Planejamento do Tempo em Sala de aula

 

Flaviane Arcênio Tinoco Costa
Pós-graduanda em Estudos Lingüísticos pela FALE/UFMG

 

REVISÃO DE LITERATURA 

 

O tempo destinado à cada parte da aula é uma decisão importante que os professores têm que tomar durante o planejamento e a execução da mesma. “O tempo estabelecido para cada sub-atividade, a fim de atingir um objetivo em comum em cada aula, é muito importante no ensino e no aprendizado” (Richards & Lockhart, 1995 p. 122-123). Wajnryb (1996) acrescenta que o planejamento do tempo durante as atividades propostas é particularmente mais difícil para professores em início de carreira, os quais, geralmente, não estão muito acostumados a preverem o tempo a ser despendido. Com um pouco mais de experiência e de prática, os professores planejam melhor e são capazes de tomar decisões mais acertadas.

 

Richards & Nunan (1995) relatam que o tempo durante as aulas em que os alunos estão ativamente engajados nas atividades propostas (time-on-task) representa uma significante contribuição para o aprendizado, ao contrário do tempo despendido nos intervalos, distribuição de livros e dever de casa e discussão sobre eventos que acontecerão nas aulas seguintes.

 

Em um estudo de caso realizado por Marshall, K. (in Richards, 1998), na tentativa de gerenciar melhor o tempo despendido durante as aulas, o alunos foram comunicados sobre sua tentativa de distribuir as atividades de uma maneira mais adequada e eficaz. Com um maior engajamento da turma foi possível atingir essa meta. O tempo de cada atividade era cronometrado por alunos voluntários e a necessidade de aumentar o tempo, caso fosse necessário era negociada. Além disso, perguntas fora do contexto da aula eram discutidas após o término da mesma. Com isso, o “time-on-task” aumentou de forma significativa, sendo possível realizar todo o plano de curso estabelecido.

 

Além do gerenciamento do tempo, o “pace” é essencial para manter os alunos alertos, motivados e engajados nas atividades (Wajnryb, 1996).

 

Richards & Lockhart (1995, p.123) sugerem algumas estratégias que ajudam a alcançar “suitable pacing” durante as aulas:

 

-         evitar explicações e instruções desnecessárias ou longas, permitindo que os alunos façam sua parte no aprendizado;

-         usar várias atividades durante a aula, ao invés de apenas uma;

-         evitar atividades previsíveis e repetitivas;

-         estabelecer o objetivo e o tempo limite para cada atividade;

-         monitorar os alunos durante as atividades para assegurar um tempo suficiente, porém não excessivo.

 

 

 

IDENTIFICAÇÃO DO PROBLEMA E OBJETIVOS:

 

Após assistir as aulas da professora Ana (pseudônimo) em uma Escola Estadual em Belo Horizonte e detectar certa deficiência na organização e distribuição das atividades durante as aulas, decidimos realizar uma pesquisa sobre “o gerenciamento do tempo na sala de aula”.

 

Quatro aulas de 30 minutos (horário reduzido devido à greve) foram observadas e verificou-se uma dificuldade em gerenciar o tempo das atividades durante as aulas e o não planejamento das mesmas (segundo a professora, o plano de aula não era feito por escrito uma vez que já sabia “tudo” o que iria fazer). Decidimos, então, avaliar o tempo estabelecido no plano de aula para cada atividade e o tempo real despendido durante a realização das mesmas (time-on-task). O objetivo desse estudo de caso é refletir sobre os problemas identificados em relação ao tempo e ao “pace”.

 

 

MATERIAIS E MÉTODOS

 

O estudo de caso foi realizado, uma vez que permite a inter-relação entre a teoria e a prática em sala de aula.

 

A coleta de dados foi feita no período de 19/05/03 a 14/08/03 através de:

-         questionários aplicados à professora;

-         notas de campo durante as aulas;

-         diários (escrito pela professora após cada aula lecionada);

-         plano de aula detalhado (Celce-Murcia, 1991); 

-         entrevistas com a professora (análise reflexiva sobre a distribuição das atividades e do tempo gasto em cada uma delas durante a aula e o motivo do sucesso ou não das mesmas);

-         entrevista final com a professora (análise do ponto de vista da professora referente aos resultados encontrados nesse estudo de caso);

-         observação de 16 aulas

 

 

RESULTADOS:

 

Ana, 29 anos, graduada em Letras (licenciatura em língua inglesa) em uma Universidade pública em 2001, leciona em uma Escola Estadual há um ano.

 

A turma observada tem 34 alunos do ensino médio (2° B), com uma média de 25 alunos presentes durante as aulas. Os alunos têm duas aulas de inglês consecutivas (50 minutos por aula), porém devido à greve as aulas foram reduzidas para 30 minutos.

 

De acordo com o questionário respondido logo após a primeira aula observada, a maioria das atividades são realizadas em sala de aula e a cada novo assunto proposto no livro, ela pede aos alunos para fazerem os exercícios como dever de casa. Contudo, durante as 16 aulas assistidas, o livro didático foi usado uma única vez (como tarefa de casa, a qual não foi solicitada para posterior correção).

Seguindo a sugestão de um aluno sobre a realizaçãom de um teatro, Ana implementou a idéia, executando-a em todas as turmas de ensino médio, as quais lecionava. O livro foi substituído por exercícios transcritos no quadro a serem copiados no caderno ou exercícios mimeografados, os quais envolviam vocabulário relacionado às peças teatrais Robin Hood, Romeu e Julieta, Ivanhoé. A professora pediu que tirassem xerox de um livro com as três histórias, contendo explicações em português e diálogos em inglês. Os alunos tinham que se dividir em grupos e apresentar uma das peças mencionadas acima. Um único grupo tirou a cópia, porém apenas da parte do diálogo que iriam apresentar. Ressalta-se que apesar da tentativa dos alunos em falar inglês durante a apresentação da peça teatral, o não treinamento e ensaio prévio, impossibilitou que os mesmos se expressassem de modo compreensível. Além disso, Ana foi muito flexível, não estipulou a peça, o número de participantes ou a data para apresentação de cada grupo. Estipulou apenas uma data limite. A falta de instruções claras e de determinação de objetivos específicos fez com os alunos não se preparassem.

 

Quando comparados as anotações de campo e os diários escritos pela professora, nota-se que a mesma relaciona a não realização de seus objetivos com a falta de material e de interesse dos alunos. Em um dos diários, relata que todos os alunos estavam fazendo os exercícios solicitados, o que não condiz com as anotações de campo. Contudo, após a entrevista (análise sobre as aulas 3 e 4), a frase presente no diário: “a aula poderia ter sido melhor... comecei a envolvê-los, mas os perdi em um certo momento”  é mais fiel ao que foi observado.

 

Após as primeiras duas aulas assistidas, perguntei-lhe como planejava as aulas. Ela disse a seguinte frase: “Não planejo por escrito, pois tudo que irei fazer já está na minha cabeça, eu já sei”. Ao dizer que “fazer plano de aula detalhado é muito chato, mas se isso for importante para a pesquisa, eu faço”, a professora demostra não perceber como um plano de aula detalhado pode ajudá-la e orientá-la melhor durante as aulas. Segundo a mesma, o plano de aula seria feito apenas para auxiliar na pesquisa.

 

Obviamente, não teria como analisar o que foi planejado e o tempo estipulado para cada atividade se o planejamento não fosse feito por escrito. Assim sendo, a partir da quarta aula observada,  após analisarmos as aulas anteriores e refletirmos sobre os aspectos abordados por Richards (1998) a respeito de como manter um “suitable pacing”, solicitei que preparasse um plano de aula detalhado para as próximas aulas refletindo sobre os seguintes aspectos:

-         tempo despendido para cada atividade a ser realizada;

-         tipos de atividades;

-         tipos de interação;

-         objetivo de cada atividade proposta;

-         material a ser utilizado para cada atividade;

-         os possíveis problemas que poderiam acontecer.

 

Apesar de entregar-lhe um modelo do plano de aula com os tópicos a serem preenchidos, os dois primeiros não foram bem detalhados, então em uma das reuniões sugeri que o plano fosse feito durante a mesma para que pudéssemos discutir e refletir sobre os objetivos e possíveis problemas que poderiam ocorrer mediante a cada atividade proposta.

 

Solicitei que tentasse realizar a aula o mais próximo possível do plano de aula por ela escrito (planejado), marcando o tempo despendido em cada atividade.

 

Eu estava presente durante a elaboração de três planos de aula (correspondentes a 6 aulas de 30 minutos) a fim de auxiliá-la caso houvesse dúvidas, sugerindo atividades apenas quando requisitada. Em um dos planejamentos, o qual contribui com uma atividade, ela fez o seguinte comentário: “já tem muita novidade, vamos guardar essa atividade que você está sugerido para outra aula...”. Destaca-se que apesar de planejar atividades variadas, apenas uma única atividade era realizada.

 

Refletindo sobre os resultados encontrados nesse estudo de caso, Ana diz que a realização de uma única atividade “é uma coisa cultural que vem de dentro de todas as aulas”.  Contudo, segundo a mesma “Isso pode ser quebrado. Tem que mudar alguma coisa. Eu quero mudar.

 

Durante as reuniões para discutirmos sobre as aulas dadas, a professora sempre mostrou-se muito motivada, refletindo sobre a necessidade de modificações em algumas atividades com as quais não obteve os resultados esperados. Agradeceu as sugestões e a oportunidade dessa troca de experiências. Apesar dessa vontade de mudança, a professora em nenhuma das aulas observadas executou o que havia sido discutido e planejado, além disso, as atividades não foram cronometradas e o tempo previsto para as mesmas não foi estipulado durante as aulas.

 

Nota-se que muito tempo foi gasto indevidamente discutindo sobre eventos que iriam acontecer nas aulas seguintes (ex. as peças a serem apresentadas), assim como assuntos não diretamente relacionados à disciplina (ex. greve). Além disso, apesar da realização do plano de aula, há uma certa falta de organização por parte da professora. Ela iniciou a nona aula observada perguntando: “Qual atividade, sobre qual peça, ainda falta passar no quadro?” (Ressalta-se que na entrevista final, a professora concordou com os dados acima mencionados, dizendo: “Realmente é feio quando o professor não sabe o vai dar. Vou melhorar minha postura diante deles (os alunos), para verem que eu sou uma professora que estou tendo controle e então isso vai mudar a mente deles também. Eu estou pensando em fazer um caderninho, com os planos de aula....”).

 

Destaca-se que as atividades geralmente demoravam muito mais do que o necessário. Em seu relato sempre dizia: “A atividade demorou um pouquinho a mais do que o planejado, não é?”, “Ah, é! A atividade demorou isso tudo!”.

 

Os exercícios mimeografados preparados pela professora e segundo a mesma extraídos de livros didáticos de inglês, apresentam erros de estrutura, instruções incompletas e confusas, sendo atividades puramente estruturais baseadas em repetição, além de má distribuição dos mesmos na folha dificultando a compreensão dos exercícios. Nenhuma atividade em que os alunos tivessem que usar criatividade foi realizada.

 

Os mesmos exercícios (folha mimeografada) foram realizados em 2 aulas consecutivas. Ana tentou modificar o enfoque para a oralidade. Assim sendo, pediu aos alunos que lessem o texto em voz alta. Cada aluno era ‘intimado’ a ler uma frase do texto, o qual foi lido 8 vezes seguidas durante a aula. Cada aluno lia uma frase, em seguida a professora repetia e traduzia a mesma. A maioria dos alunos pedia que ela lesse para posteriormente repetir a frase, que logo em seguida era traduzida pela professora. Após a reflexão sobre a aula, a mesma considerou a leitura em voz alta como uma conquista, demonstrando-se satisfeita com os resultados.

 

Na entrevista final, Ana fez o seguinte comentário: “Eu fui muito ingênua (risos). Claro que não teve nada de criativo, de comunicativo, mas só de fazer com que eles falem alguma coisa ou participem. Não que eu ache que isso também é a forma correta. Hoje a gente sabe que tem outras maneiras de trabalhar isso. O texto dá impressão de que eu sou uma daquelas professoras totalmente fechada. Eu me dou por satisfeita diante do que eu tenho. Os alunos têm pavor de falar inglês. Você começar a pedir para eles falarem, na verdade, não é que seja um resultado maravilhoso,  mas já é alguma coisa.” 

A professora afirma que trabalhar a oralidade dos alunos é extremamente importante, e que está ciente de que a reprodução (leitura) de texto é diferente de comunicação oral, mas que mesmo assim, força a repetição para trabalhar a pronúncia. Durante as aulas, a comunicação oral foi realizada somente através da leitura em voz alta e da repetição.

 

A fim de fazer com que todos os alunos lessem em voz alta, ameaças em relação à nota ou à falta são constantes justificativas para os mesmos fazerem o que está sendo pedido. “Quando eu pedir para ler ou responder tem que fazer. Está valendo nota”, “... se não fizerem os exercícios eu não darei presença. Vocês terão faltas na lista de chamada” (faltas diferentes da ausência, considerada como falta de participação, contudo os alunos não foram avisados sobre essa diferença). Como muitos alunos não faziam o que havia sido pedido e tinham que responder as questões (a maioria múltipla-escolha), eles respondiam incorretamente. Além disso, ela perguntava, mas não oferecia tempo suficiente para os alunos pensarem e responderem. Desta maneira, em um caráter “teacher-centered” faz perguntas e as responde imediatamente.

 

A avaliação e a nota, segundo Ana, é uma questão cultural. Ela relata que:

o Estado apresenta uma política de que nota não é importante, contudo os professores ainda estão sustentando a questão da nota.” “Perguntar quanto vale, parece que não valeu nada. Eu detesto isso. Eu não gosto, mas eu falo, gente, vocês preocupam só com nota.... tem que pensar se vai captar (aprender) alguma coisa. Isso (essa atitude) me incomoda, mas a maioria dos professores ainda sustenta isso... Como para os outros professores tudo vale nota, eles vêm para a aula da gente com o mesmo espírito...É cultural mesmo. Vejo na minha época, que eu estudava em escola pública, não era desse jeito, tudo valendo nota não, era uma prova. Exercício não valia nota, mas a gente fazia. Se é para os alunos fazerem em sala de aula, eles não fazem. Se não vale nota, aí é que não fazem mesmo.” Apesar de demonstrar em seu discurso, uma certa insatisfação em relação à vinculação da nota ao processo de avaliação e aprendizagem: Ana continua utilizando a ‘nota’ como argumento para os alunos fazerem as atividades propostas.

 

Ana é risonha, tranqüila e atende cada aluno em sua respectiva carteira. Contudo, essa atenção individualizada favorece a desordem, dispersando os alunos, sendo apenas alguns favorecidos, geralmente os “bons”, como são por ela considerados. A professora acredita que alguns alunos têm mais facilidade para aprender o que é ensinado em sala de aula: “Alguns alunos não prestam atenção, não querem aprender”, “outros pegam as coisas no ar”. A mesma afirma ainda que prestigia os “bons alunos”, que estão interessados em aprender, vêm às aulas e participam. Os que não vêm às aulas não merecem sua atenção. “Às vezes, eles (os ‘maus alunos’) me chamam, mas eu não atendo, ignoro”. Ana não considera “justo” ficar repetindo a matéria para os alunos que não comparecem às aulas. O fato de não aprenderem está relacionado, segundo a professora, à falta de interesse e à desordem, e não às eventuais falhas do professor mediador do conhecimento.

 

A interação professor-aluno(s) prevalece durante a correção das atividades. Inicialmente as perguntas eram direcionadas a turma em geral, estimulando a participação espontânea, porém eram sempre os mesmos que as respondiam. Posteriormente, passou a elicitar os nomes, forçando-os à responder. Percebe-se que, apesar da tentativa de substituir essa interação professor-aluno(s) por exercícios realizados em dupla, esses são sempre escritos, não permitindo que os alunos se comuniquem oralmente em inglês. Mesmo quando pede para um aluno perguntar algo em inglês para seu colega, ela traduz, repetindo a pergunta a fim de ter certeza de que todos compreenderam. Segundo a mesma:

“alguns alunos têm o perfil de querer só as coisas reprodutivas (ao invés das produtivas), e eu tenho que alcançar esses alunos também. Eles são a grande maioria. Eles estão acostumados a receberem  praticamente toda a informação pronta.  Às vezes, eu não quero traduzir, falo que não vou traduzir e têm alunos que falam assim: você é professora e está aqui para dar tudo ‘mastigado’  para a gente.... Eles ficam impacientes... Isso é a preguiça mesmo.”  Isso aí eu estou com dificuldade de quebrar. Mesmo porque, eles se acomodam. Eles não estão entendendo, o que adianta eu ficar falando. Eu acho difícil desvincular isso, tirar esse negócio de traduzir. Eu vou estar refletindo. Eu acho que na escola pública, é mais difícil. No cursinho eu acho que teria jeito”. Mais uma vez, ela relaciona a estrutura física e tecnológica ao ensino, dizendo: “Você pode fazer qualquer coisa com uma estrutura. Segundo Ana, em uma escola que tem ‘estrutura’, o aluno tem prazer em frequentar e participar das aulas.

 

Quando questionada em relação à freqüência e como as atividades são realizadas em sala de aula, verificou-se que a leitura e tradução de textos são predominantes, seguidos dos exercícios relacionados ao vocabulário e gramática, o que foi confirmado com as anotações de campo.

 

Após onze aulas transcrevendo no quadro as atividades (geralmente exercícios de múltipla escolha) ou corrigindo a folha mimeografada referentes às peças a serem apresentadas, o Present Perfect (que estava previsto para a nona aula observada) foi introduzido. O plano de aula visava a introdução do novo tópico de uma maneira mais comunicativa e dedutiva. Porém a professora se ateve a explicação estrutural (20 minutos) e à tradução de uma estrutura inexistente na língua portuguesa, confundindo ainda mais os alunos. A professora preocupa-se intensamente com a tradução do léxico e com a nomenclatura gramatical. Como verifica-se em sua descrição ao introduzir o Present Perfect: “Hoje vamos aprender matéria nova. É o Present Perfect. Have you ever...?”, “Como vocês perguntam se alguma vez em sua vida você já assistiu Titanic?”, “ Como é formado esse tempo verbal?”, “O que é Past Participle?”, Por que usa have ou has?...”

 

Ao justificar a mudança de planos (aula relativa à introdução do Present Perfect), ela relatou que aprendeu de um modo estrutural e acredita que esta é a melhor forma de ensinar, a fim de solucionar quaisquer dúvidas que os alunos possam vir a ter ao lerem o livro texto e responderem as questões do dever de casa. Segundo ela, “isso evita conflitos com o livro”. Richards & Lockhart (1995, p.30) acreditam que “as crenças sobre o ensino são frequentemente uma reflexão sobre como os próprios professores aprenderam”.

 

Ao refletir sobre os resultados encontrados, ela relata:

Você colocou uma fala minha que parece que eu estou sendo assim radical, que esse (o modelo estrutural) é a maneira correta. Eu não acho que esta é a maneira correta, não. Foi a maneira que me alcançou. Mas, de uma certa forma, eu não dispenso essa maneira totalmente. Sei que têm alunos como eu em sala de aula. Esse negócio de ficar deduzindo, tem muitos que não gostam. Eles querem chegar logo ao ponto, eles acham que é uma enrolação, eles ficam sem paciência. Então, tem uma cultura nisso. Eu acho que tem que mudar.

 

Mesmo estando envolvida em um projeto de educação continuada para professores da rede pública e apresentar o desejo de renovação,  a professora continua vinculada a abordagem tradicional (estrutural) de ensino. “A produção e sistematização de formas do sistema gramatical, a tradução, o direcionamento da interação em sala de aula, a ausência de criação de momentos para o desenvolvimento de comunicação real na língua-alvo” são enfatizados durante as aulas (Almeida Filho, 1999, p.37). Em seu discurso mencionado abaixo, a mesma apresenta contradições entre suas crenças e suas atitudes:

“Eu me considero ainda tradicional (estrutural), como eu te disse, eu estou tentando quebrar. É um modelo difícil de se desvincular. Apesar não estar gostando desse modelo, pois não tem alcançado muitos alunos. Por outro lado, eu tenho uma contradição entre esses dois aspectos. O tradicional alcança determinados alunos, mas não alcança outros alunos, na questão da motivação. Eu acho que o tradicional tira a motivação porque os alunos querem ter prazer. Todos os adolescentes, todo mundo, na verdade, está em busca do prazer. O tradicional, às vezes, pode ser motivo de não ter prazer, não trazer prazer para sala de aula. (Contudo), alguns alunos têm prazer. Acha que o professor passando a matéria no quadro, escrevendo, é o professor que ensina, que trabalha. Também por não conhecer o outro lado.... Então, eu vejo colegas de trabalho, da educação continuada, dizer que (ao tentar inovar) tem aluno que fala que a professora não dá nada....”

 

Almeida Filho (1999 p.43) descreve que “o confronto de uma nova abordagem e metodologia de ensino com a abordagem de formação e prática da professora reflete em questionamentos presentes em seu discurso e em incoerências que caracterizam sua prática.” Há contradição entre as atividades planejadas e o que realmente é realizado em sala de aula. Apesar dos planos de aula basear-se em atividades mais comunicativas e interativas, estes não foram efetivados. Consequentemente, o tempo estimado para as atividades não foi cumprido, uma vez que nem mesmo as atividades propostas foram realizadas.

 

Em uma análise final sobre os resultados do trabalho e a reflexão dos mesmos em sua carreira profissional, Ana afirma que a participação nesse estudo de caso foi válida. Segundo a mesma, apesar de considerar incômoda a exposição de sua competência na área de ensino, os resultados encontrados a fizeram refletir sobre alguns conceitos e, com certeza, afetarão seu futuro como professora.

 

CONCLUSÃO

 

Em relação ao “pace” das aulas observadas, mesmo tendo conhecimento das estratégias sugeridas por Richards & Lockhart (1995), nenhuma delas foi implementada. Uma única atividade era, geralmente, realizada durante toda aula (30 minutos), sendo previsível e repetitiva. Enquanto os alunos faziam o exercício, apenas alguns (“bons alunos”, assim por ela determinado) eram favorecidos durante o atendimento individualizado. Além disso, os objetivos e/ou tempo limite para cada atividade não foram estabelecidos durante as aulas.

 

Destaca-se que, apesar do desejo de mudança, esse é um processo lento e complexo, envolvendo as crenças e percepções do professor sobre o ensino e o aprendizado. Por isso,  apesar de seu discurso de querer modificar sua abordagem para algo mais interativo e comunicativo, a professora ainda encontra-se presa a uma abordagem tradicional de ensino, baseando suas aulas no aprendizado que obteve durante sua formação em língua inglesa.

 

A fim de verificarmos reais modificações da postura da professora em sala de aula, em relação às atividades propostas e realizadas, e ao tempo despendido durante as atividades (time-on-task), um estudo longitudinal faz-se necessário.

 

 

 

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA (de acordo com as normas APA)

 

1. Almeida Filho, J. C. P.(1999). O professor de língua estrangeira em formação. Campinas: Pontes.

 

2.  Brown,  J. D. & Rodgers,  T.  S. (2002) Case study research: developmental research. In: Doing Second Language Research. Oxford: Oxford University Press.

 

3. Celce-Murcia, M. (1991) Teaching English as a Second or Foreign Language (2nd ed.). New York: Newbury House.

 

4. Clandinin,  D.  J. &  Connelly,  F.  M. (2000)  Composing field texts. In: Narrative inquiry:

experience and story in qualitative research.  San Francisco: Jossey-Bass Publishers.      

 

5. Nunan,  D. (1992)  Case study.  In: Research methods in language learning.  Cambridge: Cambridge University  Press. 

 

6. Richards, J. (1998) Teaching in Action: Case Studies from Second Language Classroom. Bloomington: Ed. TESOL.

 

7. Richards, J. & Lockhart, C. (1995) Reflective Teaching in Second Language Classroom (2nd ed.). Cambridge: Cambridge University Press.

 

8. Richards, J. & Nunan, D. (1995) Second Language Teacher Education. (5th ed.). Cambridge: Cambridge University Press.

 

9. Wajnryb, R. (1996) Classroom Observation Tasks: a Resource Book for Language Teachers and Trainers. Cambridge: Cambridge University Press.