habilidade em particular está sendo verificada. Não responder satisfatoriamente a uma questão, ou seja, não demonstrar ter uma determinada habilidade não implica necessariamente em não compreensão do texto. Muitas vezes a resposta dada pelo estudante pode não ter sido considerada satisfatória por ser vaga, imprecisa ou inadequada em relação à habilidade que está sendo verificada mas, ao mesmo tempo, pode revelar compreensão do texto. Numa questão de localização de informação, por exemplo, o sujeito pode ter contado com seus conhecimentos prévios ou com sua memória e não ter recuperado o elemento do texto a que a pergunta se referia, mas apresentar considerações pertinentes ao texto em sua resposta. Em uma questão de identificação do tema, o sujeito pode não ter identificado o tema, mas trazer outras informações em sua resposta que revelam compreensão do texto. O mesmo pode acontecer nas questões inferenciais e de opinião.


Uma análise qualitativa das respostas, ou seja, uma análise que busca verificar a compreensão do texto e as formas de construção de sentido usadas pelos sujeitos, independentemente de uma avaliação da adequação dessa resposta à pergunta proposta ou à habilidade de leitura que está sendo verificada, nos permite dizer que em ambos os formatos de apresentação do texto – hipertextual e contínuo - os leitores foram capazes de compreender os textos, construindo para eles uma rica rede de relações que envolvia não apenas os elementos do texto, mas também, como era esperado, conhecimentos prévios, experiências, bem como deduções, analogias e disanalogias, entre muitas outras operações cognitivas envolvidas no processamento de metáforas, cadeias referenciais, relações temporais e espaciais, entre outras.


Considerando as respostas por habilidades, percebemos que houve diferença no desempenho dos sujeitos no que concerne à compreensão global: o formato contínuo apresentou resultados melhores que a versão hipertextual. Em relação às demais habilidades - produção de inferências, localização de informação e de opinião - o formato hipertextual apresentou melhores resultados que a versão contínua. Há que se considerar, no entanto, que o número de sujeitos que participaram desse experimento era pequeno (eram 15) e, portanto, esses resultados apresentam apenas uma tendência, cuja validade precisa ser verificada em pesquisas que lidam com um número maior de informantes.


Os resultados encontrados, no entanto, reforçam algumas de nossas expectativas. Uma delas é a de que o formato hipertextual apresentaria melhores resultados nas questões de localização de informação explícita, pois uma das vantagens que se espera de um hipertexto é a facilitação na localização de informações dado o acesso direto à informação por meio de links.


Por outro lado, foi contrariada a expectativa de que não haveria diferença nos dois formatos na questão de opinião. Aparentemente não há motivos para que os dois formatos tenham influência na habilidade dos sujeitos de expressar opinião. Mas muitos informantes não emitiram uma opinião sobre a relação entre o homem e o tempo. Num entanto, uma explicação possível para essa diferença é que os sujeitos deveriam expressar uma opinião sobre o tema do texto. É interessante notar que os sujeitos na versão contínua tiveram mais dificuldade de perceber o tema do texto que os sujeitos da versão hipertextual e isso é reforçado na questão em que eles deveriam emitir uma opinião sobre o tema da propaganda. Os sujeitos da versão hipertextual, por sua vez, conseguiram melhorar os seus resultados na questão opinativa, em relação à questão que procurava verificar o tema, o que não aconteceu com os informantes da versão contínua. Outro dado interessante é que, considerando que a compreensão global parece ser uma espécie de requisito para a opinativa, ou seja, é preciso entender o texto para emitir uma opinião a respeito dele, era de se esperar que os sujeitos da versão contínua obtivessem resultados melhores nessa questão do que os sujeitos do formato hipertextual uma vez que aqueles se saíram melhor na questão de compreensão global, mas não foi isso que aconteceu.


Também não esperávamos diferença na compreensão global dos dois formatos. Mas o que pode explicar a vantagem para o formato contínuo é que, na resposta dada à primeira pergunta, alguns sujeitos explicaram a estratégia que usariam para apresentar o quadro a alguém, revelando a ambigüidade interpretativa dessa questão. Nesses casos a resposta foi computada como inadequada, a não ser quando acompanhada de uma explicação sobre o quadro ou descrição dele. Essa ambigüidade gerou muitas respostas inadequadas na versão hipertextual.


Nas operações inferenciais de modo geral, as duas versões apresentaram resultados semelhantes. Entretanto, é interessante notar que resultados melhores foram encontrados na versão hipertextual quando se tratava da produção de uma inferência causal. Uma possível explicação para essa diferença é o fato de que, nesta versão, os links deixam claro a que figura o texto se refere, o que não acontece com tanta evidência na versão contínua, em que os sujeitos deveriam identificar as figuras a que a pergunta se referia, embora o texto explicitasse de que figura se tratava. Os sujeitos das duas versões apresentaram resultados muito semelhantes nas questões inferenciais que verificavam a habilidade de estabelecer relações entre partes do texto, seja ela uma relação mais específica de partes do texto ou envolvendo uma compreensão mais global do texto.


Isso não significa, no entanto, que o formato contínuo dificulta ou impede a compreensão do texto. Uma análise qualitativa das respostas mostra que os alunos, independentemente do formato de apresentação do texto, compreenderam bem o texto e foram capazes de lidar muito eficiente e criativamente com os diferentes espaços mentais que ele nos instiga ativar e integrar.


Esse experimento levanta muitas perguntas que devem ser verificadas em futuras pesquisas, entre as quais podemos citar: esses resultados podem ser generalizados para outros gêneros textuais? Esses resultados se devem ao fato de o texto fazer referência a uma imagem? Será que a tendência de melhores resultados para o hipertexto será também encontrada na leitura de textos prioritariamente verbais? O que acontecerá em leitores menos proficientes?


As respostas dadas pelos estudantes nos mostram que as perguntas relativas ao texto fizeram com que eles fossem, a cada passo, enriquecendo sua leitura, clareando ou tornando mais consciente a construção de sentido e isso nos leva a pensar nas inúmeras possibilidades hipertextuais (ou não) de ajudar nossos alunos a desenvolver suas habilidades de leitura.


Esses resultados nos levam a acreditar que o formato hipertextual pode ser de grande valia em ambientes de ensino-aprendizagem, uma vez que facilita e estimula a consulta ao texto e incita a integração das partes do texto.

Algumas conclusões


O experimento apresentado neste artigo faz parte de um conjunto maior de experimentos semelhantes, nos quais outros gêneros textuais foram testados. Uma análise global desses experimentos nos mostrou uma vantagem para o hipertexto, embora a diferença entre os resultados dos sujeitos que leram a versão hipertextual e dos que leram a versão contínua não seja muito grande, à exceção da localização de informações em que o hipertexto apresenta sempre uma grande vantagem se comparado ao formato contínuo.


A leitura de hipertextos parece gerar resultados um pouco diferentes da leitura de textos contínuos, mas esse formato precisa ser pesquisado em outras situações de compreensão de textos escritos em ambientes digitais para que possamos saber melhor como e em que situações isso acontece, e para que possamos identificar com mais exatidão os fatores que provocam as diferenças. O hipertexto não apresentou dificuldades para os estudantes que participaram dos experimentos conduzidos nessa pesquisa. Pelo contrário, esse formato parece ter facilitado várias das operações, como a localização de informações explícitas, a produção de inferências e a emissão de opinião. Esses resultados reforçam nosso pressuposto de que toda leitura é um processo hipertextual, ou seja, de que a compreensão é um processo de integração de informações de diversas fontes na busca da construção de uma rede articulada e coerente de informações. Sendo assim, não há motivos para acreditar (e nossos experimentos comprovam isso) que o hipertexto
(9) possa provocar dificuldades de leitura em comparação com o texto contínuo. Ao contrário disso, o hipertexto parece ser um formato mais amigável que o texto contínuo e, portanto, pode ser um instrumento eficaz em situações de ensino-aprendizagem, além de ser estimulador da leitura. Esse assunto merece outra longa conversa.

Abstract


In this paper we present the results of an experiment in which a comparison between the reading comprehension of a text presented in two formats: digital and continuous hypertext, was made in order to find out about the influence of the format of presentation in reading comprehension. The text used in this experiment brings explanations about the painting Dance to the Music of Time by Poussin, and was analyzed using the Theory of Mental Spaces proposed by Fauconnier and Turner (2002).

Key-words: reading, hypertext, Poussin.