CONTO E MÚSICA: DIÁLOGO COM AS PERIFERIAS

Maria das Graças Fernandes

Nada tenho a temer exceto as palavras.
Rubem Fonseca

Este trabalho pretende analisar o conto “Agruras de um jovem escritor”, de Feliz ano novo, de Rubem Fonseca, e a música rap “Diário de um detento”, do grupo musical Racionais MC’s, enfocando diferentes modalidades narrativas. O propósito deste estudo é possibilitar uma reflexão sobre o material didático e paradidático adotado no ensino de literatura e apresentar sugestões de trabalho para o 1º e o 2º Graus. Serão enfatizadas a linguagem e a temática da violência na construção narrativa, a fim de se apresentar ao professor de literatura novas possibilidades de introduzir essa discussão em sala de aula, estabelecendo conexões com outras artes e áreas do conhecimento como música, cinema, televisão e História. Hoje, não é possível a abordagem do tema literatura, sem antes pensar em algumas questões básicas da contemporaneidade, causadoras de grandes inquietações: as mutações da linguagem, o fenômeno da globalização e a cultura de massa. Nessa perspectiva, o conto e a música selecionados para análise tematizam outros aspectos, como linguagem e violência urbana, e apontam questionamentos sobre a ordem e o sistema vigentes. O conto aqui analisado, ao fazer parte de Feliz ano novo, publicado em 1975, causou grandes inquietações na ocasião de seu lançamento e foi proibido pela censura da ditadura militar. A obra constitui-se numa ficção de temática urbana cujas personagens habitam sempre os limites, ou seja, as margens da sociedade. Atualmente, essa obra ainda é bastante discutida por abordar temas polêmicos como a violência e a segregação do homem na sociedade, e por apresentar uma linguagem contundente e chula, de forma a agredir os parâmetros sociais e gramaticais vigentes. Por isso mesmo, a obra desse autor atinge um grande público, tal como o rap dos Racionais MC’s.

Como se sabe, em nossa sociedade, a música tem papel fundamental na vida e na formação dos jovens. No Brasil, ela constitui uma grande manifestação cultural e, acompanhando as transformações do homem e da sociedade, expressa nas melodias e nas letras as relações do indivíduo com seu mundo. Por isto, tanto a música quanto o conto servem como subsídio para leitura e análise um do outro.

As aflições da linguagem

A partir do título do conto, “Agruras de um jovem escritor”, o narrador desvenda toda uma trama de dificuldade de uso da linguagem e questiona o processo de produção textual. Vagueando sempre em ambientes sórdidos, o narrador-personagem é quase um alcoólatra que, deslumbrado por um prêmio de poesia da Academia Brasileira, sonha com um reconhecimento instantâneo. Nesse sentido, o questionamento acerca de já ser ou não escritor, no conto, não se modifica com o surgimento da personagem Lígia, que nasce do nada à sua procura e se instala em seu apartamento. É próprio de Rubem Fonseca a criação de personagens que surgem sem nenhuma referência passada ou projeto para o futuro. Nota-se um certo investimento no momento presente. As narrativas contemporâneas tendem a privilegiar o momento do acontecimento. As ações fixam-se na agilidade do presente, no aqui e no agora. As personagens normalmente não possuem preocupações que ultrapassem os limites da experiência cotidiana. Nesse aspecto, pode-se pensar também numa forma de revalorizar a produção literária do momento, embora saibamos que, para isso, temos que reconhecer a influência da tradição na elaboração destes textos. Na leitura do conto, o narrador nos leva a várias referências: Marcel Proust e Joyce, por exemplo, em um texto marcado pelas influências dos grandes clássicos. Viver intensamente o presente é um desejo de Lígia e do narrador que também não sabemos de onde veio e porque estava naquele local. Lígia apresenta-se inicialmente com uma postura servil e submissa ao prostrar-se aos pés dele dizendo: “faz de mim o que quiseres”.[1] Aparentemente, Lígia é uma personagem pouco significativa mas, no desenrolar da trama, rouba a cena e, ao final do conto, o narrador a descobre como autora do romance que ele estava escrevendo ou, pelo menos, pensava estar. O encontro das duas personagens não revela nenhuma paixão avassaladora, nem um cálido amor de romance. Sem estabelecer regras ou compromisso formal, por não ter para onde ir, Lígia se instala em seu apartamento e começou a datilografar seu romance: compunham “um bom arranjo”,[2] como diz o narrador. Apesar do esmero de Lígia em agradá-lo, não é vista por ele como uma grande companheira e a relação entre eles encaminha-se de forma parasitária e antropofágica, fundamentando-se num processo crescente de apropriação e posse do trabalho da personagem, que culmina em sua total anulação. Resta de Lígia apenas o discurso escrito que também é absorvido pelo companheiro.

Tais questões permitem reflexões acerca do papel e do lugar ocupado pela mulher dentro da literatura, em especial, dentro do conto fonsequiano, contemporâneo. O texto de certa forma denuncia, ou pode-se dizer, anuncia as novas tendências das relações interpessoais, além de ironizar as histórias dos romances clássicos absorvidos pelas grandes massas. A narrativa é linear e construída a partir de fragmentos momentâneos do convívio das grandes cidades.

Estes fragmentos são remontados e apresentados ao leitor em forma de texto, utilizando-se de signos que não deixam de passar uma certa comicidade. Os aspetos cômicos podem ser encontrados em diversas partes do texto, como: ao encontrar-se só no apartamento, sentindo os nervos em frangalhos, porque um encapuçado tocava insistentemente sua campainha, depois de tentar gritar e não ser ouvido, tentar telefonar e o telefone estar enguiçado, “o jovem escritor” abre a porta, nu, de facão na mão e, ao invés de um ladrão, depara-se com uma freira velha que pedia esmolas. Outra cena engraçada foi quando, ao tentar jogar o revólver de Lígia no bueiro, “chegou um crioulo com um canivete na mão dizendo, passa a grana e o relógio para cá se não eu te furo”.[3] Ao ouvir isso, a personagem não leva em conta o perigo de ser atingido pelo canivete do crioulo, mas pensa no relógio japonês de quartzo.

Mais adiante, outro episódio envolvendo as mesmas personagens: ao ir a um telefone público para tentar conseguir socorro para a sua mulher que estava em coma, ele reconhece o ladrão que havia tentado assaltá-lo, em quem tinha atirado. Este também o reconhece e sai correndo com medo de levar outro tiro, mas o protagonista corre atrás dele gritando: “hei, hei! você tem uma ficha de telefone?”[4] O ladrão era subnutrido, doente e gritava: “não atire, eu tenho mulher e filho”[5]. O ladrão tinha uma ficha de telefone amarrada em um fio de náilon e a empresta para que ele telefone. Após chamar o Pronto Socorro, recupera a ficha de telefone puxando-a pelo fio de náilon, a devolve ao ladrão, e o convida para ir até seu apartamento para lhe dar apoio moral. Além dos aspectos cômicos da narrativa, outros recursos estabelecem elos de aproximação do leitor: a forma de apresentação textual, como a ausência de parágrafos, a mistura de linguagem coloquial e culta, e a pouca preocupação em nomear o protagonista do conto. Seu nome só é conhecido através do bilhete de despedida em que Lígia escreve "José", nome que remete à personagem bíblica mas que é, também, comum e usual em várias esferas sociais. Podemos ver esta escolha como proposital, no sentido de situar o narrador como sendo um indivíduo comum, em uma comunidade também comum. Tudo isto apresenta-se como uma nova modalidade na escrita.

Uma forma de trazer o leitor, se não para dentro do texto, pelo menos para bem próximo dele, tornando-o o mais verossímil possível. No conto, o autor utiliza-se da habilidade que possui em lidar com a escrita para questionar as faces opacas da linguagem. Borges, no texto “A Biblioteca de Babel”, fala da interlocução das diversas formas de linguagem e de conhecimento entre as inúmeras obras e ciências. Apesar desta interlocução constante e das várias janelas por onde entram e saem os conhecimentos, os livros de um mesmo hexágono e de prateleiras vizinhas não se reconhecem:

Durante muito tempo, acreditava-se que esses livros impenetráveis correspondiam a línguas passadas ou remotas. É verdade que os homens mais antigos, os primeiros bibliotecários, usavam uma linguagem assaz diferente da que falamos agora; é verdade que algumas milhas à direita a língua é dialetal e que noventa andares mais acima é incompreensível (...)[6]

A narrativa apresenta-se como um texto babélico, indicando dificuldades de comunicação. Reportando essa idéia para o conto “Agruras de um jovem escritor”, percebe-se que, embora as personagens pertençam a uma mesma esfera social e cultural, com condições de vida semelhantes, no entanto, como os livros do hexágono da Biblioteca de Babel, elas não se entendem. Nesse sentido, o rap dos Racionais MC’s, “Diário de um detento”, também coloca em evidência esta opacidade da linguagem.

A poética da exclusão

O rap é uma forma de expressão que teve sua origem por volta da década de 70, nos bairros novaiorquinos, em guetos, com uma comunidade predominante de negros. Os habitantes desses locais, carentes de um instrumento que levantasse seus problemas e questionasse a situação do seu grupo no país, criaram tal estilo musical, misto de fala e canto rimado. RAP - Abreviação para rhythm and poetry. Gênero musical criado por negros norte-americanos que se caracteriza por ritmo acelerado e quase inexistência de melodia e harmonia. Surge em 1979, com lançamento de Rapper's Delight, do grupo Sugarhill Gang. As letras, em geral longas, são quase recitadas e utilizam gírias dos guetos e das gangues que habitam os bairros pobres das metrópoles norte-americanas.

É executado, em regra, por uma dupla. Um DJ (disc-jóquei) cuida da parte sonora, ou seja, dos efeitos especiais obtidos pelas mixagens, enquanto o MC (mestre-de-cerimônias) se encarrega do texto. O rap é associado, desde o início, aos grafiteiros e à dança de movimentos bruscos, sincopados. Quando utiliza melodia, recebe o nome de hip hop. Entre as bandas de destaque estão Ice Cube, Run DMC, Ice T, Kurtis Blow e NWA. No final da década de 80, o rap mistura-se a outros gêneros. Surgem o jazz rap, o raggamuffin (mistura com o reggae) e o dance rap. Há ainda o rap consciente, que fala de problemas políticos. Seu principal porta-voz é o Public Enemy. O rap chega ao Brasil no início dos anos 80, mas só ganha espaço na indústria fonográfica em 1993, com o lançamento do primeiro disco de Gabriel, o Pensador. Em São Paulo, os destaques são os grupos Sampa Crew e Racionais MC's.[7]

Como se pode notar, na citação acima, os principais objetivos deste novo estilo eram questionar, conscientizar, reivindicar, colocar em xeque o sistema e denunciar o processo de exclusão em que viviam as comunidades negras. O rap espalhou-se rapidamente, encontrando terreno fértil no Brasil, em locais de grandes aglomerações como os centros urbanos. Tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil, as comunidades negras são numerosas, constituindo populações discriminadas e perseguidas. A partir dessas informações, o professor de literatura poderá trabalhar com o conto de forma mais interativa, fazendo sua leitura em comparação com a música e ligando ambos os textos ao contexto cultural e sócio-político do país.

A música analisada, “Diário de um detento”, é uma melodia de grande alcance entre os jovens, talvez porque denuncie a falência do sistema carcerário brasileiro. A letra relata uma das maiores tragédias acontecidas no Brasil, na década de 90: o massacre no complexo penitenciário do Carandiru, na cidade de São Paulo, em 03 de outubro de 1992. Construída com imagens sobrepostas de violência, a letra do rap constitui uma nova modalidade narrativa, foge aos padrões normais da música, ditados pela indústria cultural e pela sociedade de consumo, e apresenta um estilo inovador. A música é o recorte de um momento real que desnuda de forma brutal, uma realidade pouco discutida, dita, escrita, talvez por não ser conhecida ou sequer pensada por muitos de nós. Com um texto contínuo, chama a atenção para dia e hora do acontecimento e denuncia a vulnerabilidade do homem enquanto ser humano diante do sistema. Desse modo, faz com que o ouvinte/leitor se veja naquele momento e visualize as cenas do massacre. A narrativa encaminha-se de forma a produzir um efeito catártico no leitor, ativando seu imaginário. Essa reflexão sobre o imaginário, nos tempos atuais, não pode ser realizada sem se descrever o lugar de onde se fala, e sem deixar de inscrevê-lo naquilo que se fala. O relato do rap, por se tratar de uma narrativa contemporânea explora o imaginário e a memória do ouvinte/leitor. A linguagem cinematográfica e televisiva é constantemente associada às cenas e às personagens presentes no momento do massacre. Ocorre a comparação das cenas aterradoras do momento do acontecido, com o que possivelmente só poderia ocorrer no "inferno". De forma irônica e nas entrelinhas, percebemos a denúncia de que muitos dos que morreram no massacre eram réus primários, ou tinham penas menores. Enfim, tratavam-se de indivíduos possivelmente recuperáveis. O termo “robocop do governo”[8] é atribuído à pessoa de Fliori, então representante do sistema na ocasião. Também Charles Bronson, protagonista de alguns filmes violentos mais consumidos nos anos 90, ou a chocante imagem de um preso caído de bruços sobre a Bíblia aberta no salmo 23 e a lembrança de Adolf Hitler, remetem-nos a memórias mais antigas e atuais facilmente identificáveis. Tudo isto revela a verdadeira "cidade babélica" existente naquele lugar. A linguagem usada no complexo é dialetal, contendo palavrões e gírias, produzindo um código cifrado e específico para aquele ambiente.

As ações no complexo do Carandiru são delimitadas em tempo e espaço pela própria condição de encarceramento. O tempo da rebelião é de três dias, sendo que no terceiro acontece o massacre. Este é o tempo narrado pela música. O limite da ação, no rap, pode estar ligado ao fato de que, na cadeia, há toda uma estrutura, um código estabelecido pelos detentos, que delimita o espaço das ações. Neste espaço, as pessoas vivem como se o fenômeno da globalização, o “atordoador” do homem, não se fizesse presente. Todas as ações transcorrem em um espaço determinado e labiríntico, que é o complexo e seus entornos. Essa delimitação também se dá no código lingüístico que, de certa forma, é criado naquele e para aquele ambiente. A Revista Veja, em publicação recente, traz uma estatística sobre o complexo do Carandiru: Ele é considerado um dos maiores presídios do país em número de presos, aproximadamente 7000, em acúmulo de problemas como a superlotação e em registro de rebeliões sangrentas. Nos últimos tempos, um outro fenômeno vem se verificando entre os muros altos da instituição. Ela se tornou um reduto de cantores, compositores e conjuntos musicais. Estima-se que pelo menos 150 presos se dediquem ao rap.[9] A matéria editada traz vários depoimentos de presos que participam de bandas, mostrando os benefícios que a música tem feito naquela comunidade, no sentido de resgatar a cidadania e a auto-estima. Para alguns, a música é uma forma de externar a angústia e matar o tempo. Já, para outros, a música é um instrumento de protesto e denúncia que leva suas vozes para além dos muros. Para estes, a música passa a ter conotação mais ampla, apontando até uma forma de sobrevivência e recomeço. Dentre estes, que se aventuram como rappers, uma observação interessante pode ser feita: a pouca idade apresentada por eles. Para Nietzsche “a música é a expressão simbólica do antagonismo e da dor primordiais”.[10] No complexo, a invasão deste estilo musical de rua, com técnicas de fácil assimilação, realiza nos detentos um sonho da liberdade. O rap retorna às suas origens, passa a ser, no espaço do Carandiru, um instrumento de expressão daquela comunidade e, em alguns casos, constitui-se uma ponte entre o presídio e a vida fora dos muros.

Tanto a narrativa fonsequiana quanto o rap dos Racionais identificam grupos sociais: alguns personagens fonsequianos, não somente os do conto “Agruras”, como os que emergem em outros contos, como: “O cobrador”, e “A coleira do cão”, dentre outros, possuem como marca uma linguagem violenta e contundente, o que se aplica também aos viventes do babélico complexo penitenciário do Carandidu. Nessa direção, podemos dizer que: as falas destas personagens nascem dos dialetos periféricos, mundanos e coloquiais que, vivendo à margem de uma língua de prestígio social, desenvolvem um trabalho de erosão dessa mesma língua. As gírias, os clichês, a linguagem de gueto dos urbanóides que vivem dos restos da sociedade de consumo possuem um caráter implosivo: à deriva e ao mesmo tempo entrelaçado ao português culto, tal falar produz uma reversão dos signos lingüísticos.

Esse jogo, além de duvidar de uma literatura legitimada pela crítica especializada, questiona também a própria língua enquanto instrumento de poder: de dentro do idioma e à suas volta, as personagens desenvolvem uma fala estranha ao padrão da escrita.[11] Para a análise dos textos, o professor pode, por exemplo, questionar o surgimento de novos valores e padrões sociais sejam eles lingüísticos, político-sociais ou culturais. influenciando radicalmente, nos dias de hoje, nossa formação enquanto cidadãos. Levando em conta o público com o qual pretendemos trabalhar, que é o jovem de periferia e a sua formação, convivemos hoje com uma total desconstrução das identidades, principalmente da identidade cultural, das raízes locais, regionais, e a substituição dessas raízes pelo global. Isto afeta desde as relações interpessoais até o modo de consumo e a nossa cultura. Segundo Néstor Canclini, “as identidades modernas eram territoriais e quase sempre monolingüísticas. As identidades pós-modernas são transterritoriais e multilingüísticas”.[12] Conforme a questão levantada pelo autor, antes, a vida era bem mais simplificada. Ficávamos em nosso território, com as variações culturais de uma única língua, embora, pelas influências históricas anteriores, nossa identidade, enquanto brasileiros, tenha sido sempre uma identidade plural.

Hoje, nos tempos de globalização, essas discussões surgem com maior complexidade. Vivemos em uma roda viva e babélica, bombardeados a todo momento com influências do mundo inteiro. Diria que nossa identidade, que já era plural, tornou-se multicultural. Esta desconstrução traz consigo outro fenômeno que implica em outras perdas, a chamada desterritorialização, ou seja, a perda do território em que se produz a identidade. Isto surge como conseqüência do fenômeno da globalização, onde o homem se sente excluído dos processos econômicos e sociais de sua própria pátria, não se encontra em seu lugar nem se reconhece enquanto cidadão. Se antes os produtos e as artes eram desenvolvidos dentro de um território e para uma determinada cultura, com a economia globalizada, nos deparamos também com a desterritorialização da produção cultural, assim como ocorre na indústria convencional. Para exemplificar melhor este fenômeno, podemos pensar em um carro projetado nos Estados Unidos: suas peças são fabricadas em diversos países diferentes, sua montagem acontece no Brasil, México, ou em outro país qualquer, e este automóvel tem ampla comercialização. Na indústria cultural, um produto - disco, livro, filme, vídeo - é produzido para correr o mundo e ser consumido por povos e culturas diversas. Toda essa diversidade desperta um desejo único nos dois narradores que, nas modalidades analisadas, são meros espectadores das ações: Encontra a porta de saída do labirinto em que se encontram. O narrador do conto procura a fama que só se consagra, ou pelo menos pensa se consagrar, ao ser preso. Isto pode ser visto como uma crítica aos grandes romances clássicos, onde as personagens só se realizavam plenamente no trágico. De certa forma, a prisão funciona mais ou menos como uma morte. Uma sobrevida talvez, ou uma vida vegetativa. No caso do rap, o narrador sonha com uma vida extramuros. Usa para isso o mesmo instrumento do conto, uma narrativa, só que musical. Sabemos que este investimento na música tem crescido muito nos últimos tempos junto às comunidades carcerárias, que são bastante heterogêneas. Elas apostam na música como instrumento de denúncia e meio de sobrevivência. Embora saibam que, de acordo com os padrões sociais vigentes, a ascensão social entre as classes, e principalmente entre os presidiários, ainda é embrionária.

A sugestão do paralelismo entre o conto e a música no ensino fundamental e, principalmente, no ensino médio pode servir de base para introduzir novas reflexões além do aspecto da linguagem e da violência urbana. Podem- se discutir fenômenos como a formação de grupos de estilos musicais, a relação dos jovens com estes grupos e como o espaço destes grupos tornam-se espaços privilegiados da expressão desse público. A presença do rap, estilo produzido inicialmente por um outro grupo social, pode ser vista como forma de reconhecimento de experiências similares, mas que expressam contextos sociais próprios. Como a relação do jovem com a música é quase direta, e vem sendo construída gradativamente, esta modalidade, como recurso didático, tende a funcionar como um chamamento a uma leitura inovadora do texto literário.

Dados sobre Rubem Fonseca

Nascido em Juiz de Fora, Minas Gerais, em 11 de maio de 1925, José Rubem Fonseca é formado em Direito, tendo exercido várias atividades antes de dedicar-se inteiramente à literatura.

Livros publicados no Brasil: (Algumas obras)

Os prisioneiros (contos, 1963), A coleira do cão (contos, 1965), Lúcia McCartney (contos, 1967), O caso Morel (romance, 1973) Feliz Ano Novo (contos, 1975), O homem de fevereiro ou março (antologia, 1973)

Notas:

[1]. FONSECA,1995. p. 94.
[2]. Ibidem. p. 94.
[3]. Ibidem. p. 95.
[4]. Ibidem. p. 97.
[5]. Ibidem. p. 97.
[6]. BORGES, 1989. p. 64.
[7]. Almanaque Abril, 1999.
[8]. MC